Insegurança alimentar e as doenças agudas e crônicas

Pulamos uma refeição e rapidamente sentimos os sinais físicos da fome (estômago roncando, dor de cabeça, tontura, vontade de atacar a primeira coisas que aparecer na frente). Mas a fome real vai além disso. O Brasil voltou ao mapa da fome. Mais de 7 milhões de pessoas não tem o que comer com frequência. No mundo mais de 800 milhões de pessoas passam fome. Isso não é só um número. São Marias, Josés, Anas, Camilas, Antônios e muito mais gente.

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Falar de fome dói. Mesmo para quem não sente. Atualmente trabalho em Portugal e diariamente um morador de rua vem revirar as lixeiras da minha rua. Já tentei falar com ele mas é assustado, acuado. Pelo que essa pessoa já passou? Ele tem nome, mas não sei qual é. Só sei que é sujo, muito magro, cabeludo e barbudo. E me preocupo com ele.

A insegurança alimentar é um termo que refere-se a quando um indivíduo ou família não sabe quando - ou se - a próxima refeição está chegando, se será algo nutritivo, são, não contaminado. Afeta pessoas em todo o mundo, de todas as idades, sexos, países. Mesmo em países ricos como os Estados Unidos, mais de 17,4 milhões de lares passam por insegurança alimentar em algum momento do ano. Fazem parte do grupo refugiados, imigrantes, pessoas de baixa renda, idosos sem apoio. A falta de fundos é óbvia em todos os casos. Como fica quando alguém tem que escolher entre comida ou remédio. Entre comida ou o pagamento do aluguel? E se o carro da família quebra? Não é fácil sair do ciclo de insegurança alimentar.

As causas da insegurança alimentar

São múltiplas as causas da insegurança alimentar, incluindo as opções políticas dos países,, as mudanças climáticas, a destruição do meio ambiente, o acesso à educação, ao trabalho e à renda, o enfraquecimento da sociedade civil, a desigualdade social, surtos de doenças, o desperdício de alimentos (em casa, nos restaurantes, do agronegócio), falta de recursos naturais (como água), empobrecimento da terra, desastres naturais, pandemias, globalização e perda das variedades locais de alimentos, a existência ou inexistência de políticas públicas protetoras (no Brasil, por exemplo, os estoques de alimentos vêm sendo continuamente esvaziados. Em 2019 várias unidades armazenadoras do estado foram vendidas).

Muitas vezes ouvimos as pessoas falando que a dieta saudável é mais barata. Será que é mesmo? É mais saudável para todo mundo? Você por exemplo tem sempre acesso ou condições de comprar alimentos frescos e orgânicos?

Quantas vezes já optamos por alimentos mais baratos na vida? Esta é uma constante para quem tem pouco. “Desembale menos e cozinhe mais” é a frase mais ouvida no momento. Mas e para quem precisa de dois ou três empregos para sustentar a família. E para quem precisa sair de casa às 5h da manhã e só volta às 10h da noite? Por que será que as pessoas tomam refrigerante com salgadinho barato no ponto de ônibus? Será apenas uma falta de conhecimento nutricional? Provavelmente o problema é muito mais profundo e por isso não podemos simplificar e sair julgando as escolhas alimentares de todo mundo, com base em nossa realidade.

Um fast-food denso em calorias pode ser muito mais interessante e barato para o trabalhador do que a salada cara e com poucas calorias do restaurante ao lado. Além disso, muitas pessoas vivem em áreas em que a disponibilidade de frutas e verduras é baixa mesmo. Por outro lado, o acesso à comida ultraprocessado pode ser alto. É o que chamamos de desertos alimentares. Uma pessoa que consegue comprar chocolate ou refrigerante no posto de gasolina mas não tem acesso à outros alimentos está em um deserto alimentar e é considerada vivendo em situação de insegurança alimentar.

Consequências da insegurança alimentar

Nosso corpo depende de comida para funcionar. Com fome a capacidade de aprender e trabalhar cai. A força de trabalho é o único recurso que muitas pessoas tem a oferecer e a redução da capacidade de trabalho agrava ainda mais a precariedade econômica da família.

No caso de crianças, há prejuízo do desenvolvimento físico e mental. A nutrição atrasa o crescimento e pode deixar sequelas cognitivas. A redução no potencial de aprendizado perpetua a pobreza no núcleo familiar. Além disso, a imunidade é prejudicada e o risco de infecções aumenta. Danos a longo prazo também podem acontecer. A opção por alimentos baratos e pouco nutritivos aumenta a probabilidade de doenças crônicas e morte prematura. Mulheres mal nutridas que engravidam podem dar à luz a crianças com maiores chances de desenvolvimento de doenças.

A fome também gera instabilidade familiar, política e social. Quando você estamos com fome, é difícil pensar em outra coisa que não comida. Pais que tem filhos passando fome em casa podem cometer delitos. Ou viver estressados, culpados e adoecidos psicologicamente. Crianças que passam fome ou que tem acesso apenas à alimentos ultraprocessados podem ser mais hiperativas, ansiosas ou agressivas.

Combate à insegurança alimentar

Quaisquer que sejam as raízes, combater a insegurança alimentar exige uma abordagem abrangente. Primeiro, precisamos capacitar as organizações que fornecem alívio imediato da fome às pessoas em nossas comunidades. Isso significa encontrar maneiras de apoiar bancos de alimentos e outras organizações de combate à fome. Capacitar as pessoas em política, para que votem bem, cobrem e, também, ajudem as próprias comunidades. Precisamos criar redes de apoio.

Segundo, precisamos de formas criativas para enfrentar os desafios de segurança alimentar causados ​​pelo próprio sistema global de alimentos. Como podemos conectar os pequenos agricultores às suas comunidades, os consumidores mais próximos e, ao mesmo tempo, com a economia global?

A mudança climática é um dos desafios mais significativos que enfrentamos. Desmatando não temos sombra, não temos água, temos um ambiente mais quente, não temos insetos polinizadores… Perdemos as variedades de nossa região, ficamos com uma dieta mais global e mais pobre.

Agricultores, indústrias, supermercados, transportadoras, pessoas precisam reduzir o desperdício de alimentos. As escolas precisam fornecer uma dieta completa à todas as crianças. Idosos de baixa renda ou que vivam sozinhas com qualquer dificuldade precisam ser apoiados.

A miséria é uma produção humana. Miséria e pobreza são primeiro um problema ético. Herbert de Souza - Betinho

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Segurança alimentar e nutricional em tempos de pandemia | O papel do governo para não faltar alimentos

Muito se fala do papel das pessoas para que não falte alimento. Mas qual é o papel do governo nisso tudo? Teremos segurança alimentar e nutricional?

A segurança alimentar e nutricional é entendida como a garantia do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer outras necessidades essenciais, tendo por base as práticas alimentares promotoras de saúde, que respeitem a diversidade cultural e sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis.  

O conceito de segurança alimentar abrange o manejo sustentável dos recursos naturais, a produção, armazenagem, distribuição, conservação e acesso universal aos alimentos, bem como os aspectos relacionados à sua qualidade, composição nutricional e aproveitamento biológico.

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Brasil está entre os países com maior insegurança alimentar no mundo

O Brasil lutou e lutou contra a fome e a miséria. Políticas públicas aumentaram o acesso a bens e serviços e reduziram a desnutrição. Porém, o país continua muito suscetível à insegurança alimentar e à desnutrição.

Alem da crise política, o Brasil vem convivendo, desde 2011, com climas extremos - secas severas no nordeste e inundações no Sul. De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU) a fome é significativamente pior em países com sistemas agrícolas altamente sensíveis a variabilidade de temperatura, chuva e seca e em países altamente dependentes da agricultura. No Brasil, a agricultura é responsável por 20% do PIB (produto interno bruto) mas apenas 1% dos créditos vão para o setor, enquanto o vizinho uruguai investe 15%.

É uma situação perigosa. Quando apenas grandes fazendeiros são apoiados, a diversidade alimentar é reduzida. Os pequenos produtores não conseguem investir em tecnologia e encontram muito mais dificuldades para lidarem com as mudanças climáticas. E os dias quentes estão tornando-se mais quentes, enquanto os dias frios, mais frios. O calor extremo está associado ao aumento da mortalidade infantil e de idosos e redução da capacidade de trabalho de adultos. O aumento da temperatura pode resultar em alterações dos volumes das chuvas prejudicando muitas culturas de alimentos, situação que deve perdurar até 2050.

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Além das mudanças climáticas, a desaceleração econômica reduziu a capacidade dos governos para lidar com as consequências dos eventos climáticos, o que agrava o risco de desnutrição, segundo relatório da FAO. De acordo com o mesmo a crise e a pobreza são fatores determinantes para a insegurança alimentar pois quando a produção cai o preço dos alimentos aumenta. Principalmente para os mais pobres o acesso a alimentos em quantidade e qualidade adequadas é reduzido.

Para a FAO os países, incluindo o Brasil, só conseguirão amenizar a insegurança alimentar quando unirem governo, setor privado e organizações não governamentais. O trabalho conjunto é que garantirá as inovações necessárias para garantir o suprimento de alimentos suficiente e adequado para todos.

Insegurança Alimentar:

Falta de disponibilidade de alimentos ou redução no acesso das pessoas a alimentos em quantidade e qualidade adequados. Uma casa é considerada como tendo segurança alimentar quando seus ocupantes não vivem com fome ou sob o medo de passar fome.

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/