As pesquisas na área de saúde frequentemente se concentram em homens ou não consideram as diferenças de sexo como fatores que podem modificar os resultados dos estudos. Essa omissão pode ser atribuída a um histórico de exclusão de mulheres da pesquisa científica, prática que foi normalizada até a década de 1990. Essa lacuna é preocupante, pois pode limitar o entendimento dos sintomas de várias doenças em mulheres, que frequentemente exibem formas diferentes de apresentação clínica.
Fatores que levaram à exclusão das mulheres dos estudos:
1. Preocupações com a Reprodução
Muitas vezes, pesquisadores evitavam incluir mulheres em estudos por medo de potenciais riscos para uma gravidez, mesmo que as participantes não estivessem grávidas. Essa abordagem era especialmente comum em estudos clínicos envolvendo medicamentos ou procedimentos invasivos, devido à preocupação com possíveis danos ao feto.
2. Variabilidade Hormonal
Os ciclos menstruais e as flutuações hormonais das mulheres eram vistos como um complicador adicional para os estudos, o que levou cientistas a priorizarem populações que consideravam mais "estáveis" — ou seja, homens. Essa percepção ignorou o fato de que entender como os hormônios femininos afetam a saúde é essencial para o desenvolvimento de tratamentos eficazes para ambos os sexos.
3. Androcentrismo na Ciência
Por séculos, a ciência foi dominada por homens, que frequentemente projetavam estudos com base na ideia de que o corpo masculino era o "padrão" universal. Isso resultou em pesquisas focadas principalmente nas necessidades e características masculinas, desconsiderando as diferenças biológicas e sociais que afetam a saúde das mulheres.
4. Legislação e Políticas de Pesquisa
Até a década de 1990, muitos ensaios clínicos excluíam explicitamente mulheres em idade fértil, mesmo quando não estavam grávidas, devido a regras de proteção inadequadas. Apenas em 1993, nos Estados Unidos, o National Institutes of Health Revitalization Act começou a exigir que mulheres fossem incluídas em estudos financiados pelo governo.
5. Papel Social e Desigualdade de Gênero
A posição das mulheres na sociedade como cuidadoras, e não como sujeitos prioritários de estudo, contribuiu para a negligência em relação às suas necessidades específicas de saúde. Além disso, questões relacionadas à saúde das mulheres, como saúde reprodutiva, muitas vezes foram estigmatizadas ou tratadas como de menor importância.
6. Sub-representação em Ensaios Clínicos
Mesmo em doenças que afetam mulheres e homens de maneira diferente, como doenças cardiovasculares, as mulheres eram frequentemente sub-representadas em pesquisas clínicas. Isso levou a lacunas no conhecimento sobre como os tratamentos afetam as mulheres, resultando em diagnósticos tardios ou inadequados.
Impactos da Exclusão
Tratamentos menos eficazes ou com mais efeitos colaterais em mulheres.
Falta de conhecimento sobre condições específicas das mulheres, como endometriose e menopausa.
Diagnósticos atrasados de doenças em mulheres, devido à aplicação de parâmetros masculinos.
Por exemplo, levou-se tempo para a ciência entender que o cérebro das mulheres responde diferente dos homens à queda hormonal relacionada ao envelhecimento. Alguns pontos importantes:
Diferenças de Risco e Prevalência Desconsideradas
As mulheres têm maior risco de desenvolver Alzheimer do que os homens, representando cerca de dois terços dos casos.
A falta de dados específicos sobre mulheres dificultou o entendimento das razões por trás dessa diferença. Isso inclui fatores biológicos, como os efeitos dos hormônios (por exemplo, o papel do estrogênio após a menopausa), e sociais, como maior expectativa de vida e desigualdade de acesso a cuidados de saúde.
Falhas na Pesquisa sobre Hormônios
Estudos iniciais não exploraram adequadamente como as alterações hormonais afetam o risco de Alzheimer nas mulheres, especialmente a queda do estrogênio na menopausa.
A falta de pesquisas limitou o desenvolvimento de intervenções hormonais eficazes e deixou questões importantes sem resposta, como o impacto da terapia de reposição hormonal no risco de Alzheimer.
Insuficiência de Dados em Ensaios Clínicos
Ensaios clínicos de medicamentos para Alzheimer frequentemente incluíram menos mulheres, apesar de serem mais afetadas pela doença. Isso resultou em tratamentos que podem ser menos eficazes ou seguros para mulheres, devido à ausência de análises específicas sobre como seu corpo metaboliza medicamentos ou responde a terapias.
Negligência de Fatores Sociais e de Estilo de Vida
fAs mulheres muitas vezes assumem papéis de cuidadoras, enfrentando mais estresse crônico e menos tempo para cuidados preventivos. Essas pressões sociais, combinadas com desigualdades históricas de gênero na saúde, foram subexploradas, apesar de seu papel potencial no aumento do risco de Alzheimer em mulheres.
Falta de Estudos sobre Biomarcadores em Mulheres
Biomarcadores, como depósitos de beta-amiloide e tau, têm sido amplamente estudados, mas sem atenção suficiente às diferenças de sexo. Mulheres podem apresentar padrões únicos de biomarcadores relacionados à progressão da doença, o que poderia melhorar a precisão do diagnóstico e das intervenções personalizadas.
Avanços Recentes e Esperança
Estudos recentes começaram a explorar as diferenças biológicas e sociais de gênero no Alzheimer. Regulamentações para maior inclusão de mulheres em ensaios clínicos têm produzido dados mais representativos.
Há crescente interesse em entender o papel do estrogênio, fatores genéticos (como a maior prevalência de APOE-ε4 em mulheres), e os efeitos da menopausa na progressão do Alzheimer. Gosto muito do trabalho e dos livros da Dra. Lisa Mosconi sobre o cérebro da mulher.