Jejum e perda de gordura abdominal

A relação entre depósitos de gordura abdominal e função cognitiva, especialmente no contexto do risco de Alzheimer, é uma área de grande interesse na pesquisa. Estudos sugerem que o excesso de gordura abdominal, particularmente a gordura visceral (gordura armazenada ao redor dos órgãos), pode estar associado a diversos desfechos de saúde negativos, incluindo o declínio cognitivo e um risco aumentado de doença de Alzheimer.

Gordura Abdominal e Função Cognitiva

Gordura abdominal refere-se à gordura visceral, que é armazenada profundamente no abdômen e ao redor de órgãos vitais como fígado, pâncreas e intestinos. Ela é distinta da gordura subcutânea, que fica logo abaixo da pele.

Pesquisas indicam que indivíduos com níveis mais altos de gordura abdominal, particularmente na meia-idade, tendem a apresentar um desempenho cognitivo mais baixo. Isso pode estar relacionado à inflamação, resistência à insulina e outras disfunções metabólicas associadas ao excesso de gordura abdominal.

O declínio cognitivo pode começar na meia-idade, e a obesidade abdominal nesta fase é considerada um possível fator de risco para Alzheimer e outras formas de demência na vida adulta. Homens de meia-idade com obesidade abdominal podem ter maior probabilidade de apresentar declínio cognitivo (Shekhtman et al., 2024).

Mecanismos que Ligam a Gordura Abdominal ao Declínio Cognitivo

  • Inflamação: A gordura visceral é metabolicamente ativa e libera citocinas inflamatórias que podem influenciar a função cerebral. A inflamação crônica de baixo grau é considerada um fator importante em doenças neurodegenerativas como o Alzheimer.

  • Resistência à insulina: A obesidade e o acúmulo de gordura abdominal estão ligados à resistência à insulina, que pode levar ao diabetes tipo 2. A resistência à insulina pode afetar negativamente a função cerebral e está associada a um maior risco de doença de Alzheimer.

  • Redução dos volumes cerebrais: Estudos demonstraram que indivíduos com maiores níveis de gordura abdominal tendem a apresentar volumes cerebrais menores, especialmente em áreas críticas para a memória e cognição, como o hipocampo.

Prevenção e Intervenção

  • Controle de peso: Reduzir a gordura abdominal por meio de mudanças na alimentação, atividade física e modificações no estilo de vida pode ajudar a mitigar o risco de declínio cognitivo.

  • Atividade física: O exercício, particularmente o aeróbico, tem mostrado reduzir a gordura abdominal e melhorar a saúde cerebral. A atividade física regular pode ajudar a proteger contra o declínio cognitivo, promovendo uma melhor circulação sanguínea e reduzindo a inflamação.

  • Dieta: Dietas ricas em frutas, vegetais, grãos integrais e gorduras saudáveis, com baixo teor de alimentos processados e açúcares, podem ajudar a controlar a obesidade abdominal e apoiar a saúde cerebral.

  • Jejum: envolve limitar a alimentação a uma janela específica de tempo, geralmente entre 8 a 12 horas por dias, com períodos de jejum fora dessa janela. Essa abordagem visa aproveitar o ritmo circadiano natural do corpo e melhorar a saúde metabólica. O jejum associado a dietas com baixo teor de carboidrato pode ajudar a reduzir a gordura visceral devido a melhoria da sensibilidade insulínica e promoção da queima de gordura (He et al., 2022).

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Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Desnutrição e Alzheimer

Estudo investigou a prevalência do declínio cognitivo em centenários e idosos da China, com foco especial na relação entre nutrição e esse declínio. Realizado dentro do Estudo de Coorte de Centenários de Hainan, envolveu 946 participantes e utilizou o Mini Exame do Estado Mental (MEEM) para avaliar a função cognitiva (Feng et al., 2022).

Resultados Principais:

  1. Prevalência do Declínio Cognitivo: O estudo encontrou uma maior prevalência de declínio cognitivo entre os centenários em comparação aos idosos mais jovens. Isso sugere que a função cognitiva tende a diminuir mais acentuadamente na população de centenários.

  2. Relação com a Nutrição: A desnutrição foi identificada como um fator importante associado ao declínio cognitivo. Índices nutricionais, como o Índice Nutricional Prognóstico (PNI) e a Avaliação Nutricional Mini – Forma Curta (MNA-SF), apresentaram valores significativamente menores nos participantes com declínio cognitivo.

  3. Associação entre Nutrição e Função Cognitiva: Análises mais detalhadas revelaram que pontuações mais altas no PNI e MNA-SF estavam associadas a uma menor probabilidade de declínio cognitivo. Indivíduos com melhores indicadores nutricionais também apresentaram melhores resultados no MEEM.

Conclusão:

O estudo enfatiza a importância do tratamento da desnutrição para prevenir ou retardar o declínio cognitivo em centenários e idosos. Investir em estratégias para melhorar a nutrição dessas populações pode ser uma medida crucial na promoção da saúde cognitiva a longo prazo.

Esses achados destacam a relevância de abordagens nutricionais preventivas no cuidado de idosos, principalmente em grupos etários mais avançados, como os centenários.

Cuidados nutricionais na demência

Organizações que prestam cuidado a pessoas com demência devem estabelecer procedimentos para atender às suas necessidades de nutrição e hidratação, orientando a prática de forma eficaz. É crucial identificar e gerenciar possíveis causas de desnutrição e desidratação em pessoas com demência (Volkert et al., 2024).

Devido ao alto risco de desnutrição e desidratação, orientação alimentar deve ser oferecida a pessoas com demência e seus familiares. Esse aconselhamento deve ser preventivo e conduzido por um especialista em nutrição para garantir qualidade.

Os cuidados nutricionais exigem consciência, conhecimento e habilidades para oferecer alimentos e líquidos adequados, reconhecer problemas nutricionais e manejar os desafios relacionados à alimentação e hidratação enfrentados por pessoas com demência. Isso inclui iniciar intervenções para prevenir e tratar desnutrição e desidratação.

Triagens de rotina para desnutrição e desidratação, juntamente com avaliação nutricional e monitoramento próximo, são essenciais. A nutrição oral deve ser apoiada abordando causas potenciais de desnutrição e desidratação, além de oferecer suporte social e de enfermagem adequados.

Suplementos nutricionais orais são recomendados para melhorar o estado nutricional. Nutrição e hidratação enteral e parenteral são consideradas opções temporárias para pacientes com demência leve ou moderada, mas não para aqueles com demência grave ou em fase terminal da vida.

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Um Novo Olhar Sobre a Obesidade: Redefinição Baseada em Evidências

A redefinição de obesidade baseada em evidências distingue a doença em dois níveis: "obesidade clínica", uma condição crônica e sistêmica diretamente causada pelo excesso de adiposidade, e "obesidade pré-clínica", caracterizada pelo excesso de adiposidade sem disfunções orgânicas atuais ou limitações nas atividades diárias, mas com aumento do risco de saúde futuro (Rubino et al., 2025).

A obesidade clínica é definida como uma doença crônica associada à disfunção orgânica contínua causada apenas pela obesidade, disse a comissão. A obesidade pré-clínica está associada a vários graus de risco à saúde, mas não a doenças contínuas.

Embora o índice de massa corporal (IMC) continue sendo uma ferramenta prática e amplamente utilizada para avaliação da adiposidade, suas limitações são evidentes. O IMC pode sinalizar pessoas que devem ser observadas, não tratadas, no que ele chama de obesidade pré-clínica quando estão em risco, assim como pré-diabetes ou pré-hipertensão. Há também pessoas que não atendem ao limite de 30kg/m2 IMC para obesidade, mas que ainda assim estão em risco de condições cardiovasculares sérias porque seus corpos carregam excesso de gordura abaixo do radar do IMC. A varredura DEXA mais sofisticada da gordura corporal é mais precisa e considerada padrão ouro, mas não está amplamente disponível.

Por isso, a Comissão propõe o uso de medidas adicionais, como circunferência da cintura, relação cintura-quadril e relação cintura-altura, para fornecer uma avaliação mais precisa da obesidade. Essas métricas alternativas devem ser simples e acessíveis, permitindo sua aplicação em diferentes contextos e regiões.

Circunferência da cintura

  1. Utilize uma fita métrica flexível e inextensível.

  2. Localize o ponto mais estreito da cintura, geralmente entre a base das costelas e o topo do osso do quadril (crista ilíaca).

    • Caso a cintura não seja claramente definida, meça na altura do umbigo.

  3. Fique em pé, relaxe o abdômen e respire normalmente. Meça ao final de uma expiração.

  4. Certifique-se de que a fita esteja paralela ao chão e ajustada ao corpo sem comprimir a pele.

Valores de referência (OMS):

  • Risco aumentado:

    • Homens: > 94 cm.

    • Mulheres: > 80 cm.

  • Risco muito aumentado:

    • Homens: > 102 cm.

    • Mulheres: > 88 cm.

A circunferência da cintura é um indicador de gordura visceral (em torno dos órgãos), associada a maiores riscos de doenças cardiovasculares, diabetes tipo 2 e síndrome metabólica.

Relação cintura-quadril (RCQ)

  1. Meça a cintura: Siga os passos descritos acima.

  2. Meça o quadril:

    • Coloque a fita métrica no ponto mais largo dos quadris e nádegas.

    • Certifique-se de que a fita esteja nivelada ao redor do corpo.

  3. Calcule a relação cintura-quadril:
    Divida o valor da circunferência da cintura pelo valor da circunferência do quadril:

Valores de referência (OMS):

  • Baixo risco:

    • Homens: < 0,9.

    • Mulheres: < 0,8.

  • Risco moderado:

    • Homens: 0,9–0,99.

    • Mulheres: 0,8–0,89.

  • Alto risco:

    • Homens: ≥ 1,0.

    • Mulheres: ≥ 0,9.

O RCQ avalia a distribuição de gordura corporal. Um valor elevado indica maior proporção de gordura abdominal, que está mais associada a riscos metabólicos do que a gordura periférica (nas pernas e quadris).

Relação cintura-altura (RCA)

  1. Meça a cintura: Siga os passos descritos para a circunferência da cintura.

  2. Meça a altura: Use um estadiômetro ou fita métrica fixada na parede para obter a altura em centímetros.

  3. Calcule a relação cintura-altura:
    Divida a circunferência da cintura pela altura (ambos em centímetros):

Valores de referência:

  • Ideal (baixo risco): RCA < 0,5.

  • Risco moderado: RCA entre 0,5 e 0,6.

  • Risco elevado: RCA > 0,6.

A RCA é uma medida prática que considera a proporção entre a gordura abdominal e a altura da pessoa, sendo útil para avaliar o risco metabólico de forma personalizada.

Pessoas com excesso de gordura corporal podem não ter evidências de doenças no que é chamado de estágio pré-clínico, mas são consideradas de risco elevado para problemas cardiovasculares, diabetes tipo 2 e alguns tipos de câncer, bem como obesidade clínica. Em crianças, o histórico familiar de diabetes tipo 2 ou hipertensão é especialmente importante na avaliação da necessidade de tratamento no estágio pré-clínico.

As descobertas da comissão, aprovadas por 76 organizações médicas ao redor do mundo e publicadas no The Lancet Diabetes & Endocrinology, não dependeram de financiamento da indústria, mas foram apoiadas pela King's Health Partners.

Para pessoas classificadas com obesidade pré-clínica, a mitigação de riscos será a prioridade. Aqueles com menor risco poderão ser manejados com mudanças no estilo de vida. Contudo, é essencial identificar os indivíduos com risco elevado que podem necessitar de intervenções médicas.

Impactos no Estudo Epidemiológico da Obesidade

Essa nova definição altera nossa compreensão da epidemiologia da obesidade. Os dados atuais, baseados exclusivamente no IMC, precisam ser atualizados para refletir a obesidade como um espectro de condições médicas. Auditorias preliminares indicam que muitas pessoas com obesidade não atendem aos critérios de obesidade clínica. No entanto, essas análises enfrentam limitações devido ao uso de dados históricos e incompletos.

Além disso, há uma oportunidade de estratificar a obesidade clínica em subtipos distintos, com base em suas apresentações clínicas ou fisiopatológicas. Essa abordagem pode contribuir para um manejo mais eficaz e uma melhor compreensão da condição.

Obesidade sarcopênica

Uma das possíveis estratificações possíveis futuramente é a obesidade sarcopênica, caracterizada pela perda de massa e função muscular. Entre os fatores de risco para a sarcopenia na obesidade estão o estilo de vida sedentário, distúrbios do tecido adiposo, comorbidades (doenças agudas e crônicas) e o próprio envelhecimento (Donini et al., 2022).

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/