A dieta cetogênica (DC) é conhecida por sua capacidade de alterar a fisiologia metabólica, sendo amplamente reconhecida por seus benefícios no controle de convulsões, glicemia e perda de peso. Recentemente, o foco tem se voltado para seus impactos no metabolismo muscular, uma área ainda pouco explorada, mas que desperta interesse crescente devido ao potencial de benefícios tanto em condições de saúde quanto de doença. Uma revisão publicada no perídico Nutrients por pesquisadores da Universidade Estadual de Moscou e da Universidade Estadual Médica de Moscou analisa os achados mais recentes sobre os efeitos da DC no tecido muscular, oferecendo insights e apontando lacunas para futuras investigações.
Energia Muscular: Os Fundamentos
O tecido muscular é um dos mais demandantes em termos de energia no corpo humano, com o ATP sendo essencial para sua função e contração. A dieta influencia diretamente o metabolismo energético, afetando a disponibilidade de ATP e de intermediários metabólicos.
Sem a DC, o glicogênio muscular é a principal fonte de energia durante exercícios de alta intensidade (acima de 70% do VO₂ máximo). Em menor intensidade e atividades prolongadas, a energia também vem de lipídios e aminoácidos. O músculo possui flexibilidade metabólica, adaptando-se ao substrato energético disponível.
As fibras musculares se dividem em dois tipos principais:
Contração lenta (tipo I): alta capacidade oxidativa e mitocondrial, sustentando atividades de longa duração.
Contração rápida (tipo II): menor dependência da fosforilação oxidativa, com subtipos:
IIa: oxidação rápida.
IIb: glicolítica rápida.
Corpos Cetônicos no Metabolismo Muscular
Durante a cetose, o fígado produz corpos cetônicos — beta-hidroxibutirato (BHB), acetoacetato e acetona — que servem como fonte de energia para o músculo esquelético. O processo de cetólise no músculo ocorre em resposta ao aumento da cetogênese no fígado, intensificada durante o exercício.
Mecanismos no músculo:
Energia: Os corpos cetônicos reduzem a utilização de glicose e proteínas musculares, preservando o tecido muscular.
Sinalização: O BHB regula a expressão gênica e as respostas adaptativas. Ele inibe histonas desacetilases (HDACs), promovendo a expressão de genes antioxidantes e antiestresse oxidativo, como FOXO3a e MT2. Contudo, também pode regular positivamente genes relacionados à atrofia muscular em contextos de déficit energético.
Estudos sugerem que o BHB, enquanto protege contra estresses celulares, pode desacelerar a regeneração muscular e promover uma "resiliência quiescente" nas células-tronco musculares.
Impactos da Dieta Cetogênica no Músculo Esquelético
Embora os dados sejam contraditórios, a DC pode:
Mitigar a perda muscular: Especialmente em contextos de envelhecimento.
Promover a transição de fibras musculares: De tipo IIb (glicolítica rápida) para tipo IIa (oxidativa rápida), com aumento da biogênese mitocondrial.
Aumentar a capacidade antioxidante: Melhorando a defesa contra o estresse oxidativo.
Regular a qualidade mitocondrial: Estudos mostram que o treinamento combinado à DC potencializa marcadores de fissão e fusão mitocondrial.
Contudo, em algumas situações, a DC não altera significativamente a massa muscular ou pode até prejudicar a síntese de proteínas, sugerindo que seus efeitos variam conforme o tipo de fibra muscular e o contexto metabólico.
Implicações e Necessidades Futuras de Pesquisa
A DC mostra maior eficácia durante períodos de estresse metabólico, como exercícios intensos ou condições de doença, onde seus efeitos protetores são mais evidentes. Contudo, ainda há lacunas significativas, especialmente sobre:
O impacto da DC em estados de superávit calórico.
Seus efeitos a longo prazo na composição muscular em indivíduos saudáveis.
Pesquisas futuras devem investigar como as cetonas influenciam o metabolismo muscular fora do contexto de jejum ou fome e identificar estratégias para maximizar os benefícios da DC no desempenho físico e na saúde muscular.
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