Causas de acúmulo de ácido succínico

O ácido succínico é um metabólito intermediário do ciclo de Krebs (ou ciclo do ácido cítrico), envolvido na produção de energia celular nas mitocôndrias. Ele é gerado a partir de α-cetoglutarato → succinil-CoA → succinato, e normalmente convertido em fumarato pela succinato desidrogenase (SDH). Pode ser avaliado em exames metabolômicos urinários.

O ciclo de Krebs (ou ciclo do ácido cítrico) é dependente de vitaminas do complexo B, como B2 (riboflavina) para formação de FAD e B3 (niacina) para formação de NAD. Mas, antes de considerar a suplementação é essencial entender a causa do problema.

Por que pensar em suplementar vitaminas do complexo B?

A vitamina B3 (niacina ou nicotinamida) é precursora do NAD⁺ (nicotinamida adenina dinucleotídeo), uma molécula crucial para o metabolismo energético — inclusive para o ciclo de Krebs, onde o ácido succínico atua. Já a vitamina B2 (riboflavina) é precursora do FAD (flavina adenina dinucleotídeo).

Hipótese: Se há acúmulo de ácido succínico, poderia indicar disfunção na enzima succinato desidrogenase (SDH) — que também depende do funcionamento mitocondrial e da disponibilidade de cofatores como NAD⁺ e FAD.

Suplementar B2 e B3 ajuda?

  • Talvez, mas somente em contextos bem específicos:

    • Se há deficiência documentada de NAD⁺ ou B3, FAD ou B2.

    • Se há disfunção mitocondrial leve ou fadiga metabólica sem causas estruturais.

    • Não há evidência de que suplementar B3 reverta acúmulo de succinato por mutação genética (como SDH mutado).

Relação com câncer

Embora não seja usado diretamente como marcador oncológico em exames clínicos de rotina, o ácido succínico pode estar indiretamente relacionado a alguns tipos de câncer, principalmente em contextos de alterações no metabolismo celular, como:

  • Tumores relacionados à mutação de genes mitocondriais, como os genes SDH (succinate dehydrogenase).

    • Ex: Paragangliomas, feocromocitomas e GISTs (tumores estromais gastrointestinais).

    • Quando há mutações em genes da SDH, o ácido succínico se acumula na célula. Esse acúmulo pode agir como oncometabólito, favorecendo o crescimento tumoral ao inibir enzimas que regulam a expressão gênica.

Usos clínicos

  • Em alguns casos, especialmente em pesquisas ou contextos específicos, a presença de níveis elevados de ácido succínico pode ser investigada como parte do perfil metabólico tumoral.

  • Porém, não é usado como um marcador oncológico isolado e validado como, por exemplo, o PSA (próstata), CEA (colon) ou CA 125 (ovário).

O que fazer?

a) Converse com um oncologista, se:

  • Você teve alteração de ácido succínico em exames metabólicos ou urinários.

  • Está investigando doenças mitocondriais ou tumores raros como feocromocitoma/paraganglioma.

b) Não comece a suplementar B3 sem orientação, especialmente em doses altas:

  • Não podemos olhar um único metabólito e extrair conclusões apressadas. Precisamos avaliar o paciente como um todo. Cuidado com suplementação exagerada.

    • Doses elevadas de niacina (>500 mg/dia) podem causar:

      • Vasodilatação ("flush" de niacina)

      • Danos hepáticos

      • Resistência à insulina

      • Interações medicamentosas

c) Exames que podem ajudar a decidir:

  • Ácido succínico urinário/plasmático

  • Perfil orgânico urinário

  • Níveis de NAD⁺ (em laboratórios especializados)

  • Mutação em genes SDHx (em suspeitas tumorais)

Quando há mutação nos genes SDHx (SDHA, SDHB, SDHC, SDHD), que codificam a enzima succinato desidrogenase (SDH), a SDH mutada perde função e o succinato se acumula. Esse acúmulo age como oncometabólito, inibindo enzimas como deoxigenases dependentes de α-cetoglutarato. Isso altera a epigenética celular e pode promover câncer (especialmente paragangliomas, feocromocitomas, GISTs).

Na dúvida:

  1. Confirmar diagnóstico genético (teste para mutações SDHx).

  2. Rastreamento por imagem (ex: PET, RM, TC) para procurar tumores.

  3. Monitoramento familiar genético (se for mutação germinativa).

  4. Tratamento específico para o tumor, se presente.

  5. Evitar tentativas de "compensar" via suplementos, pois o bloqueio é estrutural/genético.

⚠️ Nenhum suplemento (incluindo B3, B2, CoQ10, etc.) reativa uma enzima SDH mutada.
Pode haver uso adjuvante em suporte metabólico, mas isso não corrige o defeito nem reverte o risco oncológico.

Se não for genético: distúrbio metabólico secundário

Se não há mutação em SDH, o acúmulo de ácido succínico pode vir de causas mais funcionais ou transitórias:

Causas possíveis:

  • Disfunção mitocondrial secundária

  • Deficiência de cofatores (B2, B3, ferro)

  • Uso de inibidores da cadeia respiratória (toxinas, medicamentos)

  • Hipóxia crônica

  • Dietas cetogênicas mal ajustadas

    • A principal fonte de energia na cetogênica são os ácidos graxos e corpos cetônicos (como o β-hidroxibutirato). A glicose está baixa, o que altera o fluxo de entrada no ciclo de Krebs. Isso pode causar desbalanço nos intermediários do ciclo, incluindo o succinato. Questões a avaliar:

      • Entrada reduzida de oxalacetato (menos glicose → menos piruvato → menos oxalacetato).

      • Produção aumentada de succinato via metabolismo de certos aminoácidos (ex: metionina, treonina).

      • Déficit de cofatores (como FAD/B2 ou NAD⁺/B3) em dietas cetogênicas mal formuladas.

      • Alteração na microbiota intestinal que produz ou interfere com metabolismo de succinato.

      • Alta carga proteica sem suporte mitocondrial

Ações:

  • Corrigir deficiências nutricionais reais (com base em exames).

  • Corrigir dieta.

  • Melhorar função mitocondrial com suporte metabólico, como:

    • B2 (riboflavina, precursor de FAD)

    • B3 (niacina, precursor de NAD⁺)

    • CoQ10 (ubiquinona)

    • L-carnitina

    • Ácido alfa-lipóico

    • Antioxidantes (NAC, vitamina C, E)

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Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Níveis de Niacina em Pacientes com Câncer

Vários estudos investigaram os níveis de niacina em pacientes com câncer, com foco especial naqueles com tipos específicos de câncer ou condições que podem afetar o metabolismo da niacina. Aqui estão os resultados relevantes:

Pacientes com Câncer Carcinoide

Pacientes com câncer carcinoide frequentemente apresentam deficiência de niacina devido ao aumento da síntese de serotonina, que desvia o triptofano da produção de niacina. O tumor carcinoide é um tipo de câncer neuroendócrino que se origina em células produtoras de hormônios encontradas em várias partes do corpo, sendo mais comum no trato gastrointestinal e nos pulmões.

Um estudo constatou que a deficiência bioquímica de niacina foi significativamente mais comum em pacientes com câncer carcinoide e síndrome carcinoide (SCC), com 10 de 36 pacientes apresentando deficiência em comparação aos controles. Este estudo destaca que a deficiência de niacina é prevalente entre esses pacientes, embora não especifique a porcentagem exata de redução nos níveis de niacina [1].

Tumores Neuroendócrinos Produtores de Serotonina

Subtipo de tumor carcinoide que especificamente produzem serotonina. Esses tumores podem causar sintomas típicos da síndrome carcinoide: rubor facial, diarreia, broncoespasmo, entre outros.Em pacientes com tumores neuroendócrinos produtores de serotonina (TNEs), a deficiência de niacina é prevalente.

Um estudo avaliou o estado da niacina antes e depois da suplementação e constatou que os níveis de metabólitos urinários de niacina antes da suplementação foram menores nos pacientes em comparação com controles saudáveis, com 45% dos pacientes apresentando níveis abaixo do normal. A suplementação de niacina normalizou o estado da niacina na maioria dos pacientes com deficiência [2].

Pacientes com Câncer em Nutrição Parenteral

Um estudo envolvendo pacientes com câncer recebendo nutrição parenteral total (NPT) constatou que a deficiência de niacina pareceu ser a mais prevalente, ocorrendo em 40% dos pacientes estudados. Isso sugere que pacientes com câncer em NPT podem apresentar reduções significativas nos níveis de niacina [3].

Esses achados ressaltam a importância do monitoramento e da potencial suplementação de niacina em pacientes com câncer para prevenir complicações relacionadas à deficiência.

Como avaliar niacina?

A melhor forma de avaliar a niacina (vitamina B3) depende do objetivo clínico e do contexto do paciente, mas, em geral, para avaliar o status nutricional ou suspeita de deficiência, a avaliação metabólica urinária (metabolômica) costuma ser mais sensível e específica do que os exames bioquímicos convencionais.

Por que pacientes com câncer podem ter redução de niacina?

  1. Baixa ingestão alimentar: Náuseas, vômitos, anorexia e alterações no paladar são comuns.

  2. Má absorção intestinal: Câncer gastrointestinal ou efeitos da quimioterapia podem prejudicar a absorção.

  3. Aumento da demanda metabólica: O câncer e a resposta inflamatória aumentam o consumo de vitaminas.

  4. Diminuição do triptofano: O triptofano é precursor da niacina. Processos inflamatórios desviam o triptofano para vias inflamatórias (como a via da quinurenina).

  5. Disfunção hepática ou renal: Pode prejudicar a conversão e excreção adequada de metabólitos da niacina.

Prevenção da deficiência

  • Monitorar de perto pacientes em risco (com câncer gastrointestinal, caquexia, radioterapia extensa, má absorção).

  • Dieta rica em niacina: carnes magras, fígado, peixes, leguminosas, grãos integrais e amendoim.

Consequências da deficiência de niacina

A deficiência leve pode ser subclínica, mas quadros moderados a graves levam a:

Receptor GPR109 e câncer de cólon

A microbiota intestinal produz diversos metabólitos, como o butirato, que impactam a homeostase intestinal. O estudo investiga como o receptor Gpr109a — ativado por niacina (vitamina B3) e butirato — contribui para a supressão da inflamação e carcinogênese no cólon.

  • O Gpr109a é altamente expresso nas células epiteliais do cólon.

  • Sua expressão depende da microbiota intestinal, particularmente de bactérias produtoras de butirato, como Clostridium spp.

  • A ativação de Gpr109a por butirato ou niacina induz apoptose (morte celular programada) de células colônicas potencialmente cancerígenas.

  • Estimula células dendríticas e macrófagos a produzir IL-10 e Aldh1a, substâncias anti-inflamatórias que promovem diferenciação de células T reguladoras (Tregs).

Modelos de Doença

  • Camundongos deficientes em Gpr109a desenvolvem colite mais grave e têm maior suscetibilidade ao câncer de cólon.

  • A administração de niacina ou butirato reduz a inflamação e a tumorogênese apenas se Gpr109a estiver funcional.

    • O butirato, como produto da fermentação bacteriana de fibras, ativa Gpr109a no epitélio e células imunes, levando a:

      • Supressão de vias inflamatórias.

      • Ativação de respostas imunes reguladoras.

      • Inibição da transformação maligna de células epiteliais.

A ativação do Gpr109a por metabólitos microbianos (como o butirato) e nutrientes (niacina) é crucial para manter a homeostase intestinal e prevenir a inflamação crônica e o câncer colorretal. Este estudo conecta de forma clara microbiota, metabolismo, sistema imune e câncer.

O que fazer: abordagens clínicas

Reposição nutricional

  • Suplementação oral de niacina: Utilizar nicotinamida, que não causa rubor (flushing) como o ácido nicotínico.

  • Suplementação de butirato (butirato de sódio, butirato microencasulado ou triglicerídeos de butirato).

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Referências

1) GM Shah et al. Biochemical assessment of niacin deficiency among carcinoid cancer patients. The American journal of gastroenterology (2005). https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/16181385/

2) G Bouma et al. Niacin (Vitamin B3) Supplementation in Patients with Serotonin-Producing Neuroendocrine Tumor. Neuroendocrinology (2015). https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/26335390/

3) RI Inculet et al. Water-soluble vitamins in cancer patients on parenteral nutrition: a prospective study. JPEN. Journal of parenteral and enteral nutrition (1987). https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/3110440/

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Dieta cetogênica e os doshas

Vata, Pitta e Kapha são os três doshas da medicina ayurvédica — princípios biológicos que governam as funções físicas e mentais. Quando esses doshas estão em desequilíbrio, podem contribuir para distúrbios metabólicos, incluindo ganho de peso e resistência à insulina.

Como cada dosha pode desenvolver excesso de peso e resistência s à insulina?

1. Kapha (água + terra)

Dosha com tendência natural ao ganho de peso. Tem um metabolismo mais lento. O desequilíbrio de Kapha está frequentemente associado à resistência à insulina e ao diabetes tipo 2.

  • Sinais de resistência à insulina em Kapha:

    • Letargia, fadiga após comer, fome emocional, retenção de líquidos.

  • Causas comuns:

    • dieta rica em carboidratos simples, sedentarismo, excesso de comida pesada e fria.

2. Pitta (fogo + água)

Dosha com metabolismo geralmente eficiente, mas desequilíbrios levam a inflamação.

  • Consequências do excesso de Pitta:

    • Aumento do apetite, irritabilidade, hipoglicemia reativa.

    • Excesso de calor interno e inflamação promovem resistência à insulina.

    • Diabetes tipo 2 mais por inflamação do que por obesidade.

3. Vata (ar + éter)

Dosha com um corpo naturalmente magro, metabolismo rápido. É menos propenso ao diabetes tipo 2, mas pode desenvolver resistência à insulina por estresse crônico, jejum excessivo ou má alimentação. Desequilíbrio leva a perda de massa muscular, fadiga e hipoglicemia.

Dieta Cetogênica Adaptada aos Doshas

No caso de resistência à insulina ou diabetes podemos pensar na redução de carboidratos, modulação da insulina, com respeito ao dosha dominante.

🟢 Kapha + dieta cetogênica

  • Meta: reduzir peso, ativar metabolismo, cortar alimentos úmidos e pesados.

  • Foco em: vegetais de baixo amido, proteínas magras, especiarias termogênicas.

  • Evitar: laticínios (exceto ghee), alimentos muito oleosos ou frios.

  • Alimentos ideais:

    • Couve, rúcula, brócolis, abobrinha.

    • Frango, peixe, ovos.

    • Ghee com moderação.

    • Temperos: gengibre, cúrcuma, pimenta preta, canela.

🔴 Pitta + dieta cetogênica

  • Meta: reduzir inflamação, controlar a fome, equilibrar calor interno.

  • Foco em: alimentos refrescantes, anti-inflamatórios, gorduras boas.

  • Evitar: alimentos picantes, frituras, carnes vermelhas em excesso.

  • Alimentos ideais:

    • Abacate, coco, pepino, folhas verdes amargas.

    • Peixe, frango orgânico.

    • Gorduras: azeite, óleo de coco.

    • Ervas: coentro, hortelã, funcho.

🔵 Vata + dieta cetogênica

  • Meta: manter estabilidade, nutrir, evitar ressecamento e frio.

  • Foco em: comidas mornas, untuosas, densas.

  • Evitar: excesso de jejum, alimentos crus e secos.

  • Alimentos ideais:

    • Abóbora, cenoura cozida, espinafre, abacate.

    • Peixes gordos, ovos, ghee.

    • Temperos: gengibre, noz-moscada, cardamomo.

    • Boa ingestão de líquidos quentes.

Observações Importantes:

A cetogênica não é indicada para todos os perfis ayurvédicos de forma rígida — especialmente Vata, que pode ser desestabilizado por dietas muito restritivas.

Para diabetes tipo 2, a cetogênica pode ser extremamente eficaz, mas deve ser monitorada, especialmente se houver uso de medicamentos como insulina.

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Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/