Muitas tentativas são feitas no sentido de aproximar a condição do paciente crítico a um estado de normalidade, com transfusões para elevar o hematócrito, grandes infusões de insulina para controlar a glicose, ventilação mecânica para normalizar os níveis de PCO2 e PO2. Contudo, muitas vezes não são observados benefícios nestas estratégias. Pelo contrário, frequentemente há um aumento da morbimortalidade após uma intervenção como as citadas. A nutrição do paciente crítico é outro exemplo de terapêutica que exige grande cuidado, já que a alimentação agressiva e de alto teor calórico mostra-se, em grande parte das vezes, ineficaz e mesmo perigosa (Patel e Codner, 2016).
Apesar dos pacientes mais gravemente doentes ou desnutridos estarem em maior risco de complicações relacionadas com a nutrição, muitas vezes estes também são os menos aptos a receber e processar os nutrientes adequadamente. É como um carro que não funciona bem. Colocar mais combustível não o fará funcionar melhor. Pelo contrário, pode provocar maior escape de gases tóxicos. O mesmo acontece no paciente crítico (Marik, 2016). Ofertar mais nutrientes não fará o corpo funcionar melhor mas pode resultar em maior trabalho metabólico, maior produção de CO2 e acidose metabólica. Mesmo quando o estresse é relativamente menor, como no caso de uma cirurgia eletiva de grande porte, sabemos que a infusão de fluidos contendo dextrose eleva significativamente os níveis séricos de glicose e lactato em relação a soluções não contendo dextrose (Degoute et al., 1989). É o paradoxo do paciente da UTI. Apesar de precisar de mais nutrientes não consegue lidar bem com eles.
A administração excessiva de proteínas também pode ocasionar o aumento excessivo da concentração plasmática de ureia e de outros resíduos azotados ao invés de proporcionar melhorias em termos de conservação muscular ou rapidez na cicatrização de feridas (Cerra et al., 1989, Ishibashi et al., 1998).
Os efeitos adversos pró-inflamatórios dos lipídios, particularmente os derivados da soja em infusões intravenosas, têm sido bem documentados (Cerra et al., 1989; Taylor et al., 2016). E, finalmente, a administração de calorias em excesso tem sido associada ao aumento da massa gorda sem benefícios na melhoria da massa muscular magra, bem como piores resultados clínicos (Braunschwei et al., 2015; Marik, 2016, Hart et al., 2002).
A arte da nutrição na UTI torna-se então reconhecer a presença e o grau de mau funcionamento do paciente e fornecer a quantidade correspondentemente óptima de combustível para proporcionar efeitos benéficos e aceleração da recuperação. Amanhã escreverei sobre o escore NUTRIC, utilizado para a avaliação do risco nutricional em pacientes críticos.
Você pode aprender mais sobre terapia nutricional e o cálculo das dietas acessando o curso de terapia nutricional enteral e parenteral.