Integração metabólica em resposta à deficiência de serotonina

O artigo Metabolomics Approach Reveals Integrated Metabolic Network Associated with Serotonin Deficiency (Weng et al., 2015) utilizou uma abordagem metabolômica para identificar biomarcadores e vias metabólicas alteradas associadas à deficiência de serotonina induzida em camundongos por inibidores farmacológicos e alteração genética.

Identificação de biomarcadores:

  • pCPA: 21 biomarcadores alterados.

  • Tph2-/-: 17 biomarcadores alterados.

  • Alterações metabólicas observadas:

    • Aminoácidos: Alterações nos níveis de aminoácidos essenciais e não essenciais.

    • Metabolismo energético: Diminuição nos níveis de intermediários do ciclo de Krebs e ATP.

    • Purinas: Redução nos níveis de nucleotídeos purínicos.

    • Lipídios: Alterações nos perfis de ácidos graxos e lipídios complexos.

    • Microbiota intestinal: Indicações de alterações no metabolismo relacionadas à microbiota.

  • Estresse oxidativo:

    • Aumento nos níveis de espécies reativas de oxigênio (ROS) e produtos de peroxidação lipídica, sugerindo um estado pró-oxidante.

Vermelho: metabólitos que aumentam na deficiência de serotonina (ou marcadores alterados).

Azul: metabólitos reduzidos.

Preto: conexões enzimáticas ou caminhos principais.

Setas verdes: indica fluxos metabólicos que ligam serotonina a outras vias (lipídios, microbiota).

Integração das Vias Metabólicas

O estudo propõe uma rede metabólica integrada associada à deficiência de serotonina, destacando:

  • Interconexões entre vias: Como o metabolismo de aminoácidos influencia o metabolismo energético e lipídico.

  • Impacto no ciclo de Krebs: Diminuição na produção de energia celular.

  • Alterações na sinalização celular: Possíveis implicações na função neuronal e comunicação celular.

Implicações Clínicas

As alterações metabólicas observadas podem contribuir para condições como depressão e esquizofrenia. A deficiência de serotonina pode estar associada a processos patológicos em doenças como Alzheimer e Parkinson. A identificação de novos biomarcadores pode auxiliar no desenvolvimento de terapias direcionadas (Weng et al., 2015).

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Acidúria Formiminoglutâmica (FIGLU): genética, clínica e implicações

A acidúria formiminoglutâmica (FIGLU) é uma condição bioquímica rara, associada a erros inatos do metabolismo e também a deficiências adquiridas de vitaminas do complexo B, especialmente o ácido fólico (vitamina B9). Sua principal característica laboratorial é a excreção aumentada de formiminoglutamato (FIGLU) na urina, sobretudo após sobrecarga de histidina.

Genética envolvida

A forma hereditária está ligada a variantes no gene FTCD (formiminotransferase-ciclodeaminase), localizado no cromossomo 21q22.3.

O gene FTCD codifica uma enzima bifuncional essencial na via de degradação da histidina, que conecta este metabolismo ao ciclo do folato. Polimorfismos de risco ou mutações patogênicas podem comprometer a atividade enzimática, levando ao acúmulo de FIGLU. A transmissão é autossômica recessiva, e mutações diferentes podem resultar em espectros distintos de gravidade.

Idade típica de manifestação

Muitos pacientes são assintomáticos na infância, sendo diagnosticados em triagens metabólicas ou investigações de atraso do desenvolvimento.

Em casos mais graves, sinais podem surgir no período neonatal ou na infância precoce, incluindo atraso neuropsicomotor, deficiência intelectual leve a moderada e sintomas inespecíficos como irritabilidade ou atraso na fala.

Tratamento

O manejo depende da causa:

  • Deficiência nutricional de folato → suplementação oral corrige a alteração metabólica e evita complicações.

  • Forma genética (deficiência de FTCD) → não existe tratamento curativo específico, mas em alguns casos suplementação de ácido folínico pode reduzir a excreção de FIGLU.

  • Suporte multidisciplinar (neuropediatria, psicologia, terapia ocupacional) é essencial para o desenvolvimento infantil.

Prognóstico

  • Casos leves: podem permanecer assintomáticos por toda a vida, identificados apenas em exames de triagem.

  • Casos mais graves: podem evoluir com déficits cognitivos persistentes, variando de leves dificuldades escolares até deficiência intelectual significativa.

O prognóstico depende da atividade residual da enzima e da precocidade no diagnóstico.

Repercussões cognitivas

O acúmulo de FIGLU reflete a dificuldade no metabolismo da histidina e no uso adequado de folato no ciclo de um-carbono, importante para síntese de DNA e neurotransmissores. Isso pode resultar em:

  • atraso da fala,

  • dificuldades de aprendizado,

  • alterações de comportamento,

  • em alguns casos, deficiência intelectual.

Outras causas de elevação de FIGLU

Nem toda elevação de FIGLU está ligada a mutações em FTCD. Outras situações incluem:

  • Deficiência de folato (nutricional ou por drogas antifolato como metotrexato);

  • Deficiência de vitamina B12, que compromete o metabolismo do folato;

  • Doenças hepáticas, que alteram o metabolismo intermediário;

  • Situações de sobrecarga de histidina, como dietas específicas ou testes de provocação.

A acidúria formiminoglutâmica é um marcador metabólico importante, que pode refletir tanto uma doença genética rara quanto condições adquiridas mais comuns, como a deficiência de folato. O reconhecimento precoce é essencial para intervenção adequada, especialmente nos casos em que suplementação vitamínica pode evitar ou minimizar repercussões cognitivas.

A interpretação correta de exames metabolômicos pode mudar totalmente a conduta clínica: diferenciar entre uma deficiência simples de vitaminas e um erro inato do metabolismo faz toda a diferença para o paciente.

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Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Acidemia Metilmalônica: Tudo o que você precisa saber sobre diagnóstico, genética e tratamento

A acidemia metilmalônica (AMM ou MMA ou MAM) ou acidúria metilmalônica é uma doença metabólica rara que afeta a capacidade do corpo de processar certos aminoácidos essenciais. Embora possa ser grave, o diagnóstico precoce e o tratamento adequado podem melhorar significativamente o prognóstico.

O que é a acidemia metilmalônica?

A AMM é causada por defeitos na enzima metilmalonil-CoA mutase (MMUT) ou em genes relacionados ao metabolismo da vitamina B12 (como MMAA, MMAB e MMACHC). Esses defeitos levam ao acúmulo de ácido metilmalônico, causando acidose metabólica, crises metabólicas e, em casos graves, comprometimento de órgãos vitais.

A doença pode se apresentar de formas variadas, dependendo do tipo genético e da gravidade da mutação.

Genética e polimorfismos de risco

A AMM é geneticamente heterogênea. Os principais subtipos são:

  • mut⁰ (deficiência total da MMUT): forma grave, com sintomas neonatais intensos. Polimorfismos comuns: c.19C>T, c.52C>T, c.91C>T, c.278G>A, c.322C>T.

  • mut⁻ (deficiência parcial da MMUT): sintomas podem aparecer na infância precoce; polimorfismos: c.299A>G, c.566A>T, c.828G>C, c.947A>G, c.2080C>T.

  • cblA (defeito na entrega de adenosilcobalamina): geralmente leve, bom prognóstico; variantes: c.394C>T, c.567dupT.

  • cblB (defeito na síntese de adenosilcobalamina): variabilidade clínica; variantes: c.96T>C, c.174_175delAG.

  • cblC (defeito na síntese de adenosilcobalamina e metilcobalamina): formas neonatais graves; variantes: c.394C>T, c.567dupT, c.609G>A.

Os polimorfismos identificam o risco, ajudam no diagnóstico precoce e orientam a expectativa de resposta ao tratamento.

Idade típica de suspeita clínica

  • Neonatal (primeiras semanas de vida): formas mut⁰ ou cblC graves → crises metabólicas intensas, vômitos, letargia, acidose grave.

  • Infância precoce (1–12 meses): mut⁻ e cblB → sintomas intermitentes, atraso no crescimento e crises desencadeadas por infecção ou jejum.

  • Infância tardia / adolescência: cblA e formas leves de mut⁻ → sintomas mais brandos, crises menos frequentes.

O teste do pezinho expandido é essencial para diagnóstico precoce, permitindo intervenção antes do primeiro episódio grave.

Tratamento

O tratamento da AMM depende do subtipo e da gravidade:

Crise aguda

  • Suspender temporariamente proteínas e fornecer calorias por via IV (glicose e lipídios) para evitar catabolismo.

  • L-carnitina IV, glicina (250mg/kg/dia) e B2 para eliminar ácidos orgânicos acumulados.

  • Correção de acidose metabólica e hiperamonemia (diálise em casos graves).

  • Hidroxocobalamina IV nos subtipos responsivos (cblA, cblB, alguns mut⁻).

  • Antibióticos (como metronidazol) para reduzir produção intestinal de propionato.

Tratamento crônico

  • Dieta hipoproteica controlada: limitar aminoácidos precursores do propionil-CoA.

  • Suplementos: L-carnitina, vitamina B12 (hidroxocobalamina) nos subtipos responsivos.

  • Acompanhamento metabólico regular: monitoramento de ácido metilmalônico, função renal, crescimento e desenvolvimento.

  • Transplante hepático ou hepatorrenal em casos graves, para reduzir crises metabólicas.

Observação importante: a adenosilcobalamina é o cofator ativo da MMUT, mas não é administrada diretamente via intravenosa; usa-se hidroxocobalamina, que é convertida em AdoCbl dentro das células.

Prognóstico

O prognóstico depende de vários fatores:

  • mut⁰: formas graves, mortalidade alta na infância sem manejo intensivo.

  • mut⁻: variabilidade; boa sobrevida com tratamento adequado.

  • cblA: geralmente bom; expectativa de vida próxima do normal.

  • cblB / cblC: dependente da resposta à vitamina B12 e controle metabólico; risco de complicações neurológicas e renais.

Repercussões cognitivas

As repercussões cognitivas são comuns, especialmente em:

  • formas graves (mut⁰, cblC neonatal)

  • crises metabólicas repetidas ou não tratadas

Principais efeitos:

  • Atraso global do desenvolvimento

  • Déficits de memória, atenção e funções executivas

  • Problemas de coordenação motora

  • Em casos graves, atraso mental profundo

Fatores que melhoram o prognóstico cognitivo: diagnóstico precoce, controle metabólico adequado e tratamento com hidroxocobalamina nos subtipos responsivos.

E se ácido metilmalônico aumentar em outras fases da vida?

O ácido metilmalônico pode aumentar em qualquer pessoa, mesmo que não tenham mutações de MMUT. Isto pode acontecer no caso de deficiência de B12, causada por abuso e álcool, dieta vegana sem suplementação, disbiose, medicações inibidoras da bomba de prótons, envelhecimento e hipocloridria. As consequências da deficiência de B12 nestes casos inclui: elevação de homocisteína, fadiga, depressão, hiperreflexia, neuropatia periférica, infecções do trato respiratório superior, desordens gastrointestinais, anemia (mascarada muitas vezes pelo ácido fólico, vitamina B9), doença isquêmica do coração, acidente vascular cerebral e trombose venosa profunda. O tratamento neste caso é a administração de adenosilcobalamina, retirada do álcool e tratamento da disbiose, conforme o caso. Monitoramos o sucesso da terapia com exames metabolômicos.

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Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/