Autismo e epilepsia - tratamento combinado com canabinóides

Em aula da Kalapa Academy o médico Mariano García de Palau discutiu o caso de uma criança de 5 anos (sexo feminino, 14 kg) com mutação do gene SYNGAP1, associada a transtornos do neurodesenvolvimento, desordens de movimento, episódios epilépticos e sintomas do transtorno do espectro autista (TEA). Muitas crianças com a mutação também apresentam dificuldades alimentares e desordens do sono, como a criança em questão.

A criança já seguia dieta sem glúten e lactose e estava em uso de dois medicamentos para o controle das crises epilépticas (micropakine e lamictal), contudo sem sucesso. O médico sugeriu o uso do CBD e do THC derivados da planta Cannabis. A família aceitou apenas o início do CBD.

Diferenças entre CBD e THC

O CBD (canabidiol) e o THC (tetraidrocanabinol) são as duas substâncias mais conhecidas e estudadas dentre os derivados da Cannabis. Estes canabinóides (existem mais de 100) ligam-se a receptores do cérebro e de outros órgãos modificando a fisiologia humana.

Existem várias espécies de Cannabis, algumas mais ricas em THC e outras mais ricas em CBD. O cânhamo é naturalmente rico em CBD e baixo em THC, tornando-o legal na grande maioria do mundo moderno, desde que a concentração de THC permaneça abaixo dos 0,2–0,3%. Isto porque o THC possui efeitos psicotrópicos, alterando o estado mental, enquanto o CBD não apresenta tais efeitos.

A maioria das pessoas utiliza óleos contendo apenas CBD ou CBD com uma concentração muito baixa de THC. Os principais usos do CBD são:

  • Controle de crises epilépticas

  • Redução de inflamação e dor

  • Tratamento de doenças inflamatórias intestinais

  • Redução de náuseas

  • Tratamento de enxaqueca

  • Controle da ansiedade

Existem medicamentos contendo THC também (como nabilona e dronabinol) usados principalmente para controle de náuseas e vômitos em pacientes com câncer fazendo quimioterapia. O THC também reduz dor, espasticidade muscular. Existem estudos para tratamento do glaucoma, insônia, anorexia e ansiedade. Além disso, muitas pessoas beneficiam-se de combinações de cannabinóides pelo efeito mais abrangente (entourage).

CBD e THC interagem com o sistema endocanabinóide, podendo modular diferentes aspectos relacionados à cognição, nocicepção, plasticidade neuronal, muitas vezes alteradas no autismo, como no caso descrito pelo Dr. Mariano de Palau.

Como CBD e THC exercem seus efeitos?

O sistema endocanabinóide é composto principalmente por dois receptores, CB1 e CB2, endocanabinóides (substâncias produzidas no corpo e que ativam tais receptores) e as enzimas responsáveis pela síntese e metabolilsmo dos endocanabinóides anandamida (AEA) e 2-araquidonoilglicerol (2-AG). Sim, nosso corpo produz canabinóides e as plantas também.

Os receptores CB1 são expressos tanto no sistema nervoso central quanto no periférico com maior expressão nos núcleos dos gânglios da base e nos neurônios pré-sinápticos GABAérgicos e glutamatérgicos.

Considerando que o sistema endocanabinóide modula emoções, humor, reações comportamentais ao contexto e interação social, os investigadores começaram a formular a hipótese de que alterações nesse sistema estariam presentes no fenótipo autista, com menor produção de substâncias como a anandamida (AEA). Desta forma, o uso de canabinóides de plantas poderia ser útil para controle da sintomatologia, pelo aumento de GABA (relaxante) e redução de glutamato (excitatório) e com menos efeitos colaterais que a medicação clássica.

Uso de canabinóides no autismo

Estudos de caso vêm demonstrado redução da hiperatividade, estereotipias e melhoria da capacidade de comunicação com o uso de canabinóides. No caso descrito

A criança descrita chegou ao serviço já seguindo dieta sem glúten e sem lactose, aos 5 anos, pesando 14 kg. Para controle das crises epilépticas a menina utilizava os medicamentos micropakine, 3 vezes ao dia (ácido valpróico + valproato de sódio) e lamictal, 2 vezes ao dia (lamotrigina) porém seguia com muitas convulsões, não falava, não demonstrava interesse pelo ambiente, tinha muitas ausências, hipotonia generalizada, agitação (especialmente à noite), agressividade, estrabismo. Fazia acompanhamento com fono, fisio e estimulação neural.

O médico sugeriu uma combinação de CBD e THC. A família recusou o uso do THC uma vez que não é permitido na Espanha. Optou pelo óleo de CBD sublingual a 10%. O tratamento foi iniciado com 1 gota pela manhã e 2 gotas noite (pausa de 12 horas). A dose total: 9,9 mg de cbd/dia (0,7mg/kg/peso). Considera-se uma dose inicial segura para teste: 0,5 a 1 mg/kg/dia.

Após 1 mês de uso os pais relataram melhor compreensão verbal, mais tranquilidade, menos agitação noturna, menor sensibilidade a estimulos auditivos, luminosos e táteis. As crises epiléticas continuaram. Foi adicionada mais uma gota do óleo, totalizando 13,2 mg cbd/dia (0,94 mg/kg/dia)

No 6o mês,foi possível a redução em 100 mg da medicação micropakine e também do lamictal. O número de crises convulsivas foi reduzida. Para melhor controle da epilepsia foi aumentada a dose do óleo para 4 gotas manhã, 3 gotas tarde e 4 gotas à noite (36,3mg de CBD/dia (2,59. mg/kg/dia). Os pais relatam insônia leve e falta de apetite da criança como efeitos colaterais.

No 8o mês houve redução de mais 50 mg de medicação micropakine e manutenão da lamictal. A marca do óleo precisou ser trocada devido à dificuldade de abastecimento e falta de estoque no país. O novo óleo (também a 10%) foi passado para 7 gotas manhã /6g à noite /7g antes de dormir (5mg/kg/dia)

Com 1 ano foi feita nova redução de valproato (micropakine), manutenção de lamictal. Pais relatam que criança reconhece as mãos, que não reconhecia. Sorri. Mais interação social, dá abraços, fica contente em sair (antes ficava irritada). Dose de CBD - 10/10/12 gotas (102,3mg de CBD) - 7,5 mg/kg/dia

Marcha continua instável (valproato?), irritabilidade persiste e a equipe sugere novamente o THC 3%. A família aceita e inicia-se com 1 gota/1gota/1 gota/2 gotas ao longo do dia. Há redução do Micropakine para 50 mg/dia mas problemas comportamentais retornam (autolesão, frustração, insônia, sem aumento das crises epilepticas). A família relata que o THC gera mais tranquilidade mas que o efeito é muito curto.

É feito novo ajuste CBD 10% - 15/15/5/15 (50mg/dia)- 7,7 mg/kg/dia.

THC 3% indica vai aumentando e chega 2/2/2/4 gotas ao dia (10mg/dia) . Valproato é aumentado também para 150 mg de micropakine. As alterações geram mais estabilidade a nível neurosensorial, melhoria de tontura e desequilíbrio vestibular, menos sensibilidade, busca tato, busca estimulação visual. Mais atenta, 50% menos nervosa, ausência de crises epilépticas no último mês, sabe orientar-se a nivel espacial, diz mamãe e papai, reconhece formas, dorme bem, movimentos intestinais normais. Quando há redução do efeito de THC (2 a 3 horas) a irritabilidade e agressividade retorna, assim como estrabismo e problemas de comportamento.

THC é novamente aumentado para 4/3/3/5 - 0,6 mg/Kg/dia THC. Há manutenção da dose da medicação de valproato 150mg/dia e lamictal (Lamotrigina) 35mg. Persistem problemas de sono a partir das 4h da madrugada com choro, ausências. Novo aumento de CBD para 9,7mg/kg/dia e THC 1,12 mg/kg/dia. Desta vez parece que a dose finalmente gera estabilidade.

O percurso mostra a importância do acompanhamento de uma equipe médica para prescrição e doseamento correto das drogas anticonvulsivantes e dos canabinóides. No Brasil, tanto CBD quanto THC são medicamentos. Em vários países o THC é proibido ou considerado medicamento, enquanto CBD pode ser considerado medicamento ou suplemento dependendo da legislação. Nos EUA e na maioria dos países da Europa o CBD é um suplemento de venda livre.

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Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/