Consumidor quer informações sobre o que come

O número crescente de pessoas que se alimentam fora de casa é acompanhado pelo também crescente número das que gostariam de ter acesso a maiores informações sobre o que lhes é servido, mesmo em restaurantes que já disponibilizam informações nutricionais aos seus clientes. É o que mostram pesquisas realizadas por Michele Sanches e Vanessa Maestro, alunas do curso de doutorado em Alimentos e Nutrição da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Unicamp, orientadas pela professora Elisabeth Salay.

Na pesquisa elaborada por Sanches, entre 250 consumidores (metade homens, metade mulheres) residentes em Campinas e que costumam alimentar-se fora de casa, 64% deles concordaram que “deveriam ser lançadas campanhas para esclarecer a população como interpretar as informações nutricionais sobre os alimentos”. Esse anseio, no entanto, por enquanto é quase uma utopia: ainda não existe nada regulamentado sobre a obrigatoriedade de fornecimento dessas informações pelos restaurantes e as constatações das pesquisadoras foram que as ações nesse sentido ainda são incipientes. Há um longo caminho a ser percorrido até que os gerentes e donos de restaurantes resolvam atender a essa necessidade.

O estudo de Sanches buscou identificar a freqüência do consumo de refeições fora de casa, que tipos de estabelecimentos eram mais freqüentados, os fatores que influenciam a escolha dos locais e quais as atitudes dos consumidores em relação à informação nutricional. A pesquisa constatou que o almoço é a refeição realizada com maior freqüência fora do domicílio, que o self service é o local preferido pelos entrevistados e que quase 89% deles têm realmente uma atitude positiva com relação às informações nutricionais fornecidas pelos restaurantes.

Já Maestro se ocupou em identificar iniciativas de fornecimento de informação nutricional em restaurantes de Campinas. Ela conversou com 114 gerentes, sendo 20 de estabelecimentos do tipo fast food e 94 do tipo full service, sorteados aleatoriamente entre as cinco regiões do município. Esse estudo contabilizou quantos dentre eles oferecem tais informações e de que tipo (se informam o conteúdo de calorias, gorduras ou a existência de opções light, por exemplo), além de avaliar se havia cálculo nutricional e, caso não houvesse, por qual motivo. A pesquisa levantou ainda os meios utilizados para veicular as informações (cardápio, folders, página eletrônica), as vantagens e dificuldades alegadas pelos gerentes que não oferecem informação nutricional e a quantidade de estabelecimentos que contam com um responsável técnico.

Somente 25,4% dos restaurantes analisados por Maestro fornecem informação nutricional e esse índice é maior entre os restaurantes fast food. O tipo de informação mais empregado é a declaração de nutrientes, com destaque para a informação do valor energético e de macronutrientes (proteínas, gorduras e carboidratos que fornecem quilocalorias) de alguns pratos. O local mais usado para a disposição das informações é o cardápio, com 48,3% das citações.

Entre as conclusões do estudo, uma das mais interessantes para a pesquisadora é que a implementação de informação nutricional nos restaurantes, de acordo com os gerentes, não alcançou a expectativa deles em aumentar o faturamento. “Percebe-se que esse fator é motivo de grande preocupação, sendo referido como uma das dificuldades mais importantes na manutenção desse tipo de ação”, relata Maestro. Em relação às dificuldades imaginadas pelos gerentes que não adotam a informação nutricional, percebeu-se que há uma preocupação maior com o custo para a elaboração da informação nutricional do que com fatores relativos aos funcionários (falta de tempo ou capacitação) e ao cardápio (falta de um receituário padrão, grande variedade de preparações).

Com base nesses dados, Sanches acredita que os proprietários e gerentes dos restaurantes só irão se ocupar em fornecer essas informações se o consumidor solicitá-las, levados pela competitividade: quem fornecer o que o consumidor está pedindo fica com essa fatia de mercado. Por isso, avalia, a mudança começaria a partir de um consumidor consciente.

Essa consciência, na opinião de Maestro, exige um trabalho contínuo e de longo prazo. Ela defende que o ensino fundamental deveria ter disciplinas de nutrição em seu currículo, como forma de estimular as crianças a ler e aplicar no cotidiano as informações nutricionais. “Crianças menos conscientes sobre a importância de uma dieta saudável serão adultos menos educados e motivados para tanto”, aponta. “A mídia também tem sua parcela de culpa, pois incentiva o consumo de alimentos calóricos, ricos em sódio e gorduras, como os sanduíches, e não incentiva o consumo de frutas, verduras e legumes”, acusa. Em sua opinião, os nutricionistas poderiam estimular seus clientes que necessitam de uma dieta de baixas calorias a exigir esse tipo de informação nos restaurantes que freqüentam ou mesmo reivindicar a criação de novos pratos mais saudáveis.

O grande desafio, define Maestro, está em o consumidor não somente ler mas entender e fazer uso das informações nutricionais. “É preciso que sejam elaborados programas com estratégias bem definidas, com recursos didáticos pertinentes, com avaliação de impacto para definirmos qual é a melhor estratégia a ser usada”, defende. No entanto, lamenta, no Brasil o assunto é novo, ainda não existe nada a respeito. Ela acredita que uma das ferramentas que conseguirá atingir toda a população é a pirâmide alimentar. Trata-se de uma proposta educativa que esclarece o papel de cada alimento no organismo e apresenta as porções recomendadas para o consumo diário. A partir dela poderiam ser elaborados cardápios balanceados e toda essa informação poderia ser transmitida, por exemplo, por meio de cartazes fixados ao longo da fila nos restaurantes.

Outras estratégias sugeridas por Maestro seriam que fossem fornecidas informações nutricionais no cardápio e que se instalasse também um glossário próximo ao buffet sobre definições, funções dos nutrientes, etc. E se possível, que houvesse um nutricionista para tirar dúvidas dos clientes, caso fosse requisitado.

Fonte: http://www.comciencia.br/comciencia/?section=3&noticia=239

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/