Cientistas vêm tentando desenvolver testes simples para o diagnóstico precoce do autismo (antes dos 2 anos de vida). Atualmente o diagnóstico é feito principalmente a partir de medidas comportamentais, mas o processo é subjetivo e demorado, comprometendo o início do tratamento.
Em 2015 um estudo mostrou que crianças autistas possuíam uma quantidade modificada de certas proteínas na saliva (Wetie et al., 2015). Os exames de saliva são promissores pois são indolores, podem ser feitos em casa (evitando o estresse de deslocamento para um laboratório ou hospital), a coleta pode ser feita por familiares. Contudo, todos os biomarcadores deveriam ser produzidos exclusivamente pelo cérebro para que que o diagnóstico fosse mais fidedigno. Isto ainda é um desafio mas pesquisas com marcadores como microRNAs continuam e esperamos que no futuro possam ser utilizados a um custo mais baixo.
Em 2018 foram publicados dois estudos e em 2019 mais um com novas técnicas para a identificação do autismo por meio de exames laboratoriais. O primeiro estudo identificou 22 metabólitos produzidos no ciclo da metionina que estariam alterados em indivíduos com autismo (Howsmon et al., 2018). De acordo com os autores as análises permitem o diagnóstico com 88% de precisão.
O segundo estudo avaliou outro grupo de substâncias (produtos finais de glicação avançada) em amostras de sangue e urina, de crianças entre 5 e 12 anos. Foi observado que as crianças com autismo possuíam concentrações mais altas de N-carboximetil-lisina, N-carboximetilarginina e ditirosina no sangue e maior quantidade de semialdeído glutâmico na urina (Anwar et al., 2018).
Um último artigo científico traz a análise do metabolismo de aminoácidos de cadeia ramificada. A desregulação metabólica também parece estar associada ao aumento dos casos de autismo. De acordo com os autores 17% das crianças com autismo teriam proporções incomuns de aminoácidos e a especificidade do teste seria de 96,3% (Smith et al., 2019).
Apesar dos avanços na área, estes exames ainda não podem ser utilizados como única ferramenta diagnóstica uma vez que os resultados dos estudos só puderam ser obtidos a partir de desenhos estatísticos não aplicáveis na clínica. Tais cálculos dependem muito da composição da amostra. Além disso, os testes parecem mais promissores para crianças com alto risco para o Transtorno do Espectro Autista. A validação dos marcadores biológicos ainda é necessária para que possam ser usados como ferramentas diagnósticas precisas. Mesmo assim, estes estudos abrem novas portas para a pesquisa e novas áreas para o diagnóstico e tratamento mais rápidos e adequados.
Enquanto isso, os passos para o diagnóstico continuam envolvendo a observação atenta da criança, a consulta ou entrevista com especialistas na área. Estes profissionais colherão depoimentos dos pais e pessoas que convivem com a criança, analisarão fotos e vídeos feitos pela família, utilizarâo escalas de avaliação (como a ATA e o M-CHAT), investigarão os antecedentes familiares. O importante é a busca de atendimento o quanto antes.
O profissional responsável pelo diagnóstico utiliza-se também das orientações do CID-11 e do DSM-5. CID (Classificação Internacional de Doenças) é o manual de diagnóstico da Organização Mundial de Saúde (OMS). Inclui todas as doenças e condições médicas reconhecidas oficialmente - incluindo uma seção sobre transtornos mentais e comportamentais. O mesmo encontra-se disponível gratuitamente on-line. O DSM-5 é a sigla inglesa para Diagnostic and Statistic Manual (Manual de Diagnóstico e Estatística). Abrange apenas os transtornos mentais e as desordens neurológicas (como o autismo) e tem sido bastante utilizado em ambiente de pesquisa. Foi elaborado pela Associação Americana de Psiquiatria.
Enquanto o DSM-5 fornece critérios diagnósticos (regras estritas usadas para determinar quais comportamentos qualificam clientes para diferentes diagnósticos), o CID-11 fornece apenas diretrizes de diagnóstico, que são um pouco menos rigorosas e permitem mais espaço para o julgamento clínico. Cada manual tenta harmonizar-se com o outro. Assim, para um grande número de diagnósticos, os manuais são bastante semelhantes.
Uma diferença bem divulgada entre o DSM-5 e o CID-10 era que o primeiro não incluía mais o transtorno de Asperger, mas o segundo sim. No CID-11 (aprovado em junho de 2018) esta classificação também desaparece.
Embora o DSM-5 seja considerado a “bíblia diagnóstica” dos transtornos mentais, o uso do CID-11 não é particularmente difícil ou radical. Para os profissionais que buscam outras abordagens diagnósticas indico a leitura do Manual de Diagnóstico Psicodinâmico (PDM-2) e da Taxonomia Hierárquica de Psicopatologia (HiTOP).