Dieta cetogênica é segura no tratamento do fígado gorduroso

O fígado é um importante órgão metabólico que realiza mais de 500 funções. Ele recebe e processa todo o sangue que sai do estômago e dos intestinos. Pode quebrar o álcool e metabolizar as medicações para que possam ser utilizadas e, posteriormente, eliminadas do corpo.

O fígado também funciona como uma reserva de energia, retirando o excesso de glicose da circulação e armazenando-o na forma de glicogênio. Este glicogênio pode ser usado como uma futura fonte de energia. O órgão também ajuda a regular os níveis de aminoácidos no sangue, metabolizar alguns nutrientes, remover toxinas e excretar a bile. Com mais de 500 responsabilidades, ter um fígado funcionando corretamente é a chave para uma boa saúde.

O que é fígado gorduroso e quem está em risco?

O fígado metaboliza e estoca gordura. Contudo, quando este estoque está alto demais, as funções do órgão ficam comprometidas e a saúde sofre. Existem duas formas principais de doença hepática gordurosa: doença hepática gordurosa não alcoólica (DHGNA) e doença hepática gordurosa induzida pelo álcool.

A esteatohepatite não alcoólica (também conhecida como NASH) é um tipo específico de DHGNA que inclui inflamação junto com o acúmulo de gordura. Este tipo é particularmente problemático, pois a inflamação pode causar cicatrizes (fibrose) e aumentar o risco de desenvolver câncer de fígado.

Nos países industrializados, a DHGNA é mais comum, podendo afetar 10% das crianças e mais de 30% dos adultos. É muito comum com o excesso de consumo de carboidratos e com a resistência insulínica. Afeta cerca de 55% dos diabéticos e 50 a 90% dos indivíduos obesos.

Por que a resistência insulínica gera problemas no fígado?

Glicose alta é prejudicial. Por isso, quando os níveis aumentam, o pâncreas começa a produzir insulina, hormônio que retira o açúcar do sangue. Quando isso acontece, o fígado usa parte da glicose para armazenamento como glicogênio. O que não puder ser armazenado dessa forma é transformado em gordura e armazenado.

Mais tarde, se o açúcar no sangue cair muito, o glicogênio será quebrado e a glicose retornará à corrente sanguínea. O problema é que muita gente consome carboidrato em excesso. Com o tempo, vários tecidos tornam-se resistentes à insulina. O fígado também pode desenvolver resistência à este hormônio. Isso significa que o órgão não será tão eficiente na remoção do açúcar do sangue. Você sabe quanto carboidrato está disponível na sua dieta?

Quanto mais glicose persiste na corrente sanguínea, mais o pâncreas fabrica insulina. Esta hiperinsulinemia está ligada a uma série de doenças. Como parte dessa resistência à insulina, o fígado também pode funcionar mal, quebrar o glicogênio e liberá-lo no sangue, mesmo quando não é necessário. Isso agrava os já altos níveis de açúcar no sangue, resultando em excesso de glicose e insulina ineficaz na circulação.

Embora a insulina em circulação seja ineficaz em extrair glicose do sangue, ela não é completamente ignorada. Em vez disso, a insulina aciona incorretamente o fígado para produzir gordura. Essa gordura adicional se combina com a gordura liberada de nossas próprias células adiposas resistentes à insulina e resulta em fígado gorduroso.

Como prevenir o fígado gorduroso?

Muitas das mesmas medidas que tomamos para melhorar nossa saúde metabólica também ajudam na prevenção do fígado gorduroso. Manter um peso saudável, deixar os açúcares, alimentos ultraprocessados, refrigerantes, sucos e fast food de lado. Praticar atividade física regular também reduz significativamente a probabilidade de desenvolver fígado gorduroso.

Como reverter o fígado gorduroso?

Quem está acima do peso vai precisar adotar uma dieta que promova a queima da gordura estocada. A atividade física ajuda neste processo. Dietas com baixo teor de carboidratos e alto teor de proteínas também demonstraram ser benéficas na redução da quantidade de gordura no fígado. Estas dietas melhoram o metabolismo do fígado, alteram positivamente a microbiota intestinal, aumentam o folato circulante e a expressão de genes que regulam a queima de gordura.

Quem tem triglicerídeos alto ou hiperinsulinemia precisa fazer corte de mais carboidratos, frutose e álcool, itens que pioram a situação. Mas espera aí? A dieta com menos carboidratos não tem mais gordura? Sim. E como uma dieta com mais gordura vai tratar a gordura no fígado? Muito bem pensado, este é um dos paradoxos da nutrição.

Dieta cetogênica é benéfica ou maléfica para o fígado?

Estudo publicado em 2021 mostrou que a dieta cetogênica é uma estratégia possível para o tratamento da esteatose hepática. A restrição de carboidratos favorece a queima de gordura e a produção de corpos cetônicos. Esta mudança metabólica reduz a formação de açúcar pelo fígado (neogliconeogênese hepática) e o acúmulo de gordura no órgão (Crabtree et al., 2021).

No estudo, publicado pelo grupo de pesquisa do Dr. Tim Noakes, um dos maiores pesquisadores do tema, foram comparados pacientes com excesso de peso seguindo dieta cetogênica hipocalórica, com suplementação de cetonas exógenas (KD+KS) ou dieta cetogênica + placebo (DK+ PL) e pacientes seguindo dieta com baixo teor de gordura (LFD).

Todos os alimentos para este estudo foram preparados em uma cozinha dietética. Os participantes recebiam instruções para evitar outros alimentos fora da dieta, assim como bebidas adoçadas. Pacientes da dieta cetogênica consumiam triglicerídeos de cadeia médica, contendo os ácidos graxos caprílico (C8) e cáprico (C10) com o café da manhã e lanches da tarde. Aprenda mais sobre a implementação da dieta cetogênica na plataforma https://t21.video.

A gordura hepática diminuiu consistentemente naqueles com maior acúmulo inicial (> 5% de gordura hepática), independentemente do grupo de dieta ou da magnitude da perda de peso.

Após a intervenção de seis semanas, a fração de gordura do fígado caiu abaixo de 5% em 7 dos 12 indivíduos, não mais atendendo à definição de esteatose hepática nesses indivíduos. Não houve diferenças em enzimas importantes da função hepática: AST, ALT, AST/ALT e bilirrubina desde o início até o pós-intervenção.

Apesar dos indivíduos em dieta cetogênica estarem consumindo 3 vezes mais gordura e 4 vezes mais gordura saturada do que o grupo que seguiu a dieta com baixo teor de gordura, a dieta cetogênica mostrou-se segura pois também contribuiu para a redução de gordura hepática, sem aumentar enzimas prejudiciais.

Embora a gordura hepática tenha diminuído de forma semelhante em todos os grupos de dieta, os mecanismos metabólicos que contribuem para a perda líquida de gordura hepática entre dietas com baixo teor de gordura e cetogênicas são diferentes.

O aumento da disponibilidade de ácidos graxos e a redução de glicose e insulina na dieta cetogênica, promovem a cetogênese hepática, como evidenciado por cetonas circulantes >1 mM/L. A menor produção de gordura e glicose pelo fígado é claramente suficiente para compensar a ingestão significativamente maior de gordura.

Além disso, o aumento do consumo de gordura saturada no contexto da ingestão de baixo teor de carboidratos não afeta adversamente as enzimas associadas à saúde e função do fígado.

Na prática, isso significa que uma variedade de dietas hipocalóricas podem ter um efeito terapêutico para diminuir a gordura hepática e facilitar a perda de peso (Crabtree et al., 2021).

A escolha dependerá das necessidades, valores, gostos, doenças pré-existentes e preferências de cada paciente e suas famílias. As dietas cetogênicas são indicadas a pessoas com depressão, obesidade, epilepsia, transtorno bipolar, esquizofrenia, resistência insulínica, diabetes ou câncer, mostrando-se uma alternativa segura para a correção metabólica nestes casos.

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/