Aplicações da metabolômica no autismo

Crianças com TEA apresentam dificuldades nas interações sociais, linguagem e interesses ou comportamentos restritos ou repetitivos. Mesmo com tratamento, apenas 20% vivem de forma independente na vida adulta após um diagnóstico de TEA na infância.

Estudo publicado na revista Communications Biology utilizou a metabolômica em recém-nascidos para identificar marcadores que possam prever a ocorrência do transtorno do espectro autista (TEA), facilitar o diagnóstico e individualizar o tratamento.

Biomarcadores para TEA

Biomarcadores são indicadores biológicos mensuráveis que fornecem informações sobre processos normais do organismo, doenças ou a resposta a um tratamento. Enquanto na genômica avalia-se genes, na metabolômica avalia-se metabólitos - molécula pequena (< ~1.500 Da), intermediária ou produto final do metabolismo celular, podendo ser detectada e quantificada.

Pesquisas anteriores identificaram marcadores metabólicos e bioquímicos para TEA em crianças e adultos, variando conforme idade, sexo e gravidade dos sintomas. Muitos desses marcadores estão envolvidos na estrutura e função do cérebro, sistema imunológico, sistema nervoso autônomo e microbioma. No entanto, nenhum fator genético ou ambiental isolado explica todos os casos de TEA em crianças.

Os genes não atuam de forma isolada, sendo que as interações poligênicas e gene-ambiente são os principais contribuintes para o desenvolvimento do TEA.

O modelo CDR

O modelo de resposta ao perigo celular (CDR) descreve vias metabólicas que conectam estressores ambientais e genéticos a alterações no desenvolvimento e ao TEA. A CDR se propaga do ponto de impacto do estressor para fora, seguindo mudanças nos sistemas metabólico, inflamatório, autonômico, endócrino e neurológico.

O TEA é mais provável de se desenvolver a partir da CDR quando os estressores atuam durante a vida intrauterina ou no início da infância. Isso afeta quatro áreas envolvidas na CDR: mitocôndrias, estresse oxidativo, imunidade inata e microbiomas. O trifosfato de adenosina extracelular (eATP) é o regulador fundamental em todas as vias da CDR.

ATP como molécula sinalizadora

O ATP é a moeda energética de toda a vida na Terra. Cerca de 90% do ATP é produzido nas mitocôndrias intracelulares e utilizado em todas as vias metabólicas.

Fora da célula, o eATP atua como molécula de informação, ligando-se a receptores purinérgicos para sinalizar perigo, metabolismo alterado e induzir a CDR. É uma das moléculas sinalizadoras mais potentes conhecidas, capaz de se ligar a receptores presentes em todas as células do corpo.

A sequência inicia-se com a ativação da imunidade inata, passando por respostas agudas localizadas e podendo evoluir para respostas sistêmicas, com possível impacto no neurodesenvolvimento humano.

ATP no metabolismo do TEA

Alterações no metabolismo de purinas e na sinalização purinérgica em resposta ao ATP foram identificadas em estudos experimentais e humanos, e confirmadas por análises multi-ômicas. O eATP é fundamental para diversos aspectos do desenvolvimento neurológico alterados no TEA, como ativação de mastócitos e micróglia, sensibilização neuronal e neuroplasticidade.

As mitocôndrias, responsáveis pela geração de ATP, processam dados, fornecem alertas precoces e iniciam respostas rápidas às mudanças ambientais. Elas executam cerca de 800 reações metabólicas, mais da metade reguladas pelo ATP e seus derivados. A disfunção mitocondrial crônica no TEA prejudica vias metabólicas e expressão gênica, interrompendo o curso normal do neurodesenvolvimento.

O que o estudo mostrou?

Usando métodos clássicos de metabolômica e redes avançadas, pesquisadores analisaram 205 recém-nascidos “pré-ASD” e 53 crianças de 5 anos com ASD. Foram identificadas 14 vias bioquímicas que explicam cerca de 80 % dos impactos metabólicos — e essas alterações convergem em moléculas de stress fisiológico (como lactato, glicerol, colesterol e ceramidas), enquanto as defesas anti-inflamatórias e antioxidantes (glutationa, CoQ10, vitaminas B, entre outros) estiveram reduzidas.

Recém-nascidos dos grupos pré-TEA e de desenvolvimento típico (DT) não apresentaram diferenças na exposição a fatores ambientais durante a gestação e primeira infância. Cerca de 50% das crianças pré-TEA apresentaram regressão do desenvolvimento em algum momento, contra 2% no grupo DT. A idade média de diagnóstico do TEA foi de 3,3 anos.

No grupo TEA, alguns metabólitos — incluindo moléculas de estresse e a purina 7-metilguanina — estavam aumentados no nascimento e continuaram a aumentar até os 5 anos. Houve também alterações em lipídios complexos, antioxidantes, neurotransmissores como dopamina, e vitaminas. Usando seis ou sete biomarcadores, foi possível distinguir pré-TEA de DT com 75% de acurácia ao nascimento e 90% aos 5 anos.

Mecanismos potenciais do TEA

As mudanças mais relevantes afetaram grupos específicos de lipídios complexos, com destaque para ceramidas, que podem causar morte celular e perda de função mitocondrial. A perda de correlações negativas entre ceramidas e purinas leva ao acúmulo dessas substâncias, resultando em disfunção mitocondrial e apoptose celular.

Esse processo reduz a atividade anti-inflamatória, reservas antioxidantes e aumenta a resposta ao estresse, piorando com a idade. A repetida ativação da CDR pode levar a danos oxidativos nas membranas celulares, reduzindo a função mitocondrial e atrasando respostas a estressores ambientais.

O estudo confirma que o TEA está associado a perfis metabólicos distintos dos observados em crianças com desenvolvimento típico, variando com idade, sexo e gravidade. A falha na reversão normal da rede de purinas pode impedir a mudança da rede GABAérgica de excitatória para inibitória, resultando em excesso de sinalização excitatória no TEA. Isso pode explicar a necessidade de rotina rígida em crianças com TEA para evitar ansiedade causada por mudanças inesperadas.

Pesquisas futuras poderão usar esses achados para desenvolver ferramentas de triagem para identificar precocemente recém-nascidos e bebês com risco de TEA, possibilitando intervenção precoce e melhores resultados clínicos.

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Metabolômica das ceramidas na doença de Alzheimer

A metabolômica das ceramidas é uma área da metabolômica focada no estudo das ceramidas, que são uma classe de lipídios complexos envolvidos em diversas funções biológicas, incluindo a regulação da integridade da membrana celular, a sinalização celular e a apoptose (morte celular programada).

Aspectos principais da metabolômica das ceramidas:

  1. Identificação e quantificação – Técnicas como espectrometria de massas (MS) acoplada à cromatografia líquida de alta eficiência (LC-MS) são utilizadas para detectar diferentes tipos de ceramidas e seus metabólitos.

  2. Papel fisiológico e patológico – As ceramidas estão envolvidas em doenças metabólicas (como diabetes tipo 2), cardiovasculares, neurodegenerativas e câncer.

  3. Interação com vias metabólicas – Elas fazem parte do metabolismo dos esfingolipídios, regulando processos inflamatórios, resistência à insulina e estresse oxidativo.

  4. Biomarcadores – O perfil de ceramidas pode servir como biomarcador para diversas doenças, sendo usado para diagnóstico e prognóstico.

  5. Efeito da dieta e estilo de vida – O consumo de gorduras específicas e o exercício físico podem modular os níveis de ceramidas no organismo.

Estudo das ceramidas no Alzheimer

O papel da metabolômica da ceramida na compreensão da doença de Alzheimer (DA) é significativo, pois destaca o envolvimento do metabolismo dos esfingolipídeos na patogênese da doença.

As ceramidas estão implicadas na apoptose neuronal, particularmente por meio de mecanismos que envolvem estresse oxidativo e acúmulo de β-amiloide (Aβ). Níveis elevados de ceramida podem aumentar a produção de Aβ ao estabilizar a β-secretase, levando a um ciclo de retroalimentação que exacerba o dano neuronal [1].

Alterações no metabolismo da ceramida contribuem para a disfunção mitocondrial, comprometimento da autofagia e interrupção da homeostase neuronal, todos críticos na progressão da DA. Essa desregulação está ligada às características fisiopatológicas gerais da DA, incluindo declínio cognitivo e morte celular [2].

Estudos multiômicos recentes caracterizaram a via ceramida/esfingomielina como um alvo terapêutico. Essas análises identificaram variantes genéticas e alterações metabólicas associadas ao metabolismo da ceramida que se correlacionam com características de imagem em pacientes com DA, sugerindo potenciais caminhos para o tratamento [3].

A compreensão da metabolômica da ceramida abre possibilidades para intervenções terapêuticas que visam modular os níveis ou vias de ceramida. Por exemplo, agentes que influenciam o metabolismo dos esfingolipídeos podem ajudar a aliviar os comprometimentos cognitivos associados à DA [3].

Em resumo, a metabolômica da ceramida fornece insights sobre as vias bioquímicas envolvidas na doença de Alzheimer, destacando seu potencial como alvo para estratégias terapêuticas.

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Referências

1) M Jazvinšćak Jembrek et al. Ceramides in Alzheimer's Disease: Key Mediators of Neuronal Apoptosis Induced by Oxidative Stress and Aβ Accumulation. Oxidative medicine and cellular longevity (2015). https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/26090071/

2) MR Chowdhury et al. Diverse Roles of Ceramide in the Progression and Pathogenesis of Alzheimer's Disease. Biomedicines (2022). https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/36009503/

3) P Baloni et al. Multi-Omic analyses characterize the ceramide/sphingomyelin pathway as a therapeutic target in Alzheimer's disease. Communications biology (2022). https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/36209301/

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Estratégias para o emagrecimento saudável

Neste outro artigo escrevi sobre 7 erros que prejudicam o emagrecimento. Agora veremos as estratégias que favorecem a perda de peso.

1) Autocuidado: Às vezes o que falta para a dieta dar certo é a baixa autoestima e falta de amor-próprio. Terapia é fundamental! A saúde ou a falta dela impacta todos os outros aspectos da vida. Por isso, cuidar-se é muito importante. A terapia também ajuda no combate ao estresse. Lembre que o estresse crônico leva ao excesso de liberação de cortisol e resistência à perda de peso, principalmente na região visceral.

2) Alimentação simples, caseira, natural: A industrialização moderna dos alimentos gerou um boom de doenças metabólicas, como obesidade, diabetes, esteatose hepática. Voltar à forma como nossos antepassados comiam é importante. Frutas, verduras, fontes naturais de proteína. Gordura corporal em excesso não é sinônimo de boa nutrição. Uma pessoa pode ter muita caloria estocada e estar deficiente em muitas vitaminas, minerais, ácidos graxos essenciais e outras substâncias protetoras. Foque nos micronutrientes e nos compostos bioativos e não nas calorias.

3) Evitar açúcar e adoçante. Troque o sabor doce pelas frutas. O açúcar adicionado e os adoçantes são obstáculos metabólicos para a perda de peso. Excesso de açúcar e adoçante acabam prejudicando a microbiota intestinal e também o fígado.

4) Aumente seu consumo de fibras. A maior parte das pessoas consome menos fibras do que precisa para garantir boa saúde intestinal, metabólica e saciedade. Prefira grãos integrais (como arroz preto ou vermelho) em vez de arroz branco refinado ou aveia instantânea.

5) Escolha gorduras saudáveis: As gorduras são essenciais à vida. Bons exemplos são provenientes de abacates, azeite de oliva, nozes (como macadâmia, rica em ômega-7), gemas de ovos de qualidade e chocolate amargo 100%.

6) Priorize qualidade: Incorpore alimentos "super-heróis": Estes são alimentos ricos em nutrientes e fitoquímicos que auxiliam diversas funções corporais e alimentam as bactérias intestinais benéficas. Têm função antioxidante e reduzem o risco de vários tipos de câncer e doenças neurodegenerativas. Exemplos incluem cebola, alho, brócolis, repolho, vegetais crucíferos, beterraba, pimenta, cúrcuma (açafrão), chá verde, leguminosas e frutas vermelhas, orégano, canela, cravo, alecrim, manjerona, cominho, salsinha, manjericão, curry, sálvia, gengibre, tomilho, hortelã...

7) Substitua parte das carnes por fontes vegetais: Você não precisa ser vegano ou vegetariano, mas sua dieta deve ser composta principalmente de plantas (frutas, vegetais, grãos integrais, vegetais ricos em amido, proteínas vegetais), com porções menores de proteínas animais e laticínios.

Leguminosas são altamente benéficas: feijões, grão-de-bico, lentilhas, ervilhas, favas e tremoços são excelentes fontes de fibras, amido resistente e proteínas. Para quem tem intolerância, começar com pequenas quantidades germinadas de leguminosas menos fibrosas (como feijão-mungo ou feijão-azuki) pode ajudar. Também existem enzimas que ajudam na digestão de proteínas vegetais. Precisa de ajuda? Marque aqui sua consulta online.

8) Use limão e vinagre de maçã: O limão reduz o impacto glicêmico de outros alimentos e auxilia na absorção de minerais. O vinagre de maçã (1 a 2 colheres de sopa em água antes das refeições) nutre as bactérias intestinais, auxilia na digestão, aumenta a saciedade e reduz os picos glicêmicos.

9) Jejum intermitente: Em vez de comer a cada 3 horas, tente fazer três refeições ao dia, para controlar a liberação constante de insulina. Além de emagrecer, você reduz a velocidade de envelhecimento:

Quebre o jejum com algo verde: sopas, saladas, suco verde, possuem alta densidade nutricional e baixa densidade calórica. São ricos em substâncias que ajudam na eliminação de toxinas e compostos amargos que melhoram a saciedade e a digestão.

10) Coma com atenção: Mastigue e saboreie os alimentos, lentamente. Aprenda mais sobre mindful eating (alimentação consciente) aqui.

11) Durma bem - a qualidade e a regularidade do sono (higiene do sono) são fundamentais para a saúde e manutenção do peso saudável. Dormir mal (devido a alimentos pesados, estimulantes ou luz artificial à noite) desequilibra os hormônios, inclusive aqueles que controlam apetite.

12) Saia do conforto térmico: existem estudos com exposição ao frio e ao calor para melhorar o metabolismo. A exposição ao frio (banho gelado, cachoeira, imersão no gelo) aumento a síntese de gordura marrom, que é mais ativa.

Já o calor, como sessões de sauna, podem aumentar proteínas de choque térmico que otimizam várias vias metabólicas, além de proporcionar relaxamento. O uso regular da sauna está associado ao aumento da longevidade e à redução da mortalidade.

13) Atividade física: embora a dieta seja fundamental para a perda de peso, a atividade física serve para gerar adaptações metabólicas, tornando o corpo uma máquina de queimar calorias melhor, mesmo em repouso. No entanto, atividades físicas intensas não são recomendadas no início do processo de perda de peso para indivíduos com sobrepeso, obesidade ou inflamação devido a lesões e riscos cardíacos. Primeiro ajustamos a dieta e começamos devagar (caminhadas, hidroginástica, natação, musculação leve). Conforme o corpo adapta-se e nutrientes são repostos com dieta saudável e suplementação, a atividade física vai se intensificando.

Precisa de ajuda? Marque aqui sua consulta de nutrição online

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/