A menopausa é uma fase normal da vida da mulher, marcada pela transição da capacidade reprodutiva para a terceira idade. Quando pensamos em menopausa, os sintomas que vêm à mente são quase sempre os mesmos: ondas de calor, alterações de humor e noites mal dormidas. Estes sintomas são principalmente causados pela queda nos níveis de estrógeno, um hormônio sintetizado a partir do colesterol.
Sintomas da transição menopausal (Liaquat et al., 2025)
Cerca de 90% do estrógeno é fabricado nos ovários e pequenas quantidades nas glândulas adrenais e no tecido adiposo. O principal tipo de estrógeno é o estradiol (E2), o mais ativo, potente e que predomina durante a vida reprodutiva. A estrona (E1) predomina na menopausa e o estriol (E3) na gestação. Depois de liberados na corrente sanguínea, os estrógenos são metabolizados no fígado e excretados no intestino. Durante os anos reprodutivos da mulher, os níveis de estrógenos ficam entre 100 e 250 pg/mL. Após a menopausa declinam para cerca de 10 pg/mL (Wang et al., 2025).
Bactérias específicas no intestino (estroboloma) processam estrógenos em formas que podem ser reabsorvidas (Liaquat et al., 2025)
No fígado, o estrógeno liga-se ao receptor ERα, aumentando a queima de gordura. Com a queda de estrógeno, o ganho de peso fica mais fácil, assim como o acúmulo de gordura no fígado. O estrógeno também regula a transcrição de genes e a expressão de BDNF, protegendo os neurônios. Sem ele, muitas mulheres percebem piora no desempenho cognitivo.
O estrógeno também estimula os osteoblastos, promovendo a formação óssea. Sem ele, o risco de osteoporose aumenta (Wang et al., 2025)
Enquanto essas mudanças visíveis acontecem, uma revolução silenciosa e muito mais profunda está se desenrolando dentro do nosso corpo. Trata-se de uma transformação completa do microbioma - a vasta comunidade de bactérias, fungos e outros micróbios que habitam nosso intestino, pele, boca e sistema urogenital. E vários dos sintomas da menopausa estão associados ao desequilíbrio da microbiota intestinal. E parece que a chave para uma menopausa mais saudável depende dessa saúde intestinal.
As 5 Maiores Surpresas da Ciência Sobre Menopausa e Microbioma
A pesquisa científica está revelando conexões fascinantes entre a queda dos hormônios femininos e as mudanças em nossos ecossistemas microbianos. Aqui estão cinco das descobertas mais surpreendentes.
1. Seu microbioma intestinal se torna mais "masculino"
Após a menopausa, a composição do microbioma intestinal das mulheres começa a se assemelhar mais à dos homens. Um estudo abrangente descobriu que essa mudança está ligada ao estado compartilhado de baixos níveis de estrogênio e progesterona, tanto em mulheres na pós-menopausa quanto em homens (Peters et al., 2022).
Além disso, as mulheres na pós-menopausa tendem a apresentar uma diversidade microbiana menor no intestino em comparação com as mulheres na pré-menopausa. Isso é importante porque uma menor diversidade no microbioma intestinal está geralmente associada a uma menor resiliência do sistema e a um risco aumentado de problemas metabólicos. Essa descoberta é surpreendente porque destaca como os hormônios sexuais, e não apenas o sexo biológico, moldam profundamente nosso ecossistema interno.
A menopausa parece estar associada a um microbioma intestinal mais semelhante ao dos homens, talvez relacionado à condição comum de um estado de baixo estrogênio/progesterona.
Enquanto o intestino passa por essa convergência, o microbioma vaginal segue uma trajetória completamente diferente e surpreendente, revelando uma regra fundamental: o que é saudável para um ecossistema microbiano não se aplica necessariamente a outro.
2. O paradoxo da vagina na menopausa: mais diversidade, menos proteção
Aqui encontramos o que os cientistas chamam de "paradoxo da menopausa". Ao contrário do intestino, onde uma alta diversidade de micróbios é geralmente um sinal de saúde, no microbioma vaginal acontece o oposto. Na pós-menopausa, um aumento na diversidade é, na verdade, um sinal de alerta.
Isso ocorre porque as espécies protetoras de Lactobacillus, que são dominantes em mulheres na pré-menopausa e mantêm um pH vaginal ácido e saudável, diminuem drasticamente. Essa perda de proteção abre espaço para o crescimento de outras bactérias e está diretamente ligada a um risco aumentado de secura vaginal, infecções do trato urinário (ITUs) e vaginose bacteriana (VB).
Essa vulnerabilidade no sistema urogenital destaca o papel crítico dos hormônios. Mas a relação não é uma via de mão única. De volta ao intestino, uma coleção especializada de micróbios, conhecida como "estroboloma", não apenas reage à queda hormonal, mas tenta ativamente intervir.
3. Conheça seu "estroboloma": as bactérias que reciclam seus hormônios
O microbioma não é apenas uma vítima passiva das mudanças hormonais; ele é um participante ativo. O conceito de "estroboloma" refere-se ao conjunto de micróbios intestinais capazes de metabolizar e reativar estrogênios.
Esses micróbios produzem uma enzima chamada β-glucuronidase, que pode "desconjugar" estrogênios, transformando-os de uma forma inativa de volta para uma forma ativa que pode ser absorvida e utilizada pelo corpo. Pense nisso como se as bactérias estivessem "desbloqueando" ou "reativando" o estrogênio que, de outra forma, seria descartado, devolvendo-o à circulação para ser usado pelo corpo.
Estudos mostram que a menopausa está associada a uma redução na abundância dessa enzima bacteriana chave. Em outras palavras, com a diminuição dessa enzima, o corpo perde uma de suas ferramentas mais importantes para reciclar e reutilizar o pouco estrogênio ainda disponível, o que pode intensificar os efeitos da queda hormonal (Wang et al., 2025).
A influência desses micróbios intestinais se estende por todo o corpo, modulando os hormônios que circulam sistemicamente. E essa onda de mudanças hormonais atinge um local surpreendente com um impacto profundo: a nossa boca.
4. Sua boca é um ponto crítico da menopausa
Uma conexão que muitas vezes passa despercebida é o impacto profundo da menopausa na saúde bucal. A queda nos níveis de estrogênio afeta diretamente os tecidos da boca, pois existem receptores de hormônios sexuais nas glândulas salivares e na mucosa oral.
Essa sensibilidade hormonal pode levar a uma série de problemas orais comuns em mulheres na pós-menopausa, incluindo:
Boca seca (xerostomia): Uma redução no fluxo salivar.
Síndrome da boca ardente (SBA): Uma sensação dolorosa de queimação na boca.
Risco aumentado de doença periodontal: A inflamação e infecção das gengivas.
Embora muitas dessas alterações microbianas apresentem novos desafios para a saúde, a ciência revelou uma reviravolta surpreendente. No intestino, a mesma maré hormonal que traz desafios também pode trazer um benefício inesperado.
5. Uma reviravolta: a menopausa pode reduzir alguns patógenos intestinais
Nem todas as mudanças no microbioma são negativas. Em uma descoberta contraintuitiva, pesquisadores descobriram que mulheres na pós-menopausa tinham uma abundância menor de certas bactérias patogênicas, como E. coli e espécies de E. coli-Shigella (Peters et al., 2022).
Isso foi inesperado, já que o envelhecimento é geralmente associado a uma maior suscetibilidade a infecções. A hipótese dos cientistas é que a diminuição da progesterona — um hormônio que pode suprimir o sistema imunológico — após a menopausa pode, na verdade, permitir uma ativação imune mais robusta contra esses patógenos específicos no intestino. Esta é uma reviravolta notável: a mesma queda hormonal que causa tantos sintomas desafiadores pode, ironicamente, fortalecer a vigilância imunológica do intestino contra certos patógenos, ao remover o efeito supressor da progesterona.
Estratégias para melhoria da microbiota
A menopausa é muito mais do que a cessação dos ciclos menstruais; é uma transição de corpo inteiro que remodela profundamente nossos parceiros microbianos, do intestino à boca e ao sistema urogenital. Para melhorar a composição da microbiota a mulher deve:
Bactérias boas alimentam-se de fibras dietéticas. Aumentar a ingestão de fibras dietéticas de alta qualidade (ex: cereais integrais, vegetais, leguminosas) favorece diversidade microbiana e suporta função intestinal saudável. O consumo de pelo menos 30 a 35g de fibras ao dia é importante. Alimentos como farelos, vegetais crucíferos, sementes, legumes e suplementos ajudam-nos a chegar lá!
Introduzir alimentos com potencial prebiótico ou ricos em compostos bioactivos: por exemplo, sementes de linhaça, fibras de soja, vegetais variados, iogurte enriquecido. Estudos indicam melhorias em perfil lipídico, massa corporal e densidade óssea em mulheres em transição para a menopausa. Alimentos prebióticos podem melhorar a permeabilidade intestinal (reduzindo translocação microbiana e inflamação).
Probióticos (Lactobacillus acidophilus, Lactobacillus gasseri, Lactobacillus rhamnosus, entre outros) têm efeitos positivos em modelos animais e em alguns ensaios em humanos, tanto para melhoria da densidade óssea, como sintomas vasomotores e comorbidades metabólicas. Com o aumento da diversidade, há reforço da barreira intestinal, possivelmente maior disponibilização ou modulação dos estrogénios através da estroboloma.
Na prática: consuma mais alimentos fermentados (iogurte natural, kefir, chucrute) ou suplementos probióticos validados. Marque aqui sua consulta para conversarmos.
Monitore massa corporal, composição corporal, perfil lipídico, glicemia, densidade óssea, sintomas (ondas de calor, humor, sono). Uma abordagem integrativa é fundamental, com atividade física regular, sono adequado, práticas de gerenciamento do estresse ou terapias de reposição hormonal, indicadas de acordo com seu caso.
Consuma fitoestrógenos, classe de compostos fenólicos produzidos por plantas como a soja e a linhaça. Sua estrutura é semelhante ao 17-β-estradiol. Quando os níveis de estrogênio diminuem, os fitoestrógenos ajudam a manter o equilíbrio hormonal. Os fitoestrogênios demonstraram ter uma variedade de benefícios para a saúde humana, como ação antioxidante, neuroproteção, fortalecimento do sistema imunológico, proteção cardiovascular e outros. Um estudo com idosos no sul da Itália constatou que uma maior ingestão de fitoestrogênios, particularmente isoflavonas, estava associada a um melhor desempenho cognitivo Os fitoestrogênios também podem melhorar a densidade óssea, aliviar os sintomas de relaxamento vascular da menopausa.
As isoflavonas vegetais são os fitoestrogênios mais conhecidos e têm atraído atenção devido às suas propriedades benéficas à saúde. As isoflavonas são transformadas, em primeiro lugar, nas agliconas genisteína e daidzeína. A daidzeína pode ser metabolizada por algumas bactérias, como Adlercreutzia equolifaciens, Eggerthella sp. YY7918, Lactococcus garvieae, Slackia equolifaciens, Slackia isoflavoniconvertens e Slackia spp., em equol e O-desmetilangolensina (O-DMA). Os lignanos não são facilmente absorvidos pelo intestino e devem ser metabolizados em enterolactona (ENL) e enterodiol (END) pela microbiota intestinal, como Clostridium saccharogumia, Eggerthella lenta e Blautia producta, que são chamados de enterolignanos, antes de poderem entrar no organismo e exercer suas funções. Em resumo, a microbiota intestinal desempenha um papel muito importante na determinação da absorção, metabolismo, distribuição e excreção de fitoestrogênios ingeridos e seus metabólitos.
O equol é um metabólito da soja. É produzido a partir da daidzeína, cuja absorção depende de uma microbiota apropriada (Gong et al., 2023)
A interação entre a microbiota intestinal e os fitoestrogênios é bidirecional. Os fitoestrogênios são metabolizados pela microbiota intestinal, e os metabólitos formados regulam e remodelam a composição da microbiota intestinal, alterando a diversidade e a abundância de bactérias.

