Nutrientes protetores contra o envelhecimento cardíaco

Mesmo sem doença, o envelhecimento é acompanhado de declínio funcional de múltiplos órgãos. Por exemplo, a função cardíaca diminui gradualmente com a idade, especialmente após os 50 anos de idade.

Em indivíduos idosos, o cenário metabólico durante a senescência celular pode aumentar o risco de desregulação da função cardíaca e disfunção do reparo cardíaco. O envelhecimento do coração é acompanhado por diversas alterações patológicas no metabolismo.

Aceleram o envelhecimento cadíaco: distúrbios mitocondriais, resistência insulínica, redução da produção de ATP, aumento da inflamação e do estresse oxidativo, aceleração da morte de células e dos danos ao DNA. As consequências incluem hipertrofia cardíaca, fibrose cardíaca, lipotoxicidade induzida por deposição lipídica, déficit energético e distúrbios hemodinâmicos, levando a um coração mais fraco (Xie et al., 2023).

O coração do velho

Ao contrário do coração jovem, o coração envelhecido apresenta catabolismo lipídico miocárdico proporcionalmente reduzido. Além disso, a glicólise anaeróbica, em vez da oxidação da glicose, domina gradualmente a fonte de energia no coração envelhecido, gerando hipertrofia cardíaca e função contrátil prejudicada.

É improvável que a glicólise compense o comprometimento oxidação da glicose e utilização de ácidos graxos, semelhante à insuficiência cardíaca induzida por isquemia cardíaca. Conseqüentemente, a glicólise anaeróbica sinergiza com a redução da utilização de ácidos graxos, resultando em um déficit de energia irreversível e persistente e em uma contração cardíaca aberrante.

O envelhecimento está associado à resistência à insulina independente da obesidade, estrutura mitocondrial interrompida e ação desregulada da insulina celular. A glicose circulante aumenta substancialmente devido à capacidade comprometida dos transportadores de glicose (GLUTs) de transferir glicose durante o envelhecimento, causando níveis elevados de insulina e glicose no sangue em jejum. O GLUT4 (também conhecido como SLC2A4) pode ser prejudicado durante o envelhecimento, reduzindo a glicose captação e utilização em cardiomiócitos.

A resistência à insulina e a intolerância à glicose podem resultar em diabetes, doenças cardiovasculares e acidente vascular cerebral e estão associadas à má função cardíaca durante o envelhecimento. A ativação da via das pentoses fosfato pode induzir oxidação prejudicada de ácidos graxos e maior acúmulo de lipofuscina nos cardiomiócitos, levando à cardio-lipotoxicidade.

Os produtos finais avançados de glicose (AGEs) também se correlacionam com cardiomiopatia, especialmente no coração de indivíduos mais velhos com diabetes. Os AGEs acumulam-se e levam à rigidez do músculo cardíaco e à disfunção diastólica.

No coração envelhecido, o catabolismo dos lipídios e a oxidação da glicose são reduzidos devido à resistência à insulina. A glicólise domina a geração de ATP, de forma ineficiente. Assim, a contribuição relativa da utilização de corpos cetônicos para geração de ATP precisa ser aumentada (Xie et al., 2023).

Metabolismo lipídico no coração envelhecido

A dislipidemia, incluindo colesterol elevado, hipertrigliceridemia e lipoproteínas de baixa densidade (LDL) elevadas, desencadeia trombose e aumenta o risco de DCV. No coração envelhecido, a função cardíaca desregulada está associada à oxidação reduzida de ácidos graxos. Isto é indicado pelo acúmulo de ácidos graxos livres (AGL) e células carregadas de lipídios nos tecidos cardíacos, consistente com hipertrofia cardíaca patológica.

O desequilíbrio entre a captação e utilização de ácidos graxos leva ao excesso de lipídios intracelulares, desencadeando espécies lipídicas tóxicas (incluindo ceramida e diacilglicerol) e, eventualmente, lipotoxicidade durante o envelhecimento cardíaco. Além do envelhecimento impedir diretamente a oxidação de ácidos graxos, o aumento da insulina contribui para a inativação da queima de ácidos graxos, ao restringir a atividade das principais enzimas limitantes da taxa nos cardiomiócitos.

A liberação de fatores pró-inflamatórios do fenótipo secretor associado à senescência (SASP), provenientes de metabólitos lipídicos, é dramaticamente aumentada no coração envelhecido. Os lipídios exógenos se acumulam e são incorporados aos triacilgliceróis para formar numerosas gotículas lipídicas no coração envelhecido. O aumento de citocinas provenientes do metabolismo lipídico recruta e promove a proliferação de fibroblastos cardíacos, induzindo assim rigidez da parede e disfunção diastólica no coração envelhecido.

Corpos cetônicos: um combustível compensatório

Os corpos cetônicos, compreendendo beta-hidroxibutirato, acetoacetato e acetona, são derivados da oxidação de ácidos graxos e servem como fontes primárias de energia corporal durante o jejum e dieta cetogênica (KD) na homeostase fisiológica. Dada a oxidação prejudicada dos ácidos graxos e a utilização da glicose no envelhecimento, os corpos cetônicos podem ser um substrato essencial que alivia a disfunção cardíaca relacionada ao envelhecimento e serve como combustível compensatório.

Além de ser fonte de energia, o β-hidroxibutirato, um antagonista das histonas desacetilases, induz a proliferação celular e inibe a inflamação. Portanto, a dieta cetogênica terapêutica é benéfica para complicações cardiovasculares relacionadas ao envelhecimento.

O catabolismo do beta-hidroxibutirato proporciona maior produção de ATP nas mitocôndrias. Por ser uma fábrica com alta demanda energética, o coração é muito rico em mitocôndrias, que geram aproximadamente 90% do ATP para manter a função de bombeamento do coração. Mitocôndiras defeituosas resultam em envelhecimento cardíaco, e a diminuição do número de organelas está associada à disfunção cardíaca relacionada ao envelhecimento.

A cardiolipina, um importante lipídeo difosfatidilglicerol também é essencial para a função mitocondrial. Os níveis de cardiolipina diminuem substancialmente no envelhecimento cardíaco e o envelhecimento resulta na diminuição da fluidez da membrana interna, o que regula ainda mais o transporte de elétrons. Além disso, o envelhecimento impulsiona o enriquecimento de EROs em cardiolipina, e a oxidação da cardiolipina pelo citocromo c resulta em dano oxidativo aumentado pela idade nas mitocôndrias.

A mitofagia facilita a eliminação de mitocôndrias danificadas. O acúmulo de mitocôndrias prejudicadas e a presença de desregulação celular, induzindo envelhecimento e disfunção cardíaca predisposta à idade, podem resultar de mitofagia defeituosa. A inativação da autofagia acelera a agregação relacionada ao envelhecimento de proteínas mal dobradas, mitocôndrias disfuncionais e subsequente geração de ERO em cardiomiócitos, perturbando o ambiente celular e promovendo o fenótipo cardíaco associado ao envelhecimento.

Os defeitos mitocondriais relacionados ao envelhecimento são caracterizados por conteúdo reduzido de NAD+ e relação NAD:NADH, e um conteúdo aumentado de NADH pode restringir a atividade do complexo I. É demonstrado que a capacidade restaurada de regeneração de NAD+ no complexo I pode resgatar a progressão degenerativa cerebral e expandir a expectativa de vida.

A cadeia de transporte de elétrons (CTE) é formada por quatro complexos enzimáticos (complexos I-IV) e um grande complexo proteico (complexo V) responsável pela síntese de ATP na membrana interna mitocondrial. Ele gera ATP a partir de ADP, fosfato inorgânico (Pi) e magnésio (Mg2+) usando um gradiente eletroquímico de prótons criado pela cadeia de transporte de elétrons. À medida que os elétrons passam pelo gradiente de potencial redox do NADH ou FADH2 para o oxigênio, os íons hidrogênio são transportados ativamente da matriz para o lado citosólico da membrana interna pelos complexos I, III e IV. O complexo I oxida o NADH, o que leva ao fluxo sequencial de elétrons para a coenzima Q, complexo III, citocromo c e, finalmente, para a citocromo oxidase (complexo IV), onde o oxigênio é reduzido a água. Porém, durante o envelhecimento cardíaco, o declínio da respiração favorece a redução relativa dos complexos I e III, levando ao aumento da produção de ERO. Este aumento de ERO contribui para o comprometimento do ciclo de Krebs e redução da produção de ATP. A sobrecarga de ERO leva à mutação e danos ao mtDNA e ativa o inflamassoma NLRP3. As setas vermelhas indicam alterações que ocorrem no envelhecimento do coração (Xie et al., 2023).

Energia do coração envelhecido

Em comparação com corações jovens, corações adultos e idosos apresentam níveis muito mais baixos de nicotinamida adenina dinucleotídeo (NAD+) e níveis mais elevados de NADH, com, portanto, proporções citosólicas NAD+/NADH reduzidas. Além disso, a sirtuína e a poli-ADP-ribose polimerase (PARP) são reduzidas. em corações envelhecidos. A diminuição de NAD+ e da relação NAD:NADH comprometem as capacidades das proteínas dependentes de NAD+, incluindo sirtuína e PARP.

O aumento da emissão de ERO é um sinal de alerta precoce para múltiplos fenótipos cardíacos patológicos. Devido à ausência de histonas protetoras, o mtDNA é altamente suscetível a danos oxidativos. Por exemplo, a chance de mutações no mtDNA de camundongos idosos é aproximadamente 1.000 vezes maior quando comparada com genes nucleares. Uma porção substancial de proteínas críticas para a gênese e capacidade dos complexos respiratórios mitocondriais, particularmente o complexo III dentro das mitocôndrias, é determinada pelo mtDNA.

A elevação do estresse oxidativo contribui para a replicação suprimida do mtDNA e diminui o número de cópias do mtDNA, causando deficiência da cadeia respiratória mitocondrial e comprometimento do metabolismo relacionado ao envelhecimento.

Os radicais livres geram oxidação do ácidos graxos e aceleram ainda mais o acúmulo de gotículas lipídicas nos tecidos cardíacos durante o envelhecimento e restringem a sobrevivência dos cardiomiócitos. Por outro lado, uma dieta com ácidos graxos ômega-3 pode neutralizar o envelhecimento cardíaco. Já ácidos graxos ômega-6 em excesso geram efeitos contrários. O ômega-3 reduz a inflamação e a resistência à insulina.

O β-HB suprime a disfunção mitocondrial ao interromper a formação do inflamassoma NLPR3 e antagonizar o SASP pró-inflamatório. Assim, a dieta cetogênica pode ser uma boa estratégia para cardíacos. A redução do consumo de carboidratos reduz triglicerídeos e a oxidação de ácidos graxos, além de tratar a resistência insulínica.

Potencial abordagem terapêutica para o envelhecimento cardíaco. As terapias metabólicas para o tratamento do envelhecimento cardíaco visam melhorar a resistência à insulina, a oxidação de ácidos graxos, a disfunção mitocondrial e as ERO. Verifica-se que medicamentos sintéticos de pequenas moléculas que visam a resistência à insulina, a ativação da sirtuína e a depuração de ERO retardam o envelhecimento cardíaco em modelo animal. Além disso, tanto o aconselhamento dietético como o exercício físico são benéficos para o envelhecimento cardíaco nos idosos (Xie et al., 2023).

Melhorando a disfunção mitocondrial

A supressão da produção de ERO mitocondriais é um foco. Antioxidantes como ácido ferúlico e coenzima Q10 são interessantes. Outra estratégia é melhorar oxidação de ácidos graxos na mitocôndria com a suplementação de acetilcarnitina.

Atividade física e restrição calórica também atrasam o envelhecimento cardíaco, melhorando a bioenergética mitocondrial, reduzindo o estresse oxidativo e ativando as sirtuínas. As práticas dietéticas ideais que apoiam a longevidade e a saúde abrangem um dieta adequada em alimentos vegetais, poucos alimentos processados, baixo consumo de álcool e alto consumo de proteínas.

O funcionamento mitocondrial também é dependente de vitaminas do complexo B e magnésio, que podem ser suplementados. Além disso, a D-ribose, um carboidrato simples que faz parte do ATP e da própria estrutura do DNA é extremamente benéfica, especialemnte para pacientes com isquemia, disfunção diastólica e fadiga crônica. Também pode ser suplementada em indivíduos saudáveis reduzindo a resistência à atividade física e atenuando a fadiga após exercício intenso.

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/