Picolinato (ácido picolínico)

O ácido picolínico (picolinato) é um metabólito derivado do triptofano, produzido na via da quinurenina. Ele é formado a partir do 3-HAA (ácido 3-hidroxiantranílico) antes da formação do ácido quinolínico e do NAD, tanto no intestino, quanto no fígado.

O triptofano, no fígado, pode seguir dois principais destinos:

  • Síntese de serotonina/melatonina (~5%)

  • Via da quinurenina (~95%) → que leva à produção de NAD⁺, ácido quinolínico, ácido picolínico e outros metabólitos. A ativação desta via ocorre principalmente em situações de inflamação crônica, estresse oxidativo e doenças neurodegenerativas.

Metabolismo do triptofano: no intestino, cerca de 4 a 6% do triptofano segue a via de formação de indóis e seus derivados (Wang et al., 2024)

Estruturalmente, o ácido picolínico é um derivado do piridina-carboxílico (um ácido orgânico com anel aromático).

Como a via se bifurca?

A enzima α-amino-β-carboximuconato-ε-semialdeído descarboxilase (ACMSD) regula um ponto-chave na ramificação da via da quinurenina:

Veja: triptofano → quinurenina → 3-hidroxiquinurenina → 3-hidroxiantranilato → ACMS (ácido α-amino-β-carboximuconato-ε-semialdeído).

Neste ponto, o ACMS pode:

  • Espontaneamente ciclizar em ácido quinolínico → precursor de NAD⁺.

  • Ser descarboxilado pela ACMSD → desviando o fluxo para a produção de ácido picolínico e intermediários da via dos ácidos graxos.

Esta enzima (ACMSD) é inativada com ômega-3. Ou seja, a suplementação reduz ácido picolínico e neuroinflamação. Por outro lado, se ácido picolínico já estiver muito baixo não recomenda-se a suplementação, uma vez que ácido picolínico também tem seus papeis biológicos importantes.

Papel biológico do ácido picolínico

O ácido picolínico atua como um quelante natural de metais, em especial zinco, ferro e cromo. Por isso, é comum ser usado para aumentar a disponibilidade de metais. Por exemplo, existem suplementos de picolinato de cromo, picolinato de zinco.

Há estudos que sugerem função imunomoduladora e participação na resposta inflamatória, já que a via da quinurenina é fortemente regulada pela ativação imune (principalmente por interferon-γ). Contudo, em excesso, o picolinato pode estar associado a processos neurotóxicos, já que está intimamente ligado ao metabolismo do ácido quinolínico (um agonista de receptores NMDA).

Avaliação urinária

A dosagem de ácido picolínico urinário (assim como de outros metabólitos da via da quinurenina) é usada em perfis de ácidos orgânicos urinários. Essa avaliação é feita por cromatografia líquida acoplada à espectrometria de massa (LC-MS/MS).

Alterações nos níveis urinários de picolinato podem indicar:

  • Disfunções no metabolismo do triptofano

  • Ativação imunológica crônica (infecções, doenças autoimunes, câncer)

  • Alterações no metabolismo do NAD⁺

Geralmente solicitamos esta análise em algumas situações:

  • Transtornos neurológicos e psiquiátricos (ex.: Alzheimer, Parkinson, depressão, esquizofrenia)

  • Transtornos do neurodesenvolvimento (TEA, TDAH)

  • Doenças metabólicas

  • Investigações em pesquisa sobre inflamação sistêmica

Pacientes com vários desequilíbrios no metabolismo do triptofano

Desequilíbrios, como os mostrados no exame acima, levam à neurotoxicidade, associam-se à depressão, ansiedade, prejuízos à cognição e sono. O ácido picolínico (picolinic acid) também é um potente ativador de citocinas inflamatórias, gerando um ciclo vicioso.

Suporte nutricional geralmente recomendado: niacina (B3), curcumina, EPA/DHA (sempre avaliar com outros marcadores).

Dietas ricas em proteína aumentam a atividade de ACMSD. Por isso, dietas cetogênicas com proteína apropriada (nem muito, nem pouco) são frequentemente indicadas nestas alterações de via.

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Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Dosagem de interlerleucinas em pacientes neurodivergentes

A dosagem de interleucinas plasmáticas em pacientes neurodivergentes (como pessoas com TEA – Transtorno do Espectro Autista, TDAH, esquizofrenia, transtorno bipolar, entre outros) é um tema de crescente interesse em neurociência translacional e psiquiatria biológica. A ideia central é que alterações imunológicas e inflamatórias podem estar associadas à neurodivergência e influenciar sintomas cognitivos, comportamentais e emocionais.

Por que dosar estas substâncias?

1. Identificação de mecanismos fisiopatológicos

Estudos mostram que pacientes com TEA, esquizofrenia ou depressão podem apresentar perfil pró-inflamatório aumentado, com interleucinas como IL-6, IL-1β e TNF-α elevadas. Já outras, como IL-10 (anti-inflamatória), podem estar reduzidas, sugerindo desbalanço imunológico. Esse perfil ajuda a entender como inflamação sistêmica pode modular a atividade cerebral e a plasticidade sináptica.

2. Biomarcadores para diagnóstico diferencial e estratificação

Ainda não existem biomarcadores definitivos para neurodivergência, mas a dosagem de interleucinas pode auxiliar na identificação de subgrupos biológicos. Por exemplo, no TEA, níveis elevados de IL-6 foram correlacionados a maior gravidade dos sintomas sociais e de comunicação. Em TDAH, alterações em IL-2 e IL-10 foram ligadas a diferenças no controle da atenção.

3. Monitoramento terapêutico

A resposta a tratamentos (psicofármacos, imunomoduladores, intervenções nutricionais ou estilo de vida) pode ser acompanhada pela variação no perfil inflamatório. Isso abre caminho para estratégias personalizadas, adaptando terapias conforme a assinatura imunológica do paciente.

4. Compreensão da relação cérebro–sistema imune

A neuroinflamação pode influenciar neurodesenvolvimento e funções cognitivas ao alterar a barreira hematoencefálica, microglia e neurotransmissão. Interleucinas plasmáticas funcionam como um marcador acessível da ativação imune periférica, que pode repercutir no SNC.

5. Limitações atuais

  • Não há padrões de referência clínicos consolidados para interpretar valores de interleucinas em contextos neurodivergentes.

  • Os níveis podem variar por idade, sexo, dieta, sono, estresse e uso de medicamentos.

  • A maioria dos estudos ainda está em fase exploratória ou experimental, sem aplicação rotineira em clínicas.

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Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Metilação, Ácido Fólico e Neurotransmissores: o que você precisa saber

Nos últimos anos, a ciência tem mostrado cada vez mais como a nutrição impacta o funcionamento do cérebro. Entre os protagonistas dessa história estão os radicais metil, o ácido fólico e o metabolismo dos neurotransmissores.

O papel da doação de radicais metil

Os radicais metil (-CH3) são como pequenas “chaves” químicas que ligam ou desligam processos no nosso corpo. Quando falamos em cérebro, eles participam ativamente da síntese e regulação de neurotransmissores como serotonina, dopamina e noradrenalina – substâncias que controlam humor, atenção, memória e sono.

O processo de adição de grupos metil (uma molécula de um carbono e três hidrogênios) a outras moléculas é conhecido por metilação. Pense nisso como se o corpo usasse grupos metil como uma espécie de "moeda" biológica para fazer as coisas acontecerem por todo o corpo, catalisando múltiplas reações em muitos sistemas diferentes. A metilação é tão onipresente que acontece em segundo plano o tempo todo, bilhões de vezes por segundo!

Existem muitas enzimas diferentes no corpo que utilizam grupos metil. Aliás, qualquer enzima que seja uma "metiltransferase" (terminada com as iniciais MT – por exemplo, a enzima COMT, que desintoxica o estrogênio e os hormônios do estresse) também desempenha um papel muito importante na modificação epigenética, onde grupos metil podem ser usados ​​para inativar partes do nosso código genético por meio da metilação do DNA.

Se o organismo não consegue doar metil de forma eficiente, podem surgir alterações na produção desses neurotransmissores, o que está associado a quadros como depressão, ansiedade, fadiga e déficit cognitivo.

Ácido fólico e metabolismo

O principal suprimento de grupos metil do corpo frequentemente vem de uma substância chamada SAMe (S-adenosil metionina), um produto dos ciclos do folato e da metionina trabalhando juntos. Há uma série de outros subprodutos vitais desses ciclos que também contribuem para outras funções importantes. Por exemplo, o ciclo do folato converte folatos alimentares em 5-MTHF (metil folato), mas no processo também ajuda a sintetizar purinas e timidina, que são necessárias para a replicação e reparo celular.

O 5-MTHF também atua como um cofator para a biopterina (BH4), que é vital para a produção dos neurotransmissores serotonina e dopamina, e dos hormônios adrenalina e noradrenalina. A biopterina também auxilia na produção de óxido nítrico, que promove a circulação e a pressão arterial saudáveis. O ciclo da metionina, na verdade, recicla um metabólito negativo chamado homocisteína, cujos altos níveis estão ligados a doenças cardiovasculares e neurodegeneração, para produzir SAMe, que ajuda a manter a homocisteína em um nível normal.

O ácido fólico (vitamina B9) é um dos nutrientes-chave para o ciclo de metilação. Ele é convertido em formas ativas dentro do corpo, que permitem a regeneração da metionina a partir da homocisteína, um processo essencial para manter o fornecimento de radicais metil.

Quando há deficiência de folato, esse ciclo se compromete e a homocisteína pode se acumular no sangue – um marcador de risco não só para doenças cardiovasculares, mas também para disfunções neurológicas.

Garantir uma boa ingestão de folato por meio da alimentação (vegetais verdes escuros, leguminosas, fígado) ou, em alguns casos, suplementação orientada por profissional de saúde, pode ser um passo importante para manter a saúde cerebral e emocional em equilíbrio.

O padrão-ouro: Teste do Formiminoglutamato (FIGLU)

Para avaliar se o organismo está aproveitando corretamente o folato, existe um exame considerado padrão-ouro: a dosagem de formiminoglutamato (FIGLU).

O FIGLU se acumula quando há deficiência de ácido fólico, sendo assim um indicador sensível do metabolismo dessa vitamina. Embora pouco solicitado na prática clínica, é um teste de grande valor em pesquisas e em situações onde se suspeita de deficiência funcional de folato, mesmo quando os níveis séricos parecem normais.

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Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/