Novas diretrizes para a cirurgia bariátrica: o que mudou?

O Conselho Federal de Medicina (CFM) publicou, em maio de 2025, a Resolução nº 2.429/25 com atualizações importantes sobre a cirurgia bariátrica e metabólica no Brasil. As mudanças ampliam o acesso ao procedimento e refletem os avanços científicos na compreensão da obesidade como uma doença crônica, complexa e multifatorial.

O que mudou?

  • Pacientes com IMC entre 30 e 35 kg/m² agora podem ser considerados para a cirurgia, desde que apresentem comorbidades graves associadas, como diabetes tipo 2, apneia obstrutiva do sono ou doenças cardiovasculares.

Especialistas publicaram em 2025 um relatório na The Lancet Diabetes & Endocrinology, propondo mudanças no diagnóstico da obesidade que vá além do Índice de Massa Corporal (IMC). Isto porque o IMC apresenta limitações, não diferenciando entre massa muscular e gordura, nem considera a distribuição da gordura corporal. Isso pode levar a diagnósticos imprecisos, que nem sempre refletem a real condição de saúde.

Para superar essas limitações, os especialistas sugerem que o IMC seja complementado por medidas como a circunferência da cintura em relação à altura ou a relação cintura-quadril, além da avaliação de sinais clínicos de problemas relacionados ao excesso de gordura corporal. Eles também propõem duas novas categorias diagnósticas:

  1. Obesidade clínica: excesso de gordura associado a sinais ou sintomas claros de disfunções nos órgãos ou limitações importantes nas atividades diárias, como dificuldades respiratórias ou problemas articulares. Nesses casos, são indicados tratamentos médicos específicos, incluindo medicamentos ou intervenções cirúrgicas.

  2. Obesidade pré-clínica: excesso de gordura sem sintomas evidentes de doenças atuais, mas com maior risco de desenvolver condições como diabetes tipo 2 ou doenças cardiovasculares. Para esses indivíduos, recomenda-se monitoramento regular e orientações para um estilo de vida saudável.

  • A idade mínima foi reduzida para 16 anos. Jovens a partir dessa idade podem ser submetidos ao procedimento, desde que atendam aos mesmos critérios clínicos dos adultos.

  • Adolescentes com 14 ou 15 anos também podem ser considerados, em situações excepcionais: quando apresentam obesidade grave (IMC ≥ 40 kg/m²), comorbidades importantes e quando houver avaliação e indicação favorável de uma equipe multidisciplinar, com consentimento informado dos responsáveis legais.

  • Técnicas como a banda gástrica ajustável e a cirurgia de Scopinaro foram desaconselhadas. Permanecem recomendadas o bypass gástrico em Y de Roux e a gastrectomia vertical (sleeve gástrico), por apresentarem maior evidência de eficácia e segurança.

  • A cirurgia deve ocorrer em hospitais com estrutura de alta complexidade, UTI disponível e equipe multiprofissional 24 horas.

  • O médico nutrólogo foi oficialmente incluído na equipe multidisciplinar mínima, ao lado do cirurgião, endocrinologista (ou clínico geral), cardiologista, psiquiatra, nutricionista e psicólogo.

Lembrando que cirurgia bariátrica não é milagre. Obesidade é uma doença crônica e o paciente precisará de acompanhamento por toda a vida.

  • Cerca de 20% a 30% dos pacientes apresentam reganho significativo de peso dentro de 2 a 5 anos após a cirurgia.

  • Após 10 anos, esse número pode subir para mais de 50%, dependendo do seguimento clínico e da adesão ao plano alimentar e atividades físicas.

Um estudo brasileiro (Eight Year Follow-Up After Gastric Bypass and Sleeve Gastrectomy in a Brazilian Cohort: Weight Trajectory and Health Outcomes) acompanhou pacientes por oito anos e mostrou que o bypass foi superior em vários aspectos. A perda total de peso foi maior (32% contra 19%) e o recidiva de peso foi menor (23% contra 39%). Além disso, o bypass apresentou melhores taxas de remissão de comorbidades após cinco anos: 63% para diabetes tipo 2, 42% para hipertensão e 51% para dislipidemia.

Perder peso é um desafio, mesmo com a cirurgia, mas mantê-lo a longo prazo pode ser ainda mais difícil. O corpo humano possui mecanismos biológicos que buscam recuperar o peso perdido, um fenômeno conhecido como adaptação metabólica. Quando a ingestão calórica é reduzida, o metabolismo desacelera para preservar energia, e hormônios como a grelina (que aumenta a fome) e a leptina (que regula a saciedade) sofrem alterações, favorecendo o ganho de peso novamente.

Fatores psicológicos e comportamentais também desempenham um papel importante, como a privação excessiva de certos alimentos e a dificuldade em manter hábitos saudáveis a longo prazo. Para evitar a recidiva de peso, é essencial adotar uma abordagem sustentável e equilibrada. Estratégias como a reeducação alimentar, o ajuste progressivo da ingestão calórica e o fortalecimento da saúde metabólica fazem a diferença nesse processo.

O acompanhamento profissional ajuda a identificar desafios individuais e criar um plano realista e eficiente. Emagrecer não deve ser um esforço passageiro, mas sim uma transformação que respeite o corpo e a mente. O sucesso da cirurgia também depende do comportamento do paciente e do acompanhamento multidisciplinar contínuo. A ausência de suporte psicológico e nutricional pode comprometer os resultados, levando a recidiva de peso e ao retorno das comorbidades.

Causas comuns do reganho de peso

  1. Falta de acompanhamento multidisciplinar (nutricional, psicológico, clínico)

  2. Maus hábitos alimentares retornando (como ingestão de alimentos altamente calóricos)

  3. Sedentarismo

  4. Distensão do reservatório gástrico ou alterações anatômicas

  5. Transtornos alimentares ou compulsão alimentar

🛡️ Prevenção e manejo:

  • Acompanhamento contínuo com equipe multiprofissional

  • Reeducação alimentar e manutenção da atividade física regular

  • Suporte psicológico e, se necessário, psiquiátrico

  • Intervenções adicionais (terapia comportamental, uso de medicamentos ou reintervenção cirúrgica)

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/