Como as enzimas reduzem a inflamação?

As enzimas são usadas para facilitar a digestão, mas também possuem propriedades anti-inflamatórias e podem ser úteis para aliviar a dor, o inchaço e acelerar a recuperação de lesões. Algumas das mais populares incluem:

1. Serrapeptase

Derivada da bactéria Serratia, encontrada no intestino do bicho-da-seda. Ajuda a reduzir a inflamação, dissolver o muco e quebrar tecidos fibrosos. Dissolve o excesso de muco e facilita sua eliminação, ajudando em condições como sinusite e bronquite. Também usada na artrite e recuperação pós-cirúrgica. Pode ser combinada com a nattokinase, extraída do natto (soja fermentada), que também ajuda a dissolver coágulos e melhorar a circulação, reduzindo o risco de trombose e acidente vascular cerebral (AVC), também conhecido como derrame.

2. Bromelaína

Extraída do abacaxi, possui fortes propriedades anti-inflamatórias. Auxilia na digestão de proteínas, reduz inchaço e hematomas. Pode ser usada para dores musculares, artrite e alergias. Suprime citocinas inflamatórias e modula a resposta imune.

3. Papaína

Encontrada no mamão, ajuda na digestão de proteínas e tem efeitos anti-inflamatórios. Pode ser útil para artrite, lesões e problemas digestivos. Assim como as outras enzimas melhora a digestão e evita que partículas de alimentos mal digeridos desencadeiem inflamação no intestino, como ocorre na síndrome do intestino irritável.

4. Protease (ou Enzimas Proteolíticas)

Grupo de enzimas que quebram proteínas e ajudam a reduzir inflamações. Encontradas em alimentos como abacaxi (bromelaína) e mamão (papaína). Auxiliam no tratamento de lesões, recuperação muscular e digestão.

5. Lipase

Enzima que digere gorduras e também possui efeitos anti-inflamatórios no organismo. Também auxilia na absorção das vitaminas lipossolúveis (A, D, E, K) e contribui para a saúde cardiovascular.

6. Amilase

Ajuda na digestão de carboidratos e pode ter efeitos calmantes sobre a inflamação. Ao acelerar a digestão, estas enzimas todas evitam fermentação, excesso de gases, desconforto e dor. Também ajuda na regulação dos níveis de açúcar no sangue.

Essas enzimas estão presentes naturalmente em alguns alimentos, mas também podem ser consumidas como suplementos. Baixe aqui meu guia de enzimas digestivas.

Precisa de ajuda? Marque aqui sua consulta de nutrição online.

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Regressão e encefalite autoimune

A encefalite autoimune (EA) é uma condição rara, caracterizada por uma inflamação no cérebro causada por uma resposta imune do corpo que ataca suas próprias células, levando a uma série de sintomas neurológicos.

A presença de anticorpos específicos, como aqueles contra a proteína-2 associada à contactina (CASPR2), foi associada à encefalite autoimune. Títulos mais altos de anticorpos e achados de ressonância magnética podem auxiliar no diagnóstico e podem se correlacionar com a probabilidade de regressão dos sintomas após o tratamento [1].

Um estudo envolvendo crianças com encefalite autoimune descobriu que as características da função imune, particularmente a proporção CD4/CD8, se correlacionavam com o prognóstico. Os fatores de prognóstico ruim incluíam idade jovem, distúrbio de consciência e função imune anormal durante a remissão, indicando que as respostas imunes podem influenciar os resultados da regressão e recuperação da doença [2].

Encefalite autoimune no autismo

A relação entre encefalite autoimune (EA) e transtorno do espectro autista (TEA) é uma área emergente de pesquisa. Alguns estudos sugerem que a EA pode atuar como um agente causador do TEA ou produzir sintomas que se assemelham ao autismo. Isso é particularmente observado em casos em que o autismo se apresenta com padrões de regressão ou início atípico, indicando que a EA deve ser considerado em diagnósticos diferenciais [3].

A presença de autoanticorpos anti-receptor de N-metil-D-aspartato (anti-NMDAR), pode levar a sintomas associados ao autismo. Esses autoanticorpos afetam a neurotransmissão do glutamato, que é crucial para a função cerebral normal [4].

A EA pode se manifestar com sintomas cognitivos, psiquiátricos e neurológicos, que podem se sobrepor a traços semelhantes ao autismo. Essa sobreposição pode complicar o diagnóstico, tornando essencial investigar condições autoimunes em pacientes diagnosticados com TEA, especialmente quando os sintomas psiquiátricos são proeminentes [5].

Alterações genéticas, doenças autoimunes, infecções virais, tumor cerebral, desregulação do sistema imune são as principais causas das doenças autoimunes. No autismo, a genética alterada parece gerar maior sensibilidade. E quando as barreiras estão alteradas (especialmente intestinal e hemato-encefálica) problemas podem surgir com maior frequência. Me perguntam muito se alergias alimentares podem ser gatilhos para a encefalite.

Alergias alimentares não são uma causa direta de encefalite autoimune. No entanto, existem algumas considerações importantes sobre como as reações alérgicas podem afetar o sistema imunológico e, em casos raros, levar a alterações encefálicas.

As alergias alimentares envolvem uma resposta do sistema imunológico a certos alimentos, geralmente proteínas presentes em alimentos como amendoim, leite, ovos, soja, etc. Em casos de reações alérgicas muito intensas, pode haver alterações no sistema nervoso, como convulsões ou alterações de consciência, mas essas manifestações são muito mais raras. Alguns artigos falam de “autismo adquirido” para a hipótese de alterações comportamentais geradas pela encefalite, especialmente quando as mudanças são rápidas e há regressão [6].

As alergias alimentares envolvem uma resposta do sistema imunológico a certos alimentos, geralmente proteínas presentes em alimentos como amendoim, leite, ovos, soja, etc. Em algumas pessoas, essa resposta pode ser bastante severa, levando a uma reação alérgica grave conhecida como anafilaxia.

Certos alimentos e aditivos alimentares podem, em algumas pessoas, contribuir para um estado inflamatório geral no corpo, o que pode potencialmente afetar o cérebro. Em condições como a encefalopatia causada por inflamação sistêmica ou por distúrbios metabólicos, pode haver efeitos neurológicos, mas não se trata de uma encefalite autoimune clássica.

Um ponto importante é que estudos mostram a correlação entre alergias intestinais e alterações na barreira intestinal [7], assim como na barreira hematoencefálica (BHE). Além disso, algumas evidências apontam que pessoas com alergias alimentares podem ter um risco maior de distúrbios neurológicos, como problemas cognitivos ou comportamentais, embora a relação causal ainda não tenha sido completamente estabelecida [8].

O comprometimento da BHE pode permitir que patógenos e células inflamatórias entrem no sistema nervoso central (SNC) gerando neuroinflamação. Estudos mostram a ativação da micróglia, contribuindo para a severidade dos sintomas, apesar de não podermos dizer que seja uma encefalite autoimune. Micróglia são células do SNC que desempenham um papel fundamental na defesa do cérebro e da medula. Existem evidências de que a microglia está ativada no TEA [9].

A detecção precoce da encefalite autoimune é crítica, pois o tratamento oportuno pode evitar consequências de longo prazo e diagnósticos incorretos. Tratamentos como terapia imunológica podem melhorar os resultados para aqueles com sintomas relacionados à autoimunidade. Outras estratégias precisam ser considerados em outras causas não autoimunes das encefalite.

Referências:

1) CG Bien et al. Anti-contactin-associated protein-2 encephalitis: relevance of antibody titres, presentation and outcome. European journal of neurology (2016). https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/27786401/

2) JY Huang et al. Immune characteristics of children with autoimmune encephalitis and the correlation with a short-term prognosis. Italian journal of pediatrics (2022). https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/35698204/

3) P Whiteley et al. Autoimmune Encephalitis and Autism Spectrum Disorder. Frontiers in psychiatry (2022). https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/34975576/

4) RF Tzang et al. Autism Associated With Anti-NMDAR Encephalitis: Glutamate-Related Therapy. Frontiers in psychiatry (2019). https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/31293459/

5) D Endres et al. Novel Antineuronal Autoantibodies With Somatodendritic Staining Pattern in a Patient With Autoimmune Psychosis. Frontiers in psychiatry (2020). https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/32848899/

6) P Whiteley et al. Autoimmune Encephalitis and Autism Spectrum Disorder. Front Psychiatry. 2021 Dec 17;12:775017. doi: 10.3389/fpsyt.2021.775017. PMID: 34975576; PMCID: PMC8718789.

7) H Wang et al. Advance in studies on food allergy mechanism based on gut barrier. Zhongguo Zhong Yao Za Zhi. 2015 Apr;40(7):1240-3. Chinese. PMID: 26281539.

8) G. Vitaliti et al. Parasympathetic nervous system involvement in food allergy: description of a paediatric case. J Biol Regul Homeost Agents. 2016 Oct-Dec;30(4):1137-1140. PMID: 28078865.

9) Rodriguez, & Kern. Evidence of microglial activation in autism and its possible role in brain underconnectivity. Neuron Glia Biol. 2011 May;7(2-4):205–213. doi: 10.1017/S1740925X12000142. PMCID: PMC3523548  PMID: 22874006

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Desregulação do eixo HPA no autismo

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) apresenta uma gama de desafios no comportamento e na adaptação ao ambiente, frequentemente resultando em dificuldades de regulação emocional e respostas desproporcionais ao estresse. Esses comportamentos não são apenas "fora de controle" por conta do TEA; eles têm uma base bioquímica, particularmente no que diz respeito ao eixo Hipotálamo-Pituitária-Adrenal (HPA), um dos sistemas mais importantes na regulação do estresse.

O Eixo HPA: O Corpo e o Estresse

O eixo HPA é responsável pela liberação de cortisol, o principal hormônio do estresse, que tem a função de preparar o organismo para reagir a situações de ameaça. Em indivíduos típicos, esse sistema geralmente responde de maneira eficaz ao estresse, ativando-se rapidamente e se normalizando após um período. No entanto, em crianças com TEA, a regulação desse sistema apresenta padrões distintos e paradoxais.

1. Níveis Basais de Cortisol:

Em crianças com TEA, especialmente aquelas com deficiência intelectual severa, os níveis basais de cortisol são significativamente mais baixos (até 29% mais baixos). Isso sugere uma espécie de "exaustão" ou uma resposta mais preguiçosa do eixo HPA em repouso. Essa baixa produção de cortisol pode ser indicativa de uma maior vulnerabilidade ao estresse. De fato, crianças com níveis baixos de cortisol em repouso podem ter maior sensibilidade ao estresse e dificuldades de adaptação, o que reforça a ideia de que esses indivíduos estão constantemente “preparados” para reagir de forma intensa a novos estressores, mesmo quando não há uma ameaça imediata.

Níveis mais baixos de cortisol no TEA (Corbett et al., 2006)

2. Comprometimento da Resposta ao Despertar (CAR):

O aumento do cortisol ao acordar, conhecido como Resposta ao Despertar (CAR), é crucial para preparar o corpo para as demandas do dia. Algumas crianças autistas têm dificuldades significativas nesse processo. Alguns estudos (mas não todos) mostram que pessoas com TEA não apresentam o aumento esperado de cortisol ao despertar, o que compromete a capacidade de se adaptar a transições e imprevistos ao longo do dia. Isso pode explicar por que muitos autistas demonstram maior resistência à mudança ou dificuldades em lidar com novas rotinas, já que o corpo não está adequadamente preparado para o que vem a seguir (Hadwin et al., 2019).

3. Resposta ao Estresse Agudo:

Apesar dos níveis começarem mais baixos, quando essas crianças enfrentam estressores agudos, como um "meltdown" (colapso emocional), a resposta do cortisol é desproporcional. Estudos mostram que os picos de cortisol nessas situações podem ser até 3,2 vezes maiores (0,426 μg/dL vs. 0,132 μg/dL) do que em crianças neurotípicas. No entanto, o tempo de recuperação do cortisol também é muito mais prolongado — cerca de 58% mais lento. Isso implica que, além de reagirem de maneira exagerada ao estresse, as crianças com TEA não conseguem retornar rapidamente a um estado de calma, o que pode resultar em ciclos de estresse prolongados e comportamentos repetitivos.

4. Alterações no Ritmo Circadiano:

O ritmo circadiano, que regula o ciclo sono-vigília, também é afetado em crianças com TEA. Essas crianças apresentam uma variação muito maior na inclinação do cortisol entre a manhã e a noite (38% mais variação), o que pode causar um descompasso em sua capacidade de regular a energia e o foco ao longo do dia. Além disso, um subgrupo de crianças autistas apresentam um aumento paradoxal do cortisol à noite, interferindo na qualidade do sono e agravando problemas de comportamento (Corbett et al., 2008). Alterações nos genes CLOCK, nos níveis de melatonina e no eixo HPA influenciam estas alterações no ritmo circadiano no TEA (Dell'Osso et al., 2022).

5. O Padrão Hormonais em Crianças com Comportamentos Estereotipados:

Em crianças com TEA que apresentam comportamentos estereotipados (como balançar o corpo, bater as mãos, etc.), a relação com o cortisol é ainda mais complexa. Crianças com déficit intelectual (DI) e TEA mostram menos cortisol, sugerindo que os comportamentos repetitivos podem funcionar como uma forma de autorregulação, uma tentativa do corpo de controlar o estresse interno. Em contraste, crianças com apenas DI, sem o TEA, podem mostrar um aumento no cortisol, o que indica que comportamentos repetitivos nessas crianças estão associados a uma maior ativação do sistema de estresse (Dufour, Lanovaz, & Plusquellec, 2022; Ohtsubo et al., 2024).

6. Hiperresponsividade Sensorial e o Esgotamento HPA:

Muitas crianças autistas apresentam hiperresponsividade sensorial — uma resposta exagerada a estímulos como luzes fortes, sons altos ou toques inesperados. Estudos mostram que essas crianças também demonstram um esgotamento mais rápido do eixo HPA, com uma queda de cortisol mais acentuada após a exposição a estressores. Isso sugere que essas crianças estão constantemente em um estado de alerta elevado, o que pode levar a uma sobrecarga do sistema de estresse e dificultar sua recuperação emocional. Em adultos com TEA, aqueles com maior grau de neuroticismo experimentam maior estresse, especialmente quando em ambientes novos e pessoas diferentes (van Oosterhout et al., 2022).

Como regular o eixo HPA no TEA?

Esses dados mostram que os comportamentos de crianças com TEA não são apenas respostas imprevisíveis. São manifestações de desequilíbrios bioquímicos mensuráveis, causados por disfunções no eixo HPA e em outros sistemas hormonais.

Regular o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HPA) e os níveis de cortisol em indivíduos com autismo pode ser complexo, mas vários estudos fornecem insights sobre possíveis abordagens.

Intervenções que reduzem o estresse e a ansiedade podem ajudar a regular os níveis de cortisol. Técnicas como terapia cognitivo-comportamental (TCC), atenção plena e estratégias de relaxamento podem ser benéficas no gerenciamento de respostas ao estresse (Corbett, & Simon, 2014).

A atividade física regular demonstrou ajudar a reduzir os níveis de cortisol e melhorar o gerenciamento geral do estresse. Incentivar atividades físicas estruturadas pode dar suporte à regulação do eixo HPA (Riis et al., 2024).

Uma dieta balanceada que apoie a saúde geral também pode desempenhar um papel no gerenciamento do estresse e dos níveis de cortisol. Intervenções nutricionais adaptadas às necessidades de indivíduos com autismo podem ajudar nesse sentido. Probióticos, ginseng, cetose ajudam a ativar o eixo HPA (Ryan et al., 2018; Wu et al., 2022).

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/