Depressão e metabolismo de folato

Diversos estudos têm mostrado maior prevalência de alterações metabólicas em pessoas com depressão resistente: disfunções mitocondriais, alterações no metabolismo de carnitina, folato e metilação.

Dose de folato nos exames

Mas ter folato (vitamina B9) no sangue não é garantia de folato cerebral. No cérebro, a vitamina B9 é fundamental para síntese de neurotransmissores e metilação de DNA. A deficiência no sistema nervoso central pode ocorrer mesmo com níveis séricos normais ou altos (Pan et al., 2023).

Folato sérico vs. folato cerebral

O transporte de folato para o cérebro depende principalmente do transportador FRα (folate receptor alpha) na barreira hematoencefálica (mais especificamente nos plexos coroides).

O que pode ocorrer em alguns pacientes é o chamado “cerebral folate deficiency” (CFD), onde mesmo com níveis séricos adequados de folato, há redução no LCR. Isso pode estar associado a autoanticorpos contra FRα, defeitos genéticos ou competição por transporte.

Excesso de ácido fólico circulante pode atrapalhar o transporte?

O ácido fólico sintético (da dieta fortificada ou suplementos) não é a forma ativa: precisa ser convertido em 5-MTHF (L-metilfolato). Níveis muito altos de ácido fólico não metabolizado no sangue podem competir pelo transportador no plexo coroide. Isso, teoricamente, poderia saturar ou “entupir” o sistema de transporte para o SNC, dificultando a entrada da forma ativa. É a armadilha dos folatos (folate trap).

Esse mecanismo ainda é hipotético, mas alguns estudos sugerem que excesso de ácido fólico sintético pode ser menos eficiente para o cérebro do que suplementar diretamente L-metilfolato (que atravessa mais facilmente a barreira hematoencefálica).

Implicações clínicas

Em depressão resistente, alguns psiquiatras investigam níveis de folato no LCR, embora seja exame invasivo. Na prática, muitas vezes se tenta suplementação com L-metilfolato ou mesmo ácido folínico, justamente para contornar essas barreiras.

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Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

O peso molecular influencia na absorção de nutrientes

Peso molecular é uma forma de medir o “tamanho” ou a massa de uma molécula. Como cada molécula é formada por átomos (oxigênio, carbono, hidrogênio, etc.), somamos as massas de todos os átomos que a compõem para saber o peso da molécula inteira.

Unidades usadas

1. Dalton (Da)

  • 1 Dalton é mais ou menos o peso de 1 próton ou 1 nêutron.

  • É uma unidade usada em bioquímica para falar de moléculas pequenas ou médias.

  • Ex.: glicose tem 180 Da → quer dizer que sua massa é 180 vezes o peso de 1 próton.

2. Gramas por mol (g/mol)

  • “Mol” é uma forma de contar quantas moléculas temos (como “dúzia” = 12, mas aqui um mol = ~6,022 × 10²³ moléculas).

  • Se uma molécula tem 180 g/mol, isso quer dizer:

    • Um mol (6,022×10²³ moléculas) pesa 180 g.

    • Logo, cada molécula individual pesa 180 Da (é a mesma medida, só em outra escala!). Ou seja, 180 g/mol = 180 Da

Em geral, usamos g/mol em laboratório (massa em gramas de muitas moléculas) e Da em biologia/nutrição (tamanho da molécula individual). Quanto menor o peso molecular, mais fácil tende a ser a absorção pelo trato gastrointestinal, porque a molécula passa com menos barreiras pelas membranas celulares. Já moléculas grandes e complexas precisam ser quebradas em unidades menores antes de serem absorvidas.

Exemplos

  • Água (H₂O): PM ~18 Da → molécula super pequena e de fácil absorção.

  • Glicose (açúcar do sangue): PM ~180 Da.

  • Vitamina C: PM ~176 Da.

  • Albumina (proteína do ovo): PM ~66.000 Da → molécula enorme. Assim como outras proteínas grandes depende de enzimas digestivas para quebrar até unidades menores absorvíveis.

  • DNA (moléculas genéticas): bilhões de Da → mega-molécula → muito grande para atravessar diretamente a barreira intestinal. Por isso, durante a digestão, o DNA dos alimentos ou de bactérias é quebrado por enzimas (DNases, nucleases, fosfatases) em fragmentos bem pequenos:

    • Nucleotídeos (ex.: adenosina monofosfato).

    • Nucleosídeos (base nitrogenada + açúcar).

    • Bases nitrogenadas isoladas (adenina, citosina, guanina, timina).

O intestino absorve principalmente nucleosídeos e bases livres, que podem ser reutilizados pelo corpo para fabricar o próprio DNA e RNA. Fragmentos grandes de DNA (vários pares de bases) quase não passam — a barreira intestinal impede. A microbiota intestinal produz DNA o tempo todo, mas esse material em geral não entra inteiro no organismo — serve mais como sinalização local (ativando receptores do sistema imune intestinal, como TLR9).

Em condições normais, entra pouquíssimo DNA intacto na circulação. O que chega ao sangue são bases e nucleosídeos reaproveitáveis, não DNA completo. Isso é importante, pois evita que DNA estranho circule no corpo (o que poderia ativar o sistema imune). fragmentos muito pequenos de DNA (oligonucleotídeos curtos) podem atravessar em quantidades mínimas, mas eles são rapidamente degradados no sangue. Em doenças intestinais com aumento de permeabilidade (“intestino permeável”), pode ocorrer passagem maior de fragmentos, o que pode influenciar imunidade e inflamação.

Insights-chave

  • <300 Da: geralmente fácil absorção (ex.: glicose, aminoácidos, vitaminas hidrossolúveis).

  • 300–600 Da: depende de solubilidade (ex.: carotenoides, vitamina E).

  • >1.000 Da: quase sempre precisam ser quebrados em moléculas menores antes da absorção (proteínas, polissacarídeos). Muitos fitoquímicos têm peso molecular alto e baixa solubilidade em água. A biodisponibilidade deles depende de quebra metabólica pela microbiota, gordura na dieta (no caso de substâncias lipofílicas), glicoconjugação (ligação a açúcares).

    • A vitamina B12 possui um peso molecular de 1.355 Da (bem maior que outras vitaminas hidrossolúveis). Tem uma estrutura molecular complexa com um núcleo corrinode (contém cobalto). Apesar do peso molecular alto, a B12 é uma excessão pois não é quebrada, usando um sistema de transporte altamente específico:

      • No estômago → B12 se liga à haptocorrina (glicoproteína salivar).

      • No duodeno → enzimas pancreáticas liberam B12 da haptocorrina.

      • No intestino delgado → B12 se liga ao fator intrínseco (FI) produzido pelas células parietais do estômago.

      • No íleo terminal → complexo B12+FI é absorvido por receptores específicos.

      • Transporte no sangue → ligada à transcobalamina II.

  • Minerais: não seguem essa lógica, pois são íons simples (absorção depende de solubilidade, competição e transportadores).

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Introdução ao metabolismo de um carbono

O metabolismo de um carbono engloba os ciclos do folato e da metionina, essenciais para transferência de grupos metila, biossíntese de nucleotídeos e epigenética. A vitamina B9 (folato) fornece grupos metila ativos através de tetra-hidrofolato (THF), enquanto a B6, em sua forma ativa PLP (piridoxal 5′-fosfato), é cofator essencial em enzimas-chave deste sistema.

Vitaminas B9 (Folato): Formas, vias e regulação

Família dos folatos (Franco et al., 2022)

A B9 pode ser ingerida como 5-MTHF (de alimentos) ou ácido fólico (em suplementos). THF é gerado de ácido fólico por DHFR e participa da conversão de serina em glicina e da síntese de nucleotídeos, além de gerar SAM no ciclo da metionina. Enzimas como MTHFR são reguladas alostericamente (p. ex., por SAM) e por modificações pós-traducionais como fosforilações.

As células desenvolveram múltiplas formas de regulação para garantir que concentrações apropriadas de folato são mantidas. Enzimas envolvidas no ciclo do 1-carbono sofrem modificações (fosforilação, acetilação, metilação, ubiquitinação) que afetam a atividade e a eficiência de proteínas, alterando o fluxo metabólico.

A deficiência de folato prejudica a síntese de DNA e a metilação, favorecendo instabilidade genômica . Está ligada a defeitos do tubo neural, doenças cardiovasculares e disfunções neurológicas — suplementação preconizada reduziu defeitos em até 50 %.

  • Câncer de cólon: baixa ingestão associada a maior risco; suplementação de longa duração pode reduzir o risco em ~75 %.

  • Câncer de pulmão: polimorfismo MTHFR C677TT reduz atividade enzimática, aumenta homocisteína — associados a maior risco em certas populações.

Já o excesso de folato pode mascarar deficiência de B12, retardando o diagnóstico. O folato em excesso também pode promover certos tumores.

  • Câncer de ovário: o receptor de folato FRα superexpresso em tumores, sendo alvo de terapias monoclonais como farletuzumab.

  • Outros tumores (próstata, pâncreas, mama): resultados epidemiológicos variados, com riscos dependentes de dose, ingestão, polimorfismos genéticos e fatores como consumo de álcool.

Vitamina B6 (Piridoxina): Funções, formas e implicações

  • Obtida de alimentos como fígado, peixes, grãos, legumes.

  • Convertida pela enzima PDXK em PLP — forma ativa — essencial para mais de 160 reações enzimáticas (metabolismo de aminoácidos, síntese de neurotransmissores, glicogênese, catabolismo lipídico, etc.).

  • Deficiência: raramente isolada; pode ocorrer em desnutrição, alcoolismo, uso de certos medicamentos. Provoca alterações neurológicas, dermatológicas e hematológicas.

    • Maior risco de câncer de cólon, pâncreas, pulmão.

    • Câncer de mama: resultados mistos; alguns estudos mostram efeito protetor da B6 em sinergia com folato.

  • Excesso: associado a neuropatia sensorial e risco elevado de fraturas e osteoporose, podendo agravar deficiência de niacina (pelagra).

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/