Inflamação e hipertrofia

A musculatura esquelética possui enorme capacidade de adaptar-se a diversos estímulos, hormonais, nutricionais e mecânicos (Zanchi, Nicastro e Lancha-Jr, 2008). A estimulação mecânica, como a que acontece no treinamento de força induz uma resposta adaptativa que leva ao aumento da massa muscular na presença de nutrientes adequados. 

Com o exercício há ativação de vias inflamatórias, parcialmente mediados pela ativação das enzimas ciclooxigenases. Com a ruptura de miofibrilas musculares ácido araquidônico é liberado da musculatura e a partir dele são produzidas substâncias inflamatórias. A musculatura esquelética sob contração também é capaz de produzir citocinas, como a interleucina 6. Apesar de gerarem dor, estas substâncias inflamatórias desempenham um papel importante pois ativam as células satélites na musculatura esquelética, as quais são essenciais ao processo de hipertrofia (Serrano et al. 2008). 

A suplementação de ácido araquidônico foi inclusive testada na tentativa de melhorar o rendimento físico. Contudo, sua suplementação (além das quantidades naturalmente presentes na alimentação) não favoreceu o ganho de massa muscular (Roberts et al., 2007).

Exercícios de alta intensidade aumentam sim a produção de radicais livres, tanto pelo aumento do consumo de oxigênio, quanto pela ativação de vias metabólicas específicas. O  treinamento adequado gera adaptações como o aumento da defesa antioxidante, o que protege os praticantes contra doenças comumente observadas em sedentários (Schenider e Oliveira, 2004). Por isso, é importante treinar com o suporte de um educador físico já que exageros aumentam o estresse oxidativo (circulação exagerada de radicais livres) e este associa-se a aterosclerose, câncer,  envelhecimento precoce dentre outros problemas, inclusive pode dificultar a hipertrofia. 

Exercícios de endurance, quando praticados cronicamente também podem aumentar o risco de fibrilação arterial, arritmias ventriculares malignas e doenças coronarianas arteriais (Lavie et al., 2015). Este ano, artigo publicado na revista JAMA mostrou, obviamente, que ser sedentário não é nada bom. A prática de atividade física foi protetora. Mas até quanto? Foi protetora quando se praticava 3 a 6 horas por semana de atividade física intensa ou 7 a 12 horas por semana de atividade física moderada. A partir daí o risco de mortalidade voltou a aumentar (Hannah et al., 2016). Para maior segurança, conte com a orientação de um educador físico.

Mais estudos nesta área ainda fazem-se necessários (De Souza et al., 2016). Suplementos antioxidantes, como vitamina C e vitamina E não tem sido preconizados, já que não melhoram o rendimento e podem até atrapalhar. Yfanti e colaboradores (2010) suplementaram vitamina C e vitamina E para praticantes de atividade física que não possuíam carências nutricionais. Não houveram quaisquer melhorias na performance ou maior adaptação muscular. 

Além disso, a suplementação excessiva pode reduzir as adaptações necessárias ao ganho de massa magra (Merry e Ristow, 2015). Desta forma, o melhor é sempre optar por uma alimentação equilibrada. Frutas cítricas como limão, morango e kiwi são boas fontes de vitamina C. A dosagem recomendada para adultos fica entre 65 e 120 mg/dia.

Um adulto saudável deve ingerir, diariamente, cerca de 15 mg desta vitamina, através do consumo destes alimentos ricos em vitamina E, como azeite, castanhas e abacate.

Já pessoas que adotam dietas desbalanceadas ou hipocalóricas possuem mais comumente carência de micronutrientes. A deficiência de vitaminas do complexo B (B1, B2 e B6) e vitamina C reduz o  VO2max (van der Beek, 1991). Neste caso, a suplementação faz-se necessária. O consumo adequado de minerais também deve ser observado. 

O zinco é cofator da Superóxido Dismutase (SOD), enzima antioxidante endógena. Além disso, o zinco tem participação na estabilidade de receptores dos hormônios sexuais. Exercícios que provocam sudorese elevada, como observado em treinos de crossfit, contribuem para a redução do zinco circulante no sangue.  A suplementação, em geral, fica entre 8 e 23 mg/dia. 

Já o selênio participa da enzima antioxidante glutationa peroxidase, a qual também atenua os efeitos deletérios do excesso de radicais livres. Outra função de grande relevância é a sua participação no metabolismo tireoidiano. Enzimas chamadas de deiodinases, responsáveis por converter o T4 em T3, têm o selênio como cofator. A baixa conversão do T4 em T3 causa um impacto negativo na produção de energia e gera menor ganho de massa magra. É comum que a suplementação fique entre 55 e 150 mcg/dia. Contudo, o selênio é facilmente obtido de alimentos como castanhas. Uma única castanha do Brasil (Pará) fornece entre 200 e 400 mcg de selênio.

O magnésio, presente em grandes quantidades em folhosos verde escuros, como  a couve, é fundamental para a produção de ATP, molécula responsável pelo armazenamento e liberação de energia. Como vimos, níveis baixos de  magnésio estão correlacionados com menores concentrações de testosterona e maior incidência de cãibras.

Por fim, o cromo tem a função de otimizar o metabolismo de absorção da glicose pela célula para ser metabolizada e transformada em energia. Estudos sugerem que o picolinato de cromo possa exercer uma ação positiva na melhora da composição corporal, promovendo o ganho de massa magra e redução de gordura, porém há controvérsia a essa conclusão em outros estudos.

As mulheres adultas precisam de 25 mcg de cromo por dia, enquanto os homens precisam de 35 mcg, e a deficiência desse mineral pode provocar sintomas como cansaço, irritabilidade, alterações do humor, e aumento dos níveis de glicose e colesterol no sangue.

Fonte das tabelas: tuasaude.com

Para saber mais sobre o assunto acesse o curso: nutrição no ganho de massa magra

Fontes das pesquisas:

De Souza EO, Lowery RP, Wilson JM, Sharp MH, Mobley CB, Fox CD, et al. (2016) Effects of Arachidonic Acid Supplementation on Acute Anabolic Signaling and Chronic Functional Performance and Body Composition Adaptations. PLoS ONE 11(5), e0155153. doi:10.1371/journal.pone.0155153.

Lavie et al. (2015). Exercise and the heart--the harm of too little and too much. Curr Sports Med Rep. 2015 Mar-Apr;14(2):104-9. http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/25757005

Roberts et al. (2007). Effects of arachidonic acid supplementation on training adaptations in resistance-trained males. Journal of the International Society of Sports Nutrition, 4, 21. DOI: 10.1186/1550-2783-4-21.

Serrano et al. (2008). Interleukin-6 is an essential regulator of satellite cell-mediated skeletal muscle hypertrophy. Cell Metab,7(1), 33-44. doi: 10.1016/j.cmet.2007.11.011.

Zanchi, N.E.; Nicastro, H.; Lancha Jr, A.H. Potential antiproteolytic effects of L-leucine: observations of in vitro and in vivo studies. Nutr Metab (Lond). 2008; 5: 20. doi: 10.1186/1743-7075-5-20

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Proteína para hipertrofia

Proteínas fornecem aminoácidos, nutrientes essenciais ao ganho de massa magra. Contudo, o consumo excessivo de carboidratos não resulta em maior ganho de musculatura. Hoffman e colaboradores (2006) compararam o consumo de proteínas no ganho de força, composição corporal e alterações hormonais de atletas de futebol americano experientes em treino de musculação. Os mesmos foram divididos em 3 grupos: 

1 - Consumo mais baixo de proteína (1,0 a 1,4g de ptn/Kg/dia);

2 - Consumo médio de proteína (1,6 a 1,8 g de ptn/Kg/dia);

3 - Alto consumo de proteína (> 2,0 g de Ptn/kg/dia). 

Todos os indivíduos praticaram musculação em alta intensidade por 4 semanas. Ao final do estudo foi observado que os grupos tiveram os mesmos resultados em relação ao ganho de força, aumento da massa muscular e perda de gordura. As concentrações de testosterona, cortisol, GH e IGF-1 também não apresentaram diferença estatística entre os grupos. Ou seja, consumir mais proteína não gerou maiores benefícios.

Por outro lado, o consumo excessivo de aminoácidos como metionina, presente em grande quantidade em carnes aumenta o risco de doenças e a mortalidade (Cavuoto e Fenech, 2012López-Torres e Barja, 2008McCarty, Barroso-Aranda J, Contreras, 2008). Paoli e colaboradores (2015) trouxeram um dado novo. Dietas com mais de 1,8g de proteína por Kg de peso aumentam a produção de miostatina e esta reduz o IGF-1 (fator de crescimento semelhante à insulina), limitando a hipertrofia. Os pesquisadores ainda estão intrigados com o resultado deste consumo crônico de proteínas e agora estudam o comportamento de moléculas sinalizadoras musculares como o mTOR e Akt.

Por horário 0,25g/Kg são mais do que suficientes (Philips, 2014). Mais do que isso não parece trazer benefícios. Ou seja, o limite fica em 20g para uma pessoa de 80kg (Atherton e Smith, 2012). O consumo de cerca de 0,25g/Kg próximo ao exercício resistido (no espaço entre 1h antes até 1h depois) aumenta a resposta anabólica. Para calcular quanta proteína você precisa ingerir em cada refeição multiplique seu peso por 0,25. Por exemplo, para uma mulher de 56 kg, multiplica-se este peso por 0,25. O resultado será 14 gramas de proteína por horário. Para saber a quantidade de proteína existente nos alimentos acesse as tabelas em anexo. Outra forma é utilizar calculadoras como o myfitness pal que está disponível em português.

Lembretes:

1. Estudos mostram que mesmo quantidades mais baixas de proteína na dieta geram hipertrofia (0,85g-1,25g/Kg), caso a dieta forneça todos os aminoácidos essenciais e também energia em quantidade adequada. 

2. Refeição com 0,25g/Kg de proteína aumentam a resposta anabólica. A refeição pode ser composta de alimentos como ovos, carnes, laticínios ou mesmo suplementos proteicos.

3. Suplementos não são necessários para a maioria das pessoas já que a dieta padrão do brasileiro já fornece ao menos 1,5g ptn/Kg. 

4. Quando busca-se o emagrecimento, sem perda de massa magra, pesquisadores como Murphy e colaboradores (2015) sugerem um consumo maior de proteínas (1,6 a 2,7g/kg/dia). Uma das explicações para a maior queima de gordura com tal prescrição é que a proteína aumenta a termogênese induzida pelo alimento. Fora isso, uma refeição com mais proteínas mantém o alimento por mais tempo no estômago, reduzindo a velocidade de absorção dos carboidratos, reduzindo a liberação de insulina, o que favorece o emagrecimento, além de promover maior saciedade.

5. Você precisa saber o que quer mas não precisa saber calcular. Não se desespere, um nutricionista fará isso por você.

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Preciso voltar ao tempo das cavernas?

O que nossos ancestrais consumiam no passado? O que havia disponível. Eles caçavam, coletavam, cultivavam, colhiam. A imagem abaixo mostra a porcentagem de diferentes alimentos na alimentação de diferentes povos, dependendo da disponibilidade de alimentos destes caçadores-coletores. Como você pode imaginar, estudar o que comiam nossos ancestrais a milhares de anos não é uma tarefa muito fácil, mas existem algumas pistas, baseados em achados arqueológicos:

 

 

Fonte da imagem: Jen Christiansen (Scientific American)

Ou seja, existiram diferentes dietas, de diferentes povos. O que não existia era alimento industrializado, fritura, refrigerante, peito de peru, bebida alcoólica, suplementos de todos os tipos...

De acordo com pesquisadores da área, os hominídios surgiram a cerca de 2 milhões de anos. Antes disso, vários de nossos ancestrais não hominídios passaram pela face da terra, tendo contribuído para nosso DNA (Eaton & Kooner, 1985). Desta forma, entender o que comiam nos ajuda a entender como evoluímos e chegamos até aqui. 

Há mais de 4 milhões de anos, no mioceno, divisão da era cenozóica, consumia-se basicamente uma dieta baseada em plantas (Jenkins & Kendall, 2006). Anatomicamente o trato digestório de chimpanzés, gorilas e outros grandes macacos se parece com o dos seres humanos. De fato, o DNA dos seres humanos e dos gorilas possui uma semelhança de 98%. E o que eles consomem? Uma dieta baseada em vegetais com menos de 2% de alimentos de origem animal em sua composição (Oelze et al., 2011Popovich et al., 1997Tutin & Fernandez, 1993). Obviamente, não tinha bacon, peito de peru e ovo frito no café da manhã.

Também existem evidências de que nossos ancestrais hominídios consumiam entre 70 e 120 gramas de fibras vegetais ao dia (Tuohy et al., 2012). Muito mais do que a dieta ocidental típica (12 a 20 gramas ao dia) (Tuohy et  al., 2009) e do que as recomendações dos órgãos de saúde (25 a 30 gramas ao dia) (Jenkins et al., 2001). 

Várias populações da África ainda possuem um alto consumo de fibras e uma baixíssima incidência de doenças cardiovasculares, obesidadecâncer de cólon e outros problemas de saúde modernos (Jenkins et al., 2001). 

Deitas com restrição elevada de carboidratos (5-10% do valor energético, por exemplo) pioram os níveis de lipídios sanguíneos, podendo piorar sua saúde cardiovascular (Mansoor et al., 2016). Dansinger e colaboradores (2005) compararam algumas dietas (Atkins, Ornish, Vigilantes do peso, Zone). Ao final de 1 ano, os resultados em emagrecimento, HDL, LDL, Glicemia, Triglicerídeos e Insulina foram similares entre todos os grupos. Em contrapartida, a dieta com menos carboidratos teve muito mais desistências que no grupo da dieta com equilíbrio dos macronutrientes. Ou seja: custo alto e benefício baixo.

Você pode seguir a dieta que achar mais apropriada para você, que se encaixar melhor em seus gostos e estilo de vida. Mas não copie a dieta dos outros. Não existe algo que sirva para todos.

Mais no curso: alimentação e suplementação para o ganho de massa magra.

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/