Irradiação de alimentos é tema antigo, mas ainda controverso

Por Mariana Perozzi, para ComCiência

A irradiação de alimentos é um tema controverso. O físico Alexandre Soares Leal, do Centro de Desenvolvimento da Tecnologia Nuclear (CDTN), ligado ao Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), aponta vários benefícios dessa tecnologia e atribui o receio que a população tem de consumir alimentos irradiados à constituição de um "imaginário negativo" ligado à questão nuclear. Já os membros da ONG Public Citizen Brasil alertam para os possíveis perigos decorrentes do uso da radiação nos alimentos e questionam os benefícios da ampliação do uso dessa tecnologia no país.

"Se você perguntar para alguém 'você comeria alimentos irradiados?', a resposta invariavelmente será não", argumenta o físico Alexandre Soares Leal. Na opinião do físico, a não aceitação por parte das pessoas decorre, entre outros fatores, da relação que se faz entre irradiação e radioatividade. Segundo ele, a contaminação radioativa pressupõe o contato físico com uma fonte radioativa, enquanto a irradiação é a energia emitida de uma fonte de radiação. Desta forma, os alimentos irradiados não se tornam radioativos, pois não contêm a fonte de radiação (apenas recebem a energia).

“Além do preconceito generalizado e da terminologia confusa - na França, por exemplo, a irradiação é chamada de ionização, para não ser confundida com radioatividade -, existem outros fatores que atrapalham a aceitação dos alimentos irradiados. Um deles é a ausência de informações sobre energia nuclear no Ensino Básico e Fundamental, ou mesmo no superior”, diz Leal, completando que, mesmo nos cursos universitários em que se pressupõe certo conhecimento do assunto (como os que usam técnicas de raio-X, por exemplo), os conceitos são frágeis e a diferenciação entre os termos, precária. “Outro problema é que a mídia, quanto trata o assunto, busca apenas o sensacional”, afirma.

O processo de irradiação consiste em submeter os alimentos, já embalados ou a granel, a uma quantidade controlada de radiações ionizantes (alfa, beta, gama, raios X e nêutrons), por um tempo prefixado. “É importante conhecer bem a dose e o tempo de exposição à radiação, os quais variam de acordo com o tipo de alimento”, ressalta a agrônoma Lucimeire Pilon, que faz doutorado no Centro de Energia Nuclear na Agricultura (Cena/USP), sob orientação de professores do Departamento de Agroindústria, Alimentos e Nutrição, da Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz" (Esalq/USP). Consegue-se, desta forma, retardar a maturação de frutas e legumes, inibir o brotamento de bulbos e tubérculos, eliminar ou reduzir a presença de parasitas, fungos, bactérias e leveduras, aumentando a vida útil dos alimentos e auxiliando na sua distribuição e comercialização.

Como nos demais métodos de conservação de alimentos (pasteurização, congelamento, etc), a irradiação ocasiona perdas de macro e micronutrientes, bem como variações na cor, sabor, textura e odor. Mas as alterações químicas provocadas nos alimentos são mínimas e nenhuma delas nociva ou perigosa, segundo o Cena/USP.

Já a organização não-governamental Public Citizen Brasil posiciona-se criticando esta tecnologia e enumera vários problemas que podem decorrer da irradiação: desde a perda de vitaminas, que se intensificaria com o maior tempo de estocagem; passando pela possibilidade de serem produzidos novos compostos nos alimentos, associados, entre outras coisas, ao câncer e a alterações genéticas em células humanas e de ratos; até o questionamento das instalações utilizadas devido ao risco de ocorrerem vazamentos e acidentes radioativos. A ONG afirma ainda que a tecnologia de irradiação beneficiará apenas os grandes agricultores de exportação, dificultando ainda mais a entrada dos pequenos agricultores no mercado externo.

Produtos no dia-a-dia sem rotulagem

Vários produtos irradiados, sobretudo especiarias, estão presentes no nosso dia-a-dia. Segundo Lucimeire Pilon, um exemplo são as especiarias usadas nos salgadinhos industrializados, como batatinhas fritas. Contudo, poucas empresas informam no rótulo o uso desse procedimento.

Alexandre Soares Leal concorda: “No Brasil, é mais provável que existam ingredientes irradiados do que o alimento irradiado em si”. Para ele, as especiarias apresentam grande potencial de contaminação por microorganismos, sendo que muitas indústrias utilizam especiarias irradiadas sem identificá-las na embalagem. “Quem usa ingredientes irradiados faz isso porque acredita ser a melhor opção, mas não divulga porque teme a reação do mercado”, opina.

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) exige que, na rotulagem dos alimentos irradiados, conste no painel principal a inscrição "alimento tratado por processo de irradiação”. Quando um produto irradiado é utilizado como ingrediente em outro alimento, esta informação deve ser apresentada na lista de ingredientes. A Anvisa estabelece que, no Brasil, os alimentos podem ser tratados por radiação, desde que a dose mínima absorvida seja suficiente para alcançar a finalidade pretendida e a dose máxima seja inferior à que comprometeria as propriedades funcionais e os atributos sensoriais do alimento. Organismos internacionais como a Organização Mundial de Saúde (OMS) e a Organização para Agricultura e Alimentação das Nações Unidas (FAO) também são favoráveis à técnica de irradiação de alimentos, autorizada em diversos países do mundo.

Fonte: http://www.comciencia.br/comciencia/?section=3&noticia=134

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/