Os transtornos neurodegenerativos (DN) são doenças devastadoras caracterizadas por disfunção neuronal progressiva e irreversível e risco de morte precoce. Os mecanismos fisiopatológicos dessas doenças são diversos e envolvem subgrupos distintos de neurônios em áreas específicas do cérebro e, consequentemente, podem afetar o comportamento, a cognição, o metabolismo e as habilidades motoras.
A doença de Alzheimer (DA), a doença de Parkinson (DP) e a doença de Huntington (DH) são DN graves que causam sofrimento severo para pacientes e seus cuidadores e também resultam em um grande fardo socioeconômico. Alguns desses transtornos, como DA e DP, estão se tornando cada vez mais prevalentes, e esse aumento se deve, pelo menos em parte, ao aumento da expectativa de vida, uma vez que a população idosa vem aumentando em todo o mundo.
Com base no fato de que a disponibilidade de um tratamento eficaz para milhões de pessoas diagnosticadas com DN está longe de ser satisfatória, há uma necessidade crucial de desenvolver abordagens de tratamento novas e mais eficientes para combater esses transtornos prevalentes.
Várias estratégias estão sendo usadas atualmente para tratar essas doenças, incluindo ácidos biliares. Estudos mostram que aplicação sistêmica de ácidos biliares fornece neuroproteção, especialmente o ácido tauroursodesoxicólico (TUDCA).
O que é ácido tauroursodesoxicólico – TUDCA?
Inicialmente considerados moléculas detergentes com um papel importante na digestão de lipídios, os ácidos biliares provaram ter importância em uma miríade de processos biológicos. Especificamente, eles têm um papel importante como moléculas reguladoras, interagindo com muitos receptores celulares para modular importantes vias de sinalização. Seu papel no fígado e no sistema gastrointestinal é bem estabelecido. Estuda-se agora o papel nas doenças neurodegenerativas.
Doença de Alzheimer
A doença de Alzheimer é um distúrbio neurodegenerativo e a mais comum das demências tardias. A patogênese da DA é complexa, envolvendo metabolismo anormal e acúmulo da proteína Aβ e acúmulo gradual da proteína TAU aberrantemente hiperfosforilada, além de neuroinflamação e estresse oxidativo, que resultam na atrofia do hipocampo e do córtex cerebral. Uma vez que essas regiões cerebrais são importantes para a memória, a morte neuronal culmina em comprometimento progressivo da memória.
Atualmente, há um ensaio clínico registrado com TUDCA na DA, nos Estados Unidos (registro de Ensaios Clínicos: NCT03533257). Resultados preliminares mostraram que o uso de taurursodiol reduziu os níveis de p-tau181 e tau total. O tratamento com a droga também reduziu os níveis de biomarcadores de degeneração neuronal e sináptica no líquido cefalorraquidiano, especificamente neurogranina e FABP3, bem como YKL-40, um biomarcador que demonstrou estar correlacionado com a perda de volume cortical e a taxa de declínio cognitivo (Arnold et al., 2024).
O medicamento não funciona em todas as doenças neurodegenerativas. Por exemplo, no momento, a mesma droga foi descontinuada no tratamento da esclerose lateral amiotrófica, por não ter demonstrado benefícios em relação ao placebo (TUDCA ALS, 2024).
Doença de Parkinson
A DP é a segunda doença neurodegenerativa mais comum, caracterizada pela morte progressiva de neurônios dopaminérgicos na região da substância negra do cérebro e deposição intracelular da proteína α-sinucleína, gerando os corpos de Lewy, que resultam em comprometimento do controle motor, como bradicinesia, rigidez e tremor de repouso.
Os sintomas se manifestam lenta e gradualmente ao longo do tempo, com uma fase assintomática, seguida por danos à substância negra e comprometimento do neocórtex. Estudos em camundongos apresentam resultados interessantes a partir do uso de TUDCA, com aumento de expressão de enzimas antioxidantes, redução da depleção de ATP e de marcadores inflamatórios (Mendes, 2017), reduz oxidação de neurotransmissores (Cuevas et al., 2020). Estudos em humanos estão ocorrendo.
Sabe-se, entretanto, que dieta com menos proteína animal e mais proteína vegetal pode melhorar a microbiota intestinal e aumentar naturalmente metabólitos como TUDCA em pacientes com Parkinson. Dietas com mais vegetais também reduzem a prisão de ventre e aumentam bactérias com propriedades antiinflamatórias nestes pacientes (Ayten, & Billici, 2024).
Doença de Huntington (DH)
A DH é uma doença neurodegenerativa hereditária, causada por uma expansão de repetição de trinucleotídeo CAG dentro do exon 1 do gene IT15, também chamado de HTT, o gene que codifica a proteína huntingtina (HTT). A repetição CAG é traduzida em uma longa sequência de poliglutamina (polyQ). A DH está associada a 36 ou mais dessas repetições [106]. A proteína HTT exibe propriedades tóxicas que causam disfunção sináptica e morte neuronal, principalmente em neurônios espinhosos médios do estriado.
Em camundongos modelo de DH, a administração de TUDCA reduziu lesões cerebrais (Keene et al., 2001; Keene et al., 2002). Como pacientes com DH apresentam alterações em níveis de ácidos biliares em relação a controles saudáveis, investigações em humanos são necessárias.
Ácidos biliares neurotóxicos podem estar elevados, enquanto os neuroprotetores podem estar reduzidos. Essas descobertas ressaltam a importância na mudança nos perfis de ácidos biliares. Contudo, são necessárias mais pesquisas para compreender plenamente as implicações clínicas desses achados e seu potencial como ferramentas diagnósticas ou terapêuticas para a DH (Chiang et al., 2024).