A Síndrome Skraban‑Deardorff (SKDEAS) é causada por variantes patogênicas no gene WDR26. Caracteriza-se por atraso global do desenvolvimento, deficiência intelectual, epilepsia, marcha atáxica, baixo tônus muscular na infância, dificuldades alimentares e feições faciais distintas (como nariz largo, dentes espaçados, sorriso gengival)
O gene WDR26 codifica uma proteína WD‑repeat que integra o complexo ubiquitina E3 denominado CTLH, atuando na ubiquitinação e degradação de proteínas regulatórias, inclusive o fator repressivo de transcrição HBP1.
A) Complexo WDR26-CTLH (EMD-12542) composto por WDR26, RANBP9, TWA1, ARMC8, MAEA e RMND5A na proporção de 2:2:2:2:1:1
B) Desenho ilustrando como os dímeros WDR26 conectam dois complexos CTLH E3 centrais em uma montagem supramolecular WDR26-CTLH E3
C) C) Modelo AF de um dímero da isoforma 1 de WDR26 (ID UniProt: Q9H7D7-1) destacando suas partes funcionalmente importantes.
Este gene forma homodímeros que ligam duas unidades centrais do CTLH E3, criando um complexo supramolecular oco com formato oval. Esse arranjo é necessário para a estabilidade e atividade da E3 ubiquitina ligase (Gross et al., 2024).
Embora WDR26 não seja uma enzima de ubiquitinação, ele modula vias intracelulares que usam ubiquitina para regular a estabilidade, localização e atividade de proteínas. WDR26 interage com o subcomponente YPEL5 e atua como receptor de substrato, reconhecendo e mediando a ubiquitinação do repressor transcricional HBP1.
As vias reguladas por ubiquitinação são cruciais no desenvolvimento neurológico, plasticidade sináptica e remoção de proteínas defeituosas. Com a perda da função de WDR26, essas vias podem ser desreguladas, o que contribui para os sintomas neurológicos da síndrome.
Um estudo analisou 16 mutações associadas à síndrome. Destas, 15 mutações comprometeram ao menos uma função essencial do complexo CTLH (montagem estrutural, interação com YPEL5 ou degradação de HBP1).
A maioria das mutações leva a falhas estruturais no CTLH E3, seja por incapacidade de formar os homodímeros essenciais ou por perda de afinidade com co‑subunidades/reguladores. Em consequência, há defeitos na ubiquitação e inspeção de proteínas reguladoras (como HBP1), o que pode perturbar a expressão gênica, decisões de crescimento e diferenciação neuronal.
É uma síndrome rara e estimativas recentes apontam para um total de cerca de 150 pacientes diagnosticados mundialmente até 2023. Não existem dados oficiais do governo brasileiro sobre número de pacientes com a síndrome de Skraban‑Deardorff no Brasil. Entretanto, a Skraban‑Deardorff Syndrome Foundation registrou a presença de 13 famílias brasileiras em seu evento global (Family Meeting).
Objetivos gerais do acompanhamento nutricional
Os objetivos nutricionais para pacientes com SKDEAS incluem:
Corrigir ou prevenir déficits nutricionais e energéticos
Apoiar o desenvolvimento neurocognitivo
Ajustar consistência e técnica alimentar à função oromotora
Modular crises epilépticas com suporte dietético
Apoiar a família com estratégias práticas e seguras de alimentação
Protocolo Nutricional para SKDEAS
1. Avaliação inicial multidisciplinar
Avaliação nutricional (peso, altura, perímetros, ingestão habitual)
Avaliação de deglutição e tônus orofacial com fonoaudiólogo
Avaliação neurológica e metabólica
Exames laboratoriais: ferro, ferritina, B12, vitamina D, zinco, selênio, perfil lipídico, glicemia, lactato, perfil hepático
2. Prescrição nutricional personalizada
a) Requisitos energéticos e proteicos (ajustados por condição clínica):
Calorias: 110–130 kcal/kg/dia (varia por idade e gasto energético)
Proteínas: 1.2–2.0 g/kg/dia (em caso de epilepsia ou catabolismo)
Lipídios: 35–50% do VET (se epilepsia presente: considerar dieta cetogênica)
b) Suplementação padrão recomendada:
Ômega-3: Suporte para k neurodesenvolvimento
Colina: formação de membranas neuronais
Vitamina D: Tônus, imunidade, ossos
Zinco: desenvolvimento, imunidade
Ferro, cognição, se ferritina <30 ng/mL
Complexo B: Metilação e neurotransmissão
Selênio: proteção antioxidante
3. Modulação da epilepsia
Se o paciente apresentar epilepsia de difícil controle, considerar:
a) Dieta cetogênica clássica
Relação gordura:carboidrato + proteína = 4:1 ou 3:1
Início sob supervisão hospitalar
Suplementação com:
Carnitina
Polivitamínico sem carboidratos
Fibras prebióticas
b) Dieta cetogênica modificada com TCM (triglicerídeos de cadeia média)
Mais palatável, permite maior teor de proteínas e vegetais
Boa aceitação para crianças seletivas
4. Adaptação da consistência alimentar e apoio à deglutição
Classificação da consistência (segundo IDDSI):
Disfagia leve: purês espessos, líquidos néctar
Disfagia moderada: dieta pastosa, líquidos mel
Disfagia grave: via alternativa (SNG, gastrostomia)
Técnicas de alimentação:
Pratos com cores contrastantes, utensílios adaptados
Alimentação em ambiente calmo, sem estímulos dispersivos
5. Estratégias comportamentais e de seletividade alimentar
Aplicar princípios do método SOS (Sequential Oral Sensory Approach):
Exposição gradual a novos alimentos
Tolerância sensorial antes da aceitação oral
Evitar coerção alimentar
Introdução lenta de texturas variadas
A nutrição tem papel terapêutico e preventivo essencial na SKDEAS:
Garante o crescimento adequado apesar de dificuldades alimentares;
Modula o funcionamento neurológico e epiléptico;
Previne deficiências nutricionais crônicas;
Apoia o desenvolvimento funcional da criança.
O protocolo deve ser sempre individualizado, com base nas necessidades clínicas, motoras e neurológicas do paciente.
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