Os diferentes agentes que podem danificar o DNA

Diferentes agentes químicos, físicos e ambientais podem danificar o DNA, o que pode levar a mutações, falhas na replicação, envelhecimento, câncer ou morte celular. Cada anotação na figura abaixo mostra um tipo de dano causado à estrutura do DNA por diferentes mecanismos.

Tipos de Lesões no DNA Representados na Imagem:

  1. Alquilação (Alquilantes monofuncionais)

  • Dano químico ao DNA, com adição de grupos alquila às bases do DNA. Os grupos metil - CH3 - são alquilas mais simples.

  • Pode alterar a estrutura química das bases, prejudicando o pareamento correto.

  • Às vezes é usada na quimioterapia para metilação de parte do DNA de células cancerígenas, com a finalidade de inibir seu crescimento.

2. Sítios Apirimidínicos / Apurínicos (Alquilantes monofuncionais)

  • Perda de uma base nitrogenada (purina ou pirimidina), deixando um local sem informação genética.

  • Causa instabilidade e dificulta a replicação e transcrição.

3. Formação de Radicais Livres

  • Moléculas altamente reativas (geralmente causadas por radiação ionizante) que atacam o DNA.

  • Resulta em quebras e modificações nas bases.

4. Quebra de Fita Simples (Single-strand break)

  • Uma das fitas da dupla hélice é rompida.

  • Pode ser reparada, mas se não corrigida, pode levar a mutações.

5. Adutos (Benzo[a]pireno)

  • Compostos químicos (como o benzo[a]pireno) formam ligações covalentes com as bases do DNA.

  • O Benzo[a]pireno (BP) é um hidrocarboneto aromático policíclico formado na combustão incompleta de matéria orgânica, como madeira, carbono, petróleo, tabaco, gases de escape dos veículos, contaminação do ar, alimentos ultraprocessados como os defumados.

  • É considerado carcinogênico por causar distorção na hélice de DNA, bloqueando sua replicação.

6. Fosfotriestéres (Alquilantes monofuncionais)

  • Envolvem alterações na ligação entre o grupo fosfato e o açúcar do DNA.

  • Transferem alquilas (como metil, etil) para algum local do DNA (como N7 da guanina ou N3 da adenina)

  • Podem afetar a integridade da cadeia.

    • Alquilação do N7 da guanina pode desestabilizar a ligação glicosídica, levando à depurinação.

    • Alquilação no O6 da guanina pode causar pareamento incorreto de bases, como G pareando com T (transversão G:C → A:T)

7. Quebras de Fita Dupla (Double-strand break)

  • Ruptura completa da dupla hélice.

  • Um dos tipos de dano mais graves, podendo levar à morte celular se não for reparado corretamente.

8. Intercalantes (Acridinas)

  • Moléculas planas que se inserem entre as bases do DNA.

  • Provocam distorção na hélice e mutações durante a replicação.

9. Crosslink DNA-DNA (Alquilantes bifuncionais)

  • Ligações covalentes entre as duas fitas do DNA.

  • Impede a separação das fitas, bloqueando a replicação.

10. Crosslink DNA-proteína (Raios X, alquilantes bifuncionais)

  • Ligações covalentes anormais entre DNA e proteínas, impedindo a separação da hélice.

  • Interfere na transcrição e replicação.

Importância da Nutrição

  • Antioxidantes naturais ajudam a prevenir lesões por radicais livres.

  • Vitaminas do complexo B (especialmente folato, B6, B12) são essenciais para a síntese e reparo do DNA.

  • Compostos bioativos vegetais (sulforafano, flavonoides, carotenoides) modulam enzimas de detoxificação.

  • Minerais como zinco e selênio são cofatores de enzimas reparadoras e antioxidantes.

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

D-2-hidroxiglutarato e os Oncometabólitos: Quando o Metabolismo gera o Câncer

A relação entre o metabolismo e o câncer tem ganhado grande atenção na ciência moderna. Um dos exemplos mais intrigantes dessa conexão é o papel dos oncometabólitos, especialmente o D-2-hidroxiglutarato (D-2HG), uma substância capaz de transformar a bioquímica celular e impulsionar o desenvolvimento de tumores. Mas como uma simples molécula pode ter tanto poder?

A origem da história: acidúria 2-hidroxiglutarática

Já em 1997, pesquisadores observaram que crianças com uma condição metabólica rara chamada acidúria 2-hidroxiglutarática apresentavam uma forte predisposição ao desenvolvimento de tumores cerebrais. Essa doença hereditária é causada por mutações nas enzimas que degradam o 2-hidroxiglutarato, levando ao acúmulo dessa substância no corpo.

Embora essa predisposição ao câncer tenha sido inicialmente considerada secundária diante dos graves sintomas neurológicos da doença — como convulsões, hipotonia e atraso no desenvolvimento —, tudo mudou com a publicação de um estudo revolucionário por Dang e colaboradores (2009).

Esse estudo demonstrou que mutações no gene IDH1 (isocitrato desidrogenase 1), comuns em certos cânceres cerebrais, levavam à produção anormal de D-2HG. Com isso, nasceu o conceito de oncometabólito, um metabólito cuja acumulação promove ativamente a oncogênese.

Como o D-2-hidroxiglutarato promove o câncer?

Em células saudáveis, a enzima IDH1 transforma isocitrato em α-cetoglutarato (α-KG) no ciclo de Krebs. Porém, mutantes IDH1 ou IDH2 adquirem uma função anormal: convertem α-KG em D-2HG, utilizando NADPH como cofator.

O acúmulo de D-2HG causa vários efeitos pró-tumorais:

  • 🧬 Inibição de dioxigenases α-KG-dependentes, incluindo TET2 e desmetilases de histonas → hipermetilação epigenética.

  • Silenciamento de genes supressores tumorais e ativação de oncogenes.

  • 🚫 Bloqueio da diferenciação celular, mantendo as células em estado progenitor, proliferativo.

  • 🔁 Ativação da via mTOR e estabilização do HIF-1α, promovendo crescimento tumoral e adaptação à hipóxia.

Em resumo, o D-2HG transforma o ambiente intracelular, promovendo proliferação, inibição de apoptose e escape da regulação epigenética — a receita perfeita para a formação de tumores.

Outros oncometabólitos além do D-2HG

Com os avanços da metabolômica, vários outros oncometabólitos foram descobertos nos últimos anos:

Essas moléculas agem de formas similares: inibem enzimas epigenéticas, alteram sinalização celular e promovem reprogramação metabólica.

Tratamento medicamentoso: Inibidores de IDH

A descoberta do papel oncogênico de D-2HG levou ao desenvolvimento de terapias-alvo revolucionárias:

  • Ivosidenibe (Tibsovo®)

    • Alvo: IDH1 mutado

    • Indicação: Leucemia mieloide aguda (LMA), colangiocarcinoma intra-hepático

    • Mecanismo: Bloqueia a produção de D-2HG, restaurando a diferenciação celular

    • Via: Oral

  • Enasidenibe (Idhifa®)

    • Alvo: IDH2 mutado

    • Indicação: LMA recidivada ou refratária

    • Via: Oral

Esses medicamentos atuam diretamente na enzima mutante, reduzindo D-2HG e seus efeitos epigenéticos. Ensaios clínicos também estão em andamento para uso em gliomas e outros tumores IDH-mutados.

E a nutrição, pode ajudar?

Embora não exista dieta capaz de reverter diretamente a mutação IDH ou bloquear a produção de D-2HG, a nutrição pode oferecer apoio complementar:

Estratégias possíveis:

  • Antioxidantes: Vitamina C, polifenóis, N-acetilcisteína

  • Suporte mitocondrial: Coenzima Q10, ácido alfa-lipoico

  • Estimulação de vias reguladoras: Dietas cetogênicas (em pesquisa para gliomas)

Vale lembrar que essas abordagens não substituem o tratamento médico, mas podem auxiliar na regulação do estresse oxidativo e metabolismo celular.

Conclusão

O D-2-hidroxiglutarato é muito mais que um simples subproduto metabólico: ele é uma molécula que redefine o papel do metabolismo na biologia do câncer. Sua descoberta como oncometabólito mudou nossa compreensão da oncogênese e abriu portas para terapias direcionadas inovadoras.

Da observação de uma rara doença metabólica infantil à criação de medicamentos que bloqueiam sua produção, a história do D-2HG exemplifica como genética, bioquímica e medicina translacional podem se unir na luta contra o câncer.

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Variantes Genéticas Cruciais para a Saúde da Gestante

Durante a gestação, o corpo feminino passa por transformações fisiológicas profundas que envolvem adaptações metabólicas, hormonais, cardiovasculares e imunológicas. Avanços recentes da genética permitiram identificar polimorfismos (variantes genéticas) que influenciam diretamente essas adaptações, ajudando a entender o risco aumentado de condições como diabetes mellitus gestacional (DMG), hipertensão, disfunções endócrinas e ganho de peso excessivo. Variações de genes podem modificar a saúde da gestante. Contudo, muitas variações podem ser moduladas para prevenção de problemas para mãe e bebê.

Genes Cardíacos

GNB3 (rs5443)

  • Participa da sinalização de receptores acoplados a proteínas G.

  • A variante T está associada a maior risco de hipertensão gestacional e retenção de peso pós-parto.

  • Modulação sugerida: atividade física regular reduz os efeitos adversos desta variante.

Genes do Pâncreas e Metabolismo Glicêmico

TCF7L2 (rs7903146, rs4506565, rs12255372)

  • Fortemente associado à secreção de insulina e DMG.

  • Genótipo TT pode aumentar em até 5x o risco de DMG.

HHEX (rs5015480)

  • Envolvido no desenvolvimento pancreático e regulação de insulina/somatostatina.

KCNQ1 (rs2237892)

  • Afeta canais de potássio em células beta pancreáticas, com impacto na secreção de insulina.

Modulação clínica: monitoramento precoce da glicemia e intervenções como dieta personalizada, uso de incretinas e insulina, quando necessário.

Genes do Tecido Adiposo

ADIPOQ (rs2241766)

  • Codifica adiponectina, hormônio anti-inflamatório e sensibilizador da insulina.

FTO (rs9939609)

  • Associado ao aumento de apetite, obesidade e resistência insulínica.

MIF (rs755622)

  • Participa da resposta inflamatória; sua expressão elevada pode impactar negativamente o ambiente uterino.

Modulação: dieta equilibrada e prática de atividade física ajudam a neutralizar os efeitos do FTO e ADIPOQ. Abordagens anti-inflamatórias podem ser consideradas para MIF.

Genes da Placenta

SHBG (rs6257)

  • Regula a biodisponibilidade de hormônios sexuais, com impacto nos níveis de estrogênio e testosterona.

VEGF (rs2146323 e rs3025039)

  • Fator de crescimento vascular essencial para angiogênese placentária.

Implicação clínica: variantes que afetam esses genes podem prejudicar o fluxo sanguíneo fetal. Avaliação Doppler e suporte vascular podem ser indicados.

Genes do Músculo Esquelético

DIO2 (rs225014)

  • Enzima que ativa o hormônio tireoidiano (conversão de T4 em T3), com impacto no metabolismo.

Modulação: verificação de função tireoidiana materna e suplementação de iodo ou T3 em casos selecionados.

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/