O que gera o autismo regressivo?

Essa foi a pergunta de uma mãe semana passada durante a consulta. A regressão no desenvolvimento acontece quando uma criança aparentemente típica perde habilidades sociais, de linguagem ou motoras e depois é diagnosticada com autismo. Costuma ocorrer entre 1 e 2 anos, um período crucial para o desenvolvimento da linguagem, socialização e interação com o ambiente.

Mas por que acontece?

A pesquisa atual sugere uma interação entre vulnerabilidades genéticas e fatores ambientais precoces.

1. Fatores genéticos

O autismo tem forte base genética, com centenas de genes associados. Crianças podem carregar mutações genéticas ou variantes que não causam sintomas sozinhas, mas que aumentam a sensibilidade a outros fatores. Em casos de regressão, é possível que essas variantes estejam ligadas a desregulação do sistema imunológico ou sináptico.

2. Fatores neurobiológicos

Diferenças em processamento cerebral e conectividade neuronal já estão presentes antes do nascimento ou nos primeiros meses de vida. O cérebro da criança pode passar por uma “fase crítica” em que qualquer insulto ambiental pode desencadear a perda de habilidades já adquiridas.

3. Inflamação e sistema imunológico

Alguns estudos sugerem que inflamações cerebrais ou autoimunidade podem ter papel na regressão. Infecções virais, exposição pré-natal a estresse ou problemas no parto podem ativar o sistema imune de forma anormal. Em alguns casos, há indícios de respostas imunológicas exageradas que afetam o desenvolvimento neurológico.

4. Fatores ambientais e epigenéticos

Poluição do ar, pesticidas, desnutrição pré-natal, estresse materno extremo ou uso de certos medicamentos durante a gravidez podem influenciar o risco. Esses fatores não “criam” autismo sozinhos, mas podem modificar a expressão dos genes, criando uma combinação perigosa para uma criança vulnerável.

Disfunção mitocondrial

Mitocôndrias são nossas usinas de energia fornecem combustível para o corpo funcional. Estudos mostram qu 5 a 10% das crianças com TEA possuem doenças mitocondriais. Em crianças com TEA regressivo é mais comum a disfunção mitocondrial (até 39%). Os fatores 1 a 4 contribuem para a disfunção mitocondrial.

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Falta de nutrientes comprometem defesas no autismo

​O artigo "Decreased cortical Nrf2 gene expression in autism and its relationship to thiol and cobalamin status" explora a relação entre o estresse oxidativo, a expressão do gene Nrf2 e o metabolismo de tiol e cobalamina (vitamina B12) em indivíduos com transtorno do espectro autista (TEA).​

Principais Descobertas

  • Redução da expressão do gene Nrf2: Foi observada uma diminuição na expressão do gene NFE2L2, que codifica o fator de transcrição Nrf2, no córtex frontal de indivíduos com TEA. O Nrf2 é essencial para a ativação de genes antioxidantes que protegem contra o estresse oxidativo. ​

  • Alterações nos níveis de cobalamina: Os níveis de metilcobalamina (MeCbl) e da cobalamina total estavam positivamente correlacionados com a expressão do NFE2L2, enquanto a hidroxocobalamina (OHCbl) apresentava correlação negativa. Isso sugere que formas ativas da vitamina B12 podem influenciar positivamente a atividade antioxidante mediada pelo Nrf2. ​

  • Disfunção no metabolismo de tiol: Metabólitos como metionina, S-adenosilmetionina (SAM), S-adenosil-homocisteína (SAH) e cistationina mostraram correlação positiva com a expressão do NFE2L2, enquanto a homocisteína apresentou correlação negativa. Esses resultados indicam uma possível disfunção nas vias de metilação e transulfuração em indivíduos com TEA. ​

  • Associação com genes de processamento de cobalamina: A expressão de genes regulados pelo Nrf2 também correlacionou-se com genes envolvidos no tráfego e processamento intracelular da cobalamina, como MMADHC e MTRR, destacando uma interconexão entre o metabolismo da vitamina B12 e a resposta antioxidante. ​

Implicações

Essas descobertas sugerem que a diminuição da atividade do Nrf2 pode contribuir para o estresse oxidativo observado em indivíduos com TEA, possivelmente devido a deficiências na cobalamina ativa e disfunções nas vias de metilação e transulfuração. Intervenções que visem melhorar o status da cobalamina e restaurar a função do Nrf2 podem representar abordagens terapêuticas promissoras para mitigar os efeitos do estresse oxidativo no TEA.​

Além disso, estudos anteriores indicam que tratamentos com metilcobalamina e ácido folínico podem melhorar o metabolismo do glutationa e o comportamento adaptativo em crianças com TEA, reforçando a importância de abordar as disfunções metabólicas associadas ao transtorno. Além disso, vários compostos bioativos dos alimentos ajudam a modular a via Nrf2, incluindo curcumina do açãfrão, sulforafano do brócolis, resveratrol das uvas roxas, genisteína (tofu, tempeh, edamame), ácido carnósico (alecrim, sálvia), EGCG do chá verde.

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Glutamina e ansiedade

Do ponto de vista Bioquímico, a Ansiedade está associada a alterações nos níveis de Neurotransmissores e Hormônios (dentre outras coisas). A alimentação tem um papel muito importante na saúde neuronal e mental. Nutrientes específicos apoiam, previnem e corrigem alterações metabólicas associadas a diversos transtornos mentais.

E, enquanto existem nutrientes que ajudam a relaxar o cérebro (como magnésio), outros compostos podem excitar o cérebro. É o caso da glutamina em alguns pacientes.

A glutamina é um aminoácido extremamente abundante e versátil. Pode ser convertida em glutamato por ação da glutaminase. O glutamato, por sua vez, pode ser convertido em alfacetoglutarato (intermediário do ciclo de Krebs) pela ação da glutamato desidrogenase (GDH). Essas reações são fundamentais no metabolismo energético, especialmente em tecidos com alta demanda como intestino, fígado e cérebro.

Quando ingerimos glutamina pela dieta ou suplementação, a maior parte é usada pelas células do intestino para manutenção da própria integridade estrutural. O excedente que chega ao fígado será usado nas reações de transaminação (AST/ALT) ou convertido em energia. Muito pouco da glutamina chega intacta ao cérebro.

Aminoácidos que entram no ciclo de krebs via alfa-cetoglutarato

Suplementação de glutamina é geralmente segura, mas precisamos ter cautela em algumas situações

Como a glutamina tem muitos destinos antes de atingir o SNC, o risco de excitação glutamatérgica central é baixo na maioria das pessoas. Contudo, devemos ter cautela em algumas situações, incluindo:

TEA (Transtorno do Espectro Autista)

Polimorfismos genéticos podem afetar a expressão de transportadores de glutamato (EAATs). Isso dificulta a recaptação do glutamato pelos astrócitos, levando ao seu acúmulo sináptico.

Resultado: Excitotoxicidade e piora dos sintomas.

Conduta sugerida: Evitar glutamina → usar glicina ou colágeno para reparo intestinal.

Ansiedade / Enxaqueca:

O excesso de glutamato pode ser resultado da neuroinflamação e estresse oxidativo, não necessariamente de má função genética. Aqui, o problema é a diminuição da GAD (glutamato descarboxilase) ou da recaptação astrocítica.

Conduta sugerida: Reduzir neuroinflamação e melhorar metabolismo mitocondrial.

Hiperinsuinemia

A enzima glutamato desidrogenase (GDH) converte glutamato em alfacetoglutarato. Alta insulina e excesso de acetil-CoA levam à produção de malonil-CoA. A malonil-CoA inibe a GDH.

Resultado: glutamato não é convertido em alfacetoglutarato → ele se acumula. Isso é crítico, pois excesso de glutamato ativa receptores NMDA, gerando excitação neuronal exagerada.

A dieta low carb (incluindo a cetogênica) tem sido usada em casos de pacientes com transtorno de ansiedade e transtorno bipolar que não respondem bem a medicação, uma vez que um subgrupo parece ter alterações do metabolismo glicolítico cerebral. Também podemos pensar na modulação do receptor NMDA:

  • Suplemenação de magnésio: inibidor fisiológico do receptor NMDA. Em condições normais, o magnésio se liga ao canal do receptor NMDA, bloqueando a entrada de cálcio e sódio. Quando o nível de magnésio é baixo, o receptor NMDA se torna mais propenso à ativação, o que pode levar à excitotoxicidade e danos neuronais, especialmente em doenças neurodegenerativas.

  • Ácidos graxos ômega-3 (EPA e DHA): encontrados em peixes e outros alimentos, têm efeitos protetores no cérebro. Esses ácidos graxos podem modulação positivamente a função do receptor NMDA, ajudando na neuroplasticidade e no fortalecimento das sinapses. Eles também podem reduzir a inflamação no cérebro, que está associada à disfunção do NMDA.

  • Vitamina E: tem propriedades antioxidantes e pode proteger os neurônios contra o estresse oxidativo, que está relacionado ao mau funcionamento do receptor NMDA e à neurodegeneração. O estresse oxidativo pode afetar negativamente a função do receptor e, consequentemente, o aprendizado e a memória.

  • Zinco: desempenha um papel importante na regulação do receptor NMDA. Em níveis normais, ele pode modular a atividade do receptor, enquanto o excesso de zinco pode resultar em disfunção e neurotoxicidade. O zinco também é importante para a sinalização celular e a plasticidade sináptica, que são mediadas pelo NMDA. No caso de ansiedade recomenda-se  manter niveis de zinco próximos de 100 no exame de sangue.

  • Curcumina: principal composto bioativo da cúrcuma, tem efeitos anti-inflamatórios e antioxidantes que podem afetar positivamente a função do receptor NMDA. Ela pode ajudar a reduzir a ativação excessiva do receptor e a excitotoxicidade, frequentemente observada em doenças como Alzheimer.

  • Fosfatidilserina: essencial para a função cognitiva e pode ter efeitos moduladores sobre o receptor NMDA. A fosfatidilserina, em particular, pode ajudar na plasticidade sináptica mediada pelo NMDA, favorecendo processos de aprendizagem e memória.

  • Vitamina D: também está envolvida na regulação do receptor NMDA. Ela pode promover a expressão de genes relacionados à plasticidade sináptica e ao funcionamento do receptor, além de influenciar a ativação do NMDA de maneira que favoreça o equilíbrio entre excitação e inibição no cérebro.

  • N-acetilcisteína: precursor do glutationa, um potente antioxidante, e pode ajudar a regular a atividade do receptor NMDA, especialmente em condições de estresse oxidativo ou excitotoxicidade, como em doenças neurodegenerativas.

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/