Exercício aeróbico e memória

Você provavelmente já ouviu que exercícios físicos fazem bem para o corpo. Mas e para o cérebro? Mais especificamente: será que o famoso exercício de endurance (corrida, ciclismo, natação…) pode aumentar o tamanho do hipocampo, região essencial para a memória e o aprendizado? A resposta curta: sim, ele ajuda.

O que a ciência descobriu

Um estudo clássico de 2011, feito pelo pesquisador Kirk Erickson e colegas, acompanhou 120 adultos mais velhos durante 1 ano. O grupo que praticou exercícios aeróbicos regularmente apresentou, em média, aumento de 2% no volume do hipocampo.

Isso pode parecer pouco, mas é muito significativo: depois dos 50 anos, o hipocampo tende a encolher cerca de 1% ao ano. Ou seja, o exercício não só freou a perda natural como ainda trouxe um ganho equivalente a “rejuvenescer” essa área em até 2 anos.

E não é só no volume: esse crescimento esteve ligado a melhora na memória espacial e em tarefas de aprendizagem.

Como isso acontece?

Os cientistas acreditam que o efeito positivo do exercício aeróbico vem de uma combinação de fatores:

  • Neurogênese → formação de novos neurônios.

  • Angiogênese → criação de novos vasos sanguíneos, melhorando a circulação no cérebro.

  • BDNF → aumento do fator neurotrófico derivado do cérebro, uma proteína que atua como “fertilizante” para as células nervosas.

Em outras palavras: o exercício cria um ambiente mais saudável e fértil para o cérebro se manter ativo.

E se parar de se exercitar?

Um estudo de 2016 com atletas veteranos mostrou que apenas 10 dias sem treino já diminuíram o fluxo sanguíneo no hipocampo. Isso sugere que os benefícios do exercício precisam ser mantidos com regularidade — não adianta treinar por um tempo e depois parar.

Jovens também se beneficiam

Não é só na velhice que o hipocampo ganha com o movimento. Um estudo de 2013, feito com adultos jovens (18 a 45 anos), encontrou uma associação clara entre prática regular de atividade física e maior volume do hipocampo direito.

Referências

1) KI Erickson et al. Exercise training increases size of hippocampus and improves memory. Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States of America (2011). https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/21282661/

2) AJ Alfini et al. Hippocampal and Cerebral Blood Flow after Exercise Cessation in Master Athletes. Frontiers in aging neuroscience (2016). https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/27547184/

3) WD Killgore et al. Physical exercise habits correlate with gray matter volume of the hippocampus in healthy adult humans. Scientific reports (2013). https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/24336512/

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Como obesidade e envelhecimento deixam nosso sistema imunológico “ligado no 220”

A obesidade é uma doença que causa um tipo de inflamação leve, contínua — chamada meta-inflamação. Isso acontece porque o excesso de gordura no corpo começa a liberar sinais que atraem células inflamatórias (como os macrófagos) – e isso afeta nossa saúde metabólica (pode gerar resistência à insulina e doenças crônicas).

O envelhecimento também desencadeia um tipo parecido de inflamação leve batizado de inflammaging (inflamação+envelhecimento). Ao longo dos anos, danos celulares, acúmulo de células “senescentes” e declínio das funções de reparo criam um ambiente de inflamação silenciosa. Isso enfraquece os órgãos, o sistema imune e acelera o envelhecimento biológico (Qu et al., 2022).

Estas duas inflamações crônicas e silenciosas — uma por excesso de nutrientes, a outra por desgaste natural — atraem monócitos, células do sistema imune que se diferenciam em macrófagos. Estes, por sua vez, amplificam a produção de mediadores inflamatórios.

Quem são os macrófagos e por que importam?

Macrófagos são células de defesa que vivem pelos tecidos do nosso corpo — nosso “faxineiros” e “socorristas” internos. Quando há excesso de gordura (na obesidade) ou sinais de desgaste (no envelhecimento), eles respondem ao chamado, se acumulam nos tecidos e mudam para um modo que libera substâncias inflamatórias. Assim, mesmo sem uma infecção, o corpo fica em estado de alerta — mas de um alerta que causa dano se for constante.

Os macrófagos “sentem” lipídios, glicose, radicais livres e sinais de células senescentes e passam por metafluxos (mudanças em vias como glicólise, respiração celular, β-oxidação de gorduras) que travam um circuito de inflamação crônica de baixo grau. Em meta-inflamação, isso sustenta resistência à insulina e aumenta o risco de diabetes. Em inflammaging, contribui para fibrose, sarcopenia e fragilidade.

A inflamação persistente também remodela a arquitetura linfoide e a qualidade da ajuda T-dependente. Células T auxiliares (Th, do inglês T helper) são cruciais para anticorpos de alta afinidade. Porém, tanto na obesidade crônica quanto na imunossenescência, o “ruído” inflamatório e a disbiose de citocinas alteram a geração/função de Th (Alonso, Fomin, & Rizzo, 2021).

Sem os Tfh funcionando bem:

  • Os anticorpos produzidos podem ser mais fracos ou de curta duração.

  • As respostas a vacinas e infecções ficam comprometidas.

  • Em alguns casos, falhas nos Tfh também estão ligadas a doenças autoimunes, quando os anticorpos passam a atacar o próprio corpo.

Imunossenescência: o sistema imune envelhecendo junto com o corpo

Imunoscenecência é um termo que fala sobre como o sistema imunológico fica “cansado” com a idade: o timo (onde nascem os linfócitos T) encolhe, temos menos T jovens, mais células envelhecidas e também mais células mieloides supressoras (MDSCs) — que atuam silenciosamente reduzindo a resposta imune. Tudo isso ocorre sob a batuta da inflammaging (Alves, & Bueno, 2019).

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Como entender o exposoma?

O exposoma é o conjunto de todas as exposições ambientais e estilos de vida que um indivíduo sofre ao longo da vida, incluindo fatores químicos, físicos, biológicos e sociais. Ele influencia diretamente a saúde, interagindo com a genética e o metabolismo, podendo levar a doenças como diabetes, doenças cardiovasculares, câncer, etc. Entender e medir o exposoma é complexo porque ele é dinâmico e multifatorial.

Componentes do exposoma

O exposoma pode ser dividido em três grandes domínios:

  1. Exposições externas gerais:

    • Poluição do ar, água, produtos químicos ambientais, radiação.

    • Condições sociais e estilo de vida: dieta, sono, estresse, atividade física.

  2. Exposições internas:

    • Biotransformações químicas no corpo (xenobióticos metabolizados).

    • Microbiota intestinal.

    • Processos inflamatórios e oxidativos.

  3. Resposta biológica:

    • Alterações no metabolismo, epigenética, proteômica e sinalização celular.

    • Fenótipo clínico (como resistência à insulina ou obesidade).

Como avaliar o exposoma?

Não existe um exame único que diga “esse é seu exposoma”. Mas podemos aproximar usando várias abordagens:

a) Exames clínicos

  • Para diabetes e doenças metabólicas:

    • Glicemia de jejum

    • Hemoglobina glicada (HbA1c)

    • Perfil lipídico

    • Pressão arterial

    • IMC, circunferência abdominal

  • Esses exames não medem exposições diretamente, mas mostram consequências do exposoma (ex.: dieta, sedentarismo, poluição, inflamação crônica).

b) Exames metabolômicos

  • Metabolômica: análise de metabólitos no sangue, urina, fezes ou tecidos.

    • Permite identificar sinais de exposição a poluentes, dieta inadequada ou estresse oxidativo.

    • Técnicas principais: LC-MS (cromatografia líquida acoplada à espectrometria de massas), GC-MS (cromatografia gasosa), NMR (ressonância magnética nuclear).

  • Aplicações:

    • Descobrir padrões metabólicos associados à obesidade, resistência à insulina e diabetes.

    • Avaliar biomarcadores de exposição química (metabolitos de pesticidas, metais, ftalatos, etc.).

    • Estimar interações gene-ambiente.

c) Exames genômicos / epigenômicos

  • Avaliam como exposições modificam a expressão gênica (metilação do DNA, microRNAs).

  • Útil para estudar efeitos cumulativos do exposoma ao longo do tempo.

Estratégia prática de avaliação do exposoma em saúde metabólica

  1. Coleta de dados clínicos:

    • Histórico de dieta, atividade física, tabagismo, uso de medicamentos.

    • Peso, circunferência abdominal, pressão arterial.

  2. Análises laboratoriais padrão:

    • Glicemia, HbA1c, perfil lipídico, função hepática e renal.

  3. Metabolômica:

    • Amostras de sangue/urina para identificar metabolitos indicativos de exposição ambiental ou alterações metabólicas.

    • Ferramenta poderosa para entender alterações pré-clínicas (antes da diabetes ou síndrome metabólica).

  4. Integração com dados de estilo de vida e ambientais:

    • Questionários de dieta e exposição.

    • Dados de poluição local ou ocupacional.

  5. Análise de risco:

    • Correlacionar alterações metabolômicas com risco de diabetes, obesidade ou hipertensão.

    • Pode usar inteligência artificial ou modelos estatísticos multivariados para integrar os dados.

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/