Estresse Oxidativo e TDAH: O Que a Ciência Está Revelando?

O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) é um dos transtornos neurocomportamentais mais comuns da infância, afetando milhões de pessoas em todo o mundo. Tradicionalmente, ele tem sido associado a desequilíbrios nos neurotransmissores dopamina e noradrenalina, mas estudos recentes estão ampliando esse entendimento — e um dos protagonistas emergentes nessa nova perspectiva é o estresse oxidativo.

O que é estresse oxidativo?

Estresse oxidativo ocorre quando há um desequilíbrio entre radicais livres (espécies reativas de oxigênio - ROS) e a capacidade do corpo de neutralizá-los com antioxidantes. Esse desequilíbrio pode causar danos em estruturas celulares como proteínas, lipídios e DNA, afetando diretamente a saúde do cérebro.

TDAH e estresse oxidativo: qual a ligação?

Vários estudos demonstraram que crianças e adultos com TDAH apresentam níveis alterados de estresse oxidativo:

  • Uma meta-análise mostrou que indivíduos com TDAH têm níveis mais elevados de marcadores de estresse oxidativo, como o malondialdeído (MDA), embora não necessariamente apresentem menor atividade antioxidante basal [1].

  • A neuroinflamação e o estresse oxidativo podem agravar os sintomas do TDAH, afetando o funcionamento mitocondrial e aumentando a vulnerabilidade neuronal [2].

  • O estresse oxidativo em TDAH está intimamente ligado à ativação do sistema imune, com elevação de citocinas inflamatórias como IL-6, IL-1β e TNF-α, que também estão associadas a alterações no comportamento e cognição [3].

E os medicamentos?

Tratamentos farmacológicos convencionais, como o metilfenidato, embora eficazes para muitos pacientes, podem aumentar o estresse oxidativo, conforme demonstrado em estudos com modelos animais. Isso levanta a necessidade de explorar abordagens complementares para minimizar danos celulares.

🌿 A promessa dos antioxidantes

Frente a esses dados, a ciência começa a olhar para os antioxidantes dietéticos como potenciais aliados no tratamento do TDAH:

Substâncias como N-acetilcisteína, sulforafano e ômega-3 por sua capacidade de reduzir a inflamação e restaurar o equilíbrio redox [2]. A modulação do sistema imune e do estresse oxidativo por meio de dieta pode melhorar sintomas em pacientes com TDAH, sendo uma alternativa segura e não invasiva [4]. Compostos como flavonoides e polifenóis atuam também na expressão epigenética de genes associados à regulação do comportamento, o que os torna ainda mais promissores como coadjuvantes no manejo do transtorno.

Aprenda mais no curso nutrição no TDAH

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Razão ácido quinurênico / ácido quinolínico

A via da quinurenina é a principal rota no catabolismo do triptofano, um aminoácido essencial usado na síntese de proteínas e de moléculas bioativas como serotonina e melatonina. Cerca de 90% do triptofano é convertido em quinurenina. A enzima IDO (indoleamina dioxigenase) é a responsável por esta degradação no sistema nervoso e é ativada por estímulos inflamatórios.

A quinurenina pode ser convertida em ácido quinurênico (especialmente nos astrócitos), com ação neuroproteotra, ou ácido quinolínico (principalmente na micróglia) que, em excesso, é neurotóxico.

A razão entre o ácido quinurênico (KYNA) e o ácido quinolínico (QUIN) tem bastante relevância em contextos clínicos e neurobiológicos, especialmente por estar ligada ao metabolismo do triptofano pela via da quinurenina.

Ácido Quinurênico (KYNA) - também conhecido por quinurenina:

  • Derivado neuroprotetor.

  • Antagonista dos receptores NMDA e α7-nicotínicos.

  • Atua reduzindo excitação neural excessiva.

Ácido Quinolínico (QUIN):

  • Derivado neurotóxico.

  • Agonista dos receptores NMDA.

  • Induz estresse oxidativo, inflamação e morte celular.

Relevância da Razão KYNA/QUIN

  • Alta razão KYNA/QUIN → Mais neuroproteção.

  • Baixa razão KYNA/QUIN → Mais neurotoxicidade, associada a doenças neurodegenerativas e psiquiátricas.

Implicações clínicas

Algumas doenças e transtornos estão associadas à alterações na razão KYNA/QUIN:

  • Depressão maior: frequentemente há aumento de QUIN e redução de KYNA.

  • Esquizofrenia: KYNA pode estar aumentado, alterando cognição.

  • Doença de Alzheimer / Parkinson: envolvimento de QUIN na neurodegeneração.

  • Esclerose múltipla, HIV, epilepsia: desbalanço dessa razão contribui para inflamação e dano neuronal.

Interpretação

A razão KYNA/QUIN ainda não tem pontos de corte universais amplamente aceitos. No caso dos exames de urina o que se avalia são processos inflamatórios e oxidativos sistêmicos crônicos. Coletas no líquido cefalorraquidiano seriam mais específicos para análise do metabolismo do triptofano no cérebro.

Exemplos de exames urinários de 3 pacientes e cuidados na interpretação

Caso 1: KYNA = 9.3 QUIN = 234.1 👉 Razão = 9.3 / 234.1 ≈ 0.040 (razão muito baixa) - indica forte tendência neurotóxica/pró-inflamatória (exemplo: infecção crônica, inflamação sistêmica, estresse oxidativo elevado).

Caso 2: KYNA = 21.5 QUIN = 74.9 👉 Razão = 21.5 / 74.9 ≈ 0.287 - apesar da razão não ser perfeita e precisarmos investigar se há leve ativação inflamatória, os dois metabólitos encontram-se dentro da faixa esperada. Além dos metabólitos do triptofano podemos observar nos exames metabolômicos, outros indicadores como 8-OHdG, homocisteína e, se o paciente também tiver um painel de fezes, a calprotectina.

Caso 3: KYNA = 49.1 QUIN = 140.2 👉 Razão = 49.1 / 140.2 ≈ 0.350 - apesar desta razão parecer adequada, precisamos lembrar que ácido quinulínico e quinurênico estão bastante acima do esperado. Talvez reflita um mecanismo compensatório de aumento de quinurinato e de maior necessidade de ácido quinolínico para produção de NAD+ (coenzima essencial para o metabolismo e produção de energia. Os exames de metabólitos devem ser analisados em conjunto. Este texto descreve apenas dois metabólitos da via das quinureninas.

Se o paciente estiver relatando baixa energia poderíamos até suplementar NAD+ . Contudo, esta suplementação não corrige a via. A redução da inflamação é fundamental e devemos investigar sempre as possíveis causas. Além disso, estas vias são dependentes de vitaminas B2 e B6, que muitas vezes precisarão ser ajustadas.

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

A sinergia entre saúde mental e saúde cerebral

A ilustração abaixo representa a complexidade e a interconexão entre saúde mental e saúde cerebral, destacando os múltiplos fatores que contribuem para ambas.

No centro da imagem está o cérebro humano, simbolizando o ponto de convergência entre dois grandes domínios:

  • Saúde mental (acima do cérebro)

  • Saúde cerebral (abaixo do cérebro)

Ambas são influenciadas por uma rede interligada de fatores biológicos, sociais e ambientais que são representados ao redor.

O lado esquerdo da imagem foca nos fatores comportamentais, sociais e genéticos que influenciam o cérebro e a mente, agrupados nas seguintes categorias:

1. Social, cognitive, and affective impairments:

  • Interação social

  • Emoções

  • Cognição

2. Lifestyle choices (escolhas de estilo de vida):

  • Sono

  • Exercício físico

  • Alimentação

3. Genética:

  • Genes

  • CNVs (Variações no número de cópias de genes)

  • PRS (Pontuações de risco poligênico)

  • Epigenética

4. Estresse:

  • Um fator crítico que interage com todos os anteriores, afetando profundamente o funcionamento cerebral.

Esses componentes contribuem para prejuízos que afetam tanto a saúde mental quanto a saúde do cérebro.

O lado direito da imagem explora os fatores externos e biológicos compartilhados que afetam o cérebro, incluindo:

Exposoma e determinantes sociais

  • Discriminação

  • Desigualdades socioeconômicas

  • Poluentes

Mecanismos patofisiológicos compartilhados

  • Estresse celular

  • Microbioma

  • Inflamação

  • Sobrecarga alostática (desgaste do corpo por estresse crônico)

Modelos neurocognitivos

São explicações — modelos teóricos ou computacionais que buscam descrever e prever como o cérebro funciona e como certas alterações podem levar a sintomas mentais ou neurológicos.

  • Sobrecarga alostática: descreve como o estresse crônico desgasta o sistema corporal e cerebral

  • Codificação preditiva: É um modelo que explica o cérebro como um “órgão de previsão” que constantemente compara expectativas com a realidade sensorial. Explica como alterações nesse sistema de previsão poderiam gerar sintomas como delírios, hipersensibilidade ou ansiedade.

O artigo defende que:

Doenças mentais como depressão, ansiedade, esquizofrenia e autismo não podem ser separadas das condições neurológicas, como AVC, epilepsia ou neurodegeneração. Há mecanismos comuns e fatores compartilhados que tornam artificial essa separação. A ciência e a medicina devem integrar essas duas áreas para promover uma abordagem mais holística e eficaz.

Sinergia entre Saúde Mental e Saúde Cerebral: Uma Abordagem Holística

Se você estiver atuando em ambiente clínico, pesquisa ou até em políticas públicas, esse modelo integrado é muito utilizado em áreas como psiquiatria funcional, saúde mental integrativa e terapia informada pela neuropsicologia.

Por exemplo, podemos usar imagens cerebrais e biomarcadores (como fMRI, qEEG, SPECT) para entender como o funcionamento cerebral se relaciona com os sintomas mentais. Isso muda o modelo de “o que há de errado com você?” para “o que está acontecendo com o seu cérebro?”.

Entender o que acontece no cérebro permite a adaptação de intervenções com base nos padrões neurais — por exemplo, hiperatividade na amígdala pode sugerir tratamentos focados em trauma ou ansiedade.

As novas abordagens combinam o modelo biopsicossocial tradicional com insights neurobiológicos:

  • Bio: Nutrição, inflamação, equilíbrio hormonal, eixo intestino-cérebro.

  • Psico: Terapia cognitivo-comportamental, terapias para traumas, trabalho narrativo.

  • Social: Relações, ambiente, comunidade.

  • Neuro: Circuitos cerebrais, sistemas de neurotransmissores, neuroplasticidade.

Podemos pensar em uma psiquiatria do estilo de vida, que promove mudanças de estilo de vida que beneficiam tanto a saúde mental quanto a cerebral:

  • Exercício físico: Aumenta o BDNF, ajuda na depressão e ansiedade.

  • Higiene do sono: Essencial para regulação emocional, memória e "limpeza" cerebral.

  • Nutrição: Dietas anti-inflamatórias, ômega-3 e saúde intestinal.

  • Mindfulness e meditação: Comprovadamente fortalecem o córtex pré-frontal e acalmam o sistema límbico.

As estratégias acima devem ser combinados com psicoeducação para ajudar os pacientes a entenderem seus transtornos com base no funcionamento cerebral — não apenas como falhas psicológicas. Isso reduz o estigma e empodera o processo de recuperação.

É importante enfatizar que o cérebro é plástico, pode mudar, por meio de terapia, aprendizado, ambiente, hábitos e, quando necessário, medicamentos, neurofeedback, treinamento cognitivo, etc.

Psiquiatria de Precisão

Mais informações permitem que abandonemos a abordagem de tentativa e erro na medicação, integrando:

  • Farmacogenética

  • Nutrigenética

  • Metabolômica

  • Exames de imagem cerebral

  • Fenotipagem digital (ex.: rastreamento de sono, humor e comportamento por apps ou dispositivos).

Estes rastreamentos também permitem a identificação precoce de riscos, antes mesmo que os sintomas apareçam como transtornos completos. Equipes multidisciplinares constituídas por psiquiatras, neurologistas, psicólogos, nutricionistas e terapeutas ocupacionais são altamente valorizadas pois o trabalho conjunto permite uma abordagem mais abrangente, precisa e eficaz.

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/