Fibrose na esclerose lateral amiotrófica

A esclerose lateral amiotrófica (ELA) envolve a degeneração dos neurônios motores e sintomas debilitantes e possivelmente fatais. A pandemia da COVID-19 afetou diretamente a qualidade de vida desse grupo, e a infecção pelo SARS-CoV-2 acelerou o processo neuroinflamatório dos pacientes. Além disso, estudos indicam que a infecção pode ter levado ao desenvolvimento da patologia em mais pessoas (Simões et al., 2024).

COVID como gatilho para ELA (Simões et al., 2024)

O artigo "Fibrose como uma Característica Comum nos Tecidos da Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA)" destaca o papel emergente da fibrose (acúmulo excessivo de tecido conjuntivo fibroso) na Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA), uma doença neurodegenerativa caracterizada pela degeneração dos neurônios motores. A pesquisa identifica a fibrose como uma característica patológica presente em diversos tecidos afetados pela ELA, expandindo a compreensão dos mecanismos da doença. Aqui estão os aspectos mais importantes do artigo:

1. Identificação da Fibrose na ELA

O estudo fornece evidências claras de que a fibrose é uma característica comum em vários tecidos de pacientes com ELA, incluindo a medula espinhal, os músculos esqueléticos e os pulmões.

Isso desafia a visão tradicional da ELA como sendo apenas uma doença neurodegenerativa, ao destacar o envolvimento da modelação da matriz extracelular (MEC) e processos fibróticos na progressão da doença.

2. Fibrose no Sistema Nervoso Central (SNC)

A pesquisa mostra mudanças fibróticas significativas na medula espinhal de pacientes com ELA, onde ocorre a degeneração dos neurônios motores. Essas mudanças incluem um aumento na deposição de colágeno e nos marcadores de fibrose no tecido da medula espinhal, o que pode contribuir para a progressão da degeneração dos neurônios motores, criando um ambiente tóxico para os neurônios. A fibrose no SNC pode prejudicar a comunicação celular normal e o reparo dos axônios, agravando ainda mais a neurodegeneração.

3. Fibrose nos Músculos Esqueléticos

Os músculos esqueléticos de pacientes com ELA apresentam cicatrizes fibróticas e acúmulo excessivo de colágeno, o que pode ser uma resposta à desnervação (perda da inervação devido à morte dos neurônios motores).

Essa fibrose no tecido muscular pode agravar a atrofia muscular e a fraqueza, que são sintomas centrais da ELA, limitando ainda mais a mobilidade e a qualidade de vida dos pacientes.

4. Fibrose em Outros Órgãos

O estudo também nota fibrose em órgãos além do sistema nervoso e músculos, como os pulmões, sugerindo que a ELA afeta múltiplos sistemas e que a fibrose pode ser uma resposta comum em diferentes tecidos.

Isso indica que a ELA tem efeitos sistêmicos, e as alterações fibróticas podem contribuir para a insuficiência respiratória, uma das causas comuns de morte em pacientes com ELA.

5. Mecanismos Moleculares que Conduzem à Fibrose na ELA

O artigo explora possíveis vias moleculares que levam à fibrose na ELA, incluindo:

- A sinalização da TGF-β (Fator de Crescimento Transformador-Beta), uma via chave que promove processos fibróticos, está aumentada nos tecidos com ELA.

- Metaloproteinases de Matriz (MMPs), que regulam a remodelação da matriz extracelular, estão desreguladas, contribuindo para o acúmulo excessivo de MEC.

6. Implicações Terapêuticas Potenciais

Ao identificar a fibrose como parte da patologia da ELA, o estudo abre novas vias terapêuticas. O alvo de vias relacionadas à fibrose (como inibidores da TGF-β ou agentes anti-fibróticos) pode retardar a progressão da doença ou aliviar os sintomas, reduzindo a cicatrização tecidual.

Tratamentos anti-fibróticos, comumente usados em doenças como fibrose pulmonar, podem ser reaproveitados para a ELA, protegendo os tecidos dos danos fibróticos.

O artigo discute a conexão entre inflamação crônica nos tecidos com ELA e o desenvolvimento de fibrose. Processos inflamatórios provavelmente desempenham um papel significativo na iniciação e manutenção das mudanças fibróticas, especialmente pela ativação dos fibroblastos e dos componentes da matriz extra celular.

Recomendações nutricionais

Baseando-se nos achados do artigo sobre a fibrose como uma característica relevante na Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA), é possível elaborar estratégias nutricionais que auxiliem no controle da fibrose, abordando a inflamação crônica, remodelação da matriz extracelular (MEC) e o estresse oxidativo. Aqui estão as principais recomendações nutricionais:

1. Reduzir a Ativação da Fibrose (via TGF-β e MEC)

O controle da sinalização do TGF-β, que desempenha papel central na fibrose, pode ser apoiado por nutrientes e compostos bioativos.

  • Curcumina: Inibe a sinalização do TGF-β e tem propriedades anti-fibróticas e anti-inflamatórias. Adicionar açafrão da terra e pimenta-do-reino (pimenta preta) a todas as refeições ou suplementar em cápsulas.

  • Resveratrol: Atua como modulador de TGF-β e tem potencial para reduzir o acúmulo de colágeno. Insira na dieta fontes como uvas vermelhas, amendoim e mirtilos ou faça a suplementação de Trans-resveratrol.

  • Chá Verde (EGCG):

    Inibe a fibrogênese e a deposição de MEC em estudos pré-clínicos. Consuma chá verde ou suplementos de EGCG.

2. Suporte Anti-inflamatório

A inflamação crônica contribui significativamente para a fibrose. Alimentos anti-inflamatórios podem ajudar a modular processos fibróticos.

  • Ácidos Graxos Ômega-3: Reduzem a inflamação crônica e modulam fibroblastos ativados. Insira n a dieta peixes gordurosos (salmão, sardinha, atum), chia, linhaça e nozes e faça a suplementação de ômega-3.

  • Vitamina D: Modula a resposta imune e pode ajudar a reduzir processos fibróticos. Avalie seus níveis de vitamina D no plasma e faça a suplementação para mantê-la por volta de 60 ng/mL.

  • Polifenóis: Presentes em frutas vermelhas, romãs e vegetais coloridos e suplementos com propriedades anti-inflamatórias e anti-fibróticas.

3. Reduzir o Estresse Oxidativo

O estresse oxidativo agrava a degeneração neuronal e estimula a fibrose. Antioxidantes na dieta são essenciais.

  • Glutationa e Precursores: Estimulam a defesa antioxidante no organismo. Fontes: abacate, aspargos, espinafre e suplementação com N-acetilcisteína (NAC).

  • Vitaminas C e E: Neutralizam radicais livres e protegem os tecidos contra o dano oxidativo. Fontes: frutas cítricas, castanhas, sementes e óleos vegetais.

  • Selênio: Cofator essencial para enzimas antioxidantes. Fontes: castanha-do-pará, frutos do mar, ovos.

  • Coenzima Q10: Melhora a função mitocondrial e pode proteger o tecido pulmonar. Prefiro a suplementação na forma ativa (ubiquinol).

4. Modulação da Microbiota Intestinal

A saúde intestinal influencia processos inflamatórios sistêmicos e pode impactar a fibrose.

  • Probióticos e Prebióticos: Melhoram a barreira intestinal e reduzem marcadores inflamatórios. Fontes: iogurte natural, kefir, kombucha, fibras alimentares (aveia, banana verde).

  • Fibra Solúvel: Promove produção de ácidos graxos de cadeia curta (butirato), com propriedades anti-inflamatórias. Fontes: aveia, leguminosas, maçã, cenoura, psyllium.

5. Controle do Acúmulo de Colágeno

Regulação da remodelação da matriz extracelular é crucial na ELA.

  • Quercetina: Inibe a atividade de metaloproteinases desreguladas e previne o excesso de MEC. Fontes: maçãs, cebolas, brócolis, suplementos.

  • Silimarina (Cardo-mariano): Estimula regeneração tecidual e reduz fibrose em modelos experimentais. Pode ser manipulada.

  • Vitamina K2: Pode ajudar a regular a mineralização e reduzir a deposição excessiva de MEC. Fontes: queijos fermentados, natto (soja fermentada).

6. Manutenção da Massa Muscular e Mobilidade

Como a fibrose nos músculos agrava a atrofia muscular, é essencial preservar a função muscular.

  • Proteínas de Alta Qualidade: Estimulam a regeneração muscular.

    • Fontes: ovos, peixes, carnes magras, proteínas vegetais (leguminosas), whey protein.

  • Magnésio: Essencial para função muscular e neuromuscular. Fontes: vegetais verdes escuros, nozes, sementes. Gosto de suplementar o magtein manipulado.

Essas estratégias nutricionais devem ser adaptadas para cada paciente, considerando intolerâncias alimentares, estado nutricional e progressão da doença, em colaboração com uma equipe de saúde multidisciplinar. Precisa de ajuda e individualização? Marque aqui sua consulta de nutrição online.

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Disbiose e disfunção mitocondrial na Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA)

A esclerose lateral amiotrófica (ELA) é uma doença neurodegenerativa rara não contagiosa, que evolui de forma progressiva. Nesta doença, os neurônios motores que conduzem a informação do cérebro aos músculos (passando pela medula espinhal) morrem prematuramente. Como consequência, os músculos vão ficando mais fracos dificultando o caminhar, o falar, o andar, dentre outros movimentos. A doença começa a dar sinais em uma única parte do corpo, espalhando-se rapidamente para a maioria dos músculos, incluindo o diafragma, aumentando o risco de morte por insuficiência respiratória. São também comuns os prejuízos cognitivos e de humor.

Causas da ELA

Existem causas genéticas (mutações de mais de 25 genes) e ambientais. Em 10% dos pacientes são identificadas mutações, mas em 90% dos casos a causa é desconhecida. Dentre as duas principais teorias:

  • Contato com a neurotoxina β-N-metilamino-L-alanine (BMAA) presente na água, ar, certos alimentos (sementes de trigo - Triticum aestivum) e cianobactérias de certas regiões do mundo (Li et al., 2024). Esta toxina é incorporada em proteínas e toma o lugar do aminoácido serina. Por isso, a suplementação de L-serina em altas doses (15g até 2 vezes ao dia) é recomendada (Bradley et al., 2017).

  • Contato com o vírus HERV-K que causa neurotoxicidade e neurodegeneração (Steiner et al., 2022). Quando o vírus é encontrado o tratamento é o uso de antiretrovirais (como aqueles usados no tratamento de pacientes com HIV).

Alterações metabólicas, incluindo desequilíbrios lipídicos, desregulação do metabolismo glicolítico cerebral e disbiose intestinal são contribuintes fundamentais para o início e progressão da Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA). Essas mudanças pioram a carência energética, aumentam a produção de radicais livres e alimentam a neuroinflamação.

A disfunção gastrointestinal e a disbiose intestinal pioram tudo, pois desregulam a imunidade, comprometem a integridade da barreira intestinal e alteram a sinalização do eixo intestino-microbiota-cérebro, acelerando a neurodegeneração (Cuffaro et al., 2024).

Estratégias terapêuticas e preventivas focadas na nutrição oferecem oportunidades promissoras para abordar esses mecanismos fisiopatológicos interconectados. Dietas enriquecidas com antioxidantes, ácidos graxos ômega-3 e compostos anti-inflamatórios mostraram potencial na redução do estresse oxidativo e da inflamação sistêmica.

É importante estimular a biogenêse mitocondrial com moléculas que ativem a via AMPK-SIRT1 (vimos no modulo de neuroinflamação), porque o efeito global será interessante nestes pacientes.

Abordagens direcionadas à microbiota, incluindo probióticos, prebióticos, pós-bióticos e transplante de microbiota fecal, surgem como ferramentas inovadoras para restaurar o equilíbrio microbiano, fortalecer a integridade intestinal e otimizar a função do eixo intestino-microbiota-cérebro.

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Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Suplementação de NAC não deve ser prolongada na síndrome de Down

Pessoas com Trissomia do Cromossomo 21 (também conhecida como Síndrome de Down) têm níveis elevados de estresse oxidativo devido a:

  • Aumento da produção de espécies reativas de oxigênio (ROS).

  • Deficiências na neutralização desses radicais livres.

Isso ocorre porque o cromossomo 21, que está triplicado na T21, gerando uma superexpressão de genes que afetam o equilíbrio oxidativo, como o gene da superóxido dismutase (SOD1). Quanto maior a expressão de SOD1, maior é a produção de peróxido de hidrogênio (H₂O₂), um radical livre, que aumenta o estresse e oxidativo, a instabilidade genética, o risco de inflamação crônica, de disfunção mitocondrial e neurodegeneração mais acelerada.

Há também superexpressão do gene CBS (cistationina beta-sintase).A CBS está associada a vários impactos metabólicos, já que o gene está localizado no cromossomo 21, que é trissômico em indivíduos com T11. A CBS é uma enzima chave na via do metabolismo da homocisteína, e sua superexpressão pode afetar várias funções fisiológicas.

1. Alteração do Metabolismo da Homocisteína

  • A CBS converte homocisteína em cistationina no ciclo da metionina. Com a superexpressão do gene, há uma redução nos níveis de homocisteína plasmática, o que geralmente é observado em pessoas com síndrome de Down. Ao avaliar a homocisteína no exame de sangue, atente-se para o fato de que pode estar um pouco mais baixa na síndrome de Down.

  • Embora níveis baixos de homocisteína sejam protetores contra doenças cardiovasculares, podem haver efeitos secundários associados ao desequilíbrio de outros metabólitos relacionados. Dificuldades na sua reciclagem também podem afetar negativamente os processos de metilação e produção de neurotransmissores e gerar mais alterações no desenvolvimento neural e cognição.

2. Estresse Oxidativo Aumentado

  • A via metabólica impactada pela CBS também está relacionada ao metabolismo do enxofre e à produção de glutationa, um antioxidante crucial. A superexpressão pode levar a um desequilíbrio nos níveis de glutationa e outros metabólitos, resultando em maior vulnerabilidade ao estresse oxidativo, com implicações no envelhecimento precoce e em doenças neurodegenerativas.

Devido ao estresse oxidativo aumentado muitas pessoas pensam em suplementar N-acetilcisteína (NAC), um precursor da glutationa, o mais potente antioxidante endógeno.

No entanto, embora tenha potencial terapêutico, o uso da NAC na T21 deve ser avaliado com cautela devido a possíveis contraindicações e efeitos colaterais. Como o NAC é precursor da cisteína, esta vai aumentar ainda mais. Assim, a suplementação prolongada de NAC pode desequilibrar o metabolismo de enxofre, contribuindo para efeitos adversos, como sobrecarga de cisteína ou produção excessiva de taurina.

A NAC pode, em alguns casos, aumentar a produção de intermediários reativos no processo de metabolização do H₂O₂ em glutationa, agravando o estresse oxidativo em vez de mitigá-lo. A introdução de NAC pode levar a um acúmulo de intermediários oxidantes se não houver um equilíbrio adequado entre as enzimas envolvidas.

NAC em excesso também pode causar efeitos colaterais gastrointestinais, como náusea, vômito, que podem ser mais difíceis de gerenciar em pessoas com T21 devido a predisposições gastrointestinais comuns, como refluxo gastroesofágico e constipação.

Muitas vezes, pessoas com SD já utilizam outros suplementos antioxidantes (como vitamina C e vitamina E). O uso concomitante de NAC pode causar sobrecarga antioxidante, desregulando ainda mais o equilíbrio redox.

Assim, o uso de NAC deve ser cuidadosamente avaliado por um médico, considerando o histórico clínico, estado imunológico e metabólico do indivíduo.

Outros pontos de atenção

  • Saúde gastrointestinal: É importante corrigir problemas digestivos, como disbiose ou intolerâncias alimentares, antes de iniciar suplementações específicas.

  • EGCG (epigalocatequina galato): Após corrigir o intestino, o EGCG, um polifenol do chá verde, pode ser benéfico. Ele ajuda a modular vias metabólicas alteradas na SD, incluindo o estresse oxidativo e inflamação. Tratar a disbiose antes vai aumentar a biodisponibilidade de nutrientes e do EGCG. A disbiose também pode transformar o EGCG em catequinas menos antiinflamatórias.

  • Disfunção mitocondrial: É comum em pessoas com T21, afetando a produção de energia e aumentando o estresse oxidativo. O aumento da expressão de CBS foi associado a alteração na cadeia de transporte de elétrons na mitocôndria, maior consumo de oxigênio, alteração da atividade do Complexo IV, maior produção de radicais livres e menor geração de ATP (Panagaki et al., 2019).

    • Podemos trabalhar com outros nutrientes como coenzima Q10, vitamina E, ácido alfa lipoico, vitaminas B1, B2, B3, C, minerais como magnésio, além de carnitina e ômega-3.

  • Deficiência de minerais: Verificar níveis de zinco, selênio e outros micronutrientes importantes para o metabolismo antioxidante e imunidade.

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Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/