Dieta cetogênica, microbiota e humor

O artigo intitulado "Ketogenic Diet and Gut Microbiota: Exploring New Perspectives on Cognition and Mood" é uma revisão abrangente publicada na revista Foods em março de 2025. Este estudo explora a inter-relação entre a dieta cetogênica (DC), o microbioma intestinal e a saúde neurológica, com ênfase nos efeitos sobre a cognição e o humor.

Pirâmide cetogênica simplificada (Jiang et al., 2025)

A DC é um regime alimentar caracterizado por baixo teor de hidratos de carbono (carboidratos) e ingestão moderada de proteínas, com o objetivo de induzir cetose — um estado metabólico em que o corpo utiliza corpos cetónicos, como o beta-hidroxibutirato (β-HB), como principal fonte de energia. Originalmente desenvolvida na década de 1920 para tratar epilepsia refratária, a DC tem sido recentemente investigada pelos seus potenciais benefícios na função cognitiva e na regulação do humor.

Microbiota Intestinal e Eixo Intestino-Cérebro

A microbiota intestinal, frequentemente referida como um "órgão oculto", desempenha um papel crucial na comunicação bidirecional entre o intestino e o cérebro, conhecida como eixo intestino-cérebro (EIC). Este eixo envolve sistemas nervoso, endócrino e imunitário, permitindo que a microbiota influencie funções cerebrais, produção de neurotransmissores e respostas emocionais.

O eixo microbiota-intestino-cérebro comunicando-se (Jiang et al., 2025)

Interação entre DC e Microbiota Intestinal

A DC altera significativamente a composição da microbiota intestinal. Estudos indicam um aumento de bactérias benéficas como Bacteroides e Prevotella, produtoras de ácidos gordos de cadeia curta (AGCC), e uma redução de bactérias potencialmente patogénicas como Cronobacter e Proteobacteria. Estas alterações podem promover um ambiente intestinal mais saudável e equilibrado.

Bactérias produzem AGCC (ou SCFAs, em inglês) pela fermentação de fibras dietéticas. Estes metabólitos não só fornecem energia às células epiteliais intestinais, mas também possuem propriedades anti-inflamatórias e neuroprotetoras. O ácido butírico, por exemplo, pode atravessar a barreira hematoencefálica e exercer efeitos positivos no sistema nervoso central.

A dieta cetogênica modula a microbiota, aumenta a produção de corpos cetônicos e AGCC (SCFAs). Estes metabólitos alteram o cérebro, regulam o metabolismo energético e os níveis de neurotransmissores, aumentam a neurotranmissão GABAérgica e contribuem para a melhoria do humor (Jiang et al., 2025).

A DC também demonstrou reduzir a inflamação intestinal e sistêmica, modulando a produção de citocinas e promovendo um perfil imunitário anti-inflamatório. Estas alterações podem contribuir para a melhoria da função cognitiva e estabilização do humor.

Através da modulação da microbiota intestinal e da produção de metabólitos benéficos, a DC pode influenciar positivamente a saúde cerebral. Observa-se uma melhoria na memória, concentração e estabilidade emocional, bem como uma redução de sintomas depressivos. Estes efeitos são atribuídos à interação entre os corpos cetónicos, AGCC e neurotransmissores como o GABA e a serotonina.

Considerações e Limitações

Apesar dos benefícios potenciais, a implementação da DC apresenta desafios:

  • Adesão a longo prazo: A restrição severa de hidratos de carbono pode ser difícil de manter.

  • Deficiências nutricionais: A ingestão limitada de fibras, vitaminas e minerais pode levar a carências nutricionais.

  • Variabilidade individual: As respostas à DC podem variar significativamente entre indivíduos.

  • Evidência clínica limitada: São necessários mais estudos clínicos de longo prazo para confirmar os benefícios e segurança da DC.

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Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Disfunção no metabolismo da glicose e redução no volume cerebral em mulheres idosas

O estudo intitulado "Sex differences between mid-life glycaemic traits and brain volume at age 70: a population-based study" investigou como as características glicêmicas na meia-idade influenciam o volume cerebral aos 70 anos, com foco nas diferenças entre os sexos.

O principal objetivo foi analisar se os níveis de glicose e outros marcadores metabólicos durante a meia-idade estão associados a alterações no volume cerebral na velhice e se essas associações diferem entre homens e mulheres.

Os pesquisadores utilizaram dados de uma coorte populacional, onde participantes tiveram suas características glicêmicas avaliadas na meia-idade e, posteriormente, realizaram exames de imagem cerebral aos 70 anos para medir o volume cerebral.

Foram analisados dados de 453 participantes (51% homens) da coorte britânica de nascimento de 1946. As medidas glicêmicas foram obtidas entre os 60 e 64 anos, incluindo glicose em jejum, HbA1c, resistência à insulina (HOMA2-IR) e função das células beta (HOMA-%B). Aos 69-71 anos, os participantes realizaram ressonâncias magnéticas para avaliar o volume cerebral total.

Principais Descobertas:

  • Mulheres: Níveis mais elevados de HbA1c, glicose em jejum e resistência à insulina na meia-idade foram associados a volumes cerebrais totais menores aos 70 anos. Por exemplo, a glicose em jejum apresentou uma associação significativa com a redução do volume cerebral (β* = -0.07; IC 95%: -0.13 a -0.01; P = 0.02).

  • Homens: Não foram encontradas associações significativas entre os marcadores glicêmicos e o volume cerebral.

  • Função das Células Beta: O HOMA-%B não apresentou associação com o volume cerebral em nenhum dos sexos.

O estudo conclui que mulheres podem ser mais vulneráveis aos efeitos adversos da hiperglicemia na saúde cerebral na velhice. Esses achados destacam a importância de monitorar e controlar os níveis de glicose na meia-idade, especialmente em mulheres, para prevenir a perda de volume cerebral e possíveis declínios cognitivos na velhice. Aprenda a cuidar do cérebro em https://t21.video

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Inflamação e depressão

O artigo "Inflammation and depression: an evolutionary framework for the role of physical activity and exercise" propõe uma abordagem evolutiva para compreender a ligação entre inflamação, depressão e o papel da atividade física como intervenção terapêutica.

Evolução, Inflamação e Depressão

A depressão pode ser entendida como uma resposta adaptativa evolutiva a ameaças ambientais, como infecções e ferimentos. Em contextos ancestrais, sintomas depressivos — como fadiga, isolamento social e perda de interesse — poderiam ter promovido comportamentos de conservação de energia e evitado riscos adicionais, facilitando a recuperação.

Esses comportamentos estão associados a uma ativação do sistema imunológico, resultando em inflamação. No entanto, no ambiente moderno, caracterizado por estresse crônico e estilos de vida sedentários, essa resposta inflamatória pode tornar-se desregulada, contribuindo para o desenvolvimento de transtornos depressivos.

A inflamação de baixo grau, caracterizada por níveis elevados de citocinas pró-inflamatórias como IL-6, TNF-α e PCR, está frequentemente presente em indivíduos com depressão. Essas moléculas inflamatórias podem afetar negativamente a neurotransmissão, a neuroplasticidade e a função do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, mecanismos implicados na patogênese da depressão.

Atividade Física como Modulação Imunológica

A prática regular de exercício físico induz adaptações musculares que promovem um perfil anti-inflamatório sistêmico. Durante o exercício, os músculos esqueléticos liberam miocinas, como a IL-6, que, apesar de inicialmente pró-inflamatória, estimula a produção de citocinas anti-inflamatórias como IL-10 e IL-1ra. Além disso, o exercício reduz a expressão de receptores do tipo Toll (TLR4) e a ativação do inflamassoma NLRP3, diminuindo a produção de IL-1β. Essas mudanças contribuem para a redução da inflamação sistêmica associada à depressão.

A intensidade do exercício influencia a resposta inflamatória e os sintomas depressivos. Estudos indicam que o treinamento físico moderado é eficaz na redução de sintomas depressivos e níveis de TNF-α, sem aumentar o estresse percebido. Por outro lado, exercícios de alta intensidade podem reduzir sintomas depressivos, mas também podem elevar os níveis de IL-6 e TNF-α, além de aumentar o estresse percebido, sugerindo que exercícios moderados podem ser mais benéficos para a saúde mental.

Benefícios Neurobiológicos do Exercício

Além dos efeitos anti-inflamatórios, o exercício físico promove a neurogênese e a plasticidade sináptica, especialmente no hipocampo e no córtex pré-frontal, áreas cerebrais associadas à regulação do humor. O aumento da expressão de fatores neurotróficos, como o BDNF, contribui para a melhoria da função cognitiva e da resiliência ao estresse, desempenhando um papel crucial na recuperação de quadros depressivos.

Assim, o exercício físico regular emerge como uma estratégia terapêutica valiosa no manejo da depressão, alinhando-se às necessidades biológicas humanas moldadas ao longo da evolução.

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/