Pesquisas em animais e estudos clínicos preliminares apontam que a dieta cetogênica (DC) — rica em gorduras, moderada em proteína e muito baixa em carboidratos — pode não só melhorar o controle glicêmico na diabetes tipo 2, mas também atenuar (ou até reverter) danos renais em fases iniciais. Ainda assim, trata-se de uma estratégia que exige acompanhamento médico e nutricional rigoroso.
1. Por que falar de rins quando o tema é cetogênica?
A nefropatia diabética é a principal causa de insuficiência renal crônica no mundo.
Até há poucos anos, acreditava-se que o dano fosse irreversível; hoje, surgem dados animadores indicando possível regressão quando a hiperglicemia e a inflamação são controladas precocemente.
A DC traz uma via metabólica alternativa — a cetose nutricional, em que o corpo passa a usar corpos cetônicos (BHB, acetoacetato) como combustível principal.
2. Mecanismos propostos
3. O que já se viu em modelos animais
Albuminúria: queda de 40-60 % após 8-12 semanas de DC em ratos Zucker diabéticos.
Histologia renal: regressão parcial de fibrose e espessamento da membrana basal glomerular.
Expressão gênica: normalização de Nrf2, SOD2 e IL-6.
4. Evidência clínica emergente
Estudo de coorte (EUA, 2018-2020)
262 adultos com DM2, eGFR 45-89 ml/min/1,73 m²
Intervenção: dieta cetogênica + telemonitoramento contínuo por app
Resultados aos 24 meses
eGFR: média +7,2 ml/min
Creatinina sérica: −0,12 mg/dl
hs-CRP: −42 %
HbA1c: −1,3 p.p.
Conclusão: melhora renal correlacionou-se com níveis de BHB ≥ 0,5 mmol/L ≥ 70 % do tempo.
Referência: “Effects of a continuous remote care intervention including nutritional ketosis on kidney function and inflammation in adults with type 2 diabetes: a post-hoc latent class trajectory analysis” (PubMed ID: 31056251).
5. Implicações práticas e segurança
Acompanhamento médico obrigatório
Ajuste de antidiabéticos (insulina, SGLT2i, metformina) para evitar hipoglicemia.
Monitoramento de eletrólitos e eGFR a cada 3-6 meses.
Contraindicações relativas
Doença renal crônica avançada (eGFR < 30 ml/min).
Histórico de pancreatite ou hipertrigliceridemia grave.
Possíveis efeitos adversos
Ceto-gripe (1ª semana), constipação, hiperuricemia.
Raros: cálculos renais, cetoacidose euglicêmica em pacientes sob inibidores de SGLT2.
Boas práticas
Ingestão hídrica ≥ 2 l/dia, salgar a comida “a gosto” (previne hiponatremia).
Preferir gorduras mono-/poli-insaturadas (azeite, abacate, nozes).
Incluir vegetais de baixo amido para fibra e micronutrientes.
6. Passo a passo para iniciar (exemplo simplificado)
Avaliação inicial: eGFR, painel lipídico, HbA1c, ácido úrico, função hepática.
Definir macros: 70 % kcal gordura, 20 % proteína, 10 % carboidratos (≤ 30 g líquidos/dia).
Introdução gradual (7-10 dias) ou “mergulhar” direto — a escolha depende da tolerância.
Telemonitoramento: uso de app para registrar glicemia capilar, cetonas sanguíneas & peso.
Reavaliação clínica: semanas 4, 12 e depois trimestral.
7. Perguntas frequentes
A dieta cetogênica desponta como ferramenta promissora não apenas para controlar a glicemia, mas também para atacar um dos maiores alvos vulneráveis da diabetes tipo 2: o rim. Embora os dados em humanos sejam ainda limitados, os resultados apontam para melhorias clinicamente relevantes na função renal e nos marcadores inflamatórios. O futuro exigirá ensaios randomizados de longo prazo, mas já é possível — com o devido acompanhamento profissional — incorporar a DC como parte de um plano integrado para frear (e talvez reverter) a nefropatia diabética inicial.
⚠️ Aviso legal
Este conteúdo tem fins informativos e não substitui consulta médica e nutricional. Qualquer mudança drástica na alimentação, sobretudo em presença de doença crônica, deve ser conduzida por profissionais de saúde habilitados.