Avaliação do status de glutationa

A glutationa é um tripeptídeo formado por glutamato, cisteína e glicina, e desempenha um papel crucial como antioxidante, protegendo as células contra o estresse oxidativo, mantendo a função mitocondrial e modulando vários processos celulares.

Como é feita a avaliação de glutationa?

  1. Medição direta de glutationa: A metabolômica permite quantificar os níveis de glutationa reduzida (GSH) e glutationa oxidada (GSSG) no sangue, urina ou outros fluidos biológicos. Esses níveis refletem o estado antioxidante do corpo e podem indicar um desequilíbrio entre as espécies redox.

    Vantagens:

    • Mede diretamente os níveis de glutationa reduzida (GSH) e glutationa oxidada (GSSG) no sangue.

    • Reflete o estado atual do equilíbrio redox e da capacidade antioxidante do organismo.

    • Melhor para avaliar estresse oxidativo agudo e reserva funcional de glutationa.

    Desvantagens:

    • A glutationa tem uma meia-vida curta e pode sofrer degradação rápida, o que exige um manuseio rigoroso da amostra.

    • Pode não refletir a produção e o metabolismo a longo prazo, pois mede um momento específico no tempo.

  2. Perfis de oxidação e redução: A glutationa participa ativamente do processo de oxidação-redução (redox). A avaliação do perfil de oxidação e redução da glutationa ajuda a entender melhor o nível de estresse oxidativo e a saúde celular. Isso pode ser importante para doenças relacionadas ao envelhecimento, doenças cardiovasculares, neurodegenerativas e câncer.

  3. Identificação de biomarcadores associados: A glutationa está intimamente relacionada com vários metabólitos e vias bioquímicas, incluindo aqueles associados ao ciclo do ácido ascórbico, ao metabolismo de ácidos graxos e à produção de energia. A metabolômica permite analisar a rede de interações de metabolitos relacionados, fornecendo uma visão mais completa do impacto do status da glutationa no metabolismo celular. Esses exames parecem avaliar o metabolismo da glutationa por meio da quantificação de metabólitos como glicina, α-hidroxibutírico, α-cetobutírico e ácido piruglutomático.

    Vantagens:

    • Analisa metabólitos como piruglutomato, α-cetobutirato e α-hidroxibutirato, que refletem a produção, reciclagem e degradação da glutationa.

    • Útil para identificar deficiências nutricionais e necessidades de cofatores (ex.: B3, B6, cisteína).

    • Reflete a função da glutationa ao longo do tempo, já que os metabólitos acumulam na urina.

    Desvantagens:

    • Não mede diretamente a glutationa disponível no corpo, mas sim os seus produtos metabólicos.

    • Pode ser influenciado por função renal e variações na hidratação, impactando a excreção urinária.

Interpretação geral do exame acima:

  1. Glicina (precursor da glutationa) está dentro do intervalo de referência, indicando que a disponibilidade desse aminoácido não é um fator limitante na síntese de glutationa.

  2. α-Hidroxibutírico está dentro do intervalo, sugerindo que o metabolismo associado à via da cisteína-glutationa não está excessivamente ativo.

  3. α-Cetobutírico elevado sugere um aumento na degradação da cisteína ou um possível déficit de B3 (niacina), que pode impactar a regeneração da glutationa.

  4. Ácido piruglutomático elevado indica um possível aumento na utilização da via do ciclo da glutationa, podendo sugerir estresse oxidativo ou uma necessidade aumentada de glutationa.

Tratamento

A depender da clínica do paciente podemos pensar em N-acetilcisteína, aminoácidos como glicina, serina, glutamina, selênio, a própria glutationa lipossomal. Além disso, é importante identificar o fator desencadeando do alto uso de glutationa (diabetes, resistência insulínica, doenças cardíacas, doenças autoimunes, infecções virais ou bacterianas, exposição à mofo, inflamações prolongadas (colite, doença de Crohn), metais pesados, exposição a pesticidas e produtos químicos industriais, uso de medicamentos que afetam o fígado (como paracetamol) ou consumo excessivo de álcool.

O próprio processo de envelhecimento também associa-se a danos oxidativos. Mas neste caso, a síntese de glutationa também fica comprometida. Doenças como asma podem aumentar o estresse oxidativo e a demanda por glutationa.

Por fim, existem alguns distúrbios genéticos que afetam a produção, a regeneração ou a função da glutationa, o que pode levar a uma maior demanda ou deficiência desse antioxidante no corpo. Exames genéticos complementares são necessários, quando existe esta suspeita. Abaixo estão alguns desses distúrbios genéticos:

1. Deficiência de Glutationa Redutase (GR)

  • A glutationa redutase é uma enzima crucial para a regeneração da glutationa após ela ser usada na neutralização de radicais livres. A deficiência dessa enzima pode prejudicar a reciclagem de glutationa, levando a níveis baixos de glutationa celular e a uma maior vulnerabilidade ao estresse oxidativo.

  • Sintomas: Pode causar fadiga, fraqueza muscular, e em alguns casos, problemas neurológicos devido ao acúmulo de radicais livres.

2. Deficiência de Glutationa S-Transferase (GST)

  • A glutationa S-transferase é uma enzima envolvida no processo de conjugação da glutationa com toxinas, facilitando sua excreção. A deficiência dessa enzima pode prejudicar a capacidade do organismo de desintoxicar e eliminar substâncias nocivas, o que resulta em uma maior exposição a toxinas.

  • Sintomas: A deficiência de GST pode ser associada a um aumento da susceptibilidade a doenças hepáticas, câncer e outras condições relacionadas ao acúmulo de toxinas.

3. Deficiência de Enzimas Envolvidas na Síntese de Glutationa (GCLC e GCLM)

  • O corpo produz glutationa através de uma série de reações bioquímicas, e as enzimas glutationa-cisteína ligase (GCLC) e glutationa-cisteína ligase moduladora (GCLM) são cruciais para a síntese de glutationa. Mutação ou disfunção nessas enzimas pode resultar em níveis baixos de glutationa.

  • Sintomas: Pode causar uma série de problemas de saúde, como defeitos no metabolismo celular, comprometimento do sistema imunológico, e maior propensão a doenças neurodegenerativas e cardiovasculares.

4. Síndrome de Alport

  • A síndrome de Alport é um distúrbio genético raro que afeta principalmente os rins, os olhos e os ouvidos. Embora seja mais conhecida por causar problemas renais e auditivos, ela também pode afetar os níveis de glutationa no corpo devido à disfunção renal e ao estresse oxidativo associado.

  • Sintomas: Perda auditiva, problemas renais e, em alguns casos, catarata e outras complicações oculares. O estresse oxidativo associado a essa condição pode aumentar a necessidade de glutationa.

5. Doenças Mitocondriais

  • Algumas doenças mitocondriais podem afetar a produção de energia celular e levar ao aumento do estresse oxidativo. Como as mitocôndrias desempenham um papel importante na produção de radicais livres, doenças que afetam essas estruturas podem levar à deficiência de glutationa ou a uma maior necessidade de glutationa para proteger as células dos danos causados por radicais livres.

  • Exemplo: Doenças como a doença de Leber e síndrome de MELAS (encefalomiopatia mitocondrial, acidose láctica e acidente vascular cerebral) podem aumentar a demanda por glutationa.

6. Hemocromatose Hereditária

  • A hemocromatose hereditária é uma condição genética que causa acúmulo excessivo de ferro no corpo, o que pode levar a danos celulares devido ao estresse oxidativo. A glutationa ajuda a neutralizar os efeitos do excesso de ferro, e a deficiência dessa substância pode agravar a condição.

  • Sintomas: Fadiga, dor nas articulações, diabetes, problemas cardíacos e hepáticos. A deficiência de glutationa pode aumentar a gravidade dos danos causados pelo excesso de ferro.

7. Deficiência de G6PD (Glicose-6-Fosfato Desidrogenase)

  • A deficiência de G6PD é um distúrbio genético comum que afeta a capacidade dos glóbulos vermelhos de regenerar glutationa. A G6PD ajuda a proteger os glóbulos vermelhos contra danos oxidativos, e a deficiência dessa enzima pode levar a episódios de hemólise (destruição dos glóbulos vermelhos) em resposta a certos alimentos, medicamentos ou infecções.

  • Sintomas: A pessoa com deficiência de G6PD pode sofrer de anemia hemolítica aguda, especialmente quando exposta a fatores que aumentam o estresse oxidativo, como certos medicamentos (exemplo: aspirina, sulfonamidas), alimentos (como fava) ou infecções.

8. Ataxia-Telangiectasia

  • A ataxia-telangiectasia é uma doença genética rara que afeta o sistema nervoso, o sistema imunológico e aumenta a suscetibilidade a cânceres devido ao comprometimento da reparação do DNA. O estresse oxidativo exacerbado nessa condição pode aumentar a necessidade de glutationa para proteger as células contra danos.

  • Sintomas: Ataxia (falta de coordenação motora), telangiectasias (dilatação dos vasos sanguíneos), aumento do risco de infecções e cânceres, e problemas neurológicos.

Esses distúrbios genéticos podem afetar diretamente a função ou a produção de glutationa, o que resulta em uma maior necessidade desse antioxidante para proteger as células contra danos. Em muitos casos, o tratamento envolve o manejo do estresse oxidativo e a suplementação de glutationa ou precursores, como a cisteína, para melhorar os níveis desse antioxidante no corpo.

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Avaliação do metabolismo do triptofano

O metabolismo do triptofano é um processo bioquímico essencial para diversas funções fisiológicas, incluindo a produção de neurotransmissores, a modulação do sistema imunológico e a síntese de vitaminas. O triptofano é um aminoácido essencial obtido através da dieta e pode seguir três principais vias metabólicas:

  1. Via da Serotonina: Cerca de 1-2% do triptofano é convertido em serotonina e, posteriormente, em melatonina. Esta via é importante para o humor, o ciclo do sono e a regulação do apetite.

  2. Via da Quinurenina: Aproximadamente 95% do triptofano é metabolizado nesta via, produzindo intermediários como o ácido quinurênico e a quinolinato. Estes metabólitos influenciam a função neurológica e o sistema imunológico. Além disso, o quinolinato é um precursor do NAD⁺, essencial para o metabolismo energético celular.

  3. Metabolismo Microbiano Intestinal: No intestino, bactérias metabolizam o triptofano em indóis, que podem influenciar a resposta inflamatória e a integridade da barreira intestinal.

Exames de Metabolômica no Estudo do Metabolismo do Triptofano

A metabolômica é uma abordagem avançada que permite a detecção e quantificação de metabólitos em fluidos biológicos (sangue, urina, líquor, fezes). Os exames de metabolômica podem avaliar o metabolismo do triptofano, auxiliando no diagnóstico e monitoramento de doenças como:

  • Transtornos do humor (depressão, ansiedade) → Avaliação da serotonina e seus metabólitos.

  • Distúrbios neurodegenerativos (Alzheimer, Parkinson, Esclerose Múltipla) → Desbalanços na via da quinurenina.

  • Doenças autoimunes e inflamatórias → Alterações em metabólitos imunomoduladores.

  • Microbiota intestinal e saúde digestiva → Produção de indóis e seus efeitos no eixo intestino-cérebro.

A análise do metabolismo do triptofano no exame de urina a seguir revela algumas alterações importantes que podem ter repercussões clínicas e nutricionais.

Principais achados do exame:

  1. 5-Hidroxindolacético Ácido (5-HIAA) - ↓ Baixo (4.1 L, referência: 6.3 - 28.7 nmol/mg creatinina)

    • Este metabólito reflete a degradação da serotonina.

    • Um nível reduzido pode indicar produção deficiente de serotonina, levando a depressão, ansiedade, distúrbios do sono e fadiga.

  2. Antranílico Ácido - ↑ Elevado (20.9 H, referência: < 11.8 nmol/mg creatinina)

    • Está envolvido na via da quinurenina e pode indicar desvio do triptofano para uma resposta inflamatória.

    • Pode estar associado a estresse oxidativo, neuroinflamação e doenças autoimunes.

  3. Ácido Quinolínico - ↑ Elevado (129.9 H, referência: 9.0 - 105.7 nmol/mg creatinina)

    • Metabólito neurotóxico derivado da quinurenina, envolvido na ativação do receptor NMDA.

    • Níveis elevados estão ligados à neuroinflamação, distúrbios cognitivos, fadiga crônica e depressão.

  4. Ácido Picolínico - Indetectável (<DL, referência: < 4.0 nmol/mg creatinina)

    • Esse ácido tem papel protetor e auxilia na regulação do metabolismo do zinco.

    • Um nível reduzido pode estar relacionado a déficits imunológicos e menor conversão de triptofano em NAD+ (energia celular).

  5. Triptofano - Dentro da faixa normal (40.7 nmol/mg creatinina, referência: 10.5 - 68.7)

    • A quantidade total de triptofano não parece estar comprometida, mas seu metabolismo pode estar desregulado.

Repercussões clínicas:

  • Baixos níveis de serotonina → Risco aumentado de depressão, ansiedade, insônia, fadiga e alterações de humor.

  • Excesso de ácido quinolínico → Pode causar neuroinflamação, névoa mental, fadiga crônica e declínio cognitivo.

  • Desvio da via do triptofano para quinurenina → Indica possível ativação da resposta inflamatória crônica, podendo estar relacionada a doenças autoimunes, estresse oxidativo e envelhecimento acelerado.

Possível tratamento nutricional

1. Aumentar a conversão de triptofano em serotonina

✅ Suplementação de cofatores essenciais:

  • Vitamina B6 (P5P) – Essencial para a conversão de triptofano em serotonina. (Fontes: banana, grão-de-bico, frango, salmão)

  • Magnésio – Cofator para enzimas envolvidas na produção de serotonina e melatonina. (Fontes: sementes de abóbora, espinafre, amêndoas)

  • Zinco – Pode melhorar a conversão do triptofano na via serotoninérgica. (Fontes: ostras, carne vermelha, castanhas)

✅ Apoiar a síntese de serotonina com L-triptofano ou 5-HTP

  • 5-HTP (100-200 mg/dia, sob orientação médica) pode ajudar a aumentar os níveis de serotonina.

  • L-triptofano (500-1000 mg/dia antes de dormir) pode auxiliar na produção de serotonina e melatonina.

2. Reduzir a neuroinflamação e o metabolismo quinurenina → ácido quinolínico

✅ Modular a inflamação com antioxidantes e anti-inflamatórios naturais:

  • Resveratrol – Ajuda a reduzir a inflamação e o excesso de ácido quinolínico. (Fontes: uvas roxas, vinho tinto)

  • Curcumina (açafrão-da-terra) – Antioxidante potente que reduz neuroinflamação.

  • Ácidos graxos ômega-3 – Moduladores da inflamação cerebral. (Fontes: peixes gordurosos, sementes de linhaça e chia)

✅ Equilibrar a microbiota intestinal

  • Probióticos e prebióticos podem ajudar a regular a conversão de triptofano e reduzir a inflamação sistêmica.

3. Melhorar a via do ácido picolínico

✅ Apoiar a produção de NAD+ (fundamental para energia celular e função cognitiva):

  • Niacina (Vitamina B3) – Auxilia na conversão do triptofano em NAD+. (Fontes: frango, atum, cogumelos)

  • Riboflavina (Vitamina B2) – Necessária para a enzima quinurenina mono-oxigenase. (Fontes: leite, ovos, vegetais verdes)

Conclusão

O exame sugere um desvio do metabolismo do triptofano para a via inflamatória (quinurenina → ácido quinolínico), com baixa conversão em serotonina. Isso pode contribuir para sintomas de fadiga, alterações de humor, inflamação e déficit cognitivo. Precisa de ajuda? Marque aqui sua consulta de nutrição de precisão.

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/