Relação entre neuroinflamação e a via da quinurenina em doenças do sistema nervoso central

A relação entre neuroinflamação e a via da quinurenina em doenças do sistema nervoso central (SNC) envolve mecanismos complexos que ligam a ativação do sistema imunológico ao metabolismo do triptofano.

A via da quinurenina é a principal rota metabólica do triptofano, levando à produção de metabólitos neuroativos, incluindo quinurenina, ácido quinurênico (KYNA), 3-hidroxiquinurenina (3-HK) e ácido quinolínico (QUIN). A via da quinurenina ocorre na microglia, além de outras células do sistema nervoso central, como astrócitos e neurônios.

Funções da micróglia

Micróglia é um sensor de mudanças moleculares no ambiente cerebral (Jia et al., 2021)

  • Auxilia na migração neuronal durante o desenvolvimento.

  • Repara danos neuronais.

  • Preenche espaços deixados pelos neurônios mortos.

  • Recicla neurotransmissores após despolarização.

  • Regula o balanço iônico.

  • Auxilia no tamponamento do pH.

Na microglia, a ativação da via da quinurenina está frequentemente associada a estados inflamatórios, pois essas células expressam a indoleamina-2,3-dioxigenase (IDO-1) e a triptofano-2,3-dioxigenase (TDO), enzimas responsáveis pela conversão do triptofano em N-formil-quinurenina, que é rapidamente transformado em quinurenina.

Aqui estão os principais pontos desta via:

Cells 2021, 10(6), 1548; https://doi.org/10.3390/cells10061548

1. Ativação Imune e a Via da Quinurenina

  • A neuroinflamação, presente em infecções e doenças como Alzheimer, Parkinson, esclerose múltipla e depressão, ativa células imunológicas no SNC, como micróglias e astrócitos.

  • Essas células liberam citocinas pró-inflamatórias, como IFN-γ, TNF-α e IL-6, que induzem a enzima indoleamina 2,3-dioxigenase (IDO) e a triptofano 2,3-dioxigenase (TDO).

  • A ativação dessas enzimas leva à conversão do triptofano (precursor da serotonina) em quinurenina, desviando o metabolismo do triptofano da produção de serotonina para a via da quinurenina.

2. Metabólitos Neurotóxicos e Neuroprotetores

A via da quinurenina gera metabólitos que podem ser neurotóxicos ou neuroprotetores, dependendo do balanço entre eles:

  • Neurotóxicos: Ácido quinolínico (QA) e 3-hidroxiquinurenina (3-HK) aumentam o estresse oxidativo, excitotoxicidade e morte neuronal.

  • Neuroprotetores: Ácido quinurênico (KYNA) atua como antagonista de receptores glutamatérgicos NMDA e reduz a inflamação.

3. Implicações Terapêuticas

Como o desequilíbrio na via da quinurenina contribui para doenças neurodegenerativas e psiquiátricas, estratégias terapêuticas incluem:

  • Inibição da IDO/TDO para reduzir a produção de metabólitos neurotóxicos.

  • Modulação dos metabólitos (exemplo: aumentar KYNA ou reduzir QA).

  • Uso de anti-inflamatórios para regular a ativação da via da quinurenina.

Esse eixo neuroinflamação-quinurenina é um alvo promissor para novas terapias em doenças do SNC. Podemos avaliar esta via com exames metabolômicos.

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Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Avaliação da neuroinflamação

A neuroinflamação pode ser avaliada por imagem PET (Tomografia por Emissão de Pósitrons) usando radiotraçadores que se ligam ao TSPO (Translocator Protein 18 kDa), um biomarcador expresso em células da glia ativadas, especialmente micróglia e astrócitos. Aqui estão alguns aspectos importantes sobre essa abordagem:

1. O Papel do TSPO na Neuroinflamação

O TSPO é uma proteína mitocondrial localizada na membrana externa das mitocôndrias. Sua expressão aumenta em resposta a inflamação e estresse celular, tornando-o um alvo importante para o estudo de doenças neurológicas inflamatórias. A ativação da micróglia e dos astrócitos leva a um aumento da densidade do TSPO, que pode ser detectado com PET (Song et al., 2019).

2. Radiotraçadores TSPO para PET

O [11C]PK11195 foi o primeiro radiotraçador desenvolvido para detectar TSPO, mas tem baixo sinal-ruído. Novos radiotraçadores como [18F]DPA-714, [11C]PBR28 e [18F]GE-180 oferecem melhor especificidade e sensibilidade. A ligação ao TSPO é influenciada por polimorfismos genéticos do gene TSPO, que podem alterar a captação dos radiotraçadores.

3. Aplicações em Doenças Neurológicas

  • Doença de Alzheimer (DA): Aumento da neuroinflamação correlacionado com acúmulo de placas beta-amiloide e tau.

  • Doença de Parkinson (DP): Ativação microglial em regiões como substância negra.

  • Esclerose Múltipla (EM): Monitoramento da ativação glial em lesões desmielinizantes.

  • Traumatismo Cranioencefálico (TCE) e AVC: Avaliação do papel da neuroinflamação secundária no dano cerebral.

  • Doenças psiquiátricas: Esquizofrenia e depressão maior podem ter um componente neuroinflamatório detectável via PET-TSPO.

4. Limitações e Desafios

  • Especificidade do TSPO: Embora seja um marcador inflamatório, TSPO não diferencia entre ativação pró-inflamatória e anti-inflamatória da micróglia.

  • Efeito do polimorfismo TSPO: Indivíduos com certas variantes genéticas podem apresentar menor captação de radiotraçadores, complicando a interpretação.

  • Alto custo e disponibilidade: Radiotraçadores PET requerem síntese específica e infraestrutura avançada. A cobertura do PET-TSPO neurológico por planos de saúde pode ser limitada. Além disso, no Sistema Único de Saúde (SUS), a cobertura para esse exame é restrita a casos específicos.

O uso da imagem PET-TSPO continua sendo uma ferramenta valiosa para entender o papel da neuroinflamação em doenças neurológicas, ajudando no diagnóstico precoce e no monitoramento da progressão da doença e resposta a tratamentos. Existem outros marcadores para neuroinflamação, mas o PET-TSPO continua sendo o mais utilizado (Chauveau et al., 2024).

Sridharan et al., 2017 - A imagem fornece evidências visuais e quantitativas da distribuição e captação de três diferentes radiotraçadores de TSPO em um modelo de neuroinflamação leve usando diferentes biomarcadores.

Como alternativa aos exames de imagem existem os exames metabolômicos, que podem identificar biomarcadores inflamatórios no sangue e na urina, fornecendo um perfil metabólico detalhado da inflamação, apesar de não serem específicos para neuroinflamação.

🩸 Biomarcadores Inflamatórios no Sangue

Esses biomarcadores refletem processos inflamatórios em curso, incluindo neuroinflamação e inflamação sistêmica:

1️⃣ Lipídios pró e anti-inflamatórios

  • Eicosanoides (derivados do ácido araquidônico): prostaglandinas (PGE₂), leucotrienos (LTB₄), tromboxanos (TXB₂).

  • Ácidos graxos poli-insaturados (PUFAs): relação ômega-3/ômega-6 pode indicar inflamação crônica.

  • Resolvinas, maresinas e lipoxinas: mediadores lipídicos anti-inflamatórios.

2️⃣ Outros Metabólitos Relevantes

  • Proteína C-reativa (PCR) metabólica

  • Metabólitos do ciclo do ácido cítrico (TCA/Krebs): disfunção metabólica ligada à inflamação.

  • Metilação da homocisteína (ligada ao metabolismo do folato e B12, indicando inflamação crônica).

💧 Biomarcadores Inflamatórios na Urina (Metabolômica)

A urina contém metabólitos que refletem inflamação sistêmica e estresse oxidativo:

1️⃣ Eicosanoides e Metabólitos Lipídicos

  • Prostaglandinas urinárias (PGE-M, PGD-M, TXB₂-M): indicam inflamação ativa.

  • Isoprostanos (8-iso-PGF2α): biomarcadores de estresse oxidativo.

2️⃣ Metabólitos do Triptofano

  • Ácido quinurênico e quinolínico: indicam ativação da via inflamatória do triptofano.

  • Serotonina urinária (reduzida na inflamação crônica).

3️⃣ Ácidos Orgânicos e Aminoácidos

  • Cetonas e metabólitos do ciclo do ácido cítrico (TCA): marcadores de disfunção mitocondrial inflamatória.

  • Metabólitos da tirosina (ácido homogentísico, ácido vanilmandélico): podem indicar inflamação associada a estresse oxidativo.

4️⃣ Indicadores de Disfunção Redox e Estresse Oxidativo

  • GSSG/GSH (glutationa oxidada/reduzida): menor relação GSH/GSSG sugere estresse oxidativo e inflamação.

  • Metilmalonato (MMA): indica disfunção mitocondrial e inflamação crônica.

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Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/

Autismo e depressão

A relação entre autismo e depressão foi explorada em vários estudos, destacando vários aspectos dessa interação complexa:

Um estudo envolvendo 1.024 estudantes universitários encontrou uma correlação positiva significativa entre traços autistas e depressão (r = 0,39, p < 0,001). Foi observado que a regulação emocional interpessoal e a autoeficácia social desempenharam papéis mediadores nessa relação, sugerindo que aprimorar essas habilidades poderia ajudar a mitigar a depressão em indivíduos com altos traços autistas [1].

Outro estudo focado em adultos em idade universitária de diferentes origens raciais revelou que a associação entre traços autistas e sintomas de ansiedade e depressão foi mais forte em participantes negros em comparação com participantes brancos não hispânicos. Isso ressalta a importância de considerar fatores demográficos ao examinar os resultados de saúde mental em indivíduos autistas [2].

A pesquisa indicou que a ansiedade e a depressão podem mediar a relação entre traços autistas e outros problemas, como comportamento de acumulação. Em uma grande amostra de estudantes universitários chineses, efeitos mediadores significativos de ansiedade e depressão foram observados, sugerindo que esses estados emocionais poderiam influenciar a manifestação de traços autistas [3].

Um estudo sobre estudantes universitários iranianos descobriu que a resolução de problemas sociais mediou parcialmente a relação entre traços autistas e depressão. Isso indica que dificuldades na resolução de problemas podem contribuir para o aumento da vulnerabilidade à depressão entre aqueles com traços autistas [4].

No geral, essas descobertas destacam uma associação consistente entre autismo e depressão, com vários fatores mediadores, como regulação emocional, ansiedade e resolução de problemas sociais desempenhando papéis significativos nessa relação. Um outro fator que contribui para a depressão no autismo é a neuroinflamação.

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Referências

1) C Liu et al. The Association Between Autistic Traits and Depression in College Students: The Mediating Roles of Interpersonal Emotion Regulation and Social Self-Efficacy. Psychology research and behavior management (2024). https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/39559710/

2) MR Kurtz et al. The role of the broader autism phenotype in anxiety and depression in college-aged adults. Frontiers in psychiatry (2023). https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/37342174/

3) W Xu et al. Relationship between autistic traits and hoarding in a large non-clinical Chinese sample: mediating effect of anxiety and depression. Psychological reports (2015). https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/25650639/

4) ZS Einadab et al. Mediating Role of Social Problem-Solving on the Relationship between Autistic Traits and Depression in a Non-Clinical Iranian Sample. Iranian journal of public health (2022). https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/36415796/

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/