Os ftalatos, uma classe de plastificantes sintéticos amplamente utilizados, são reconhecidos como desreguladores endócrinos, com capacidade de interferir no desenvolvimento humano. Estes compostos podem ser classificados em dois grupos principais: ftalatos de alto peso molecular (HMWPs) e ftalatos de baixo peso molecular (LMWPs). A exposição aos HMWPs ocorre predominantemente através da alimentação e do contato com plásticos de PVC, enquanto os LMWPs são absorvidos principalmente pela pele, poeira e ar interno.
Os ftalatos são um grupo de compostos usados para flexibilizar plásticos de PVC e são encontrados em embalagens de alimentos, cosméticos e produtos de higiene pessoal. A exposição ocorre principalmente pela ingestão de alimentos contaminados.
Riscos à Saúde e Desenvolvimento Fetal
A exposição gestacional aos ftalatos é preocupante devido à sua capacidade de atravessar a placenta, transferindo-se para o feto em desenvolvimento. Estudos associam essa exposição a efeitos adversos na gravidez, como maior risco de pré-eclâmpsia, parto prematuro e menor peso ao nascer. Além disso, a exposição pré-natal aos ftalatos está ligada a condições de saúde a longo prazo, incluindo obesidade infantil, doenças respiratórias, problemas neurodesenvolvimentais (TDAH, TEA) e disfunções reprodutivas.
Mecanismos Epigenéticos e Exposição aos Ftalatos
Os mecanismos pelos quais os ftalatos afetam o desenvolvimento incluem modificações epigenéticas, especialmente a metilação do DNA (DNAm). Essa modificação regula a expressão gênica e pode atuar como um registro das exposições ambientais iniciais, influenciando a saúde ao longo da vida. Estudos em modelos animais mostram que a exposição ao ftalato altera padrões de DNAm em regiões genômicas associadas ao crescimento, metabolismo e desenvolvimento neurológico.
Em humanos, a pesquisa tem focado em tecidos como a placenta e o sangue do cordão umbilical. O BPA é usado em plásticos como mamadeiras, latas de alimentos e bebidas e em materiais como resinas epóxi. Ele pode ser encontrado também em selantes dentários e em plásticos de PVC. A exposição humana ao BPA ocorre principalmente por meio de alimentos e bebidas, mas também pode ocorrer pelo contato com papel térmico de recibos de caixa.
Resultados indicam associações entre metabólitos de ftalatos e BPA e alterações epigenéticas em genes relacionados a hormônios sexuais, crescimento e funções imunológicas. Essas mudanças epigenéticas podem contribuir para o aumento de peso corporal, risco de síndrome metabólica e problemas neurocomportamentais.
Avanços e Desafios na Pesquisa
Estudos mais recentes analisam como diferentes tecidos, como sangue venoso e células epiteliais bucais (BECs), podem oferecer insights complementares sobre os efeitos dos ftalatos. Enquanto o sangue reflete respostas imunológicas, os BECs, originados do mesmo tecido embrionário que o cérebro, podem ser melhores substitutos para estudar impactos no desenvolvimento cerebral.
A escolha do tecido é crucial, já que as alterações epigenéticas são altamente específicas. O estudo Alberta Pregnancy Outcomes and Nutrition (APrON), no Canadá, investigou 152 pares mãe-filho e confirmou que as alterações no DNAm variam entre tecidos e estão ligadas a exposições específicas a ftalatos. Essas descobertas destacam a necessidade de políticas que protejam gestantes e crianças dessas exposições.
Impactos na Saúde Humana
BPA e fitalatos são conhecidos por suas propriedades estrogênicas e por atuarem como desreguladores endócrinos. O BPA, por exemplo, pode se ligar aos receptores de estrogênio, afetando o desenvolvimento sexual e podendo levar a distúrbios neurocomportamentais e hormonais, especialmente em fetos e crianças. Já os ftalatos têm sido associados a distúrbios reprodutivos em homens, como criptorquidia e hipospádia, quando expostos durante o período crítico de diferenciação sexual.
Epigenética e Efeitos a Longo Prazo
Estudos têm mostrado que a exposição a esses produtos químicos pode modificar a expressão genética por meio de alterações epigenéticas, sem alterar a sequência do DNA. Isso pode afetar órgãos e sistemas ao longo da vida. A metilação do DNA e outras modificações epigenéticas, como a alteração de histonas e microRNAs, são mecanismos que podem ser influenciados por esses produtos químicos ambientais, impactando o risco de doenças, como câncer e distúrbios reprodutivos.
Diversas pesquisas têm demonstrado que a exposição a baixos níveis de BPA e ftalatos pode resultar em efeitos adversos à saúde, como obesidade, distúrbios hormonais e problemas de desenvolvimento. A exposição durante a gravidez e a infância é particularmente preocupante, já que esses períodos representam janelas de vulnerabilidade.
Toxicogenômica e Efeitos Epigenéticos do Bisfenol A (BPA) e Ftalatos
1. Toxicogenômica do BPA e Ftalatos
A toxicogenômica do BPA e dos ftalatos revela interações com um grande número de genes e proteínas. De acordo com o Banco de Dados Comparativo de Toxicogenômica, o BPA interage com 1.232 genes e proteínas, enquanto os cinco ftalatos mais comuns (DEHP/MEHP, DBP/BBP/MBP) interagem com 265. Essas interações indicam que tanto o BPA quanto os ftalatos compartilham padrões similares de toxicidade e efeitos adversos à saúde. Um estudo que comparou essas interações encontrou 89 genes e proteínas comuns entre os dois, com destaque para vias relacionadas à inflamação e neoplasias, como cânceres urogenitais e mamários. Isso sugere que esses produtos químicos podem desempenhar papéis significativos no desenvolvimento de doenças crônicas e cânceres.
2. Efeitos Epigenéticos do BPA e Ftalatos
Os efeitos epigenéticos do BPA e dos ftalatos são amplamente documentados, mostrando como esses produtos químicos podem alterar a expressão genética sem modificar a sequência do DNA. A exposição ao BPA pode modificar a metilação do DNA, influenciando características fenotípicas, como a cor da pelagem em camundongos. Esse efeito epigenético pode ser revertido por suplementação de ácido fólico ou fitoestrógenos, como a genisteína, durante a gestação.
A exposição in utero ao BPA e aos ftalatos pode causar alterações na metilação de genes importantes, modificações de histonas (proteínas que regulam a estrutura do DNA) e alterações na expressão de microRNAs. Essas modificações podem persistir ao longo da vida e resultar em distúrbios de saúde, como problemas neurais, imunológicos, infertilidade e doenças complexas como câncer e diabetes.
Exemplos de Alterações Epigenéticas em Animais
BPA: A exposição neonatal ao BPA alterou a metilação do gene Pde4d4 na próstata de ratos, levando a uma expressão elevada desse gene. O BPA também afetou a metilação do gene Hoxa10, que está envolvido no desenvolvimento uterino, e causou alterações no cérebro de camundongos, associadas a mudanças na expressão gênica.
Ftalatos: No caso dos ftalatos, a exposição a BBP induziu desmetilação no gene ESR1, que está envolvido na resposta ao estrogênio. A exposição ao DEHP aumentou a metilação do DNA em testículos de camundongos, afetando a produção de testosterona e o desenvolvimento fetal.
3. Efeitos Transgeracionais
Além dos efeitos diretos na geração exposta, a exposição ao BPA e aos ftalatos pode ter efeitos transgeracionais, afetando as gerações futuras. Estudos demonstraram que a exposição a essas substâncias durante a gestação pode promover a puberdade precoce em fêmeas e afetar a espermatogênese nos machos da geração subsequente. A metilação diferencial do DNA foi observada nas gerações F3 expostas, sugerindo que essas alterações podem ser passadas para as gerações seguintes.
Exposição Pré-Natal a Ftalatos e suas Implicações no Desenvolvimento de Bebês
Estudos sobre os efeitos de substâncias químicas no desenvolvimento fetal têm ganhado destaque, especialmente em relação aos ftalatos, produtos químicos presentes em plásticos e outros produtos. Um estudo recente focou na exposição pré-natal a ftalatos de alto e baixo peso molecular durante o segundo trimestre de gestação e seus impactos no desenvolvimento de bebês. A pesquisa identificou 12 CpGs (regiões do DNA com metilação alterada) de alta confiança em amostras de sangue venoso de bebês com 3 meses e 12 CpGs em células epiteliais brônquicas (BECs), sugerindo que biomarcadores de exposição aos ftalatos podem ser detectados ainda na infância.
Especificidade Tecidual e Exposição aos Ftalatos
Os resultados mostraram que as associações de metilação do DNA (DNAm) com a exposição aos ftalatos não se sobrepuseram entre os tecidos analisados, como o sangue e as células BECs. Isso sugere que os efeitos da exposição podem ser específicos de tecido, dado o papel do DNAm na identidade celular. As diferenças nas concentrações de ftalatos entre os tecidos também podem impactar as associações, e mais pesquisas são necessárias para avaliar os melhores métodos para a avaliação de risco cumulativo, como a ingestão diária tolerável (TDI) e o nível de efeito adverso não observado (NOAEL).
Associações com Funções Endócrinas, Imunológicas e Neurodesenvolvimentais
A exposição pré-natal aos ftalatos foi associada a alterações no DNAm de genes relacionados à regulação hormonal, função imunológica, reparo de DNA e neurodesenvolvimento. Muitos dos CpGs identificados estavam em genes vinculados à função endócrina (como os hormônios tireoidianos e sexuais) e ao sistema imunológico, corroborando com estudos que indicam que os ftalatos podem afetar esses sistemas. Além disso, as alterações no DNAm associadas ao neurodesenvolvimento sugerem que a exposição precoce pode influenciar a formação neural e o desenvolvimento cognitivo.
Implicações para a Saúde Imunológica e Reparação de DNA
Além dos impactos no sistema endócrino e no neurodesenvolvimento, o estudo também mostrou que a exposição aos ftalatos está ligada a genes que regulam a função das células imunológicas e o reparo do DNA. Alterações no DNAm foram associadas ao desenvolvimento de doenças autoimunes, inflamatórias e distúrbios alérgicos, como asma e eczema. Isso reforça a ideia de que a exposição a ftalatos pode ter efeitos de longo prazo na saúde imunológica e na integridade genética.
Embora os resultados deste estudo revelem associações promissoras entre a exposição pré-natal aos ftalatos e alterações no DNAm, é necessário mais trabalho para entender completamente os mecanismos subjacentes a essas mudanças e seu impacto nos resultados de saúde e neurodesenvolvimento.
Este estudo também indicou que os CpGs identificados são altamente sensíveis às exposições ambientais precoces, refletindo a importância da metilação do DNA em processos de desenvolvimento essenciais. Essas alterações podem estar associadas a problemas de saúde a longo prazo, como distúrbios endócrinos, reprodutivos e neuropsiquiátricos.
Com base nessas descobertas, a exposição aos ftalatos representa uma preocupação significativa para a saúde pública, destacando a necessidade de monitoramento e regulamentação mais rigorosos para proteger os bebês e crianças de seus efeitos potenciais.