Onde as condições do neurodesenvolvimento se encaixam nos modelos transdiagnósticos em psiquiatria?

As condições do neurodesenvolvimento (CNDs), como o transtorno do espectro autista (TEA), o transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) e a deficiência intelectual, tradicionalmente são consideradas categorias diagnósticas distintas. No entanto, incorporá-las em modelos transdiagnósticos de psiquiatria exige reconhecer suas características compartilhadas e sobrepostas com transtornos mentais.

a Uma visão do desenvolvimento dos transtornos psiquiátricos. b Idades típicas de início para diferentes tipos de transtornos (Thapar & Riglin, 2020)

Artigo publicado em 2024 apresentou uma visão geral de onde as CNDs se encaixam e como um espectro neurodesenvolvimental pode enriquecer os modelos transdiagnósticos.

1. Dimensões compartilhadas entre os transtornos

Modelos transdiagnósticos, como o Research Domain Criteria (RDoC), focam em dimensões subjacentes de funcionamento, em vez de categorias diagnósticas rígidas. As CNDs se encaixam nesse modelo ao destacar:

  • Processos cognitivos: Déficits em funções executivas (por exemplo, memória de trabalho, flexibilidade cognitiva), proeminentes no TDAH, mas também observados em transtornos do humor e esquizofrenia.

  • Cognição social: Comprometimentos na teoria da mente e no reconhecimento emocional, comuns no autismo, também aparecem no isolamento social da esquizofrenia e depressão.

  • Arousal e regulação: Disfunções no processamento sensorial ou na regulação emocional, centrais nas CNDs, também estão presentes no transtorno de estresse pós-traumático (TEPT), transtorno de ansiedade generalizada e transtorno de personalidade borderline.

2. Perspectiva desenvolvimental

As CNDs enfatizam os trajetos de desenvolvimento do cérebro, algo que frequentemente falta nos modelos transdiagnósticos. A integração de um espectro neurodesenvolvimental fornece:

  • Origens precoces: Muitos transtornos psiquiátricos surgem de alterações durante períodos críticos do desenvolvimento cerebral. As CNDs poderiam ancorar os modelos transdiagnósticos na neurobiologia do desenvolvimento.

  • Variabilidade ao longo da vida: Condições como autismo e TDAH mudam ao longo da vida, muitas vezes se cruzando com transtornos do humor, ansiedade e dependência química na adolescência e na idade adulta.

3. Mecanismos genéticos e neurais sobrepostos

Descobertas genéticas e neurobiológicas revelam fatores de risco compartilhados entre CNDs e outros transtornos mentais:

  • Pleiotropia: Genes associados às CNDs (por exemplo, aqueles que afetam o funcionamento sináptico) contribuem para um espectro de transtornos psiquiátricos.

  • Redes cerebrais: A disfunção de circuitos neurais (como a rede em modo padrão e a rede de saliência) conecta as CNDs a condições como TOC, esquizofrenia e ansiedade.

Ao integrar essas descobertas, um espectro neurodesenvolvimental pode fornecer uma base para entender o contínuo de vulnerabilidade entre os transtornos.

4. Espectros baseados em sintomas

Um espectro neurodesenvolvimental nos modelos transdiagnósticos poderia incluir dimensões específicas de sintomas:

  • Processamento sensorial: Um espectro de hipersensibilidade/hipossensibilidade sensorial abrangendo autismo, ansiedade e TEPT.

  • Atenção e hiperatividade: Sintomas centrais do TDAH se alinham com déficits cognitivos em transtornos bipolares e de uso de substâncias.

  • Interação social: Dificuldades no engajamento social estão presentes nas CNDs, ansiedade social e transtornos psicóticos.

Essas dimensões podem enriquecer os constructos transdiagnósticos existentes, como os do modelo HiTOP (Hierarchical Taxonomy of Psychopathology).

5. Implicações clínicas

A integração das CNDs nos modelos transdiagnósticos pode:

  • Reduzir o estigma: Ver condições como autismo ou TDAH como parte de um espectro compartilhado, e não categorias isoladas.

  • Personalizar o tratamento: Adaptar intervenções com base em dimensões subjacentes (por exemplo, perfis sensoriais, déficits em funções executivas), em vez de diagnósticos categóricos.

  • Orientar intervenções precoces: Identificar trajetórias de desenvolvimento que levam a condições comórbidas (por exemplo, ansiedade no autismo) pode permitir cuidados preventivos.

Um novo espectro neurodesenvolvimental

Um espectro neurodesenvolvimental dentro dos modelos transdiagnósticos poderia:

  • Servir como base para entender como o desenvolvimento cerebral precoce influencia o risco de uma ampla gama de transtornos psiquiátricos.

  • Enfatizar as interconexões entre disfunções cognitivas, sociais e emocionais ao longo da vida.

  • Destacar os mecanismos biológicos compartilhados e os contínuos fenotípicos que conectam as CNDs a outros transtornos.

Essa perspectiva aproximaria a psiquiatria de um modelo dimensional unificado que considera tanto as origens desenvolvimentais quanto os mecanismos compartilhados entre as condições de saúde mental. Aprenda mais na plataforma https://t21.video.

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/