No México, uma batalha está sendo travada nos tribunais por agricultores, apicultores, artistas, ativistas do meio ambiente, cientistas e defensores dos consumidores, na tentativa de salvar as espécies nativas de alimentos. O país possui 59 variedades nativas de milho. Agricultores sempre escolheram as melhores sementes para semear no ano seguinte. Porém, com a entrada de grandes corporações, houve contaminação da lavoura por variedades genéticamente modificadas que não reproduzem-se. Ou seja, o produtor rural fica obrigado a anualmente comprar sementes de gigantes agroquímicos.
Para o povo mexicano, o milho é uma característica definidora de sua herança cultural, história e culinária. Os povos indígenas do que hoje é o México cultivaram as primeiras variedades de milho há milhares de anos. O milho é consumido cozido e também é o principal ingrediente de tortilhas, pastéis, tamales, pozol e dezenas de outras preparações.
Os povos indígenas do que hoje é o México cultivaram as primeiras variedades de milho há milhares de anos. Mas desde 2009 as permissões para empresas multinacionais começaram a exterminar as variedades nativas, conhecidas como crioulas. Em 2011, a Monsanto e a Syngenta solicitaram as primeiras licenças para plantar milho geneticamente modificado no norte do México. Em outubro de 2013, um juiz federal ordenou uma suspensão temporária das licenças depois que um grupo de 53 agricultores e consumidores entrou com uma ação coletiva alegando que o cultivo de transgênicos violava o direito constitucional dos mexicanos a um ambiente limpo. Nos anos seguintes, os tribunais continuam a sustentar essa decisão, exigindo mais estudos e ampliando a proibição.
Contudo, o governo Trump tem forçado a liberalização das leis. Por isso, os autores da ação coletiva buscam uma ordem judicial que declara que a introdução em larga escala de milho geneticamente modificado viola a Lei de Segurança de Organismos Geneticamente Modificados do México, os direitos fundamentais à nutrição e à saúde e os direitos dos povos indígenas, bem como de diversas leis internacionais.
Ao mesmo tempo artistas como Fernando Laposse criam projetos artísticos e de mobiliário que usam as cascas de milho, não só para mostrar no mundo a riqueza e diversidade dos grâos de milho no México, mas também para estimular a regeneração das práticas agrícolas tradicionais.
No momento, a única esperança de salvar as espécies de milho tradicionais está nos povos indígenas, que continuam a plantá-los por tradição e não por ganho financeiro. Fernando opera em parceria com a comunidade de Tonahuixtla, uma pequena vila de agricultores e pastores. Infelizmente, a chegada da agricultura industrial à área e a falta de oportunidades de emprego geraram uma migração em massa, a erosão da terra e a perda de sementes nativas.
Em conjunto com o CIMMYT, o maior banco de sementes de milho do mundo, as sementes nativas estão lentamente retornando à agricultura tradicional. As cascas coletadas na colheita agora são transformadas por um grupo de mulheres locais no material de revestimento, criando assim o necessário emprego local. Este também é um projeto que exemplifica o poder do design de transformar, reparar e promover a coesão social.
Um banco de sementes armazena material de modo a evitar que certas culturas desapareçam. Também deveriam funcionar como uma opção para agricultores familiares que desejam ser independentes em relação às empresas produtoras de semente e conservar as espécies nativas, conhecidas como sementes crioulas.
No Brasil, a Embrapa, faculdades, o instituto brasileiro de florestas, o INCA, os indígenas, e os agricultores familiares são os principais responsáveis pela coleta e preservação das sementes nativas. A Embrapa é o 5o maior banco de sementes do mundo. Contudo, passa pela sua maior crise histórica, com um corte no orçamento de 20%. Com a redução das variedades de sementes a soberania alimentar fica ameaçada e passamos a depender cada vez mais de tecnologia externa.
Conhece o termo Soberania Alimentar?
Soberania alimentar é “[…] o direito dos povos definirem suas próprias políticas e estratégias sustentáveis de produção, distribuição e consumo de alimentos que garantam o direito à alimentação para toda a população, com base na pequena e média produção, respeitando suas próprias culturas e a diversidade dos modos camponeses, pesqueiros e indígenas de produção agropecuária, de comercialização e gestão dos espaços rurais, nos quais a mulher desempenha um papel fundamental […]. A soberania alimentar é a via para se erradicar a fome e a desnutrição e garantir a segurança alimentar duradoura e sustentável para todos os povos.” (Fórum Mundial sobre Soberania Alimentar, Havana, 2001).
A segurança alimentar e nutricional consiste na realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde, que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis. (II Conferência Nacional de SAN, 2004; LOSAN, 2006)