A endometriose é uma condição inflamatória crônica dependente de hormônios. Ocorre em mulheres em idade reprodutiva e está estritamente ligada a variações de hormônios esteroides sexuais e alterações endometriais relacionadas durante o ciclo menstrual.
Os principais eventos que causam a implantação ectópica de células endometriais são a dependência de estrogênio e a resistência à progesterona, que diminuem os níveis de vários genes-alvo da progesterona endometrial, a decidualização e a receptividade endometrial, ao mesmo tempo em que aumentam a proliferação de tecido semelhante ao endometrial fora do útero.
Alterações epigenéticas podem ocorrer desde a vida intrauterina e ao longo da infância e adolescência, potencialmente predispondo a doenças como a endometriose.
A impressão epigenética de genes hormonais durante o desenvolvimento pode ter um papel crítico na função do trato reprodutivo feminino adulto, conforme demonstrado pelo aumento da incidência de câncer endometrial em mulheres cujas mães usaram dietilestilbestrol (estrógeno não esteroide) durante sua gestação.
Mecanismos epigeneticos envolvidos na endometriose
1. Metilação do DNA
Alterações na metilação do DNA têm sido amplamente observadas na endometriose. A metilação do DNA normalmente reprime a expressão gênica, e sua desregulação pode levar à ativação ou silenciamento anormais de genes associados à doença.
Hipermetilação de genes supressores de tumor, como HOXA10 e GATA2, está associada à redução da capacidade de implantação e à função alterada do endométrio.
Hipometilação de genes pró-inflamatórios e pró-angiogênicos, como ESR2 (receptor de estrogênio-β), contribui para o ambiente hormonal e inflamatório da doença.
2. Modificações das Histonas
As modificações das histonas (como acetilação, metilação, fosforilação) regulam a estrutura da cromatina e a acessibilidade dos genes.
Aumento da acetilação das histonas em promotores de citocinas pró-inflamatórias, como IL-6 e IL-1β, intensifica a inflamação.
Metilação anormal das histonas em genes relacionados à proliferação celular e apoptose contribui para a sobrevivência e crescimento das lesões.
3. RNAs Não Codificantes
MicroRNAs (miRNAs): Esses pequenos RNAs não codificantes regulam a expressão gênica pós-transcricional. Perfis desregulados de miRNAs na endometriose incluem:
MiRNAs reduzidos (família miR-200, miR-143), que normalmente suprimem a inflamação e a angiogênese.
MiRNAs aumentados (miR-21, miR-451a), que promovem a sobrevivência celular e a formação de lesões.
Longos RNAs Não Codificantes (lncRNAs): Evidências emergentes sugerem que lncRNAs, como HOTAIR e MALAT1, estão envolvidos na proliferação celular, migração e modulação imunológica na endometriose.
As alterações epigenéticas geram os fenômenos de dominância do estrogênio (E2 dominance) e resistência à progesterona (P4 resistance) em pacientes com endometriose.
Rossi e colaboradores (2023) explicam que, na endometriose, os níveis de estrogênio estão anormalmente elevados no microambiente do tecido endometriótico devido à:
Superexpressão do receptor de estrogênio α (ERα) e do receptor de estrogênio β (ERβ). Especificamente, o ERβ está altamente expresso nas lesões endometrióticas, o que amplifica os efeitos do estrogênio.
Epigenética: Modificações, como metilação diferencial, regulam a expressão dos receptores de estrogênio. No tecido endometriótico, genes envolvidos na degradação do estrogênio estão silenciados, enquanto genes que promovem sua produção estão ativos.
Essa dominância do estrogênio contribui para um ciclo de inflamação crônica, proliferação celular e resistência à apoptose, características da endometriose.
A resistência à progesterona é descrita como uma característica central da endometriose. Este fenômeno se dá principalmente pela:
Redução da expressão do receptor de progesterona (PR), tanto na forma PR-A quanto PR-B. Isso ocorre por alterações epigenéticas, como a hipermetilação do promotor do gene que codifica os receptores.
Diminuição da resposta aos efeitos anti-inflamatórios e anti-proliferativos da progesterona no tecido endometriótico, o que exacerba a inflamação e proliferação mediadas pelo estrogênio.
O tecido endometriótico é descrito como menos responsivo à progesterona devido a alterações no microambiente epigenético e a padrões aberrantes de acetilação e metilação de histonas.
A dominância do estrogênio e a resistência à progesterona se reforçam mutuamente, criando um ciclo vicioso que mantém o ambiente patológico da endometriose. O desequilíbrio hormonal leva a alterações epigenéticas adicionais, exacerbando a progressão da doença.
4. Epigenética Ambiental
Exposições ambientais, como disruptores endócrinos (ex.: dioxinas, bisfenol A), podem alterar o epigenoma, contribuindo para o desenvolvimento da endometriose.
Esses produtos químicos induzem reprogramação epigenética, modificando padrões de metilação do DNA e alterações nas histonas em genes relacionados a vias hormonais.
Terapêutica Epigenética
Dado o papel da epigenética na endometriose, há um interesse crescente em terapias epigenéticas:
Inibidores de DNA metiltransferases (ex.: azacitidina): Visam reverter padrões anormais de metilação do DNA.
Inibidores de desacetilases de histonas (ex.: trichostatina A): Alvo para reduzir inflamação e proliferação celular.
O estudo do papel da epigenética na endometriose fornece insights sobre sua patogênese e revela potenciais alvos terapêuticos. Embora já tenha havido muitos avanços, é necessário mais pesquisa para entender plenamente como os mecanismos epigenéticos interagem com fatores genéticos, hormonais e ambientais na progressão da doença.
A resistência à progesterona e dominância estrogênica promovem a expressão de SIRT1. A superexpressão de SIT1 piora a endometriose, contribui para falhas de implantação durante a tentativa de gravidez e a inibição de SIRT1 reverte estes efeitos.
Inibir a SIRT1 (Silent Information Regulator 1), uma desacetilase de histona da classe III, é uma estratégia terapêutica potencial para tratar a proliferação celular anormal, a inflamação e a resistência à apoptose observadas na endometriose. Abaixo estão métodos para inibir o SIRT1 usando medicamentos e abordagens naturais:
Abordagens para inibição da SIRT1:
Medicamentos em estudo (nenhum está disponível para prescrição em 2024)
EX-527 (Selisistat): Um inibidor seletivo e potente do SIRT1, frequentemente usado em pesquisas. Mostrou potencial em modular vias envolvidas na endometriose, mas está principalmente em estágios experimentais. É mostrado na figura acima.
Sirtinol: Outro inibidor específico do SIRT1, que interrompe processos celulares dependentes do SIRT1.
Cambinol: Uma pequena molécula que inibe o SIRT1 e o SIRT2, potencialmente influenciando a inflamação e a proliferação.
Suplementos com efeitos indiretos sobre o SIRT1:
Nicotinamida (Vitamina B3): Atua como inibidor do SIRT1 ao competir com o NAD+ (nicotinamida adenina dinucleotídeo), um cofator para a atividade do SIRT1.
Curcumina (da Cúrcuma): A curcumina demonstrou inibir a atividade do SIRT1 e pode reduzir a inflamação e a proliferação celular nas lesões endometrióticas.
Resveratrol: Embora seja conhecido como ativador do SIRT1, em doses mais altas pode ter efeitos paradoxais e inibir sua atividade. O resveratrol também suprime o estresse oxidativo e a inflamação, proporcionando benefícios indiretos para o manejo da endometriose.
Epigalocatequina Galato (EGCG) do Chá Verde: O EGCG modula a atividade do SIRT1 e reduz inflamação, estresse oxidativo e angiogênese associada à endometriose.
Quercetina: Encontrada em maçãs, cebolas e frutas vermelhas, a quercetina pode inibir vias que envolvem o SIRT1, embora seu papel na endometriose precise de mais evidências específicas.
Trissulfeto de Diallyl (do Alho): Pode inibir o SIRT1 indiretamente ao promover estresse oxidativo e modular vias envolvidas na proliferação celular e apoptose.
Outras estratégias
Jejum e Restrição Calórica: Essas abordagens podem influenciar a disponibilidade de NAD+, afetando indiretamente a atividade do SIRT1. No entanto, práticas extremas devem ser realizadas sob orientação médica, pois podem piorar outros sintomas.
Considerações e Precauções:
Ação Específica ao Alvo: Embora a inibição do SIRT1 possa oferecer benefícios, o SIRT1 tem papéis protetores em certos tecidos. A inibição ampla pode ter efeitos colaterais indesejados.
Estágio Experimental: Muitos inibidores do SIRT1, especialmente os sintéticos, ainda estão em estudos pré-clínicos ou nos primeiros ensaios clínicos.
Dada a complexidade da endometriose, é fundamental buscar orientação médica antes de iniciar qualquer terapia.
Precisa de ajuda? Marque aqui sua consulta online