A memória é a capacidade de adquirir, armazenar e recuperar (evocar) informações disponíveis. Quando lembramos do nascimento dos filhos, do dia do casamento, do bolo que a avó fazia quando éramos crianças estamos falando de uma memória de longo prazo explícita. A aquisição da memória explícita depende da aquisição da informação e os neurotransmissores acetilcolina e dopamina são fundamentais.
Essa informação adquirida precisa ser consolidada por potenciação em longo prazo (LTP). As sinapses dos neurônios precisam ficar mais eficientes. Isso acontece especialmente durante o sono. Quem não dorme bem, não consolida bem as memórias e os aprendizados. E neste processo, especialmente na fase 5 (ou REM) do sono. Quem toma remédio benzodiazepínico (para ansiedade, transtornos de humor), como diazepam, alprazolam, midazolam, etc acabam não entrando no sono REM, o que prejudica a consolidação de memórias. Por isso, só usar medicamento não é legal. Tem que fazer higiene do sono, fazer atividade física, comer comida saudável, fazer terapia, praticar yoga, meditar… Até porque existem estudos mostrando que o uso de benzodiazepínicos aumenta o risco de doença de Alzheimer (Tapiainen et al., 2018).
Se comer é um aprendizado de toda uma vida, podemos ajudar as crianças a iniciarem uma relação muito mais saudável com a comida.
Muitos de nós, que fomos crianças nas décadas de 1980 a 1990, associamos a cozinha afetiva com bolos, tortas e massas compostos basicamente por açúcar e farinha. Itens sempre presentes em nossas mesas, preparados com muito amor pelas nossas mães e avós.
Tempos em que os processados começavam a ganhar as prateleiras dos supermercados e, por isso, não existiam estudos, muito menos repercussão científica sobre os perigos desses alimentos.
Fomos ensinados a aceitar a salada no almoço e na janta pensando em ganhar um doce quando a refeição acabasse.
E assim, o açúcar ganhou protagonismo em nossas memórias, ao contrário da comida de verdade, que muitas vezes era recebida como uma obrigação.
Mas, será que precisa mesmo ser assim? Será que não podemos ensinar a criar memórias afetivas com a comida saudável?
Como criar momentos especiais com a comida saudável
À medida que crescemos e amadurecemos, enquanto seres humanos, o nosso paladar muda e também a nossa consciência relacionada à nossa saúde.
É provável que as gerações que estão tendo filhos agora, aos 20 ou 30 anos, fechavam a expressão facial para o brócolis no prato.
E, também, que descobriram a quantidade de pratos incríveis e deliciosos que podem ser feitos com esse vegetal.
Então, por que não criar uma memória a partir de um bolinho de brócolis? Assim como outros vegetais, pode aparecer refogado, na sopa, em diversos preparos em que o sabor e a textura são valorizados sem perder as propriedades nutricionais.
Já falei aqui neste artigo sobre os benefícios de cozinhar com as crianças. Sei que, para a maioria das famílias, não faz parte do dia a dia. Mas, para os pequenos, deve parecer como uma brincadeira quando, também ali, estão colocando um tijolinho na construção das memórias afetivas.
Isso também ajuda a aliviar o estresse diante da mesa!
Atendo praticamente todas as semanas famílias com queixas sobre crianças seletivas.
Como criar um momento especial em volta da mesa se tudo o que é saudável acaba rejeitado?
Em primeiro lugar, precisamos respeitar as preferências naturais dos nossos filhos. Eu recomendo que os vegetais sejam oferecidos em seu formato e textura reais para que a criança conheça os alimentos como são, in natura.
Mas, conforme cresce, a criança desenvolve as próprias preferências. É muito importante adequar os alimentos mais nutritivos aos formatos que a criança mais aceita. Se ela prefere algo mais pastoso, por exemplo, não significa que vá comer somente purê de batatas, massas e leite.
Pode acrescentar caldos e purês, também, de vegetais e carnes. Também não significa que deva comer todos os alimentos saudáveis, todas as verduras e frutas que existem. Assim como nós, adultos, não gostamos de todos os alimentos que existem, a criança também não é obrigada a gostar.
É importante incluir os grupos de alimentos, mas não todos os alimentos do grupo!
O respeito às preferências pode ser fundamental.
Também é importante não forçar as quantidades. A criança pode comer o quanto satisfazer seu apetite. Não há necessidade de complementar com uma mamadeira, ou biscoitos e farináceos, na maioria dos casos.
Isso, sim, pode contribuir para uma relação difícil com a comida e a perda de interesse pelos alimentos saudáveis.
Comer é aprendizado e ele aprende com você
Já se perguntou por que a criança assiste várias vezes o mesmo episódio de desenho animado? É porque, principalmente abaixo dos 6 anos, está em uma fase de assimilação. A criança é como uma esponja que absorve todas as novidades ao seu redor.
Para ela, nada passa despercebido. Portanto, a atitude dos pais faz toda a diferença nesse momento. Ensinar pelo exemplo é o melhor caminho.
Além da família toda precisar se alimentar saudável, é importante que também não existam as chantagens relacionadas à comida. No estilo “só pode brincar se comer tudo” ou “se comer a salada ganha o doce”.
Nessas situações estão enraizados os principais transtornos alimentares e compulsivos desenvolvidos ao longo da vida. O ser humano grava no subconsciente esse sistema de recompensa onde após uma situação desagradável pode descontar as frustrações na comida.
Ao ensinar que comer saudável pode ser gostoso, a família evita que a criança desenvolva esse problema futuro. Se a comida que faz bem ao corpo também é deliciosa, o argumento de que um docinho é algo para quem merece porque se comporta perde todo o sentido.