Glicanos e lúpus

O lúpus é uma doença autoimune crônica que pode causar inflamação e danos em diversos órgãos e tecidos. A glicação, por outro lado, é um processo bioquímico em que açúcares se ligam a proteínas, lipídios ou DNA, formando produtos finais de glicação avançada (AGEs). Esses compostos estão associados ao envelhecimento celular e a diversas doenças, incluindo complicações no lúpus.

Glicanos são carboidratos complexos que se ligam a proteínas ou lipídios, formando glicoproteínas e glicolipídios. Eles desempenham funções importantes na modulação do sistema imunológico, e as suas alterações podem contribuir para a patogénese do LES. Os glicanos desempenham um papel fundamental na autoimunidade e estão envolvidos em diversas patologias autoimunes, incluindo o Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES).

Impacto na patogénese do Lupus Eritematoso Sistémico:

  1. Alterações na glicação das proteínas: No LES, as alterações na glicação das proteínas podem afetar a sua função e levar à formação de autoanticorpos. As glicoproteínas, como as imunoglobulinas, podem ser modificadas, resultando na formação de complexos imunes que se depositam nos tecidos, desencadeando a inflamação e a lesão dos órgãos, como nos rins (nefrite lupica).

  2. Reconhecimento de glicanos pelo sistema imunológico: O sistema imunológico é capaz de reconhecer glicanos específicos em células e moléculas, podendo induzir respostas autoimunes. Por exemplo, os anticorpos anti-glicano, como os anticorpos anti-Ro/SSA e anti-La/SSB, são comuns no LES e podem estar associados a manifestações cutâneas e neurológicas. Esses anticorpos reconhecem glicanos expostos na superfície das células, o que pode contribuir para a ativação das células T e B e a produção de autoanticorpos.

  3. Disfunção na tolerância imunológica: No LES, a alteração na apresentação de glicanos nas células pode afetar a tolerância imunológica, permitindo que o sistema imunológico reconheça e ataque tecidos próprios. Isso é particularmente relevante na formação de autoanticorpos que atacam componentes celulares, como o DNA e proteínas nucleares, o que caracteriza a doença.

  4. Glicanos na regulação da inflamação: Glicanos também modulam a inflamação através da interação com receptores de células imunes, como os receptores de tipo lectina. A alteração da estrutura glicânica pode aumentar a ativação de células inflamatórias, como as células T e macrófagos, intensificando a resposta inflamatória e a destruição tecidual no LES.

Impacto no tratamento do Lupus Eritematoso Sistémico:

  1. Ligação de glicanos como abordagem terapêutica: O entendimento dos glicanos pode abrir novas abordagens terapêuticas. Por exemplo, a utilização de moléculas que modulam a interação glicano-receptor pode ser uma estratégia para controlar a resposta autoimune no LES. Terapias que inibem a formação de autoanticorpos contra glicanos específicos poderiam reduzir a inflamação e a lesão tecidual.

  2. Intervenção na produção de anticorpos anti-glicano: O tratamento que visa a inibição da produção de anticorpos contra glicanos específicos, como os anti-Ro/SSA, pode ser uma estratégia para melhorar o prognóstico do LES, prevenindo lesões cutâneas e neurológicas. Alguns estudos investigam terapias baseadas em vacinações para gerar uma resposta imunológica controlada contra esses glicanos.

  3. Modulação da glicação das proteínas: Intervenções que regulem a glicação das proteínas ou modifiquem a exposição de glicanos na superfície das células podem ser exploradas para tratar o LES. A glicação alterada pode ser revertida ou ajustada para reduzir a formação de autoanticorpos e diminuir a resposta inflamatória.

  4. Uso de terapias imunomoduladoras: O tratamento do LES envolve frequentemente imunossupressores ou imunomoduladores, e uma melhor compreensão do papel dos glicanos poderia levar ao desenvolvimento de medicamentos mais específicos que atinjam a disfunção glicano-imune sem suprimir excessivamente o sistema imunológico.

Redução Natural da Glicação

Para minimizar a formação de AGEs e potencialmente ajudar no controle da inflamação no lúpus, algumas estratégias naturais podem ser úteis:

  1. Alimentação Anti-Glicação:

    • Reduzir açúcares e carboidratos refinados (pães brancos, doces, refrigerantes).

    • Priorizar alimentos ricos em antioxidantes (frutas vermelhas, cúrcuma, chá verde).

    • Evitar alimentos processados e frituras, que contêm AGEs prontos.

    • Aumentar o consumo de alimentos anti-inflamatórios, como azeite de oliva, abacate e peixes ricos em ômega-3.

  2. Modos de Preparo dos Alimentos:

    • Prefira cozidos no vapor, assados em temperaturas moderadas ou ensopados.

    • Evite grelhados em alta temperatura e frituras, que aumentam os AGEs nos alimentos.

  3. Suplementação:

    • Carnosina e Ácido Alfa-Lipóico (ALA) são antioxidantes que podem reduzir a formação de AGEs.

    • Resveratrol (presente na uva e no vinho tinto) pode modular a inflamação e a glicação.

    • Vitamina B6 e B1 ajudam na metabolização da glicose e podem reduzir a formação de AGEs.

  4. Estilo de Vida:

    • Exercícios físicos regulares melhoram a sensibilidade à insulina e reduzem a glicação.

    • Sono de qualidade reduz o estresse oxidativo e melhora a resposta imunológica.

    • Redução do estresse através de meditação e técnicas de relaxamento pode reduzir inflamação sistêmica.

Essas estratégias podem ajudar no controle da inflamação no lúpus e reduzir a formação de AGEs, promovendo uma melhor qualidade de vida. Precisa de ajuda? Marque aqui sua consulta de nutrição online.

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Doença Celíaca: Riscos de Contaminação Cruzada

A doença celíaca é um distúrbio autoimune no qual a ingestão de glúten — uma proteína presente no trigo, cevada e centeio — desencadeia uma resposta imunológica que danifica o intestino delgado. Mesmo traços mínimos de glúten podem causar sérios problemas de saúde para indivíduos com doença celíaca, tornando a contaminação cruzada uma preocupação crítica em ambientes alimentares.

Fontes Comuns de Contaminação Cruzada:

  1. Equipamentos de Cozinha Compartilhados

    • Torradeiras, fritadeiras, tábuas de corte e utensílios usados tanto para alimentos com glúten quanto para opções sem glúten.

  2. Farinha Suspensa no Ar

    • Partículas de farinha podem permanecer no ar e se depositar em superfícies sem glúten, especialmente em padarias e pizzarias.

  3. Procedimentos de Limpeza Inadequados

    • Resíduos de glúten em superfícies, esponjas, panos de prato e eletrodomésticos.

  4. Recipientes e Bins Compartilhados

    • Uso compartilhado de colheres e contato cruzado em lojas ou cozinhas.

  5. Resíduos de Glúten em Alimentos Processados

    • Glúten oculto em molhos, temperos ou linhas de produção que também processam alimentos com glúten.

Estratégias para Prevenir a Contaminação Cruzada

1. Áreas Exclusivas para Alimentos Sem Glúten

  • Criar espaços separados para o preparo de alimentos sem glúten.

  • Utilizar armazenamento claramente identificado para ingredientes sem glúten.

2. Equipamentos e Utensílios Separados

  • Manter panelas, frigideiras, facas e tábuas de corte exclusivos para alimentos sem glúten.

  • Usar fritadeiras separadas para itens sem glúten (por exemplo, batatas fritas não devem ser cozidas em óleo usado para alimentos empanados).

  • Utensílios e recipientes codificados por cores ajudam a diferenciar os alimentos sem glúten.

3. Procedimentos de Limpeza Adequados

  • Lavar todas as superfícies, utensílios e equipamentos com detergente e água quente antes de preparar alimentos sem glúten.

  • Utilizar esponjas e panos exclusivos para utensílios sem glúten.

  • Lavar bem as mãos antes de manusear ingredientes sem glúten.

4. Armazenamento Seguro de Alimentos

  • Guardar alimentos sem glúten nas prateleiras superiores para evitar contaminação por partículas de glúten.

  • Manter todos os itens sem glúten em recipientes herméticos.

5. Treinamento e Conscientização da Equipe

  • Capacitar funcionários sobre a doença celíaca, fontes de glúten e riscos de contaminação cruzada.

  • Implementar protocolos rigorosos para o manuseio de pedidos sem glúten em restaurantes e indústrias alimentícias.

6. Testes e Verificação da Presença de Glúten

  • Usar kits de teste para verificar a presença de glúten em ambientes com alto risco de contaminação.

  • Garantir que fornecedores sigam padrões de certificação sem glúten.

Estratégias para Remover o Glúten em Ambientes Alimentares

Embora a melhor abordagem seja prevenir a contaminação, algumas técnicas podem ajudar a remover o glúten de superfícies e equipamentos de cozinha:

  1. Limpeza Completa com Detergentes

    • Apenas passar um pano não é suficiente — superfícies devem ser esfregadas com sabão e enxaguadas completamente.

  2. Uso de Lava-Louças com Alta Temperatura

    • Lava-louças comerciais com ciclos de água quente podem remover efetivamente resíduos de glúten.

  3. Substituição de Superfícies Porosas

    • Tábuas de corte de madeira, panelas de ferro fundido e plásticos riscados podem reter glúten; materiais como aço inoxidável ou vidro são mais seguros.

  4. Filtros HEPA para Glúten Suspenso no Ar

    • Em locais onde há farinha no ar, filtros HEPA podem ajudar a reduzir partículas de glúten.

Conclusão

A contaminação cruzada representa um grande risco para pessoas com doença celíaca, mas protocolos rigorosos, manuseio adequado dos alimentos e equipamentos exclusivos podem garantir um ambiente alimentar mais seguro. A prevenção é a estratégia mais eficaz, pois a remoção do glúten após a contaminação pode ser desafiadora. Treinar a equipe, implementar práticas claras de segurança alimentar e testar resíduos de glúten são medidas essenciais para proporcionar uma experiência segura para os celíacos.

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Método para Avaliação da Pegada de Carbono de Acordo com os Alimentos Consumidos

A pegada de carbono dos alimentos é calculada a partir da quantidade de gases de efeito estufa (GEE) emitidos durante o ciclo de vida dos produtos alimentares, geralmente expressa em quilogramas de CO₂ equivalente (kgCO₂e) por quilograma de alimento. O método mais comum segue estes passos:

1. Coleta de Dados Alimentares

  • Utiliza-se questionários de frequência alimentar (QFA) ou registros alimentares para determinar a quantidade e o tipo de alimentos consumidos por uma pessoa ou população.

  • Os dados são convertidos para unidades padrão (gramas ou quilogramas por dia/semana).

2. Uso de Fatores de Emissão de GEE

  • Cada alimento tem um fator de emissão específico, que representa a quantidade de CO₂ equivalente emitida por kg do produto.

  • Esses fatores são obtidos de bases de dados ambientais, como:

    • FAO (Food and Agriculture Organization)

    • IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas)

    • Base de dados Ecoinvent

    • Estudos científicos sobre pegada de carbono de alimentos

Exemplos de Fatores de Emissão (Valores Médios Estimados):

3. Cálculo da Pegada de Carbono Total

A pegada de carbono do consumo alimentar é obtida multiplicando-se a quantidade consumida de cada alimento pelo seu respectivo fator de emissão:

Pegada de Carbono Total=∑(Quantidade de Alimento Consumido×Fator de Emissão)Pegada de Carbono Total=∑(Quantidade de Alimento Consumido×Fator de Emissão)

Onde:

  • A quantidade de alimento está em kg/dia ou kg/semana

  • O fator de emissão está em kgCO₂e/kg

Exemplo prático:
Se uma pessoa consome 200 g de carne bovina por dia e o fator de emissão da carne bovina é 50 kgCO₂e/kg, a pegada de carbono desse consumo será:

0,2 kg×50 kgCO₂e/kg=10 kgCO₂e/dia0,2 kg×50 kgCO₂e/kg=10 kgCO₂e/dia

O mesmo cálculo é feito para todos os alimentos da dieta, e os valores são somados para obter a pegada de carbono total diária ou anual.

4. Comparação com Padrões Alimentares

Os resultados são comparados com diferentes padrões alimentares, como:

  • Dieta ocidental rica em carne → Maior pegada de carbono

  • Dieta mediterrânea → Pegada moderada, dependendo do consumo de carne e peixe

  • Dieta vegetariana ou vegana → Pegada de carbono significativamente menor

No estudo realizado na Universidade do Porto, esse método foi utilizado para calcular a pegada de carbono da dieta dos funcionários, revelando que uma maior adesão à dieta mediterrânea estava associada a uma pegada de carbono um pouco maior, possivelmente devido ao consumo de peixes e produtos de origem animal.

Um estudo intitulado "Adherence to the Mediterranean Food Pattern and Carbon Footprint of Food Intake by Employees of a University Setting in Portugal" foi publicado na revista Nutrients em 2024. O objetivo da pesquisa foi avaliar a adesão dos funcionários da Universidade do Porto à dieta mediterrânea e analisar a pegada de carbono associada ao seu consumo alimentar.

Principais Resultados:

  • Adesão à Dieta Mediterrânea: Apenas 13,2% dos participantes atingiram uma pontuação de seis ou mais na escala da dieta mediterrânea, indicando baixa adesão pela maioria.

  • Pegada de Carbono: A média da pegada de carbono do consumo alimentar dos participantes foi de 8146 ± 3081 CO₂ equivalente por quilograma de alimento, um valor relativamente alto em comparação com outros países.

  • Correlação entre Dieta e Pegada de Carbono: Houve uma correlação positiva fraca, mas estatisticamente significativa (r = 0,142, p = 0,006) entre a adesão à dieta mediterrânea e a pegada de carbono da alimentação. Isso sugere que os indivíduos com maior adesão à dieta mediterrânea tendem a ter uma pegada de carbono um pouco mais elevada.

Conclusões:

O estudo concluiu que a maioria dos participantes apresentou baixa adesão à dieta mediterrânea e uma pegada de carbono elevada relacionada ao seu consumo alimentar. Curiosamente, aqueles com maior adesão à dieta mediterrânea também apresentaram, em média, uma pegada de carbono mais alta. Esses resultados destacam a complexidade das escolhas alimentares e seus impactos ambientais.

Para mais informações detalhadas, você pode acessar o estudo completo no repositório da Universidade do Porto.

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/