Velhos e novos tratamentos para a doença de Machado-Joseph (ataxia SCA3)

A doença de Machado-Joseph ou ataxia SCA3 é uma neuropatologia rara, causada pela mutação do gene ATXN3, localizado no cromossomo 14. As principais características são a perda progressiva da coordenação motora, do controle muscular, as perturbações na visão, na fala e na deglutição. A maior parte dos pacientes manifestam a doença entre os 35 e os 50 anos mas existem subtipos que manifestam-se na infância e outros apenas na terceira idade. A expectativa e qualidade de vida dependem da gravidade dos sintomas e da idade de aparecimento dos mesmos, assim como do acesso aos cuidados necessários.

Guilherme Karam era portador da doença

Guilherme Karam era portador da doença

A doença parece ter surgido na Ásia, chegando depois aos Açores, a Portugal continental, suas colônias e, com as migrações, ao restante do mundo. No Brasil, a doença foi mais divulgada em 2016, por ocasião do falecimento do ator Guilherme Karam, aos 58 anos.

Até o momento não existe cura para a doença. Por isto, o tratamento costuma ser sintomatológico. Por exemplo, fisioterapia, atividade física, yoga e terapia ocupacional podem ajudar os pacientes a manterem-se independentes por mais tempo. Fonoaudiólogos trabalham com pacientes com dificuldades na fala e deglutição. A espasticidade (aumento involuntário das contrações musculares) pode ser reduzida com medicamentos antiespasmódicos, como o baclofeno. Os sintomas parkinsonianos podem ser tratados com terapia com levodopa. Os óculos prismáticos podem reduzir os sintomas diplópicos, como a visão dupla.

Estudos da Universidade de Coimbra focam no papel das ataxinas, proteínas nucleares que, ao sofrerem mutações, geram ataxias (perda do controle muscular durante movimentos voluntários). De acordo com estudos recentes, portadores da doença de Machado-Joseph, produzem menores quantidades de ataxina 2 e acúmulo tóxico da ataxina 3. Pesquisas nesta área focam então em fórmulas farmacêuticas capazes de reduzir a ataxina 3.

A sirtuína 1 (SIRT1) também parece estar reduzida no cérebro de portadores da doença. Mas estudo de 2016 demonstrou que a restrição calórica resgata a transcrição e os níveis desta proteína associada à longevidade e à redução da neuroinflamação. O mesmo foi realizado em camundongos e mostrou melhorias na coordenação, trazendo novas hipóteses para intervenções e estudos em humanos (Cunha-Santos, et al., 2016). O resveratrol, é um pigmento roxo, com ações antiinflamatórias, capaz também de elevar a SIRT1, assim como o jejum (Mohar & Malik, 2013; Hayashida et al., 2010).

Outro alvo é o neuropepídio Y (NPY), um modulador da comunicação entre o sistema nervoso e o sistema imune. O NPY também contribui para a neurogênese e atenua a neuroinflamação (Duarte-Neves, Almeida e Cavadas., 2016). A prática de jejum aumenta o NPY. O jejum também contribui para o emagrecimento. Assim, nos pacientes que precisam emagrecer o ideal é jantar cedinho e só comer no dia seguinte após cerca de 12 horas a 16 horas. Ou seja, quem jantou às 20h vai comer no dia seguinte ao meio dia (16 horas em jejum). Quem nâo consegue deve fazer pelo menos 12 horas de jejum, alimentando-se após 8h da manhã, neste caso. Quem não quer ou não pode emagrecer pode também fazer 12 horas de jejum, pelo menos 2 vezes por semana, estimulando a neurogênese, mas sem nenhuma restrição calórica, para que haja manutenção do peso. Evidências recentes mostram que toda doença que cursa com elevado estresse oxidativo pode beneficiar-se do jejum. Este é o caso da doença de Machado-Joseph (Pacheco et al., 2013).

A dieta antiinflamatória também é fator essencial na redução da neuroinflamação. O consumo de nozes, por exemplo, vem sendo investigado, na modulação do estresse oxidativo no sistema nervoso. Nozes são ricas em fitoquímicos antiinflamatórios capazes de melhorar a sinalização nervosa, aumentar a neurogênese e sequestar agregados de proteínas tóxicas (Poulose, Miller e Shukitt-Hale, 2014). O chá verde também vem sendo muito investigado pelos efeitos antioxidantes (catequinas neutralizam radicais livres e previnem a oxidação de lipídios nas membranas do cérebro), efeito quelante de metais pesados, capacidade de reduzir marcadores inflamatórios associados à neuroinflamação, reduzir a agregação de beta-amilóide e a neurotoxicidade, manter vasos do cérebro elásticos e saudáveis (Kakutani, Watanabe e Murayama, 2019).

Na clínica, os efeitos da dieta no combate ao estresse oxidativo e à neuroinflamação podem ser avaliados indiretamente, por meio de exames laboratoriais. Considera-se ideal: hemoglobina glicada abaixo de 5%, insulina de jejum abaixo de 5 µUI/mL, Homa-IR abaixo de 1,2, ácido úrico abaixo de 3,9 mg/dL, proteína C-reativa até 1 mg/L, relação apoB:apoa1 até 0,6.

Para atingir os valores acima alguns pacientes precisarão adotar uma dieta com características mais cetogênicas. Um estudo publicado em 2022 mostrou que a suplementação de triglicerídeos de cadeia média (TCM) na quantidade de 18g ao dia, por 3 meses, melhorou a marcha e o equilíbrio de pacientes idosos. Isto foi devido ao metabolismo da glicose suprimido no córtex sensório-motor no cérebro. Além disso, ressonância magnética e PET com 18F-fluorodeociglicose também confirmaram o aumento da conectividade funcional do hemisfério cerebelar ipsilateral (Mutoh et al. 2022).

Basicamente, o cérebro estava funcionando melhor e isso se traduziu em melhor movimento físico. Os MCTs (triglicerídeos de cadeia média) são únicos em comparação com outras gorduras, pois são rapidamente convertidos em corpos cetônicos. As cetonas são pequenas moléculas solúveis em água que são capazes de atravessar a barreira hematoencefálica. Eles fornecem mais energia por unidade de oxigênio e produzem menos resíduos metabólicos, daí sua reputação como um supercombustível para o cérebro.

Conforme envelhecemos o uso de glicose para o cérebro torna-se menos eficiente. Por isso, açúcares e carboidratos simples devem ser reduzidos e corpos cetônicos aumentados. Uma forma de estimular a produção de corpos cetônicos é pela dieta cetogênica suplementada com TCM.

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Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/
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