O Legado Invisível da Guerra: Como o Trauma do Passado Pode Marcar Gerações

É difícil imaginar que a dor vivida por um soldado há mais de 150 anos possa influenciar a saúde de seus filhos — mas a ciência tem mostrado que isso é mais do que possível. Um estudo recente sobre prisioneiros da Guerra Civil Americana revelou que os traumas sofridos por uma geração podem deixar marcas profundas nas seguintes, mesmo décadas depois.

Esse fenômeno faz parte do crescente campo da epigenética, que estuda como fatores ambientais — como estresse extremo, fome e violência — podem alterar a forma como os nossos genes se expressam. Em outras palavras, nossas experiências não apenas moldam quem somos, mas podem também impactar quem nossos filhos serão.

O Passado Que Persiste no Presente

Pesquisadores analisaram registros de soldados da União que foram mantidos como prisioneiros em condições brutais durante a Guerra Civil dos EUA. Descobriram que os filhos desses homens tinham maior probabilidade de morrer precocemente, principalmente por causas como câncer e AVC. Acredita-se que isso seja resultado de alterações epigenéticas transmitidas de pai para filho (Costa, Yetter, & DeSomer, 2018).

Mas o que isso tem a ver com 2025?

Infelizmente, tudo. Hoje, o mundo segue marcado por conflitos armados e crises humanitárias. Guerras civis, invasões, terrorismo, repressões estatais e deslocamentos forçados afetam milhões de pessoas. Conflitos como os da Ucrânia, Rússia, Gaza, Sudão, Síria, Haiti, Irã e outros continuam a expor populações inteiras a níveis extremos de sofrimento.

E esses traumas não desaparecem quando o conflito acaba. Como mostrou o estudo, a fome, o estresse crônico e a violência vividos por uma geração podem alterar a saúde física e mental de seus filhos e netos.

Ou seja, os efeitos das guerras de 2025 podem ainda estar sendo sentidos em 2100 — não apenas nos livros de história, mas nos corpos e mentes de pessoas que sequer nasceram.

As ações humanitárias são fundamentais. O estudo traz uma mensagem de esperança: os efeitos epigenéticos podem ser mitigados. Filhos cujas mães estavam bem nutridas durante a gravidez, por exemplo, tiveram melhores condições de saúde, mesmo sendo descendentes diretos de prisioneiros traumatizados. Ou seja, o cuidado no presente importa — e muito. Garantir segurança alimentar, acesso à saúde e apoio psicológico às populações em zonas de conflito pode quebrar ciclos de sofrimento que, de outra forma, durariam gerações.

Responsabilidade Coletiva

Saber que os traumas de hoje podem marcar o amanhã impõe um novo tipo de responsabilidade: não basta reconstruir prédios, precisamos também reconstruir pessoas. Governos, ONGs, profissionais de saúde e até cidadãos comuns têm um papel a cumprir para reduzir as cicatrizes invisíveis deixadas por guerras e desastres.

A epigenética nos ensina que as decisões que tomamos hoje — em tempos de conflito ou paz — ecoam muito além do presente. Protestar, cortar relações com países em guerra e cuidar da saúde física, mental e emocional dos afetados por guerras não é apenas um gesto de humanidade, é uma forma de proteger o futuro da nossa espécie.

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/