Tenho muita sorte de estar diariamente com famílias deliciosas e que me enchem de inspiração, de propósito. Sou muito grata por me apresentarem aos seus filhos com síndrome de Down (SD), por me deixarem aprender com eles, rir com eles de suas histórias engraçadas, por permitirem que eu os veja crescer e realizarem seus sonhos.
Contudo, não é sempre assim. Nossa vida não é fácil. Temos todos momentos melhores e momentos dolorosos. Nesta pandemia ficou muito claro o tanto que precisamos cuidar de nossa saúde física, mental, espiritual. A quantidade de pais e jovens com SD deprimidos que atendi neste ano foi muito, muito grande. Felizmente as pessoas estão abrindo-se mais sobre a temática e buscando ajuda multiprofissional. Isto é fundamental, pedir socorro é o primeiro passo.
Depressão na SD
Na síndrome de Down o risco de depressão e outros problemas de saúde mental (ansiedade, insônia, autismo, hiperatividade, impulsividade etc) parece ser superior ao da população geral.
As causas para a depressão, em específico, são multifatoriais e incluem características genéticas, desregulação hormonal (como disfunção tireoidiana) ou de neurotransmissores, medicação, estressores psicossociais e ambientais, luto, abuso, mudanças de rotina, limitações na comunicação, isolamento, além de carências nutricionais (como B12), doença celíaca, apneia do sono, deficiência visual ou auditiva e até disbiose intestinal.
Fique atento também à resposta tardia ao luto (por exemplo, quando a babá deixa de trabalhar com a família, quando um ente querido, como o avô, morre, quando há mudança de escola ou quando um irmão casa-se e sai de casa). Pode levar tempo até que uma pessoa com SD entenda a magnitude ou a permanência de sua perda. O diagnóstico nem sempre é fácil, principalmente se não houver verbalização. Mantenha a observação e compartilhe suas preocupações com profissionais de saúde capacitados.
A depressão não tratada acarreta em outros problemas de saúde, perda de habilidades, declínio de habilidades cognitivas e sociais, ganho ou perda de peso, dificuldades de sono, com aceleração da neuroinflamação e maior risco de demência. Portanto, o acompanhamento médico anual é fundamental para que sejam descartadas ou tratadas condições médicas que interfiram no comportamento (como o hipotireoidismo). Profissionais da saúde mental com experiência em transtornos do desenvolvimento devem ser consultados, tanto para diagnóstico, quanto para tratamento, em geral, inclui intervenção farmacológica, combinada com componentes psicossociais.
Depressão na família T21
Cuidadores (pais, avós) também devem ficar atentos em si mesmos em relação aos sintomas de depressão. Muitas pessoas deprimidas não descrevem-se assim. Vão levando, pelo bem da família, com muita garra e energia. Mas todos nós passamos por fases, temos pensamentos ou sentimentos negativos que vêm e vão. Se estes começam a impactar negativamente a atenção precisa ser redobrada.
Cada pessoa experimenta a depressão de maneira diferente. Alguns podem sentir sintomas clássicos, como tristeza, desesperança, pensamentos suicidas. Outros relatam apenas cansaço ou irritabilidade aumentada. O tipo e o grau dos sintomas também variam de indivíduo para indivíduo e podem mudar com o tempo. Alguns sintomas comuns da depressão incluem:
Sentir-se triste, choroso, vazio, sem esperança
Mudanças nos hábitos alimentares - perda de peso e falta de apetite ou, ao contrário, compulsão alimentar
Mudanças no sono - sono excessivo ou a falta dele
Sensação de cansaço o tempo todo
Falta de motivação para fazer qualquer coisa
Perda de interesse por pessoas e / ou atividades que antes lhe davam prazer
Sentindo-se entorpecido
Agitação ou irritabilidade
Sentir que nada do que você faz é bom o suficiente
Aumento do consumo de álcool ou drogas ou tempo excessivo em atividades entorpecentes, como a própria navegação na Internet
Problemas para se concentrar, pensar ou planejar - como se sua cabeça estivesse cheia de névoa
Negligenciar seu bem-estar físico e aparência
Querer fugir ou escapar da situação
Pensamentos de morte ou suicídio
Sintomas físicos contínuos que não respondem aos tratamentos convencionais, incluindo dores de cabeça, distúrbios digestivos e dores crônicas no pescoço e nas costas
Se está com sintomas como estes há mais de 2 semanas procure ajuda médica. Quando temos outras pessoas para cuidar podemos sentir um desgaste progressivo. Quando as pessoas com SD são pequenas, os pais estão na casa dos 20, 30, 40 anos, fases de mais energia. Contudo, com o passar do tempo a energia vai acabando. Já ouvi falar que por trás de pessoas com necessidades especiais bem cuidadas, existe sempre uma mãe ou um pai que deixou de viver. Mas não tem que ser assim. O autocuidado é a principal arma para conseguirmos cuidar bem daqueles que amamos.
Se você deixa de fazer tudo o que gosta, se não tem tempo para estar com as outras pessoas importantes da sua vida, se não cuida do seu corpo e da sua mente, sua saúde deteriora-se. Cuidar da própria alimentação, fazer atividade física, praticar yoga, meditar ou rezar devem fazer parte da sua rotina diária. Um cuidado básico é com o intestino. Se o seu vive irregular fique atento pois a inflamação intestinal aumenta o risco de depressão.
Exames nutrigenéticos podem avaliar o metabolismo de nutrientes e o risco de menor produção de neurotransmissores associados à depressão. Estes exames podem ser solicitados, durante consulta, para pais e filhos.
Psicobióticos na prevenção e no tratamento da depressão
Os psicobióticos são microrganismos probióticos (principalmente bactérias boas) que afetam as funções neurológicas do sistema nervoso central de qualquer pessoa. O eixo intestino-cérebro interfere na qualidade de vida e influencia a saúde mental, inclusive o risco de ansiedade, depressão, doença de Alzheimer, Parkinson, Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) e Síndrome de Tourette.
Por isso, o eixo microbioma-intestino-cérebro é um alvo para o tratamento de transtornos psiquiátricos. Faz parte da terapia a adoção de uma dieta antiinflamatória e o tratamento da disbiose intestinal. Estudos mostra, por exemplo, que o baixo número de espécies de Bifidobacterium e / ou espécies de Lactobacillus resulta em indivíduos com um alto nível de transtorno depressivo. Pesquisas também investigaram o efeito de várias cepas microbianas, como as cepas de Lactobacillus e Bifidobacterium no Alzheimer.
A reposição de probióticos em geral é feita com o uso de suplementos em cápsulas ou sachês. Leites fermentados, kefir, kombucha também ajudam a melhorar a qualidade da microbiota, uma vez que contribuem para a redução da inflamação e da resistência à insulina.
Exemplo de psicobióticos com ação testada em humanos
Psicobióticos são definidos como microorganismos probióticos que, quando ingeridos, influenciam positivamente a saúde mental (Dinan, Stanton & Cryan, 2013), reduzem estresse, ansiedade (Schmidt et al., 2015; Bhagwagar, Hafizi & Cowen, 2005), melhoram o humor (Steenbergen et al., 2015) e comportamentos neuróticos (Hilimire, DeVylder e Forestell, 2015).