Mitocôndrias, Estresse Oxidativo e o Impacto no Neurodesenvolvimento

Evidências crescentes destacam o papel crucial das mitocôndrias em condições ligadas ao neurodesenvolvimento. Além de sua função tradicional como usinas energéticas celulares, elas regulam processos metabólicos, redox e epigenéticos. Isso inclui o suporte à maquinaria epigenética, que afeta o acesso ao DNA e a organização da cromatina. No neurodesenvolvimento, as mitocôndrias influenciam diretamente o destino de células-tronco neurais e, por consequência, a neurogênese em cérebros em formação e adultos.

Mitocôndrias e a Gestacão

Durante a gestação, a disfunção mitocondrial está associada a condições como pré-eclâmpsia. Problemas na oxigenação podem levar a uma remodelação inadequada das artérias espirais, comprometendo a invasão do trofoblasto e alterando a interação entre trofoblastos e células imunológicas maternas. Isso pode impactar negativamente a comunicação materno-fetal, resultando em distúrbios gestacionais.

O Ciclo Vicioso: Disfunção Mitocondrial e Estresse Oxidativo

A relação entre disfunção mitocondrial e estresse oxidativo é bidirecional. O excesso de espécies reativas de oxigênio (EROs) danifica as mitocôndrias, que, em resposta, produzem ainda mais EROs. Este ciclo é conhecido como "liberação de ERO induzida por ROS" e está presente em diversas patologias crônicas. Fatores ambientais, como metais pesados, inflamação crônica e disfunções metabólicas, exacerbam esse processo, contribuindo para condições como o Transtorno do Espectro Autista (TEA).

Mitocôndrias e o Transtorno do Espectro Autista (TEA)

Estudos revelam várias anormalidades mitocondriais em indivíduos com TEA. Biomarcadores como lactato, piruvato e creatina quinase estão frequentemente elevados, indicando comprometimentos na cadeia de transporte de elétrons (ETC). Esses problemas podem explicar sintomas gastrointestinais comuns, como constipação, frequentemente relacionados à disfunção de enterócitos.

Curiosamente, síndromes como Down e Rett também compartilham esses padrões mitocondriais alterados. Isso reforça a conexão entre mitocôndrias, microbiota intestinal e o neurodesenvolvimento.

Disbiose Intestinal, Ácidos Graxos e Estresse Oxidativo

Indivíduos com TEA frequentemente apresentam desequilíbrios nos ácidos graxos. Os níveis de ácidos graxos saturados são elevados, enquanto os de poliinsaturados, como o ω3 (especialmente o DHA), são reduzidos. Isso compromete a fluidez das membranas celulares e a função de proteínas como a Na+/K+-ATPase, resultando em pior oxigenação tecidual e aumento do estresse oxidativo.

O Papel do Propionato na Microbiota

O propionato (PPA), um metabólito bacteriano produzido por Clostridia spp. e Bacteroidetes, tem papel significativo. Estudos indicam que o PPA promove inflamação e disfunção mitocondrial, impactando o desenvolvimento neural embrionário e promovendo neuroinflamação. A exposição materna ao PPA pode ter implicações duradouras para o feto.

Conexões Intestino-Mitocôndria no TEA

Existem pelo menos três conexões principais entre o trato gastrointestinal e as mitocôndrias em indivíduos com TEA:

  1. Disfunção mitocondrial causando sintomas gastrointestinais.

  2. Exposição ambiental a pesticidas, metais pesados e medicamentos.

  3. Efeitos de lipopolissacarídeos (LPS) e outros metabólitos bacterianos na função mitocondrial.

Perspectivas Terapêuticas

A identificação de biomarcadores como DHA-ω3 e o manejo do estresse oxidativo oferecem novas oportunidades terapêuticas. Suplementação com ácidos graxos poliinsaturados, antioxidantes e compostos moduladores da função mitocondrial despontam como alternativas promissoras.

A disfunção mitocondrial emerge como uma peça-chave na compreensão do TEA, conectando fatores genéticos, ambientais e metabólicos a manifestações neurocomportamentais e gastrointestinais. Avançar nesse entendimento é essencial para o desenvolvimento de diagnósticos precoces e tratamentos personalizados.

Nutrientes para melhorar a função de mitocôndrias dos neurônios

1. Complexo B - As vitaminas do complexo B, como B1 (tiamina), B2 (riboflavina), B3 (niacina), B6, B9 (ácido fólico) e B12, desempenham papéis cruciais na produção de energia mitocondrial.

2. NADH (Nicotinamida Adenina Dinucleotídeo) - forma reduzida de NAD⁺, um coenzima central na produção de ATP (energia celular).

3. Coenzima Q10 (Ubiquinol) - Atua como um transportador de elétrons na cadeia respiratória mitocondrial. Tem propriedades antioxidantes.

4. Ácido Alfa-Lipoico - poderoso antioxidante lipossolúvel e hidrossolúvel, que pode neutralizar espécies reativas de oxigênio (ROS). Regenera as vitaminas C e E.

5. Creatina - auxilia no armazenamento e transporte de energia em células de alta demanda, como os neurônios.
Ajuda a regenerar ATP a partir de ADP, fornecendo energia rápida para a função celular.

6. Antioxidantes (em geral) - Combatem os radicais livres que danificam as mitocôndrias.
Exemplos incluem vitaminas C, E, glutationa e compostos naturais como resveratrol das uvas roxas, flavonoides do cacau, catequinas do chá verde.

7. Carnitina - transporta ácidos graxos de cadeia longa para dentro das mitocôndrias, onde são usados como combustível para gerar energia.
A acetil-L-carnitina, uma forma ativa, também tem propriedades neuroprotetoras e melhora a função cerebral.

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Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Adoçantes na dieta cetogênica

Frequentemente associamos açúcar com sensações boas. Afinal, o consumo de alimentos açucarados estimula a liberação de dopamina, neurotransmissor associado ao prazer e sensação de bem-estar. Contudo, o consumo excessivo de açúcar está relacionado à inflamação, o que pode afetar negativamente a memória e o aprendizado a longo prazo. Em pessoas com resistência insulínica, o açúcar aumentará a glicação cerebral, reduzirá a neuroplasticidade e aumentará o risco de demência na velhice.

Formação de produtos finais de glicação avançada (AGEs)

Produtos Finais de Glicação Avançada (AGEs) são compostos formados quando açúcares reagem de maneira não enzimática com proteínas, lipídios ou DNA. Esse processo ocorre tanto no organismo humano quanto nos alimentos, especialmente durante métodos de cozimento em altas temperaturas, como grelhar ou fritar.

A acumulação de AGEs no corpo está associada ao envelhecimento e ao desenvolvimento de doenças crônicas, como doenças cardiovasculares, diabetes mellitus e Alzheimer. Os AGEs podem induzir rigidez vascular, estresse oxidativo e inflamação, contribuindo para a deterioração de tecidos e órgãos ao longo do tempo. Os AGEs podem ser formados fora ou dentro do corpo:

  • AGEs exógenos: reação de Maillard em alimento, fumaça de cigarro

  • AGEs endógenos: produzidos no corpo em condições de hiperglicemia

AGEs têm ação pró-oxidante e pró-inflamatória.

AGEs e Diabetes

Em indivíduos com diabetes mellitus, especialmente em estados de hiperglicemia crônica, a formação de AGEs é acelerada. Esses compostos podem modificar irreversivelmente as propriedades químicas e funcionais de diversas estruturas biológicas, contribuindo para complicações vasculares, como retinopatia, nefropatia e neuropatia diabéticas.

AGEs e Demência

A presença de AGEs no cérebro está relacionada ao desenvolvimento de doenças neurodegenerativas, como a doença de Alzheimer. Os AGEs podem induzir estresse oxidativo e inflamação neuronal, promovendo a formação de placas amiloides e emaranhados neurofibrilares, características típicas da demência.

Inter-relação entre Diabetes e Demência

O diabetes é reconhecido como um fator de risco para o desenvolvimento de demência. A hiperglicemia crônica leva à formação aumentada de AGEs, que, por sua vez, podem afetar negativamente a função cognitiva. Além disso, a resistência à insulina e a hiperinsulinemia, comuns no diabetes tipo 2, estão associadas à acumulação de proteínas amiloides no cérebro, exacerbando o risco de demência.

Dicas para Reduzir AGEs

  • Métodos de Cozimento: Prefira cozinhar alimentos a baixas temperaturas, como cozinhar no vapor ou ferver, em vez de grelhar ou fritar.

  • Escolha de Alimentos: Opte por alimentos frescos e minimamente processados, ricos em antioxidantes, de baixo índice glicêmico que podem combater os efeitos nocivos dos AGEs.

  • Moderação no Consumo de Açúcares: Reduza a ingestão de açúcares refinados e carboidratos simples para diminuir a formação endógena de AGEs.

  • Suplementos inibidores de glicação: cinamaldeído (500 mg a 2g/dia em extrato de canela padronizado), carnosina (500 mg a 1g/dia)

  • Dieta cetogênica - dieta pobre em carboidratos, moderada em proteína e rica em gorduras. A dieta favorece o controle da glicemia, reduz o estresse oxidativo e a neuroinflamação. Açúcares são eliminados e, se necessário, há substituição por adoçantes.

Adoçantes na dieta cetogênica

Os adoçantes podem ser ótimos para adicionar sabor à sua comida sem o impacto negativo que o açúcar tem. Mas você ainda pode querer se acostumar com menos doçura em sua comida. Normalmente, após 1 ou 2 semanas, você se acostuma com menos açúcar e alimentos com sabor doce e notará que “precisa” menos. Desta forma, você realmente desfruta do sabor puro que a natureza já deu aos pratos que você prepara.

Existem 2 tipos de adoçantes: os adoçantes naturais e adoçantes artificiais. Os melhores adoçantes naturais são baseados em estévia e os polióis, como xilitol e eritritol (sabor mais próximo do açúcar). A estévia tem um sabor amargo que nem todo mundo gosta, mas já existem marcas como color andina com menos sabor residual.

Vantagens do Eritritol

  • Contém zero calorias e zero carboidratos

  • Não aumenta os níveis de açúcar no sangue ou insulina

  • A substância ativa é excretada na urina sem ser utilizada pelo organismo

  • Na forma granulada ou em pó, comporta-se como o açúcar e é uma fácil substituição em todo o tipo de receitas

  • Pode ser usado tanto quente como frio: não perde a doçura quando aquecido

  • É muito melhor para os dentes do que a maioria dos outros açúcares e adoçantes (que podem causar placa bacteriana e cáries)

  • O sabor é como açúcar. A única diferença é que dá uma sensação refrescante na língua que muitas pessoas acham bastante agradável

  • De todos os polióis, o eritritol é o menos provável de causar inchaço, gases ou diarreia (embora ainda possa ocorrer sensibilidade)

Desvantagens do Eritritol

O eritritol é cerca de 30% menos doce que o açúcar, então você precisa adicionar um pouco mais para obter a mesma doçura em suas receitas. Se você precisa da mesma doçura do açúcar, experimente nossa mistura de eritritol e estévia sem gosto residual.

Adoçantes artificiais são substâncias químicas feitas em fábrica ou laboratório. Eles geralmente contêm menos calorias e carboidratos do que o açúcar comum e, portanto, são frequentemente usados em produtos "diet" e "light", como refrigerantes.

Estes são os adoçantes artificiais mais usados:

  • Alitame

  • Aspartame

  • ciclamato

  • Neotame

  • Sacarina

  • Sucralose

De maneira geral, esses adoçantes passaram por extensos estudos e são considerados seguros para consumo nas quantidades aprovadas pelas agências reguladoras, como a FDA (Administração de Alimentos e Medicamentos dos EUA) e a EFSA (Autoridade Europeia para a Segurança Alimentar). No entanto, alguns estudos sugerem que o consumo excessivo de certos adoçantes artificiais pode estar relacionado a efeitos negativos à saúde, como alterações no metabolismo, aumento de risco de câncer (em alguns estudos animais, mas não em humanos) e impactos na microbiota intestinal.

  1. Aspartame: Pode causar problemas para pessoas com fenilcetonúria (uma condição genética rara). Não há evidências conclusivas que provem riscos à saúde em doses normais de consumo.

  2. Sucralose: Considerado seguro, mas alguns estudos sugerem que o consumo em excesso pode afetar negativamente a microbiota intestinal.

  3. Ciclamato: Foi banido em alguns países no passado devido a preocupações com sua segurança, mas é aprovado em muitos outros países, inclusive na Europa, após novos estudos.

  4. Sacarina: Foi associada a risco de câncer em estudos antigos com ratos, mas esses achados não foram confirmados em humanos, levando as agências a considerá-la segura.

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Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Dieta cetogênica e neuroproteção

O cérebro adulto, embora represente apenas 2% do peso corporal, consome cerca de 20–23% da energia do corpo, predominantemente na forma de glicose. Quando a glicose é insuficiente, ele recorre aos corpos cetônicos (KBs) como fonte de energia alternativa. A dieta cetogênica (DC), criada em 1921 por Dr. Wilder para tratar epilepsia refratária em crianças, demonstrou benefícios em doenças neurodegenerativas como Alzheimer (AD), Parkinson (PD) e esclerose lateral amiotrófica (ELA).

Características da Dieta Cetogênica (DC)

  • Clássica: Rica em gorduras (90%) e pobre em carboidratos, com uma proporção de energia de 4:1 (gordura: não gordura).

  • Baseada em triglicerídeos de cadeia média (MCT): Mais fácil de manter e rica em ácidos graxos como ácido octanoico e decanoico, que são rapidamente transformados em corpos cetônicos no fígado.

  • Dieta Atkins Modificada (DAM): Menos restritiva, com 10–20g de carboidratos por dia. Contém 27% de proteínas, 39% de carboidratos e 34% de gorduras. Estudos em ratos mostram que a DAM melhora a função cognitiva e pode beneficiar distúrbios neurológicos associados a alterações metabólicas.

Efeitos Neuroprotetores da Dieta Cetogênica

  1. Melhora da função mitocondrial:

    • Redução da produção de espécies reativas de oxigênio (ROS).

    • Aumento na produção de ATP e expressão de proteínas desacopladoras (UCPs), que protegem os neurônios contra estresse oxidativo.

  2. Aumento de fatores neurotróficos:

    • Elevação do BDNF, que promove a plasticidade sináptica e a neurogênese.

    • Estímulo de fatores como NT-3 e GDNF, que suportam o desenvolvimento neuronal.

  3. Efeitos anti-inflamatórios e antioxidantes:

    • Produção de ácidos graxos poli-insaturados (PUFAs), especialmente ômega-3 (n-3), conhecidos por sua ação anti-inflamatória e manutenção da função sináptica.

    • Redução de ômega-6 (n-6), que promove inflamação.

  4. Regulação do sistema endocanabinoide (eCB):

    • Importante na atividade sináptica e neuroplasticidade, reforçando o papel dos lipídios na função cerebral.

Implicações na Saúde e Longevidade

A dieta cetogênica promove mudanças metabólicas sustentáveis no sistema nervoso central, oferecendo benefícios que vão desde o combate ao envelhecimento celular até a melhora da composição microbiota-intestino-cérebro. Além disso, o aumento de n-3 PUFAs está associado a uma melhor função cognitiva e prevenção de doenças inflamatórias e neuropsiquiátricas.

Efeitos diretos e indiretos da cetose no cérebro (Tao, Leng, & Zhang, 2022)

Mecanismos de Neuroproteção da Dieta Cetogênica

Os efeitos neuroprotetores são alcançados por meio de três principais mecanismos: regulação mitocondrial, efeitos antiapoptóticos e ação anti-inflamatória.

1. Regulação Mitocondrial: Antioxidantes, Proteínas Desacopladoras e Produção de ATP

Os corpos cetônicos (KBs), como β-hidroxibutirato (BHB) e acetoacetato, desempenham um papel essencial na proteção neuronal ao:

  • Reduzir o estresse oxidativo: Diminuem a produção de espécies reativas de oxigênio (ROS) e aumentam a expressão de enzimas antioxidantes (ex.: SOD2 e catalase).

  • Melhorar a função mitocondrial: Protegem os neurônios contra disfunções no complexo respiratório mitocondrial, regulam o equilíbrio NAD+/NADH e inibem a abertura prolongada do poro de transição de permeabilidade mitocondrial (mPTP).

  • Promover a produção de ATP: O BHB aumenta significativamente os níveis de ATP em mitocôndrias cerebrais.

  • Ativar vias antioxidantes celulares: Estimula a via Nrf2 e regula o sistema redox, promovendo adaptações celulares de longo prazo ao estresse oxidativo.

Essas mudanças mitocondriais melhoram a eficiência energética e reduzem o risco de degeneração neuronal.

Mecanismos neuroprotetores da dieta cetogênica (Tao, Leng, & Zhang, 2022)

2. Efeitos Antiapoptóticos

A apoptose, ou morte celular programada, é um fator crítico em doenças neurodegenerativas. A DC reduz a apoptose neuronal por meio de:

  • Inibição de fatores pró-apoptóticos: Diminui a expressão de proteínas como caspase-3 e Bax.

  • Aumento da proteção celular: Eleva os níveis de calbindina, uma proteína que regula o cálcio intracelular, protegendo os neurônios.

  • Regulação de vias moleculares: Inibe a dissociação do fator pró-apoptótico Bad e reduz a atividade da via AMPK.

Essas ações aumentam a sobrevivência dos neurônios e protegem contra danos celulares em condições neurodegenerativas.

3. Papel Anti-inflamatório da Dieta Cetogênica

A neuroinflamação está fortemente ligada a doenças como Alzheimer e Parkinson. A DC combate a inflamação por meio de:

  • Inibição de citocinas pró-inflamatórias: Reduz os níveis de IL-1β, TNF-α e IL-6, principalmente por meio da inibição da via NLRP3 inflamassoma.

  • Modulação de microglia: Promove a polarização da microglia para o fenótipo M2, associado à regeneração e proteção neuronal.

  • Ativação de receptores anti-inflamatórios: O BHB ativa os receptores HCA2 e PPARs, inibindo a via NF-κB e reduzindo a inflamação crônica.

Mecanismos antiinflamatórios da dieta cetogênica (Tao, Leng, & Zhang, 2022)

Embora concentrações muito altas de BHB possam induzir efeitos pró-inflamatórios, em níveis controlados, a DC é eficaz para reduzir processos inflamatórios associados à neurodegeneração.

Dieta Cetogênica e a Microbiota-Intestino-Cérebro

A dieta cetogênica (DC) desempenha um papel neuroprotetor indireto por meio de alterações no eixo microbiota-intestino-cérebro. Este eixo envolve a interação entre o microbioma intestinal e o sistema nervoso central (SNC), e estudos recentes têm destacado como a DC influencia positivamente a saúde cerebral através desse mecanismo.

1. A Relação entre a DC e a Microbiota Intestinal

  • Alterações na composição microbiana: A DC modifica a abundância de bactérias específicas, como o aumento de Akkermansia e Lactobacillus, que produzem ácidos graxos de cadeia curta (SCFAs). Esses SCFAs possuem efeitos neuroprotetores, melhoram a memória e têm impacto positivo na barreira hematoencefálica (BBB).

  • Redução de organismos pró-inflamatórios: A DC diminui a presença de Desulfovibrio, conhecido por prejudicar a barreira intestinal. Essa mudança ajuda a melhorar o fluxo sanguíneo cerebral e a reduzir o risco de doenças neurodegenerativas como Alzheimer.

  • Impacto nos biomarcadores: Estudos demonstraram que a DC regula biomarcadores relacionados ao Alzheimer, como os níveis de proteínas tau e β-amiloide (Aβ42).

2. Microbiota, Fibras Solúveis e Fatores Neurotróficos

A ingestão de fibras como fructooligossacarídeos (FOS) e galactooligossacarídeos (GOS) estimula a produção de SCFAs. Esses ácidos promovem:

  • Aumento do BDNF: O fator neurotrófico derivado do cérebro (BDNF) é essencial para a plasticidade sináptica e a memória.

  • Melhoria na expressão do NMDAR: Receptores de N-metil-D-aspartato, fundamentais para processos cognitivos, também são regulados.

Esses benefícios mostram que o microbioma intestinal é um elo crucial na relação entre dieta e saúde cerebral.

3. DC e Doenças Neurodegenerativas: O Caso do Comprometimento Cognitivo Leve (MCI)

O comprometimento cognitivo leve (MCI) é uma condição que frequentemente precede a demência. Diversos estudos destacam o impacto positivo da DC no tratamento dessa condição:

  • Melhorias cognitivas: Pacientes com MCI apresentaram melhora em testes de memória verbal e funções executivas após intervenções com DC.

  • Intervenções baseadas em triglicerídeos de cadeia média (MCT): Um estudo mostrou que 24 semanas de suplementação com 56 g/dia de MCT aumentaram os corpos cetônicos e a memória dos pacientes.

  • Redução de biomarcadores do Alzheimer: A DC reduziu proteínas tau e melhorou os níveis de Aβ42 no líquido cefalorraquidiano.

  • Estudos clínicos promissores: Um ensaio clínico randomizado revelou uma correlação entre altos níveis de cetonas e melhor desempenho em memórias episódicas e linguagem.

Essas descobertas sugerem que a DC é uma intervenção segura e eficaz para melhorar a função cognitiva em pessoas com MCI.

Dieta Cetogênica e a Doença de Alzheimer: Benefícios e Mecanismos

A Doença de Alzheimer (DA) é uma enfermidade neurodegenerativa progressiva, sendo a forma mais comum de demência. Caracteriza-se pela perda de memória, dificuldades nas atividades diárias e alterações cognitivas. Sua fisiopatologia envolve redução do metabolismo de glicose cerebral, disfunção mitocondrial, acúmulo de placas de beta-amiloide (Aβ) e emaranhados neurofibrilares de tau. Estudos recentes apontam que a dieta cetogênica (DC) pode atuar como uma intervenção terapêutica promissora, trazendo benefícios por meio de diversos mecanismos moleculares.

1. Impacto Metabólico e Molecular da DC na DA

  • Redução do metabolismo de glicose no cérebro: Na DA, a capacidade de utilizar glicose é patologicamente reduzida, devido à menor expressão do transportador de glicose GLUT1 no cérebro. A DC fornece energia alternativa ao cérebro por meio de corpos cetônicos (KBs), compensando essa deficiência.

  • Redução de placas de beta-amiloide (Aβ): O uso de corpos cetônicos em vez de glicose como fonte de energia ajuda a prevenir o acúmulo de Aβ no cérebro. Estudos pré-clínicos em modelos animais mostraram que a DC reduz a deposição de Aβ e tau fosforilada, melhorando a memória e o aprendizado.

  • Melhoria da barreira hematoencefálica (BBB): A DC melhora a integridade da BBB, regula a síntese de óxido nítrico endotelial e aumenta a expressão de proteínas transportadoras associadas às placas de Aβ, auxiliando na sua remoção.

  • Função mitocondrial: A DC melhora a função mitocondrial e reduz os níveis de proteína precursora amiloide (APP) em modelos animais, o que pode minimizar a produção de fragmentos tóxicos de Aβ.

2. Estudos Pré-Clínicos e Clínicos

Estudos em modelos animais

  • Modelos de camundongos com DA: A DC melhorou a função de memória e aprendizado e reduziu o impacto de Aβ e tau fosforilada nos tecidos cerebrais.

  • Efeitos na vascularização cerebral e microbiota intestinal: Em ratos e camundongos, a DC aumentou a função cerebrovascular, melhorou a composição da microbiota intestinal e reduziu inflamações sistêmicas, diminuindo o risco de progressão da DA.

Estudos clínicos em humanos

  • Aumento de corpos cetônicos e função cognitiva: Pacientes tratados com triglicerídeos de cadeia média (MCT) apresentaram elevação de β-hidroxibutirato (um KB) e melhora significativa na função cognitiva.

  • Resultados promissores em diferentes grupos genéticos: Pacientes com o genótipo APOE4(-) tiveram melhores respostas ao tratamento com DC, incluindo aumento do fluxo sanguíneo cerebral e melhora no desempenho cognitivo.

  • Melhor qualidade de vida e atividades diárias: Estudos mostraram que pacientes com DA em estágios leve a moderado apresentaram pontuações mais altas em testes de qualidade de vida e funcionalidade diária após intervenções com DC.

  • Casos de intervenção prolongada: Um paciente com DA tratado com cetona monoéster por 20 meses apresentou melhora no humor, nos cuidados pessoais e nas atividades cognitivas e diárias.

3. Limitações e Considerações

Embora os benefícios da DC no tratamento da DA sejam encorajadores, ainda existem limitações:

  • Variabilidade individual: Fatores genéticos, como APOE, e diferenças metabólicas podem influenciar os resultados.

  • Memória específica: Algumas intervenções com DC não mostraram impacto direto na memória, embora tenham melhorado outros aspectos cognitivos e funcionais.

  • Mais estudos necessários: Ensaios clínicos maiores e mais longos são fundamentais para validar a eficácia da DC em diferentes estágios da DA.

Dieta Cetogênica e a Doença de Parkinson: Uma Abordagem Terapêutica Promissora

A Doença de Parkinson (DP) é caracterizada pela degeneração progressiva de neurônios dopaminérgicos na substância negra do mesencéfalo, resultando em sintomas motores (como tremores e rigidez) e não motores (como depressão e declínio cognitivo). A dieta cetogênica (DC) tem se mostrado promissora no manejo dessa condição, atuando por meio de mecanismos metabólicos e anti-inflamatórios.

1. Mecanismos Metabólicos da DC na DP

  • Disfunção mitocondrial e fornecimento energético:
    A disfunção do complexo I mitocondrial é um fator-chave na morte dos neurônios dopaminérgicos na DP. A DC fornece corpos cetônicos (como o β-hidroxibutirato), que podem contornar a dependência do complexo I e oferecer uma fonte alternativa de energia, melhorando a função mitocondrial e aumentando a produção de ATP.

    • Estudos in vitro mostraram que corpos cetônicos protegem neurônios mesencefálicos contra danos induzidos por agentes neurotóxicos, como MPTP e rotenona.

    • Em modelos animais de DP, a infusão contínua de β-hidroxibutirato protegeu os neurônios dopaminérgicos da degeneração e aumentou a respiração mitocondrial.

    • O ácido octanoico (C8), um componente da DC, reduziu significativamente os danos dopaminérgicos no estriado ao aumentar a atividade metabólica mitocondrial.

  • Glutationa e proteção antioxidante:
    A DC mostrou-se eficaz em ratos com DP ao aumentar os níveis de glutationa, um antioxidante essencial que protege os neurônios contra o estresse oxidativo.

2. Efeitos Anti-Inflamatórios da DC

A inflamação e a ativação de micróglias (células imunes do cérebro) desempenham papéis importantes na progressão da DP. Estudos indicam:

  • Micróglias ativadas na substância negra de pacientes com DP liberam fatores inflamatórios (IL-1, IL-6, TNF-α, entre outros) que contribuem para a neurodegeneração.

  • Em camundongos tratados com MPTP, a DC reduziu a ativação microglial, os níveis de proteínas inflamatórias (IL-1β, IL-6, TNF-α) e a perda neuronal, melhorando também a função motora.

  • A cetose nutricional demonstrou reduzir a proliferação de astrócitos, diminuindo a toxicidade glutamatérgica e a neurotoxicidade associada.

3. Melhora dos Sintomas Motores e Não Motores

  • Efeitos motores:
    Estudos em modelos animais mostraram que a DC melhora a função motora, com maior eficácia quando combinada com medicamentos como pramipexol. Em humanos, pacientes submetidos à DC apresentaram redução significativa nos escores da escala de avaliação da doença de Parkinson (MDS-UPDRS).

  • Efeitos não motores:
    A DC mostrou melhorias em sintomas não motores, como memória, acesso lexical e funções cognitivas, especialmente em comparação a dietas de baixa gordura.

4. Evidências Clínicas

  • Estudos clínicos:

    • Após 28 dias de DC, pacientes com DP apresentaram melhora significativa nos sintomas motores e não motores, com redução média de 43,4% nos escores do MDS-UPDRS.

    • Em um estudo randomizado, pacientes submetidos à DC tiveram melhoras superiores nos sintomas não motores em comparação a uma dieta de baixo teor de gordura.

    • A DC também demonstrou benefícios na cognição, incluindo memória e funções linguísticas, embora sem diferenças significativas em testes motores específicos, como tapping de dedos.

Dieta Cetogênica e a Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA): Uma Alternativa Promissora?

A Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA) é a doença mais comum dos neurônios motores, caracterizada pela perda progressiva de neurônios motores superiores e inferiores no cérebro e na medula espinhal. Essa neurodegeneração leva à paralisia e, frequentemente, à morte por falência respiratória em 2 a 5 anos após o início dos sintomas. Com opções terapêuticas limitadas, a busca por tratamentos mais eficazes é essencial. A dieta cetogênica (DC) tem se destacado como uma abordagem potencialmente promissora para mitigar os efeitos da ELA por meio de ações antioxidantes, metabólicas e neuroprotetoras.

1. Mecanismos da ELA e o Papel da Dieta Cetogênica

A ELA envolve múltiplos mecanismos patológicos, incluindo:

  • Produção excessiva de radicais livres: O estresse oxidativo contribui para a disfunção mitocondrial e a morte neuronal.

  • Toxicidade de neurotransmissores excitatórios: O excesso de glutamato causa hiperexcitabilidade e dano celular.

  • Disfunção mitocondrial: A redução da atividade das enzimas da cadeia respiratória mitocondrial afeta o equilíbrio energético nos neurônios motores.

A DC atua sobre esses mecanismos de diversas formas:

  • Redução do glutamato e da excitabilidade neuronal: Corpos cetônicos (KBs) diminuem a concentração de glutamato na fenda sináptica, reduzindo a toxicidade excitatória.

  • Aumento da capacidade antioxidante: A DC estimula antioxidantes endógenos, protegendo os neurônios do estresse oxidativo.

  • Melhora da função mitocondrial: Estudos in vitro mostram que a DC restaura a atividade do complexo I da cadeia respiratória mitocondrial, promovendo maior produção de ATP.

2. Sirtuínas e Proteção Mitocondrial

Recentemente, pesquisas têm destacado o papel das sirtuínas (SIRTs) no combate ao estresse mitocondrial em modelos de ELA.

  • SIRT3: Essa proteína regula a resposta ao estresse mitocondrial e protege contra a fragmentação mitocondrial e apoptose neuronal induzida por mutações como SOD1-G93A, associadas à ELA.

  • Ação da DC: Estudos mostram que corpos cetônicos aumentam a expressão de sirtuínas em neurônios motores primários, melhorando a sobrevivência celular e reduzindo danos mitocondriais.

3. Estudos em Modelos Animais

Pesquisas pré-clínicas em camundongos transgênicos SOD1-G93A, modelo amplamente usado para estudar a ELA, demonstraram os seguintes benefícios da DC:

  • Preservação dos neurônios motores:

    • O primeiro estudo com DC em 2006 mostrou que camundongos tratados apresentaram maior preservação de neurônios motores, aumento no peso mitocondrial e maior síntese de ATP.

  • Melhoria na performance motora:

    • O uso de triglicerídeos de ácido caprílico (uma fonte energética alternativa) melhorou o desempenho motor, preveniu a perda de neurônios motores na medula espinhal e aumentou a taxa de consumo de oxigênio mitocondrial. Esses animais viveram, em média, 6 dias a mais do que o grupo controle.

  • Sobrevivência estendida:

    • Em um estudo baseado no regime cetogênico "Deanna", camundongos alimentados com DC apresentaram desempenho superior nos testes motores e um aumento de 7,5% no tempo de sobrevivência.

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Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/