A evolução humana tem sido acompanhada por mudanças periódicas fundamentais no estilo de vida refletidas nos hábitos alimentares. Os humanos deixaram de ser caçadores-coletores nômades, típico do período Paleolítico ou Idade da Pedra Antiga, que começou há 2 milhões de anos. Uma profunda mudança no estilo de vida humano ocorreu com a Revolução Agrícola do período Neolítico, também conhecida como Idade da Pedra Nova (10.000 anos AC). Nesse período, o ser humano passou a levar uma vida sedentária, domesticando vários animais e plantas, que formaram a base de um novo estilo de vida baseado na agricultura e na coleta de alimentos.
Surgiram novos alimentos, como cereais e laticínios, e a densidade populacional aumentou. A última mudança marcante nos hábitos alimentares humanos começou com a Revolução Industrial, há menos de 200 anos, marcou o início de um afastamento radical dos alimentos locais e sazonais. A dieta moderna é caracterizada por uma alta ingestão de produtos de origem animal e açúcares, uso de conservantes e baixa ingestão de alimentos de origem vegetal, como frutas, vegetais e cereais integrais.
Estas mudanças afetaram nossa saúde, com o aumento da incidência de problemas de saúde como doenças inflamatórias intestinais (DII), síndrome do intestino irritável (SII), câncer, diabetes, asma, doenças autoimunes e até certos transtornos mentais. Um dos motivos é que as espécies microbianas do nosso intestino também foram mudando.
As práticas tradicionais de populações da África, América do Sul e Ásia, provavelmente se assemelham aos nossos estilos de vida antigos. Estudos dessas populações ajudam pesquisadores a determinar os efeitos do estilo de vida (caça e coleta como no Período Paleolítico, ou agricultura como no Período Neolítico) na coevolução dos humanos e sua microbiota intestinal.
As populações tradicionais estudadas, indivíduos de tribos isoladas, incluindo caçadores-coletores de Hazda, adultos e crianças de Malawi, crianças de Burkina Faso, Papua Nova Guiné e ameríndios possuem uma microbiota diferente das pessoas vivendo em sociedades com dieta ocidentalizada.
As dietas modernas contêm muito menos fibras e muito mais gordura do que as dietas antigas. A ingestão diária de fibra em dietas antigas pode chegar a 100 g, especialmenete solúvel, enquanto adultos em países industrializados normalmente comem apenas 15 g de fibra ao dia, ficando ainda aquém da ingestão diária mínima recomendada de 20–30 g, a depender da faixa etária. Além disso, no ocidente, consome-se mais fibras insolúveis.
Indivíduos vivendo na África rural podem consumir de 60 a 120 g de fibra por dia. Uma das consequências da depleção de fibras é a diminuição na produção de ácidos graxos de cadeia curta, potencialmente favorecendo o estabelecimento da família Enterobacteriaceae, que inclui muitas bactérias patogênicas como Escherichia coli, Salmonella, Proteus, Shigella e Yersinia.
A microbiota é mais diversa estruturalmente e funcionalmente (com capacidades aprimoradas de degradação de polissacarídeos, em particular) em populações rurais e remotas de países em desenvolvimento do que em populações urbanas industrializadas. Alguns táxons ou funções bacterianas podem ter desaparecido do intestino durante a ocidentalização. Os táxons provavelmente perdidos incluem o Treponema, um gênero de bactérias anaeróbicas do filo Spirochaetae altamente especializado na degradação de fibras.
Ocidentalização, deficiência de vitamina D e disbiose intestinal
A ocidentalização teve consequências inesperadas para a saúde humana. Por exemplo, níveis adequados de vitamina D na população escocesa dependeram por mais de 14.000 anos de um equilíbrio tênue entre características biológicas (ou seja, pele despigmentada ao máximo otimizando a produção de vitamina D), exposição à luz solar (ou seja, atividades ao ar livre) e hábitos alimentares (ou seja, consumo de alimentos ricos em vitamina D, como bacalhau ou arenque).
No entanto, a urbanização crescente do país (iniciada há aproximadamente 200 anos) foi acompanhada por uma diminuição no consumo de peixes ricos em vitamina D e uma diminuição nas atividades ao ar livre, com essas duas mudanças contribuindo para a ruptura do frágil equilíbrio de vitamina D e levando a níveis sem precedentes de deficiência de vitamina D na escala populacional.
Acredita-se que essa deficiência seja um fator de risco para doenças emergentes relacionadas ao sistema imunológico. As agências de saúde pública, portanto, recomendam suplementar a dieta com vitamina D e aumentar a exposição à luz do dia.
A vitamina D ativa ações genômicas por meio de receptores de vitamina D (VDRs). VDRs são ativados no fígado por 1,25(OH)2D ou um ácido biliar secundário chamado ácido litocólico (LCA), que é produzido por bactérias intestinais e atua como um ligante fisiológico adicional para VDR.
Após a ativação, o VDR heterodimeriza com FXR/RXR e então se liga ao elemento responsivo à vitamina D do DNA. Assim, o VDR contribui para a degradação do LCA. A ativação do VDR também modula o gene CYP7A1 que regula a conversão do colesterol em ácidos biliares. Portanto, esse gene diminui a síntese de ácidos biliares, sugerindo que o VDR pode atuar como um sensor de ácidos biliares.
No intestino, verificou-se que o VDR mantém a função da barreira intestinal regulando as proteínas epiteliais das junções apertadas. Isso leva ao bloqueio da translocação de bactérias ou subprodutos bacterianos na circulação do hospedeiro e reduz a inflamação.
Este exemplo destaca como mudanças relativamente recentes na escala da história humana podem interromper equilíbrios estabelecidos há muito tempo controlados pela genética, comportamento, dieta e meio ambiente.
Melhore a dieta para apoiar seu microbioma e prevenir doenças
As intervenções dietéticas são a abordagem mais robusta e alcançável para modular a microbiota intestinal. Aumentar o consumo de fibras, diminuir o consumo de carne e diversificar a dieta faz parte das estratégias mais importantes neste sentido.
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