Estudo publicado na Nature Neuroscience mostra os dados existentes de uma estrutura de meta-análise multi-coorte e multi-ômica que analisou 25 conjuntos de dados ômicos, incluindo microbioma, marcadores de citocinas, expressão gênica do cérebro humano, dieta e dados metabólicos, para identificar perfis ômicos específicos no Transtorno do Espectro do Autismo (TEA).
O termo "ômicos" se refere a diferentes tecnologias usadas para estudar a função, diferenças e a interação entre vários tipos de moléculas que constituem as células de um organismo, como genes, transcritos, proteínas e pequenos metabólitos. As ciências ômicas são campos de estudo que fazem parte das ciências biológicas e compreendem os estudos que terminam com -omica ou -omico -omics, como Genômica, Proteômica, Metabolômica e Transcriptômica.
O estudo em questão utilizou-se destas tecnologias e identificou que 591 microorganismos são mais frequentes em crianças com TEA e 169 micróbios mais comuns no grupo de controle. As variações observadas podem ter relação com demografia da coorte (conjunto de pessoas estudadas) e sua localização geográfica. As sete coortes incluídas no estudo eram provenientes da Ásia, Europa, América do Sul e América do Norte. A pesquisa demonstrou fortes associações entre vários níveis ômicos, incluindo tipos de microorganismos, metabólitos produzidos e fatores genéticos, no contexto do autismo.
Os tipos de bactérias mais encontradas no TEA aumentam a inflamação e a desregulação imunológica. Assim, há maior presença de anticorpos atacando o cérebro e aumento de citocinas inflamatórias, questões associadas ao TEA. Por exemplo, as concentrações da citocina inflamatória denominada fator de crescimento transformador de citocina beta (TGF-β) estava significativamente elevada nas crianças com TEA analisadas.
Este estudo é mais um a mostrar que o microbioma intestinal tende a ser diferente no TEA e que isto impacta na resposta inflamatória e imune. Assim, o cuidado com o intestino é fundamental, sendo o microbioma um marcador muito importante do TEA.
Dieta cetogênica, TEA e microbiota
A dieta cetogênica é restrita em carboidratos, forçando o corpo a utilizar gordura e a produzir corpos cetônicos, os quais exercem poderosa atividade anti-inflamatória e antioxidante no cérebro. A dieta cetogênica também ajuda a restaurar a composição microbiana intestinal no TEA. Esta melhoria pode ter efeitos positivos na comunicação social e na redução de comportamentos repetitivos (Li et al., 2021).
Sintomas gastrointestinais, incluindo constipação e diarreia, são comuns em indivíduos com TEA e estão associados à gravidade dos sintomas do transtorno, a depender do quão alterada está a microbiota. A microbiota intestinal se comunica com o cérebro através dos sistemas nervosos neuroendócrino, neuroimune e autônomo, que é o chamado eixo microbiota-intestino-cérebro.
A dieta cetogênica contribui para o aumento dos níveis de Akkermansia, Parabacteroides, Bacteroides e Desulfovibrio spp. em modelos animais de convulsão, síndrome de deficiência do transportador de glicose 1 e TEA.
Em sua pesquisadora, a Dra. Cecilia Giulivi descobriu que a produção energética pode ser até dois terços menor nos autistas. A maioria das crianças estudada por ela apresentava disfunção no complexo I mitocondrial e altos níveis de piruvato – um subproduto do metabolismo do açúcar e evidência de disfunção mitocondrial (Giulivi et al., 2010). Hoje, a Dra. Cecilia Giulivi é uma das proponentes da dieta cetogênica no autismo, como terapia metabólica para garantir maior flexibilidade mitocondrial, menor neuroinflamação e estresse oxidativo cerebral.
Ainda existem poucos estudos sobre alterações da microbiota intestinal em humanos tratados com dieta cetogênica, mas esperamos que as pesquisas avancem nos próximos anos, mas vamos acompanhando.