Os fosfolipídios são constituintes essenciais das membranas celulares, e possuem uma taxa de renovação muito alta, o que envolve uma síntese contínua. Os principais fosfolipídios em humanos são fosfatidilcolina, fosfatidiletanolamina, fosfatidilinositol e esfingomielina.
A fosfatidilcolina (PC) compreende aproximadamente 50% do conteúdo de fosfolipídios das células humanas. Garante a manutenção da homeostase e compartimentalização celular. Também desempenha atividades enzimáticas associadas aos sistemas de membrana e orquestra a imunidade humoral.
No sistema nervoso central, os fosfolipídios estruturais da membrana neuronal são essenciais para a maturação cerebral adequada. A fosfatidilcolina é importante para o crescimento de neuritos e regeneração neuronal. A membrana celular prejudicada e o metabolismo dos fosfolipídios têm sido implicados na fisiopatologia do edema cerebral e lesão cerebral traumática, bem como na hipóxia e na isquemia cerebral. Também ocorrem alterações nas membranas neuronais e no metabolismo dos fosfolipídios estruturais associadas ao envelhecimento cerebral e certas doenças neurodegenerativas, como comprometimento cognitivo, demência vascular e demência senil do tipo Alzheimer.
Alterações no metabolismo dos fosfolipídios, particularmente da fosfatidilcolina, têm sido implicadas como mecanismos que desencadeiam a cascata apoptótica em diversas condições. A citicolina é o nome genérico da substância farmacêutica que quimicamente é a citidina-5'-difosfocolina (CDP-colina), um precursor intracelular natural da fosfatidilcolina. Consiste em ribose, citosina, pirofosfato e colina.
A CDP-colina também está relacionada ao metabolismo do neurotransmissor acetilcolina. Assim, a administração de CDP-colina é uma fonte exógena de colina e citidina. A colina participa de vários processos neuroquímicos relevantes. É o precursor e metabólito da acetilcolina, desempenha um papel no metabolismo do 1-carbono e é um componente essencial de diferentes fosfolipídios de membrana. A fração citidina, uma vez transformada em uridina, é utilizada para a síntese de DNA e RNA, bem como para a síntese de constituintes de membrana e glicosilação, tendo também um efeito importante nos receptores purinérgicos.
A citicolina protege a substância branca e a substância cinzenta após traumatismo craniano através da supressão do estresse oxidativo e inibição da superativação da calpaína (enzima de degradação). Em animais que passaram por lesão medular, a suplementação de citicolina reduziu a peroxidação lipídica e melhorou a função motora. Em humanos, a suplementação contribui para a redução do edema cerebral.
Após derrame cerebral o cérebro sofre uma isquemia (falta de oxigenação), com o consequente sofrimento neuronal. A síntese endógena de CDP-colina fica comprometida porque a célula, sob tais condições, carece dos compostos de fosfato de alta energia necessários para esta via biossintética. Estudos experimentais demonstraram que a citicolina previne a liberação de ácidos graxos durante isquemia cerebral e hipóxia e aumenta a síntese de fosfolipídios estruturais. A sequelas pós-derrame são menores com a suplementação de citicolina.
A suplementação de altas doses de citicolina (assim como creatina) também aumenta os níveis cerebrais de adenosina trifosfato (ATP) pós isquemia. a citicolina também possui efeito neuroprotetor, restaurando a função da barreira hematoencefálica, mantendo a integridade mitocondrial e aumentando a sirtuína 1.
A Sirtuína 1 (SIRT1) é uma proteína que atua como um sensor metabólico. Em resposta a diferentes estímulos ambientais, a SIRT1 liga-se à estrutura da cromatina e regula a expressão gênica de fatores que regulam o metabolismo energético e a resposta ao estresse.
A citicolina também aumenta significativamente os níveis de dopamina no corpo estriado e de norepinefrina no córtex cerebral, sendo muito interessante no tratamento do TDAH e da doença de Parkinson. Os efeitos da citicolina parecem ser mediados pela hipersensibilidade de alguns receptores dopaminérgicos.
Citicolina e memória
Estudos experimentais mostraram que a citicolina restaura parcialmente o desempenho da aprendizagem e memória em camundongos que passaram por situação de hipóxia. Também previne amnésia gerada por medicamentos, drogas ou privação de sono.
Com o envelhecimento o cérebro muda. Observam-se alterações no metabolismo lipídico e glicolítico.
No declínio cognitivo e Alzheimer, a citiciolina restaura a atividade das bombas de acetilcolinesterase e Na+/K+ no hipocampo, melhorando a memória.
De acordo com López-Coviella e cols. (1987) os níveis plasmáticos de colina aumentaram 48% e os níveis plasmáticos de citidina 136% duas horas após a administração de uma dose oral única de 2 g de citicolina.
Em indivíduos que receberam três doses de 2 g em intervalos de duas horas, os níveis plasmáticos de colina atingiram um pico, representando aproximadamente 30% do valor basal, quatro horas após a administração da dose inicial de citicolina, enquanto os níveis plasmáticos de citidina aumentaram até seis horas e foram cinco vezes superiores ao valor basal (p < 0,001).
Estas observações mostram que a citicolina, administrada tanto por via oral como intravenosa, é convertida em dois principais metabólitos circulantes, citidina e colina. No entanto, a citidina plasmática é convertida em uridina, a sua forma circulante, que é transformada no cérebro em fosfato de uridina, que por sua vez será convertida em trifosfato de citidina a nível neuronal.
E um estudo piloto duplo-cego, aleatorizado, controlado por placebo, a citicolina (1 g/dia/12 semanas) foi administrada por via oral e comparada com grupo que recebeu placebo. Todos os pacientes tinham diagnóstico de demência senil leve a moderada do tipo Alzheimer. Em comparação com os 17 doentes tratados com placebo, os doentes que receberam citicolina e que tinham um genótipo APOE ε4 positivo apresentaram uma melhoria significativa na sua capacidade cognitiva, avaliada pela escala de avaliação da doença de Alzheimer (Alvarez et al., 1999).
Numa revisão sistemática publicada pela Biblioteca Cochrane, Fioravanti e Yanagi (2004) examinaram os efeitos da citicolina no tratamento de pacientes idosos com déficits cognitivos. Utilizando os seis estudos que relataram resultados de testes de memória em 675 participantes com déficits cognitivos associados a distúrbios cerebrovasculares, a meta-análise evidenciou um efeito positivo estatisticamente significativo da suplementação oral de citicolina na memória, no comportamento, impressão clínica global e tolerabilidade.
A absorção por via oral é virtualmente completa e a biodisponibilidade por via oral é, portanto, aproximadamente a mesma que pela via intravenosa. Uma vez absorvida, a citicolina é amplamente distribuída por todo o corpo, atravessa a barreira hematoencefálica e atinge o sistema nervoso central, onde é incorporada à membrana e à fração fosfolipídica microssomal.
A citicolina ativa a biossíntese de fosfolipídios estruturais das membranas neuronais, aumenta o metabolismo cerebral e atua nos níveis de diferentes neurotransmissores. Aumenta os níveis de norepinefrina e dopamina no sistema nervoso central. Devido a estes mecanismos farmacológicos, a citicolina tem um efeito neuroprotetor em condições hipóxicas e isquêmicas e também melhora o desempenho da aprendizagem e da memória. Restaura a atividade da ATPase mitocondrial e da Na+/K+ATPase da membrana, inibe a ativação da fosfolipase A2 e acelera a reabsorção do edema cerebral em vários modelos experimentais.
É um suplemento seguro, conforme demonstrado pelos testes toxicológicos realizados, que não apresenta efeitos colinérgicos sistêmicos significativos e é um produto bem tolerado. Estas características farmacológicas e os mecanismos de ação da citicolina sugerem que este produto pode ser indicado para o tratamento de doenças vasculares cerebrais, traumatismos cranianos de gravidade variável e distúrbios cognitivos de diferentes causas.