Aldosterona e dieta cetogênica

Que a dieta cetogênica é u ma estratégia interessantíssima para pessoas com diabetes tipo 2, síndrome metabólica, obesidade e a doença cardiovascular todo mundo sabe. Mas o que faz com os níveis de aldosterona?

A aldosterona é o mineralocorticoide mais potente produzido pelo córtex suprarrenal. Causa retenção de sódio e perda de potássio. Nos rins, a aldosterona provoca a transferência de sódio do lúmen do túbulo distal para as células tubulares em troca de potássio e hidrogênio.

Estudos de perda de peso usando redução calórica demonstraram uma diminuição na aldosterona, mais excreção de sódio água. Para os propensos a reter sódio (que gera inchaço, pressão alta, insuficiência cardíaca congestiva, edema/inchaço no tornozelo), essa excreção maior de sódio com a dieta acaba sendo uma bênção. E o que acontece na dieta cetogênica?

Um estudo prospectivo controlado de alimentação avaliou as concentrações de aldosterona e renina ao longo de 6 semanas em uma dieta cetogênica hipocalórica (25% de restrição energética) + placebo (DC+PL), dieta cetogênica + suplemento de sal de cetona (DC+SC) e uma dieta com baixo teor de gordura (BTG). A ingestão de sódio consistiu em 6100 mg, 2300 mg e 2000 mg para os grupos DC+SC, DC+PL e BTG, respectivamente.

Ambas as dietas cetogênicas forneceram 40 gramas (g) por dia de carboidratos, 1,5 g/kg de peso de referência de proteína e as calorias restantes fornecidas como gordura. A dieta BTG forneceu 25% de gordura total, 1,5 g/kg de peso de referência de proteína e 100 g de carboidratos.

A aldosterona sérica foi coletada em jejum na posição ereta nas semanas 0, 2, 4 e 6. Vinte e quatro participantes nos grupos de dieta cetogênica foram pareados por idade e índice de massa corporal, então divididos nos grupos DC+PL ou DC+SC. Um grupo separado de 12 participantes pareados foi recrutado especificamente para o grupo BTG.

A idade média foi de 33 anos. O peso diminuiu 6, 8 e 7 kg em média nos grupos DC+SC, DC+PL e BTG, respectivamente, ao longo de 6 semanas (p<0,05 para todos). A pressão arterial sistólica (PAS) melhorou de 117 e 115 mmHg nos grupos DC+SC e DC+PL para 110 mmHg ao longo de 6 semanas, enquanto a PAS média basal de 118 no grupo de dieta BTG não mudou.

A aldosterona média basal de 13,6 e 13,6 ng/dL nos grupos DC+SC e DC+PL aumentou para 33,3 e 27,3 ng/dL ao longo de 6 semanas (p<0,001). A aldosterona média basal de 8 ng/dL no grupo de dieta de BTG mudou não significativamente para 11,5 ng/dL ao longo de 6 semanas (p>0,05). Usando associações de valores previstos, aumentos em cetonas foram positivamente associados com aldosterona mais alta (R2=0,86; p<0,001).

Conclusão: Os participantes deste estudo em uma dieta cetogênica apresentaram níveis significativamente elevados de aldosterona ao longo do estudo, enquanto os participantes em uma dieta com baixo teor de gordura apresentaram pouca mudança. Inesperadamente, a aldosterona foi significativamente maior na dieta cetogênica com alto teor de sódio vs. baixo teor de sódio. Houve uma associação significativa entre cetonas e aldosterona, sugerindo que as cetonas podem desempenhar um papel estimulante na síntese ou secreção de aldosterona.

Este resultado foi inesperado uma vez que com a restrição de carboidrato há maior excreção de sódio e a queda de sódio leva a aumento de renina e aldosterona para conservação do mineral. Contudo, uma vez que qualquer excesso de sódio e água tenha sido eliminado do corpo nas primeiras semanas de uma dieta cetogênica, um novo equilíbrio entre ingestão de sódio e excreção de sódio deve ocorrer para que a circulação sanguínea adequada possa ser mantida.

Se, neste estado ceto-adaptado, o sódio da dieta for restrito, o cérebro e os rins enviam sinais para as supra-renais, que aumentam a produção de aldosterona, do hormônio do estresse cortisol e do hormônio de luta ou fuga adrenalina. Resultado? Sem sal há mais cansaço e estresse. Como níveis aumentados de cortisol e adrenalina são hormônios do estresse que impedem um sono adequado, indivíduos em dieta cetogênica devem receber maior suplementação de sódio. A dieta cetogênica neste estudo já possuía mais sódio do que as outras dietas, mas possivelmente estes indivíduos precisariam de ajustes de todos os eletrólitos e não só o sódio.

Em geral, indica-se:

  • 4–6 gramas de sódio

  • 3,5–5 gramas de potássio

  • 400–600 mg de magnésio

  • 1 grama de cálcio

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Mecanismos da dieta cetogênica na depressão

O termo depressão compreende uma vasta gama de experiências, mas os denominadores mais comuns são tristeza, perda de interesse por atividades antes apreciadas, desesperança e baixa energia. Estes sentimentos arrastam-se por longos períodos gerando uma queda na vitalidade.

Teorias apontam mudanças nos níveis de serotonina, dopamina e noradrenalina, mas as coisas não são tão simples. Estes neurotransmissores são, sem dúvida, importantes para a regulação do humor, mas não refletem a complexidade em torno da depressão. Por exemplo, em mulheres, quedas hormonais, especialmente no período da perimenopausa e menopausa aumentam o risco de depressão e também declínio cognitivo.

Um em cada quatro mulheres corre o risco de vir a ter depressão em algum momento da vida; entre os homens, a probabilidade é de um em sete. A Organização Mundial de Saúde estima que mais de 280 milhões de pessoas sofram de depressão no mundo.

Entre os gatilhos para depressão encontram-se o estresse, a neuroinflamação (por viroses, envelhecimento, alergias, disbiose, dieta inadequada, obesidade,...), a genética. Não há um gene único que aumente o risco de depressão, nem de outros transtornos psiquiátricos (como o transtorno afetivo bipolar). Já foram encontrados centenas de genes que desempenham pequenos papeis no sistema nervoso. E a interação entre genética e ambiente é importante.

Mecanismos ligando obesidade, inflamação e depressão (Fu et al., 2023)

Em momentos de estresse produzimos cortisol, um hormônio que mobiliza energia e reduz a inflamação. Mas em situações de estresse crônico, como quando precisamos tomar uma decisão de vida ou nas doenças crônicas (como obesidade) a elevação constante de cortisol faz com que o corpo se habitue. Após um tempo, deixa de reagir ao cortisol e a inflamação aumenta ainda mais.

Pessoas acima do peso também produzem mais citocinas inflamatórias. O tecido adiposo não é uma reserva de energia passiva e estas citocinas ativam o sistema imune. Mais de 40 genes relacionados à depressão também estão relacionados à inflamação. Quanto maior é o aumento de proteína C reativa, um marcador de inflamação, menor é o bem estar e mais sintomas de depressão tendem a aparecer.

Passar longos períodos de tempo sentados leva à inflamação dos músculos e do tecido adiposo. A privação de sono e as toxinas ambientais têm o mesmo efeito. Alimentos processados levam à inflamação do estômago e intestino. Tabaco gera inflamação no sistema respiratório. E, como tudo está ligado, o cérebro sofre. Inflamação constante faz o cérebro interpretar que estamos sob ataque constante. Ela gera substâncias para nos defender, o que consome nossa energia. Ele nos esconde do perigo (é comum o deprimido querer ficar embaixo das cobertas). Um terço de todas as depressões parece ser provocada pela inflamação.

Claro que nem toda depressão pode ser justificada por inflamação e estresse. Mas, na escala de cinzas que começa com o estresse psicossocial e termina com mecanismos de defesa biológica difíceis de controlar, há o que possamos fazer. Atividade física, sono de qualidade, terapia, medicação quando necessária, dieta e suplementação antiinflamatória fazem parte do tratamento.

Em termos biológicos, a depressão é tão estranha quanto a pneumonia ou o diabetes. Nem a pneumonia, nem o diabetes, nem a depressão têm absolutamente nada a ver com falta de caráter. Aconselhar alguém deprimido a se alegrar e recompor-se é como dizer aos pulmões com pneumonia para se recompor. Ou para o pâncreas do diabético a se recompor. Tal como devemos procurar tratamento para pneumonia ou diabetes, também o devemos fazer em caso de depressão.

O acesso do paciente com transtorno de humor a uma equipe multidisciplinar mínima com psiquiatra, psicólogo, educador físico e nutricionista deveria ser direito de todos.

Intervenções nutricionais na depressão

A combinação de estratégias é muito importante pois, entre 30% e 40% dos pacientes não respondem adequadamente à farmacoterapia e psicoterapia para o tratamento da depressão. Estas devem ser acompanhadas de outras estratégias. A dieta pode afetar a depressão de várias maneiras, incluindo:

  • regulação do metabolismo do triptofano,

  • redução da inflamação,

  • equilíbrio do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HPA),

  • modulação do eixo micróbio-intestino-cérebro,

  • aumento do fator neurotrófico derivado do cérebro (BDNF),

  • regulação epigenética.

Dieta cetogênica no tratamento da depressão

Pesquisas emergentes da psiquiatria nutricional e neuronutrição têm se concentrado na identificação de distúrbios metabólicos fundamentais dentro dos neurônios e em todo o corpo envolvendo resistência à insulina, inflamação, estresse oxidativo e alterações do microbioma intestinal. Todos esses quatro distúrbios metabólicos fundamentais estão presentes na depressão maior (2) e transtornos de ansiedade subjacentes (3) e podem ser modulados diretamente pelo uso da terapia metabólica cetogênica (TMC).

Modelos pré-clínicos demonstram que a intolerância à glicose está diretamente associada à ansiedade e que a resistência à insulina desencadeia comportamentos depressivos. No tecido cerebral, a resistência à insulina resulta em hipometabolismo cerebral da glicose e um ciclo vicioso de necessidades energéticas não atendidas. Em estudos humanos, o hipometabolismo cerebral da glicose é uma característica da depressão maior, do transtorno de ansiedade generalizada (TAG) e do transtorno afetivo bipolar (TAB).

A TMC, também conhecida como dieta cetogênica terapêutica é uma dieta com baixo teor de carboidratos, moderada em proteínas e rica em gorduras que suporta uma mudança metabólica fundamental de glicose para corpos cetônicos como a principal fonte de combustível. As TMC clássicas são formuladas com proporções estritas de macronutrientes, mais comumente 4:1 e 3:1 (gordura: proteína + carboidratos), e demonstraram eficácia em epilepsia intratável e distúrbios genéticos.

Mais recentemente, as TMC clássicas modificadas com proporções mais baixas de macronutrientes de 2,5:1, 2:1 e 1,5:1 e 1:1 foram utilizadas em pesquisas e na prática clínica. Elas permitem mais variedade na dieta, são mais fáceis de sustentar por longo períodos, além de atenderem mais facilmente às necessidades de micronutrientes, exceto vitamina D.

As TMC exploram a capacidade natural do corpo de produzir corpos cetônicos (d-beta-hidroxibutirato (BHB), acetoacetato e acetona) no fígado a partir de ácidos graxos, mantendo o consumo de carboidratos muito baixo. A produção aguda e sustentada de corpos cetônicos produz uma mudança fundamental na energia do combustível dentro das células, particularmente neurônios, que podem redirecionar radicalmente e depender rapidamente de BHB e acetoacetato prontamente disponíveis para energia celular. Os corpos cetônicos também aumentam a densidade vascular na barreira hematoencefálica, o que pode aumentar notavelmente a disponibilidade de corpos cetônicos para o metabolismo energético do cérebro em 40 vezes. As cetonas são uma fonte de energia para o SNCe os neurônios.

Tanto na cetose nutricional aguda quanto na de longo prazo, os corpos cetônicos têm uma série de efeitos biológicos que alteram diretamente o estado de energia celular do cérebro, aumentam a densidade mitocondrial e melhoram a morfologia mitocondrial, que demonstrou ser alterada em transtornos de humor.

Pesquisas recentes mostram que uma dieta cetogênica (KD) reduz as taxas de disparo neuronal, modula canais iônicos e cascatas de sinalização celular e estimula a síntese bioquímica e a neurotransmissão de GABA ao inibir a glutamato descarboxilase, um importante neurotransmissor inibitório envolvido no disparo neuronal e na ansiogênese. O BHB ativa a transcrição de genes relacionados a antioxidantes ao inibir histonas desacetilases, desencadeando mudanças adaptativas de longo prazo na expressão gênica. Além disso, em concentrações fisiológicas, os corpos cetônicos reduzem a neuroinflamação por meio de ação direta nos receptores acoplados à proteína G.

Talvez o mais importante, a KD aumenta diretamente o NAD+, o que reduz espécies reativas de oxigênio e aumenta a produção de ATP mitocondrial. Também é utilizado como substrato para sirtuínas e enzimas PARP associadas ao reparo e longevidade do DNA.

A psiquiatra Lori Calabrese relata neste artigo o uso da dieta cetogênica para a remissão de sintomas de pacientes com depressão e ansiedade generalizada. Pacientes com transtorno de ansiedade tendem a responder mais rapidamente do que pacientes com diagnóstico de depressão, apesar de estes também poderem alcançar remissão dos sintomas com a combinação medicação, psicoterapia e pelo menos 7 semanas de dieta cetogênica. A Dra. Calabrese deu uma entrevista para o podcast metabolic mind em 2024.

Resumindo, embora os mecanismos exatos da dieta cetogênica no tratamento da depressão ainda sejam objeto de debate, as teorias principais destacam alguns pontos:

  • Neuroproteção

    • Energia alternativa para o cérebro: As cetonas, produzidas pelo corpo durante a cetose, podem fornecer uma fonte de energia alternativa para as células cerebrais, protegendo-as de danos e promovendo a saúde neuronal.

    • Redução do estresse oxidativo O estresse oxidativo está associado a diversos problemas de saúde, incluindo a depressão. As cetonas podem ajudar a reduzir esse estresse, contribuindo para a proteção neuronal.

  • Efeitos anti-inflamatórios

    • Redução da inflamação cerebral: A inflamação crônica no cérebro tem sido associada à depressão. A dieta cetogênica pode ajudar a reduzir essa inflamação, contribuindo para a melhora do humor.

    • Melhora da função mitocondrial: As mitocôndrias são as "usinas de energia" das células. A dieta cetogênica pode melhorar sua função, o que, por sua vez, pode reduzir a inflamação e melhorar a saúde mental.

  • Melhora da saúde metabólica

    • Regulação da insulina: A resistência à insulina está ligada à depressão. A dieta cetogênica pode melhorar a sensibilidade à insulina, o que pode ter um efeito positivo no humor.

    • Estabilização do açúcar no sangue: As oscilações nos níveis de açúcar no sangue podem afetar o humor. A dieta cetogênica pode ajudar a estabilizar esses níveis, contribuindo para uma sensação de bem-estar.

  • Equilíbrio de neurotransmissores

    • Influência na produção de neurotransmissores: A dieta cetogênica pode influenciar a produção de neurotransmissores como a serotonina e a dopamina, que estão envolvidos na regulação do humor.

    • Redução dos sintomas depressivos: Algumas pesquisas sugerem que a dieta cetogênica pode ajudar a reduzir os sintomas depressivos, possivelmente através de sua influência nos neurotransmissores.

Além disso, probióticos, micronutrientes e outras substâncias ativas exibem efeitos antidepressivos significativos ao regular as vias acima. Elas fornecem insights para o desenvolvimento de alimentos antidepressivos.

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Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

GABA , INTESTINO E CÉREBRO

A microbiota intestinal tem muitas funções e beneficia o ser humano contribuindo para a digestão de alimentos, produção de vitaminas e defesa contra cepas patogênicas. Interage com o organismo humano por meio de contato direto (por exemplo, por meio de antígenos de superfície) e moléculas solúveis, que são produzidas pelo metabolismo microbiano. A existência do chamado eixo intestino-cérebro de comunicação bidirecional entre o trato gastrointestinal e o sistema nervoso central (SNC) também suporta uma via de comunicação entre a microbiota intestinal e os circuitos neurais do hospedeiro, incluindo o SNC.

Vários metabólitos microbianos que apresentam propriedades neuroativas foram descritos: (i) moléculas gasosas, como monóxido de carbono, sulfeto de hidrogênio e óxido nítrico; (ii) Ácidos graxos de cadeia curta (AGCC) como n-butirato, propionato e acetato; (iii) aminas, como putrescina, espermidina, espermina e cadaverina, que demonstraram estar envolvidas nas respostas do SNC ao estresse.

Curiosamente, as bactérias podem produzir uma ampla gama de moléculas que imitam os hormônios humanos. Por exemplo, o dipeptídeo muramil (semelhante à serotonina) e o indol (semelhante à melatonina) podem causar sono e sonolência, enquanto o lipopolissacarídeos (LPS) de bactérias Gram-negativas podem atuar diretamente sobre células da tireoide, por meio de receptores do tipo toll like (especialmente TLRs tipo 4) e regulam positivamente a expressão do gene da tireoglobulina.

Por outro lado, foi demonstrada a resposta direta das bactérias a alguns dos peptídeos reguladores/moléculas neuroativas secretadas pelas células enteroendócrinas e/ou pelo sistema nervoso humano, o que indica a presença de receptores neuromoduladores/neurotransmissores no envelope bacteriano. Por exemplo, os hormônios do estresse epinefrina e norepinefrina aumentam o crescimento in vitro de E. coli em mais de quatro ordens de grandeza e a proporção Clostridium/Bacteroides no intestino humano. O Vibrio cholerae pode responder à epinefrina e à norepinefrina (aumentando a taxa de crescimento, a motilidade natatória e a produção de fatores de virulência, como o fenótipo de sequestro de ferro) por meio de proteínas sensoras específicas.

As hipóteses mais avançadas consideram que as bactérias comensais contribuem para a comunicação cérebro-intestino, através de mediadores químicos partilhados, e isto faz parte dos mecanismos de homeostase que ajudam a manter a estabilidade da microbiota intestinal e possivelmente as funções e comportamento do cérebro. Essa “via de mão dupla” mediada por neuroquímicos é um dos princípios que sustenta a ciência da endocrinologia microbiana.

A comunicação bidirecional entre a microbiota intestinal e o sistema nervoso central (SNC) pode ocorrer através de múltiplas vias diretas ou indiretas. Estes incluem mecanismos endócrinos, imunológicos e neurais (Mazzoli, & Pesione, 2016)

Produção Bacteriana de Glutamato e GABA

L-Glutamato (Glu) e ácido γ-aminobutírico (GABA) são conhecidos principalmente por seu papel como os principais neurotransmissores no SNC de mamíferos, com funções excitatórias e inibitórias, respectivamente. Várias cepas bacterianas são capazes de produzir Glu. Bactérias corineformes, como Corynebacterium glutamicum, Brevibacterium lactofermentum e Brevibacterium flavum, têm sido amplamente utilizadas para a produção fermentativa industrial de Glu. Cepas LAB pertencentes a Lactobacillus plantarum, Lactobacillus paracasei e Lactococcus lactis também são capazes de sintetizar Glu. Um estudo recente revelou que cerca de 15% das cepas de LAB isoladas de alimentos fermentados asiáticos são produtoras de Glu.

Bactérias podem sintetizar GABA através da descarboxilação de Glu pela enzima glutamato descarboxilase (GAD). O GAD foi encontrado em bactérias Gram-positivas e Gram-negativas, onde está associado a sistemas que estão envolvidos na homeostase do pH e na geração de energia metabólica. Entre os microrganismos que são geralmente reconhecidos como seguros ou promotores da saúde, vários LAB (por exemplo, cepas pertencentes aos gêneros Lactobacillus, Lactococcus e Streptococcus) e cepas de Bifidobacterium foram relatados como biossintetizando GABA. A relação bioquímica entre Glu e GABA vai muito além desta atividade moduladora reciprocamente, uma vez que Glu e GABA são facilmente interconvertidos.

Glu é sintetizado in situ no SNC, uma vez que não consegue passar a barreira hematoencefálica (BHE). Glu é acumulado em vesículas e, após estimulação adequada, liberado no espaço sináptico, onde pode se ligar a um painel de receptores Glu (GluRs) que podem ser encontrados em neurônios pós-sinápticos. GluRs diferem com base em seu mecanismo de ação (por exemplo, receptores ionotrópicos, iGluR ou metabotrópicos, mGluR, Glu) e capacidade de resposta farmacológica [por exemplo, N-metil D-aspartato, NMDA ou α-amino-3-hidroxi-5 ácido -metilisoxazol-4-proprinoico (AMPA) ou receptores sensíveis ao cainato]. Os receptores ionotrópicos controlados por ligantes medeiam respostas sinápticas rápidas regulando diretamente o influxo de íons.

Os receptores metabotrópicos são acoplados às proteínas G e modulam cascatas de transdução de sinal mais lentas. Qualquer excesso de Glu presente na fenda sináptica é absorvido pelas células gliais ou neurônios para evitar a excitação prolongada dos neurônios pós-sinápticos, o que pode levar à morte celular. Glu na glia é desaminado oxidativamente em α-KG [pela Glu desidrogenase (GluDH)] ou convertido em Gln pela Gln sintetase. A Gln é liberada das células gliais, captada pelos neurônios pré-sinápticos [via transportadores de Gln (GlnT)], e é então convertida de volta em Glu pela glutaminase. Além de seu papel na neurotransmissão, o Glu também está envolvido em outros processos neurais, como o desenvolvimento neuronal e a plasticidade sináptica.

Neurônios pré-sinápticos inibitórios convertem Glu em GABA através da enzima GAD e o empacotam em vesículas através de transportadores vesiculares de GABA (vGATs). Novamente neste caso, Gln é uma fonte alternativa de Glu. Os múltiplos receptores GABA que estão presentes nos neurônios pós-sinápticos incluem receptores ionotrópicos (GABAA, GABAC) e metabotrópicos (GABAB). Além do GABA, esses receptores são possivelmente modulados por vários outros compostos, por exemplo, barbitúricos, baclofeno, benzodiazepínicos e esteróides Qualquer excesso de GABA não ligado é eliminado pelas células gliais através dos transportadores de GABA (GAT-1). O GABA é então convertido pela GABA transaminase (GABA-T) em semialdeído succínico, com biossíntese concomitante de Glu.

Glu/GABA: do intestino ao cérebro

Vimos que várias bactérias, incluindo bactérias probióticas e bactérias que colonizam o trato gastrointestinal humano, são capazes de produzir Glu ou GABA. O Bifidobacterium dentium, um produtor de GABA, é capaz de atenuar a sensibilidade dos neurônios dos gânglios da raiz dorsal em ratos. Até o momento, a maioria dos estudos sobre os efeitos do Glu/GABA em humanos preocupam-se Glu/GABA dietético.

Glu e GABA podem ser encontrados nos alimentos como componentes naturais ou como suplementos alimentares. Glu está entre os aminoácidos mais abundantes (8–10%) encontrados nas proteínas dietéticas. Além disso, o glutamato monossódico é amplamente utilizado como aditivo de sabor em alimentos. O GABA é relativamente abundante em alimentos vegetais, como germes e brotos de arroz integral, espinafre, cevada e brotos de feijão, onde foram detectadas concentrações de GABA entre 300 e 720 nmol/g de peso seco, embora mais altos níveis são encontrados em alimentos fermentados. Nos últimos anos, a utilização do GABA como suplemento alimentar aumentou progressivamente, tanto para alívio da ansiedade quanto na melhoria da qualidade do sono.

Pelo menos cinco estudos diferentes relataram que a administração oral de GABA ou alimentos/bebidas suplementados com GABA (quantidades correspondentes de GABA de cerca de 50-100 mg) teve efeitos positivos na saúde humana. Esses efeitos incluem: (i) a redução do estresse psicológico em pessoas que realizaram tarefas aritméticas, (ii) a redução do estresse em indivíduos expostos a altura; (iii) uma maior capacidade de executar ações planeadas priorizadas.

Podem ser hipotetizadas múltiplas vias pelas quais o Glu / GABA intestinal luminal pode afetar o SNC, incluindo seu transporte através do intestino e da BBB e sua detecção através de terminais aferentes que inervam o trato gastrointestinal.

Vias potenciais para Glu/GABA luminal no intestino (de origem dietética ou da microbiota intestinal) para influenciar o sistema nervoso (Mazzoli, & Pesione, 2016)

Vários transportadores que medeiam a absorção de Glu foram encontrados na membrana apical das células epiteliais GI, principalmente no intestino delgado e também no estômago. Glu é um dos principais nutrientes dos enterócitos. Apenas uma pequena percentagem (entre 5 e 17%, dependendo dos estudos) do Glu ingerido é transportada para a circulação portal, mas isto geralmente não afecta grandemente a concentração de Glu no plasma. Além disso, um aumento da concentração plasmática de Glu (após a ingestão de Glu) não afeta necessariamente a concentração de Glu nos tecidos cerebrais, uma vez que é geralmente reconhecido que o Glu não pode passar pela BBB. Um aumento de 20 vezes (ou mais) na concentração plasmática de Glu foi considerado necessário para acessar os tecidos cerebrais em roedores. O alcance de uma concentração tão elevada de Glu no plasma após a ingestão alimentar (ou biossíntese de Glu pela microbiota intestinal) parece bastante improvável.

No que diz respeito aos transportadores de GABA, eles são encontrados principalmente no SNC. No entanto, foi demonstrada a ligação H+/GABA através da membrana apical das células epiteliais intestinais humanas (Caco-2). Além disso, transportadores de GABA foram detectados na membrana basolateral das células Caco-2. Estas descobertas sugerem que o GABA luminal deve ser capaz de atravessar a barreira intestinal e possivelmente atingir alvos extra-intestinais. Na verdade, foi relatado que o GABA administrado por via oral em ratos aumentou a concentração de GABA no sangue, com um pico após 30 min. No entanto, a capacidade do GABA de cruzar a BBB ainda é controversa. Alguns estudos também sugeriram que a permeabilidade da BBB ao GABA poderia diminuir com o aumento da idade. De qualquer forma, uma ação direta do Glu intestinal luminal e / ou GABA no SNC não pode ser excluída, embora sejam necessários mais estudos in vivo para confirmar esta hipótese.

Probióticos para o tratamento de transtornos psiquiátricos?

A neuroendocrinologia microbiana aborda a capacidade dos probióticos de sintetizar e responder a compostos neuroativos e, assim, afetar os processos neurológicos do hospedeiro e, às vezes, a fisiologia geral do hospedeiro. Vários estudos forneceram evidências sobre a capacidade das cepas probióticas de modular o humor e as respostas ao estresse dos humanos e de reduzir a ansiedade e a depressão. Por exemplo, a administração de Bifidobactérias e lactobacillus pode aumentar os níveis de melatonina salivar matinal, reduzindo assim os sintomas da síndrome do intestino irritável. Também foi relatada uma modulação direta da atividade dos neurônios mioentéricos por produtos de fermentação não identificados de Bifidobacterium longum exibindo efeitos ansiolíticos.

Alterações nos circuitos Glu/Gln/GABA no SNC têm sido relatadas para transtornos de ansiedade generalizada, bem como em outras condições psiquiátricas, como transtorno depressivo maior (TDM), transtorno afetivo bipolar (TAB), transtorno maníaco-depressivo e esquizofrenia.

A maioria dos antidepressivos (como os tricíclicos), embora tenham um efeito positivo no humor dos humanos, não aliviam e podem até agravar os sintomas cognitivos ou prejudicar a vigilância (por exemplo, inibidores seletivos da recaptação de 5-HT), e podem causar dependência (por exemplo, benzodiazepínicos). Encontrar terapias alternativas ou adjuvantes é, portanto, uma prioridade de investigação e, a este respeito, a utilização de bactérias neuromoduladoras ou dos chamados psicobióticos é uma perspectiva fascinante.

Pessoas com GABA adequado tendem a ser mais calmas, pacientes, organizadas, estáveis emocionalmente. A falta aumenta nervosismo, irritação, falta de paciência, ansiedade, insônia, justamente pelo desequilíbrio em relação a outros neurotransmissores.

Curiosamente, os efeitos ansiolíticos e antidepressivos da ingestão de Lactobacillus rhamnosus JB-1 em camundongos envolvem uma redução nos níveis plasmáticos de corticosterona e alterações nos padrões de expressão dos receptores GABAA e GABAB em áreas específicas do cérebro. Esses efeitos foram mediados pela comunicação intestino-cérebro através do nervo vago.

Embora a produção de GABA tenha sido especulada como o fator chave na a capacidade de um Lactobacillus helveticus –B. longum para reduzir comportamento(s) semelhante(s) à ansiedade, os efeitos probióticos observados na saúde psicológica de um hospedeiro são geralmente provavelmente o resultado de múltiplas interações com o hospedeiro.

Nootrópicos que estimulam GABA

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