Batatas fritas e neurotoxicidade: saiba mais sobre a acrilamida

A acrilamida (ACR) é um composto químico que apresenta efeitos neurotóxicos e genotóxicos. Causa sintomas neurológicos como tremores, fraqueza geral, dormência, formigamento nos membros ou ataxia. Numerosos estudos científicos demonstram o efeito da ACR nas terminações nervosas e sua estreita ligação com o sistema colinérgico.

O sistema colinérgico faz parte do sistema nervoso autônomo que regula as funções corticais superiores relacionadas à memória, aprendizagem, concentração e atenção. Dentro do sistema colinérgico, existem neurônios colinérgicos, estruturas colinérgicas anatômicas, o neurotransmissor acetilcolina (ACh) e receptores colinérgicos. Alguns relatos científicos sugerem um efeito negativo da ACR no sistema colinérgico e em reações inflamatórias no corpo.

A via anti-inflamatória colinérgica (PAC) é uma via neuroimunomoduladora localizada no sangue e nas membranas mucosas. Seu papel é interromper a resposta inflamatória no momento apropriado. Ela previne a síntese e a liberação de citocinas pró-inflamatórias e, em última análise, regula a resposta imune local e sistêmica.

O mecanismo molecular celular para inibir a síntese de citocinas é atribuído à acetilcolina (ACh), o principal neurotransmissor vagal, e a subunidade do receptor nicotínico α7 (α7nAChR) é um receptor-chave para a via anti-inflamatória colinérgica. A combinação de ACh com α7nAChR resulta na inibição da síntese e liberação de citocinas pró-inflamatórias.

A AChE sanguínea é capaz de interromper a estimulação da via anti-inflamatória colinérgica devido à clivagem da ACh. Consequentemente, a produção de citocinas é essencial para a proteção contra patógenos e o reparo tecidual, mas a liberação excessiva de citocinas pode levar à inflamação sistêmica, falência de órgãos e morte. As respostas inflamatórias são reguladas com precisão para proteger eficazmente contra estímulos nocivos.

O sistema nervoso central interage dinamicamente com o sistema imunológico, modulando a inflamação por meio das vias humoral e nervosa. O aumento dos níveis de acetilcolina (ACh) induzido pelo estresse atua aliviando a resposta inflamatória e restaurando a homeostase. Esse processo de sinalização termina quando a ACh é hidrolisada pela acetilcolinesterase (AChE).

Existem muitos relatos científicos indicando os efeitos nocivos da ACR na AChE. A maioria deles indica que a ACR reduz a concentração e a atividade da AChE. Devido ao efeito neurotóxico da acrilamida, que está relacionado à perturbação da secreção de neurotransmissores, e sua influência na perturbação da atividade da acetilcolinesterase, pode-se concluir que ela perturba a resposta inflamatória normal.

1) O que cada parte da figura representa

  • Cytokines / endotoxins (citocinas / endotoxinas): Sinais inflamatórios produzidos por células imunes (ex.: TNF-α, IL-1β) ou componentes bacterianos (ex.: LPS). Eles aparecem “na periferia”, onde a inflamação começa.

  • Vagus nerve – centripetal (aferente): Fibras do nervo vago que sobem para o tronco encefálico levando a mensagem: “há inflamação aqui”.

  • Cérebro: Núcleos no tronco encefálico (como o núcleo do trato solitário) integram o alerta e disparam a resposta regulatória.

  • Vagus nerve – centrifugal (eferente)
    Fibras do vago que descem levando o comando anti-inflamatório. Esse comando chega a órgãos e gânglios periféricos e envolve também células imunes que produzem acetilcolina.

  • Acetylcholine (ACh): O neurotransmissor “mensageiro” da via. Ele é liberado nas proximidades de células imunes.

  • Macrophage + α7 nAChR: Macrófagos expressam o receptor nicotínico α7 (α7 nAChR). Quando a ACh se liga a esse receptor, cascatas intracelulares inibem vias pró-inflamatórias (como NF-κB) e reduzem a liberação de citocinas.

  • Anti-inflammatory reaction: Resultado final: amortecimento da resposta inflamatória sistêmica.

Ou seja, sinais inflamatórios ativam o vago aferente → cérebro → vago eferente → ACh → α7 nAChR em macrófagos → menos citocinas. Este “freio biológico” impede que infecções, traumas ou inflamações crônicas saiam do controle. Intervenções que aumentam o tônus vagal (de estimulação elétrica a estratégias comportamentais) exploram exatamente esse circuito para reduzir inflamação.

Onde a batata frita (e a acrilamid)a entra na história?

A acrilamida (ACR) é um composto neurotóxico formado, por exemplo, quando alimentos ricos em amido são assados, fritos ou torrados a altas temperaturas. Batata frita, pizza, pãezinhos torrados são ricos em acrilamida. A neurotoxicidade da ACR pode sabotar vários pontos desse diagrama — e é isso que o artigo discute como hipótese para inflamação no sistema colinérgico:

  1. Dano a neurônios vagais e colinérgicos: A ACR causa “axonopatia distal” e disfunção sináptica. Se fibras vagais ou neurônios colinérgicos forem afetados, o sinal eferente que deveria liberar ACh enfraquece, reduzindo o freio anti-inflamatório.

  2. Menor liberação de acetilcolina: A ACR forma adutos com proteínas (especialmente em cisteínas) envolvidas no ciclo vesicular e na maquinaria sináptica. Resultado provável: quanta de ACh menores ou liberação mais errática, novamente “afrouxando” a VCAI.

  3. Estresse oxidativo e microglia reativa: A ACR aumenta espécies reativas de oxigênio e ativa microglia, subindo a maré pró-inflamatória. Quando a maré sobe e o freio colinérgico está fraco, a resposta inflamatória tende a ser mais intensa e prolongada.

  4. Interferência no α7 nAChR (direta ou indireta): Mesmo sem bloquear diretamente o receptor, a ACR pode alterar a expressão/funcionalidade do α7 nAChR por estresse celular e sinalização inflamatória, tornando os macrófagos menos responsivos à ACh.

4) O fio lógico completo

  1. Inflamação periférica gera citocinas/endotoxinas →

  2. Vago aferente alerta o cérebro →

  3. Cérebro manda um “contra-comando” via vago eferente

  4. ACh é liberada e ativa α7 nAChR em macrófagos →

  5. Citocinas caem (ação anti-inflamatória).

Com acrilamida: neurotoxicidade + estresse oxidativo → menos ACh / menor tônus vagal / macrófagos menos sensíveis → freio colinérgico falha → inflamação mais alta e persistente.

5) Implicações práticas (para contextualizar no blog)

  • A via colinérgica anti-inflamatória é um alvo terapêutico (estimulação do vago, agonistas/positivadores do α7 nAChR).

  • A exposição crônica à acrilamida pode predispor a um estado inflamatório de baixo grau ao fragilizar esse circuito.

  • Estratégias de redução de ACR na dieta (modos de preparo mais “brandos”, evitar queimar/torrar alimentos ricos em amido) e de suporte ao tônus vagal (sono, exercícios, respiração diafragmática) fazem sentido dentro desse modelo.

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Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Como o Acrilamida Afeta o Cérebro: Entendendo os Mecanismos de Neurotoxicidade

Acrilamida (ACR) é um composto tóxico que se forma em alimentos ricos em amido quando submetidos a altas temperaturas (como frituras e assados, incluindo pão torrado e batata frita). Diversos estudos têm mostrado sua ligação com neurotoxicidade, mas os mecanismos ainda não estão totalmente esclarecidos. A figura abaixo ilustra de forma integrada como o intestino, sistema imune e cérebro se comunicam e contribuem para o efeito da acrilamida sobre o sistema nervoso central (SNC).

1. O Papel do Microbioma Intestinal

Tudo começa no intestino, onde a acrilamida pode alterar a composição da microbiota intestinal. Bactérias benéficas, como Lactobacillus reuteri, Lactobacillus rhamnosus e Bacteroides fragilis, podem ser impactadas, modificando a produção de metabólitos essenciais (como BDNF e GABA) que regulam o funcionamento neuronal.

Além disso, a exposição à acrilamida pode levar à liberação de metabólitos tóxicos como LPS (lipopolissacarídeos) e Aβ (beta-amiloide), conhecidos por estarem associados a processos inflamatórios e neurodegenerativos.

2. Inflamação e Sistema Imunológico

Esses metabólitos ativam células imunes e induzem a liberação de citocinas pró-inflamatórias. Essa resposta inflamatória pode atravessar a barreira intestinal e chegar ao eixo intestino-cérebro, estimulando a ativação do HPA axis (eixo Hipotálamo-Hipófise-Adrenal), que regula estresse e resposta inflamatória sistêmica.

3. O Impacto no Cérebro

No SNC, a acrilamida provoca uma cascata de eventos:

  • Ativação de micróglias → células de defesa do cérebro que, quando ativadas em excesso, liberam moléculas inflamatórias.

  • Estresse oxidativo (ROS) → a mitocôndria é afetada, aumentando a produção de espécies reativas de oxigênio que danificam células nervosas.

  • Danos neuronais diretos → tanto via inflamação quanto via toxicidade direta, levando à degeneração neuronal.

O resultado é a neurotoxicidade, que pode se manifestar em déficits cognitivos, motores e aumento do risco de doenças neurodegenerativas.

4. Vias Alternativas e Perspectivas Futuras

A figura também sugere que existem outros mecanismos ainda não identificados (marcados como “?”). Isso abre caminho para pesquisas futuras, especialmente na identificação de novos metabólitos derivados da interação entre acrilamida e microbiota intestinal.

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Por que algumas pessoas têm pesadelo quando tomam melatonina?

O equilíbrio dos neurotransmissores é fundamental para a saúde mental, a qualidade do sono e o bem-estar geral. Substâncias como serotonina, dopamina, noradrenalina e melatonina regulam o humor, a atenção, os ciclos do sono e até mesmo a intensidade dos sonhos. Quando esse equilíbrio é alterado — seja por fatores ambientais, estilo de vida ou predisposição genética — podem surgir efeitos inesperados.

Um exemplo disso ocorre em pessoas com atividade aumentada da enzima monoamina oxidase (MAO), responsável por degradar neurotransmissores como serotonina, dopamina e noradrenalina. Nesses casos, os níveis dessas substâncias tendem a cair mais rapidamente. Isso explica por que a suplementação com melatonina pode desencadear sonhos intensos ou pesadelos: o sono REM é aprofundado, mas a falta de serotonina para estabilizar a atividade neural deixa o cérebro mais suscetível a experiências oníricas negativas. O mesmo raciocínio vale para o 5-HTP, precursor da serotonina. Embora ele aumente temporariamente a disponibilidade desse neurotransmissor, em indivíduos com alta atividade da MAO a degradação é acelerada, gerando oscilações bruscas e resultando em sonhos vívidos ou perturbadores.

Essas observações reforçam a importância de compreender como fatores genéticos influenciam o metabolismo cerebral. Exames genéticos que avaliam variantes relacionadas a enzimas como a MAO, transportadores de serotonina ou receptores dopaminérgicos podem oferecer informações valiosas sobre a resposta individual a suplementos e medicamentos. Com base nesses dados, é possível personalizar estratégias de tratamento e suplementação, prevenindo efeitos adversos e promovendo um equilíbrio neuroquímico mais estável e saudável.

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Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/