MELAS E AUTISMO

MELAS (Síndrome mitocondrial encefalomiopática com acidose láctica e episódios de acidente vascular cerebral) e Autismo são duas condições distintas, mas há pontos de interseção entre elas, especialmente no contexto de distúrbios mitocondriais e desenvolvimento neurológico. Lembrando que até 5% das crianças com TEA possuem doenças mitocondriais raras [1].

O que é MELAS?

MELAS é uma doença mitocondrial genética rara, causada por mutações no DNA mitocondrial (geralmente na mutação A3243G do gene MT-TL1). Os sintomas mais comuns incluem:

  • Episódios semelhantes a AVC antes dos 40 anos

  • Encefalopatia (convulsões, demência)

  • Miopatia (fraqueza muscular)

  • Acidose láctica

  • Surdez neurossensorial

  • Cefaleias recorrentes

O que é Autismo?

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é uma condição do neurodesenvolvimento caracterizada por dificuldades de:

  • Comunicação e interação social

  • Comportamentos repetitivos

  • Interesses restritos

  • Sensibilidade sensorial

MELAS e Autismo: Qual é a ligação?

Pesquisas indicam que distúrbios mitocondriais (como MELAS) podem estar associados a sintomas autistas, especialmente em crianças. Isso porque:

  • O cérebro consome grande parte da energia do corpo. Se a mitocôndria não está funcionando corretamente (como em MELAS), o desenvolvimento neurológico pode ser afetado.

  • Algumas crianças com MELAS podem apresentar sintomas compatíveis com TEA (como regressão no desenvolvimento, dificuldades de interação, etc.).

Sintomas sobrepostos

  • Regressão no desenvolvimento

  • Dificuldades de linguagem

  • Comportamentos repetitivos

  • Atraso motor ou cognitivo

Estudos e dados relevantes

Um estudo destacou que os erros inatos do metabolismo (EIMs), que incluem distúrbios mitocondriais como o MELAS, podem se manifestar com sintomas psiquiátricos ou comportamentais, incluindo características semelhantes ao autismo. No entanto, observou-se que os EIMs estão subjacentes aos sintomas autistas em menos de 5% dos casos [2].

Pesquisas indicam que pacientes com MELAS podem apresentar comprometimentos cognitivos e déficits neuropsicológicos. Por exemplo, um estudo envolvendo 15 pacientes com encefalomiopatias mitocondriais constatou que a deterioração cognitiva era comum, particularmente naqueles com MELAS [3]. Esse declínio cognitivo pode potencialmente se sobrepor aos desafios de desenvolvimento observados no autismo.

Estudos genéticos sugerem que a disfunção mitocondrial pode contribuir para distúrbios do neurodesenvolvimento, incluindo o TEA. A literatura indica um interesse crescente nas bases genéticas de ambas as condições, embora as ligações diretas entre o MELAS e o TEA permaneçam amplamente inexploradas.

Diagnóstico e acompanhamento

  • Exames genéticos (teste da mutação A3243G para MELAS)

  • Biópsia muscular

  • Ressonância magnética do cérebro

  • Dosagem de ácido láctico e pirúvico

  • Avaliação neuropsicológica e comportamental

  • Testes de linguagem e cognição

  • Investigação metabólica se houver suspeita de distúrbio mitocondrial

Manejo clínico

  • MELAS: Não há cura, mas pode-se usar suplementos mitocondriais (como coenzima Q10, L-carnitina, ácido lipoico, complexo B), evitar gatilhos metabólicos, acompanhamento multidisciplinar. A conduta pode ser individualizada com testes nutrigenéticos e metabolômicos.

  • TEA: Intervenções comportamentais (ABA, TEACCH), fonoaudiologia, terapia ocupacional, suporte educacional e nutricional.

Em resumo, embora MELAS e autismo possam compartilhar algumas características sobrepostas, a relação direta entre os dois precisa ser melhor investigada. As doenças mitocondriais são mais raras, porém, podem existir também alterações de funcionamento mitocondrial (disfunção mitocondrial). Estas sim, são mais comuns [4].

Referências

1) G Oliveira et al. Mitochondrial dysfunction in autism spectrum disorders: a population-based study. Dev Med Child Neurol (2005). doi: 10.1017/s0012162205000332. PMID: 15739723.

2) F Ahmadabadi et al. Autistic feature as a presentation of Inborn Errors of Metabolism. Iranian journal of child neurology (2020). https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/33193781/

3) CJ Lang et al. Neuropsychological status of mitochondrial encephalomyopathies. European journal of neurology (1995). https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/24283633/

4) DA Rossignol & RE Frye. Mitochondrial dysfunction in autism spectrum disorders: a systematic review and meta-analysis. Molecular Psychiatry (2012). https://doi.org/10.1038/mp.2010.136

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Disrupção da barreira hematoencefálica na doença de Parkinson

A doença de Parkinson (DP) é um distúrbio neurodegenerativo associado ao acúmulo anormal da proteína α-sinucleína (α-syn) em neurônios da substância negra. A morte neuronal leva à redução de dopamina e desequilíbrios funcionais nos circuitos cerebrais, afetando o controle motor. Daí sintomas como tremores, rigidez, etc.

Pesquisas revelam que infecções crônicas geram danos à barreira hematoencefálica (BHE) — a “muralha” que protege o cérebro.

Estudo 1 – Cientistas usaram ressonância magnética com contraste para analisar cérebros de pacientes com DP e encontraram aumento significativo na permeabilidade da BHE.

Ou seja, o cérebro está mais exposto a toxinas, células imunes e... micro-organismos. Isso pode acelerar a inflamação e a morte dos neurônios dopaminérgicos — peça central no #Parkinson.

Estudo 2 – Outra pesquisa foi além: encontrou DNA e estruturas de fungos e bactérias em múltiplas regiões cerebrais de pacientes com Parkinson.

Microrganismos como Candida, Fusarium e Streptococcus estavam presentes em neurônios, vasos e outras regiões do cérebro. Isso sugere infecção crônica no cérebro, algo antes considerado impensável.

Vários fatores genéticos, ambientais, imunológicos, metabólicos e microbianos, podem ser gatilhos ou aceleradores da doença por aumentar a hiperpermeabilidade da BHE, incluindo:

  1. Alto consumo de glúten e sensibilidade não celíaca

  2. Disbiose intestinal

  3. Infecções crônicas (fungos e bactérias)

  4. Inflamação sistêmica e autoimunidade

  5. Exposição a metais pesados, como alumínio

  6. Envelhecimento, estresse oxidativo e depleção de glutationa

Mas muito pode ser feito!

- Tratar intestino - toxinas intestinais podem induzir a formação de agregados α-syn no sistema nervoso entérico

- Adotar dieta antiinflamatória

- Repor nutrientes fundamentais para sistema imune, como vitamina D

- Suplementação de nutrientes mitocondriais (como B2 e magnésio), também necessários à transformação da vit.D na forma ativa

- Uso de silício orgânico para eliminação de alumínio

- Reduzir estresse oxidativo com suplementos apropriados

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Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Genética não é destino: o livro não dita o final da história!

Cada um de nós nasce com um "livro de receitas" único – nosso DNA. Ele contém todas as instruções para construir e manter nosso corpo. O núcleo de cada célula contém quase 2 metros de DNA, compactado, organizado e estruturado de forma que cada célula sabe exatamente o que ler desta informação, o que, como e quando fazer a cópia da informação e a produção de proteínas.

Dentro de uma célula, nem todas as receitas são preparadas ao mesmo tempo, nem em todos os lugares. Algumas ficam guardadas, outras são usadas o tempo todo, e outras ainda podem ser ativadas ou silenciadas conforme o ambiente e o estilo de vida.

Os Temperos da Epigenética

A epigenética é como os temperos e anotações que o chef (nosso corpo) coloca no livro:

  1. Metilação do DNA: Imagine um post-it colado em cima de uma receita dizendo: “Não cozinhe esta!”
    A metilação é a adição de grupos químicos (CH3 ou metil) que silenciam genes, impedindo que sejam lidos.

  2. Modificações nas Histonas: O DNA é enrolado em "carretéis" chamados histonas. Se estiver bem apertado, ninguém consegue ler aquela parte do livro. Se estiver soltinho, a receita está acessível!
    Certas marcas químicas mudam o grau de enrolamento – ativando ou bloqueando genes.

  3. RNA não codificante: Mensageiros especiais que dizem: “Essa receita está errada – jogue fora!”
    Alguns RNAs impedem que certos genes sejam traduzidos em proteínas.

Você é o Cozinheiro: Ambiente e Escolhas Importam

Alimentação, exercícios, sono, estresse, exposição a toxinas, afeto na infância... Tudo isso marca o livro com post-its, rabiscos ou destaques coloridos. São as marcas epigenéticas!

Exemplos reais:

  • Gêmeos idênticos (mesmas instruções do livro) podem acabar com diferentes receitas ativadas, dependendo da vida que levam.

  • Filhos de mães que passaram fome durante a gestação podem ter genes de metabolismo alterados.

Moral da história: DNA não é destino!

Você não pode mudar o texto original do seu livro (o DNA), mas pode influenciar como ele é lido e usado. Isso significa que nossas escolhas contam – e contam muito!

É como se o DNA fosse o roteiro de um filme. Já a epigenética é o diretor, que escolhe quais cenas entram, quais são cortadas, e como a história será contada. E você é o protagonista, o ator principal, influenciado pela história, mas também com poder de mudar o final.

Alimentação e epigenética

Certos nutrientes ou compostos bioativos modificam quimicamente o DNA (ou as proteínas ao redor dele), regulando a expressão gênica. Veja exemplos:

  • Gestantes com dieta pobre em folato têm maior risco de alterações epigenéticas no feto.

  • Dieta mediterrânea tem sido associada a perfis epigenéticos protetores contra doenças crônicas.

  • Estudos mostram que dietas ricas em ultraprocessados podem desregular a epigenética ligada à inflamação, obesidade e até depressão.

Brasileiros estão consumindo muitos ultraprocessados!

A pesquisa “Estimativa da participação calórica de alimentos ultraprocessados nos municípios brasileiros”, publicada em 2025 estimou a participação calórica de alimentos ultraprocessados nos municípios brasileiros – ou seja, quanto do total de calorias que os indivíduos ingerem provém desse tipo de alimento. A variação foi de 5,7% ( em Aroeiras do Itaim, Piauí) a 30,5% (em Florianópolis, Santa Catarina).

Enquanto Maranhão, Piauí e Tocantins, estados com maior proporção de população rural, apresentaram as estimativas mais baixas de consumo de ultraprocessados, São Paulo, com grande concentração urbana, apresentou estimativas municipais acima de 18%. Além disso, todas as 26 capitais e o Distrito Federal apresentaram estimativas mais elevadas em comparação com os demais municípios de seus respectivos estados (Cacau et al., 2025).

Municípios com renda per capita abaixo de 5 salários mínimos apresentam estimativas muito inferiores de consumo do que aqueles onde mais de 15% da população possui uma renda per capita igual ou superior a 5 salários mínimos. Os municípios mais ricos têm estimativas de participação calórica de alimentos ultraprocessados acima de 20% (com exceção de Vitória - ES).

O estudo também aponta que o consumo de ultraprocessados têm aumentado no país, especialmente nas regiões norte e nordeste e que possivelmente os municípios que apresentaram as menores estimativas tenham um desempenho diferente quando os dados da POF e do Censo brasileiro forem atualizados.

O consumo de alimentos ultraprocessados está associado a diversos riscos à saúde, tanto no curto quanto no longo prazo. Esses alimentos são formulações industriais feitas majoritariamente de substâncias extraídas de alimentos (como óleos, gorduras, açúcares, amidos e proteínas), derivados de constituintes alimentares ou sintetizados em laboratório (como corantes, aromatizantes e realçadores de sabor).

Principais riscos à saúde do consumo excessivo de ultraprocessados:

- Obesidade
- Doenças cardiovasculares
- diabetes tipo 2
- câncer colorectal
- Problemas digestivos
- Depressão

Mas por que tudo isso acontece?

Esses efeitos têm três principais mecanismos interligados:

1. Modificações epigenéticas

Alimentos ultraprocessados afetam diretamente a expressão gênica sem alterar a sequência do DNA.

  • Excesso de açúcar e gordura → altera os padrões de metilação do DNA, ativando genes inflamatórios.

  • Deficiência de nutrientes reguladores (como colina, folato, zinco) → prejudica o funcionamento das “chaves” epigenéticas.

  • Compostos artificiais (corantes, conservantes, adoçantes) → associados a disfunções epigenéticas e até à regulação de genes de humor.

Resultado: genes relacionados à saciedade, metabolismo de gordura e resposta ao estresse podem ser desregulados.

2. Desequilíbrio metabólico e inflamação crônica

  • Ultraprocessados causam picos de glicose e insulina, gerando resistência insulínica e estresse oxidativo.

  • Esse ambiente metabólico ativa genes pró-inflamatórios e silencia genes protetores via epigenética.

Exemplo: células imunes começam a se comportar como se o corpo estivesse constantemente inflamado.

3. Desregulação hormonal e do eixo intestino-cérebro

  • Adoçantes artificiais e aditivos afetam o microbioma intestinal, que por sua vez influencia a metilação do DNA.

  • Alterações no intestino estão ligadas a problemas como ansiedade, depressão e alterações cognitivas.

Estudos mostram que alterações epigenéticas em regiões do DNA ligadas à produção de serotonina e dopamina (neurotransmissores do bem-estar) podem ocorrer por influência da dieta. Como diz o título do texto: genética não é destino. Temos escolhas. Uma delas é: desembalar menos e cozinhar mais!

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Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/