Dietas cetogênicas no tratamento do câncer

Já em 500 aC, o jejum era usado como um tratamento eficaz para muitas doenças. Em 1910, Guelpa e Marie propuseram o jejum como tratamento contra a epilepsia. E funcionou. Em 1921, Woodyatt observou que dietas com alto teor de gordura e baixo teor de carboidratos em indivíduos sem comorbidades médicas significativas produziam acetona e β-hidroxibutirato, 2 fontes de energia produzidas pelo fígado na ausência de glicose. Hoje sabemos que estas substâncias possuem potencial antioxidante, antiinflamatório e antitumoral.

O termo dieta cetogênica (KD) foi cunhado por Wilder e Peterman. Os investigadores relataram melhorias na saúde mental e na cognição de pacientes seguindo dietas restritas em carboidratos e ricas em gordura. De fato, hoje esta dieta também é usada no tratamento do declínio cognitivo e do Alzheimer.

Dieta cetogênica no tratamento de pacientes oncológicos

Em 1922, Braunstein observou que a glicose desaparecia da urina de pacientes com diabetes após o diagnóstico de câncer, sugerindo que a glicose é recrutada para áreas cancerosas onde é consumida em taxas mais altas do que o normal. Durante esse mesmo período, o Prêmio Nobel Otto Warburg descobriu que as células cancerígenas produzem altas quantidades de lactato a partir da glicose, mesmo na presença de oxigênio abundante. Warburg conduziu muitos experimentos in vitro e em animais demonstrando esse resultado, conhecido como efeito Warburg.

A glicose estimula o pâncreas a liberar insulina, hormônio que permite que a glicose entrar nas células. Com alta ingestão de carboidratos e glicose, o pâncreas secreta cada vez mais insulina, o que promove a interação dos receptores do hormônio do crescimento para produzir o fator de crescimento semelhante à insulina 1 (IGF-1) no fígado, promovendo o crescimento e a proliferação celular, o que pode ser prejudicial para pacientes com câncer.

A superexpressão dos transportadores de glicose 1 e 3 (Glut-1, Glut-3) também ocorre em muitos cânceres e corresponde ao grau de captação de glicose em tumores agressivos, conforme observado na tomografia por emissão de pósitrons (PET).

Já, quando a glicose é escassa, o corpo sente a necessidade de produzir uma forma alternativa de energia para as células. O fígado então produz cetonas e ácidos graxos, que fornecem energia para as células saudáveis, mas não beneficiam as células cancerígenas. As células cancerígenas têm mitocôndrias disfuncionais e possivelmente defeitos na cadeia de transporte de elétrons, que interrompem a produção normal de trifosfato de adenosina (ATP) da mitocôndria. O resultado é que as células cancerígenas tornam-se fortemente dependentes do ATP proveniente do processo menos eficiente produção de ácido lático, por meio de fermentação.

A produção excessiva de lactato, que faz parte do efeito Warburg, compensa os defeitos de produção de ATP causados pela fosforilação oxidativa mitocondrial disfuncional. As dietas cetogênicas retardam o câncer ao inibir a insulina/IGF e as vias de sinalização intracelular a jusante, como fosfoinositídeo 3-quinase (PI3K)/proteína quinase B (Akt)/alvo mamífero da rapamicina (mTOR).

As dietas cetogênicas também amplificam a adenosina monofosfato – proteína quinase ativada (AMPK), que inibe a glicólise aeróbica e suprime a proliferação, invasão e migração tumoral.

O paciente deve ser acompanhado por profissionais experientes para evitar ou corrigir possíveis efeitos colaterais como perda de peso excessiva, tontura, queda da pressão arterial, constipação ou pedras nos rins. Caso necessite de ajuda marque aqui sua consulta de nutrição online.

Em um estudo piloto, Schmidt e colaboradores (2011) forneceram a dieta cetogênica e shakes de gordura e proteína como lanches para 7 de 16 pacientes com uma variedade de cânceres metastáticos avançados. Os níveis de colesterol no sangue permaneceram estáveis, algumas medidas de qualidade de vida melhoraram e não houveram complicações graves.

Dados de segurança e viabilidade de várias pesquisas sugerem que pacientes com câncer podem tolerar o uso da dieta cetogênica e que esta melhora os efeitos das terapias convencionais, assim como reduz os efeitos tóxicos da quimioterapia e radioterapia, assim como maximiza os efeitos da imunoterapia.

Estudo com pacientes com câncer de próstata mostrou que a dieta cetogênica não aumenta o risco cardiovascular, sendo uma possibilidade neste grupo (Freedland et al., 2021). Combinar essa abordagem dietética com opções quimioterápicas e radioterapêuticas padrão pode ajudar a melhorar a resposta do tumor e mais pesquisas são urgentemente necessárias (Tan-Shalaby, 2017).

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/